Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
284337/11.9YIPRT.G1
Relator: MARIA DA PURIFICAÇÃO CARVALHO
Descritores: INJUNÇÃO
PRESCRIÇÃO PRESUNTIVA
PRESUNÇÕES JUDICIAIS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/30/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1. Convolado o procedimento injuntivo em acção ordinária, por ter sido apresentada contestação, ocorreu transmutação processual desaparecendo a injunção.
2. Encontrando-nos perante a normal tramitação de um processo comum, deverá, neste âmbito, ser discutida e apreciada a relação jurídica substantiva - sinteticamente gizada.
3. Para ser atendida a prescrição presuntiva deve o réu devedor, na contestação, invocar o pagamento efectivo em simultâneo com a prescrição presuntiva.
4. A utilização pelas Relações de presunções naturais ou judiciais é lícita, mas tem como limite a exigência de uma congruência com a matéria de facto fixada através da livre valoração da prova produzida, com imediação e oralidade, em audiência,
Decisão Texto Integral: RELATÓRIO
C.. instaurou procedimento de injunção, contra D.., pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de € 33.600,00, acrescida de juros vencidos no valor de € 8.181,83 e vincendos até integral pagamento.
Alegou, para tanto e em síntese, que dedica-se à importação e compra e venda de veículos automóveis e que, em 20 de Outubro de 2008, vendeu ao réu o veículo automóvel da marca BMW, modelo 330 D, com o quadro n.".. e de matrícula .. pelo preço de € 33.600,00, emitindo para o efeito a factura n." 003 que devia ser liquidada no prazo de 10 dias. Porém, o réu levou o referido veículo mas não pagou qualquer quantia para liquidar a factura e pagar o respectivo preço.
No Requerimento de injunção, à frente da expressão “Obrigação emergente de transacção comercial (DL n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro) ”, está escrito “SIM”.
Notificado de tal pretensão, o réu apresentou oposição, na qual invocou o pagamento do preço acordado, no valor de € 25.000,00, sendo que € 12.500,00 foram pagos ao autor a título de sinal, e € 12.500,00 no stand vendedor na Alemanha. Conclui, pugnando pela improcedência da acção e pela condenação do autor como litigante de má-fé, no pagamento de multa e indemnização a seu favor em valor não inferior a € 2.500,00, assim como no reembolso das despesas que despendeu e vier a despender com a contestação, incluindo os honorários ao seu mandatário.
Na sequência da deduzida Oposição foi determinado por despacho proferido de 13.02.2012 (fl. 42) que os autos sigam a forma de processo ordinário, com o cumprimento do vertido no artigo 492 nº1 do CPC.
Dispensada a audiência preliminar foi proferido despacho saneador, no qual depois de se afirmar a regularidade da instância, foi fixado o valor da causa e procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e da base instrutória.
A matéria de facto controvertida foi fixada por decisão (fl. 108) sem censura.
Realizada a audiência de julgamento no final foi proferida a seguinte decisão:
Pelo exposto, julga-se a presente acção procedente por provada e, em consequência, condena-se o réu D.. a pagar ao autor C.. a quantia de € 33.600,00, acrescida de juros de mora à taxa legal anual supletiva aplicável às operações comerciais, até integral pagamento, ascendendo a € 8.181,83 os juros vencidos em 16.11.2011.
Não se vislumbram indícios de litigância de má fé - art. 456° do C.P.Civil.
Custas a cargo do réu - arts. 446°, n." 1 e 450°, n." 3, segunda parte, do C.P.Civil. Notifique e registe.
É desta decisão que o réu vem apelar, pedindo nas suas conclusões a apreciação das seguintes questões:
- Utilização indevida do processo de injunção, excepção dilatória de conhecimento oficioso cuja omissão de conhecimento na sentença deverá ser suprida pelo Tribunal da Relação.
- tendo o requerido invocado o pagamento do preço deveria ter-se decidido pela prescrição presuntiva;
. analisando a prova produzida, quer documental quer testemunhal o tribunal deveria ter respondido negativamente aos quesitos 1º, 3º, e 4º e positivamente aos quesitos 5º, 6º, e 7º.
O autor contra alegou defendendo a improcedência do recurso.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.
Âmbito do Recurso
As questão a resolver são as supra enunciadas.

Fundamentação
De Facto
Na decisão recorrida foi considerada provada a seguinte factualidade
- Da matéria dada como assente no Despacho Saneador:
a) C.. dedica-se à importação e compra e venda de veículos automóveis.
b) Existe o veículo automóvel da marca BMW, modelo 330 d, com o quadro nº.. o qual foi comprado na Alemanha e posteriormente matriculado em Portugal com a chapa n."...
c) O custo de aquisição do veículo na Alemanha, em 15.4.2008, foi de € 25.000,00.
d) O A. efectuou a legalização em Portugal do veículo identificado em b).
- Da resposta aos quesitos que integram a base instrutória:
e) Em 20.10.2008 o A. declarou vender ao R. e este comprar o veículo identificado em b).
f) Pelo preço de € 33.600,00.
g) O qual tinha de ser pago até 30.10.2008.

Do Direito
Tendo em vista a resolução das supramencionadas questões, importa começar, como é óbvio, por dizer que o procedimento de injunção, é uma providência pré-judicial adequada, em certos casos, à obtenção de um título executivo, através da aposição da fórmula executória no respetivo requerimento (art.ºs 7º e 14º do DL 269/98, de 1 de Setembro) Cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Acção Executiva Singular, 1998, págs. 90/91, Salvador da Costa, A Injunção e as Conexas Acção e Execução, 3.ª edição, pág. 138, e acs. da Relação de Lisboa de 24/2/2000 e de 9/3/2000, in CJ, ano XXV, Tomo I, pág. 127, e Tomo II, pág. 84, respectivamente.. Este procedimento, introduzido no ordenamento jurídico português pelo DL 404/93, de 10 de Dezembro, teve uma regulamentação mais completa com o DL 269/98, de 1 de Setembro, e seu anexo.
Nos termos deste anexo, sendo deduzida oposição por parte do requerido, o procedimento passava a correr termos no tribunal, depois de efectuada distribuição, como acção declarativa, seguindo a tramitação prevista para a acção declarativa especial simplificada, como definido se achava nesse mesmo diploma.
Posteriormente, o Decreto-Lei nº 32/2003, de 17 de Fevereiro alterou o art. 7º do anexo ao Decreto-Lei nº269/98, considerando-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o art. 1º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei nº 32/2003, de 17 de Fevereiro.
Para as transacções comerciais previstas neste último Decreto-Lei, veio ainda, o Decreto-Lei nº 107/2005, de 1 de Julho, sob a motivação de descongestionamento dos tribunais, estipular que quando o valor fosse superior à alçada do tribunal da Relação, a dedução de oposição ou a frustração da notificação do procedimento de injunção, determinavam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma comum do processo ordinário, transmutando-se a injunção, em acção ordinária.
O art. 1º do Decreto-Lei nº.32/2003, de 17 de Fevereiro transpõe para a ordem jurídica interna a directiva nº2000/35/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Junho, a qual estabelece medidas de luta contra os atrasos de pagamento nas transacções comerciais.
Com este Decreto-Lei, a injunção passou a ser também possível em situações de dívida comercial independentemente do montante da dívida.
Assim, o seu art. 7º dispôs o seguinte:
a)O atraso de pagamento em transacções comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida.
b)Para valores superiores à alçada do tribunal de 1ª. instância, a dedução de oposição no processo de injunção determina a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum.
Assim, o diploma aplica-se a todos os pagamentos efectuados como remunerações de transacções comerciais, excluindo os contratos celebrados com consumidores (nos termos constantes do Decreto-Lei nº 84/2008, de 21 de Maio, é considerado «consumidor», aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma actividade económica que vise a obtenção de benefícios) e definiu como «Transacção Comercial» qualquer transacção entre empresa ou entre empresas e entidades públicas, qualquer que seja a respectiva natureza, forma ou designação, que dê origem ao fornecimento de mercadorias ou à prestação de serviços contra uma remuneração.
E, por seu turno, definiu «Empresa» qualquer organização que desenvolva uma actividade económica ou profissional autónoma, mesmo que exercida por pessoa singular.
Diz o recorrente que Constata-se que não foram cumpridos os requisitos legais para a utilização do procedimento de injunção uma vez que a relação invocada pelo requerente não configura uma transacção comercial e o requerido não é comerciante ou uma empresa e o valor reclamamdo é de41 781,83 euros.
Desde já, cumpre dizer que, na oposição o requerido não aludiu à impropriedade do meio processual utilizado pelo requerente, limitando-se a excepcionar o pagamento do preço e a impugnar a demais factualidade.
Não obstante, integrando tal matéria a esfera do conhecimento oficioso vamos proceder à respetiva apreciação.
A decisão do juiz a quo omitiu a discussão desta matéria é verdade, mas também nada teria que dizer.
De facto não se verifica na situação sub judice qualquer erro na forma de processo.
Tendo expressamente qualificado como comercial a sua relação jurídica travada com o requerido, o requerente serviu-se de um meio processual que, em conformidade com a causa de pedir - compreendida no contexto extremamente simplificado e sintetizado deste tipo especial de processo - era perfeitamente adequado (vamos seguir o entendimento expresso no acórdão da Relação de Lisboa de 19.03.2013 proferido mo processo 35913/12.8YIPRT.L1-7 com o qual se concorda)
Ou seja, alegou dedicar-se à importação e compra e venda de veículos automóveis e que vendeu um automóvel ao requerido cujo preço o comprador não satisfez.
Pressupondo a veracidade do alegado – ou mesmo o eventual silêncio do requerido –, não subsistiriam quaisquer dúvidas acerca da perfeita adequação do meio processual utilizado.
Não é, por conseguinte, logicamente possível conceber a citada situação como de erro na forma de processo, o que nem o próprio requerido se lembrou de invocar.
Por outro lado, não se verifica igualmente qualquer excepção dilatória inominada que imponha a absolvição da instância do demandado.
Seguindo de perto o decidido pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de 2012 (relator Salazar Casanova ), em recurso de revista excepcional, publicitado in www.jusnet.pt., ultrapassada que se encontra, na sequência da dedução de oposição, a fase da declaração de injunção, mostra-se precludido o conhecimento das questões que poderiam levar ao indeferimento desta.
Conforme se saliente nesse aresto : “ …as condições que a lei impõe para que seja decretada a injunção são condições de natureza substantiva que devem verificar-se para que a injunção seja decretada ; no entanto, ultrapassada esta fase, elas não assumem expressão na fase subsequente do processo que venha a ser tramitado sob a forma de processo comum ordinário ( … ) Com efeito, neste caso, a circunstância de o crédito não se enquadrar na transacção comercial a que alude o artigo 2º, nº 1 e 3º do Decreto-lei nº 32/2003 não exerce nenhuma influência, rectius, não tem qualquer correlação com a forma de processo a tramitar em momento subsequente “.
O pedido que se visava com aquele especial procedimento não era, em rigor, o da condenação no pagamento do total da quantia indicada no requerimento, mas - e em concreto - o da declaração executória da injunção.
Com a dedução da oposição, tal desiderato esboroou-se.
Houve transmutação processual, desaparecendo a injunção.
Frustrando-se o seu objectivo, o que sucede se for deduzida oposição ou não for possível concretizar a notificação do requerido, cessa o procedimento de injunção e os autos passam a tramitar-se, após distribuição, como acção declarativa [ Miguel Teixeira de Sousa, Acção Executiva Singular, 1998, págs. 91/92).
O que existe agora – sem fundamento bastante para a sua inviabilização – é apenas uma acção declarativa comum de condenação, igual a tantas outras.
Assim sendo, encontrando-nos perante a normal tramitação de um processo comum, deverá, neste âmbito, ser discutida e apreciada a relação jurídica substantiva - sinteticamente gizada.
O Requerente de injunção passou a ser autor na acção declarativa que resultou da convolação daquela forma de processo e o Requerido é, agora, Réu na dita ação.
Cremos ser, este o entendimento que, se adequa com a reforma processual civil na qual se colocou o acento tónico na supremacia do direito substantivo sobre o processual, os princípios da celeridade e economia processual, da cooperação e da descoberta da verdade material.
Acresce que, não se pode clamar pela necessidade da introdução de regimes processuais simplificados, no sentido de algo aligeirados nos seus pressupostos formais, e depois sindicar as manifestações concretas dessa simplificação com base num exacerbamento dos elementos de forma. Valem nestes casos critérios de razoabilidade e de adequação formal mínima dirigidos à aferição da tutela conferida aos interesses do demandado. Se tais interesses foram suficientemente salvaguardados, mesmo que com base num significativo aligeiramento dos pressupostos formais habituais, devemos considerar estarem efectivamente garantidos os direitos processuais das partes no quadro de um processo que não deixou de se configurar, procedimentalmente, como justo.

Prescrição Presuntiva
A este respeito alega o recorrente que Na oposição deduzida o requerido veio afirmar que já tinha procedido ao pagamento do veículo em causa.
O requerido fundamento o seu pedido de condenação do requerido numa alegada venda realizada em 20.10.2008. Tendo o requerido invocado o pagamento do preço deveria ter-se decidido pela prescrição presuntiva do pagamento reclamado.
Na verdade, as prescrições dos Art.ºs 316º e 317º, são prescrições de curto prazo, de natureza presuntiva, visto que se fundam na presunção do cumprimento, presunção que pode ser ilidida pelo credor, embora só por via de confissão do devedor.
Tal confissão pode ser extrajudicial, e nesse caso, só releva se for escrita, ou pode ser também judicial, caso em que tanto vale a confissão expressa como a tácita (Art.º 313º e 314º do C.C.).
Quer dizer, o efeito da prescrição presuntiva não é, propriamente, a extinção da obrigação, mas antes a inversão do ónus da prova, que deixa de onerar o devedor que, por isso, não tem de provar o pagamento, para ficar a cargo do credor, que terá de demonstrar o não pagamento (e só por confissão do devedor judicial ou extrajudicial).
Mas, tendo a prescrição presuntiva de cumprimento sido criada pelo legislador para valer ao devedor de dívidas que costumam ser pagas rapidamente e de cujo pagamento não é habitual cobrar recibo, configura, um benefício, uma faculdade do devedor, o que explica o seu não conhecimento oficioso pelo Tribunal. O beneficiário usa a prescrição, se quiser. E tal excepção deve deduzida na contestação, sob pena de preclusão, como resulta do n.º 1 do art. 489º do CPC ao consagrar o princípio da concentração da defesa.
Sendo que, para ser atendida deve o réu devedor, na contestação, invocar o pagamento efectivo em simultâneo com a prescrição presuntiva.
… não basta invoca-la, sendo ainda necessário que, quem dela pretenda prevalecer-se, alegue o pagamento, ainda que não tenha de o provar, ou pelo menos, não pode alegar factualidade incompatível com a presunção de pagamento, sob pena de ilidir a presunção. Neste sentido ACSTJ de 08.05.2013 proferido no processo 199632/11.5YIPRT:L1.S1 Moreira Alves.
Porém, a verificar-se a dita prescrição, nunca poderia produzir os efeitos nos termos pretendidos pelo recorrente, antes invertia o ónus da prova, devendo o senhor Juiz de 1.ª Instância, elaborar a respectiva Base Instrutória que contemplasse essa realidade, a ser objecto de prova por parte do autor, o que nesta acção não ocorreu conforme decorre do despacho saneador.
De facto, nessa altura este teria todo o interesse em requer o depoimento de parte do réu, pedido este que não ocorreu neste processo em consequência do ónus de prova do pagamento do preço ter sido imposto ao réu.
É verdade que, também se tem entendido que a prescrição pode ser alegada de forma tácita. Neste caso o critério determinante será a susceptibilidade de se deduzir, da conduta do prescribente com toda a probabilidade ,a vontade de se valer da prescrição – neste sentido ver o livro “ Prescrição e Caducidade “ de Ana Filipa Morais Antunes, Coimbra Editora pp 48.
O que neste caso não aconteceu, antes o réu perante a redacção do despacho saneador que lhe imputa o ónus da prova do pagamento nada diz, apresenta prova testemunhal e assim se faz a audiência de julgamento. Aliás em sede de alegações continua a defender que fez prova dos factos que alegou (ver fls 134 destes autos).
Improcede pois esta questão e com ela a pretensão de serem dados como provados os artigos 5º, 6º, 7º da base instrutória por verificação da prescrição presuntiva.

Impugnação da Matéria de Facto
Por fim alega o recorrente que analisando a prova produzida, quer documental quer testemunhal o tribunal deveria ter respondido negativamente aos quesitos 1º, 3º, e 4º e positivamente aos quesitos 5º, 6º, e 7º.

(…)untou aos autos vasta prova documental com vista à prova da factualidade por si alegada, nomeadamente:
Todos os documentos do automóvel
Declaração de compra e venda devidamente assinada pelo vendedor
Seguro automóvel
Comprovativo do pedido de registo da aquisição com data de 07 de Maio de 2008
Documento único Automóvel e
Comprovativo do pagamento do IUA feito pelo requerido em 29.05.2008.
Tudo factos que são a prova evidente de que o veículo já está pago.
Cremos que o Tribunal deveria utilizar o instituto das presunções legais . In casu o facto conhecido é a entrega do veículo e de toda a documentação e o facto desconhecido seria o pagamento.
Por sua vez, alega o recorrido que nas conclusões apresentadas o recorrente não deu integral cumprimento ao ónus a seu cargo que emerge do art. 685-A, do C.P.C. e das suas alíneas.
Na verdade, nos termos do disposto no art.º 685-A, do C.P.C., sob pena de rejeição do recurso, ao recorrente que impugne a matéria de facto caberá indicar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e especificar os concretos meios probatórios, (O sublinhado é nosso) constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que, em seu entender, impunham decisão diversa quanto a cada um dos factos (aos quais deve aludir na motivação do recurso e sintetizar nas conclusões)
Da leitura apenas das conclusões poderá pensar-se que o apelante não indicou para os pontos em concreto que pretende ver alterados, qual o específico meio probatório que impunha ali decisão diferente, limitando-se a indicar a prova documental e testemunhal produzida – veja-se a conclusão 16 .
Todavia, na motivação indica os documentos que considera relevantes e os quais fundamentam a resposta positiva aos quesitos 5º a 7º. Indicou também os depoimentos que entende não relevarem para a resposta aos quesitos 1 a 3 complementada esta indicação com a transcrição dos depoimentos. Desta exposição concluímos que, os específicos meios de prova a apreciar são a prova documental e testemunhal indicadas na conclusão 16.
Vamos pois apreciar a impugnação da matéria de facto, porque satisfeito o ónus exigido pelo art.º639º do atual CPC uma vez que a decisão em apreciação foi proferida após 01 de Setembro de 2013.
A resolução desta questão será efetuada com a invocação e aplicação das regras sobre o ónus da prova.
Estipula a lei que àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita- art.º 342º do CPC.
O ónus de prova é portanto dirigido às partes, tendo estas uma obrigação de natureza potestativa, sendo que as partes são livres de as realizar ou não, assumindo as consequências daí resultantes. Indiretamente, o ónus de prova vai igualmente relevar para a atuação do Juiz. No momento da repartição da prova, o Juiz deve facultar à parte a quem a prova aproveita, a possibilidade de fazer a respetiva prova. No momento da avaliação da prova, não tendo a parte possuidora do ónus feito a devida prova, o Juiz vai decidir contra ela.
Já a contraprova consiste na obtenção processual de qualquer outro elementos probatório de sinal oposto, que não o que obriga em sede de ónus de prova e que deixe o Juiz na dúvida sobre a existência do facto a demonstrar – art.º 346º do C. Civil.
Acresce referir que, depois de afirmar, no seu artigo 341º, que “As provas têm por função a demonstração da verdade dos factos”, o Código Civil procede, nos artigos seguintes, ao estabelecimento da distribuição do ónus de prova pelas partes intervenientes num litígio (conforme já assinalado); mas ao impor a cada uma das partes o encargo de provar determinados factos, não proíbe que eles o sejam pela outra ou pelo próprio tribunal: com efeito, o ónus da prova em relação a determinados factos traduz-se, para a parte a quem compete, no dever de fornecer a prova desses factos, sob pena de sofrer as consequências desvantajosas da sua falta e não na proibição da prova pela parte contrária.
Neste processo, tendo o recorrido invocado contrato de compra e venda competia-lhe o ónus da prova da existência desse negócio.
Por sua vez tendo o recorrente pretendido invocar facto impeditivo de tal pedido (o pagamento do preço) e assim matéria de exceção (exceção peremptória) àquele competia a alegação e prova, da exceção nos termos previstos no art.º 342º mencionado.
Ora, revista toda a prova, não concordamos com a análise que o tribunal fez e que está contida no seu despacho de fundamentação da decisão de facto.
De facto, constata-se que, nenhuma prova testemunhal ou documental existe, que nos permita afirmar que em 20.10.2008 o autor declarou vender e o réu declarou comprar o veículo em causa, o qual tinha de ser pago até 30.10.2008 .
Com a data de 20.10.2008 apenas temos a fatura junta aos autos pelo autor, porém da aposição de tal data no documento, apenas resulta que a fatura foi emitida no dia nela assinalado.
Por sua vez, todas as testemunhas disseram que não assistiram ao negócio.
As indicadas pelo autor contaram que sabem que ele vendeu o carro ao réu no ano de 2008 e que o réu não pagou o preço. Conhecimento do venda e do não pagamento do preço que lhes advêm do que o autor lhes contou.
A testemunha indicada pelo réu, amigo das partes – como nos disse, apenas veio contar que em Julho de 2008 encontrou o réu no parque de estacionamento do continente de Matosinhos e que o réu lhe mostrou o carro tendo dito que pagou cerca de 33 mil euros.
Olhando para os documentos juntos aos autos, quer pelo réu quer pelo autor constata-se que tais documentos foram juntos para prova de factos alegados na petição (requerimento injuntivo) e contestação e não foi impugnada nem a letra, nem a assinatura nem a sua genuinidade.
Temos assim dois documentos datados de 09.04.2008 (fls 100) e 15.04.2008 (fls 9) comprovativos do pagamento do preço do veículo em duas parcelas de 12 500,00 euros.
Temos depois a fatura da compra do veículo emitida com data de 15.04.2008 no valor de 25.000, 00 euros. (fls. 11)
O certificado de aprovação em inspeção técnica para matricula referente ao veículo em causa nos autos emitido com data de 21.04.2008 ( fls. 16)
Requerimento para emissão do livrete preenchido em nome do autor e referente ao mesmo veículo ( fls 14 e 15).
Requerimento-declaração para registo de propriedade do mesmo veículo no qual se identifica como comprador o réu e vendedor o autor, totalmente preenchido nestes itens (fls. 18).
Documento intitulado “ simulação de seguro” emitido por Filpoças , Mediação de Seguros Lda. com data de 07 de Maio de 2008 no qual figura como tomador do seguro o réu e como veículo seguro o BMW serie 3/Diesel versão 330DA ( fls. 6)
Documento no qual é pedido o registo da propriedade.Transferência da propriedade apresentado em 07 de Maio de 2008 em que figura como titular o réu ( fls.21)
Documento do Ministério das Finanças e da Administração Pública referente ao Imposto único de Circulação do veículo com a matricula 85-FQ-67 emitido em 29.05.2008 em nome do réu, no valor de 382,90 euros tendo sido pago em 29.05.2009 (fls. 23).
Verifica-se ainda que, com base em alegação das partes comprovada por documento junto aos autos e aceitação pelas partes foi considerado assente que o autor efetuou a legalização em Portugal do veículo identificado em B).
A ser assim, pelas mesmas razões (alegação pelo réu, comprovada por documento junto aos autos e não impugnação da letra, assinatura ou genuinidade dos documentos pela parte que o não ofereceu) com a permissão do art.º 662 nº1 do CPC, e considerando que os documentos são objetos elaborados pelo homem com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto, determina-se que:
. a alínea C) da matéria assente ter a seguinte redação O custo de aquisição do veículo na Alemanha em 15.04.2008 foi de 25.000,00 euros tendo sido pago em duas partes de 12.500, 00 euros cada
Mais se de considerar como assente a seguinte factualidade:
Com data de 21.04.2008 foi emitido certificado de aprovação em inspecção técnica para matricula referente ao veículo em causa nos autos (fls. 16)
Foi apresentado requerimento para emissão do livrete preenchido em nome do autor e referente ao mesmo veículo (fls. 14 e 15).
O Requerimento-declaração para registo de propriedade do mesmo veículo foi preenchido estando identificado como comprador o réu e vendedor o autor.(fls. 18).
Com data de 07 de Maio de 2008 foi emitido por F..,Lda documento intitulado “ simulação de seguro” no qual figura como tomador do seguro o réu e como veículo seguro o BMW serie 3/Diesel versão 330DA ( fls. 6)
Com data de apresentação de 07 de Maio de 2008 em que figura como titular o réu foi pedido o registo da propriedade.Transferência da propriedade ( fls.21)
Com data de 29.05.2008 foi emitido em nome do réu, no valor de 382,90 euros e data limite de pagamento de 2008.08.04 foi emitido documento do Ministério das Finanças e da Administração Pública referente ao Imposto único de Circulação do veículo com a matricula 85-FQ-67 , tendo sido pago tal valor em 29.05.2009 ( fls. 23).
Em consequência do exposto, a matéria assente apurada nestes autos é a seguinte:
a) C.. dedica-se à importação e compra e venda de veículos automóveis.
b) Existe o veículo automóvel da marca BMW, modelo 330 d, com o quadro nº.. o qual foi comprado na Alemanha e posteriormente matriculado em Portugal com a chapa n."...
c) O custo de aquisição do veículo na Alemanha, em 15.4.2008, foi de € 25.000,00 tendo sido pago em duas partes de 12.500, 00 euros cada .
d) O A. efectuou a legalização em Portugal do veículo identificado em b).
e)Com data de 21.04.2008 foi emitido certificado de aprovação em inspecção técnica para matricula referente ao veículo em causa nos autos .
e)Foi apresentado requerimento para emissão do livrete preenchido em nome do autor e referente ao mesmo veículo.
f)O Requerimento-declaração para registo de propriedade do mesmo veículo foi preenchido estando identificado como comprador o réu e vendedor o autor.
g)Com data de 07 de Maio de 2008 foi emitido por F.., Lda documento intitulado “ simulação de seguro” no qual figura como tomador do seguro o réu e como veículo seguro o BMW serie 3/Diesel versão 330DA.
h)Com data de apresentação de 07 de Maio de 2008 em que figura como titular o réu foi pedido o registo da propriedade.Transferência da propriedade .
i)Com data de 29.05.2008 foi emitido em nome do réu, no valor de 382,90 euros e data limite de pagamento de 2008.08.04 foi emitido documento do Ministério das Finanças e da Administração Pública referente ao Imposto único de Circulação do veículo com a matricula .. , tendo sido pago tal valor em 29.05.2009 .
Por sua vez a resposta ao artº. 1 da base instrutória é a seguinte
Provado que em Abril/Maio de 2008 o autor declarou vender ao réu e este comprar o veículo identificado em, B), com o esclarecimento que nessa autora o veículo foi entregue ao réu.
E a resposta ao artigo 4º da base instrutória apenas pode ser “ Não. Provado”, por falta de prova acerca da factualidade que do mesmo consta.
No que se reporta aos artigos 5º a 7º da base instrutória entende o réu que considerando as regras da experiência comum, dúvidas não restariam que seria de considerar pago o preço de um automóvel, cuja posse e chave é entregue ao comprador que o passa a usar; cuja declaração de venda é entregue ao comprador, cujo registo automóvel é feito em nome do comprador que passa a ser o titular inscrito; cujos impostos passa a ser pagos pelo comprador e cujo seguro automóvel é feito com o comprador,
Apreciemos pois, esta última questão
No que se refere à prova por presunção esta encontra-se regulada nos artigos 349º e SS. CC.
Nos termos do artigo 349º CC, presunções são ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido; nos termos do Art. 351º CC as presunções judiciais só são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal.
O vocábulo presunções provém do latim presumptio, tendo o sentido vulgar de “ opinião ou juízo, que se baseia nas aparências nos indícios, nos princípios de prova …”.
Presunções judiciais são as ilações que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido – cfr art 350º CC.
Nas presunções judiciais, o facto conhecido que constitui a base da presunção, não tem necessariamente que constituir um facto advindo ao processo por alegação e prova da parte a quem a presunção favorece, como sucede, por exemplo, quando o facto base neste tipo de presunções constitui um facto notório.
Cabe lembrar também a este propósito, que, como é comummente referido, as presunções não são propriamente meios de prova, mas meios lógicos ou mentais de que o julgador se serve para a descoberta de factos, numa verdadeira dedução dos factos provados.
Na verdade, as presunções baseiam-se em inferências. E em lógica, a inferência é a operação mental por meio da qual se estabelece uma proposição que não se conhece directamente, por causa da sua ligação com outras proposições conhecidas, mantendo a proposição a que se chega o mesmo valor de verdade daquela de que se parte.
Tais inferências nem sempre são imediatas, como sucede nas que baseiam as presunções legais.
Nas presunções judiciais, o normal é que as inferências sejam mediatas, exigindo-se termos mediadores, e dai a importância dos factos ditos probatórios para este tipo de presunções, em que o facto probando se infere das máximas da experiência, dos juízos correntes de probabilidade, dos princípios da lógica …
A estrutura jurídica da presunção é constituída pelo facto ou factos provados através de outros meios de prova; a actividade lógico-experencial de indução, que os tem por objecto; e o facto ou factos presumidos mediante estas operações intelectuais.
Com efeito, não só há-de resultar provado o ou os factos básicos mas há-de determinar-se, ainda, a existência ou conexão racional entre esses factos e o facto consequência. Além de se permitir, em concreto, a análise de toda a prova produzida em sentido contrário com vista a desvirtuar quer os indícios quer a conexão racional entre esses indícios e o facto consequência.
Daí que, para a valoração de tal meio de prova (também chamada circunstancial ou indiciária), devam exigir-se, os seguintes requisitos: - pluralidade de factos-base ou indícios; - precisão de tais indícios estejam acreditados por prova de carácter directo; - que sejam periféricos do facto a provar ou interrelacionados com esse facto; - racionalidade da inferência
É a prova “prima facie”, baseada no “simples raciocínio de quem julga” e “nas máximas da experiência, nos juízos correntes de probabilidade, nos princípios da lógica ou nos próprios dados da intuição humana” (P. Lima e Ant. Varela, Código Civil Anotado, I, 310).
E podem as Relações, no uso da sua competência em matéria de facto, recorrer a presunções judiciais, instituto previsto nos artºs 349º e 351º do C. Civil, para com base nelas desenvolverem a matéria de facto fixada na 1ª Instância, declarando como provado algum facto por ilação de outro dado por provado, ou para reforçar a fundamentação da decisão recorrida. - neste sentido, v., por exemplo, Acórdãos do STJ de 8.10.2009 – proc. nº1834/03.OTBVRL.A.S1, de 7.07.2010 – proc. nº 2273/03.8TBFLG.G1.S1, de 02-12-2010-processo1/04.0TBCPV.P1.S1.
De forma mais cristalina os seguintes acórdãos do STJ
Acórdão de 2.12.2010 proferido no processo 1/04.0TBCPV.P1.S1 segundo o qual As instâncias podem tirar, através das chamadas presunções judiciais, ilações lógicas da matéria de facto dada como provada, completando-a e esclarecendo-a. Os factos comprovados podem ser trabalhados com base em regras racionais e de conhecimentos decorrentes da experiência comum de modo a revelarem outras vivências desconhecidas.
Mas essas deduções hão-de ser o desenvolvimento lógico e racional dos factos assentes. Já não é possível extraí-las de factos não provados, nem de factos não alegados, ou seja, de uma realidade processualmente não adquirida.
E ainda Acórdão de 30.06.2011 no processo 6450/045 sendo Relator Lopes do Rego, segundo o qual
“ (…) a utilização pelas Relações de presunções naturais ou judiciais é lícita, mas tem como limite a exigência de uma congruência com a matéria de facto fixada através da livre valoração da prova produzida, com imediação e oralidade, em audiência, não podendo conduzir, nem a uma alteração directa das respostas dadas aos pontos de facto que integravam a base instrutória, nem a um desenvolvimento, no próprio Acórdão, da base factual do litígio, susceptível de criar contradições com o julgamento da matéria de facto que formalmente tenha permanecido como inalterado ou imodificado.”
Neste contexto, entendemos que a presunção do pagamento do preço, nos termos invocados pelo requerente, se verifica considerando a base factual constante das alíneas e) a i) da matéria assente e resposta ao artº 1 da base instrutória conjugadas com as regras da lógica e da experiência.
De facto o réu na qualidade de comprador tem consigo todos os elementos necessários à “perfeição/conclusão” deste contrato.
O carro foi-lhe entregue, assim como todos os documentos necessários ao reconhecimento do carro como sua propriedade pelo qual deve pagar os respectivos ónus necessários à sua circulação, como é o caso dos seguros e imposto de circulação.
Imposições legais estas que foram cumpridas nos termos apurados.
Acresce dizer que, o pagamento do veículo em duas partes nos valores cada de 12500,00 euros e nas datas apuradas, coincide com a versão que o réu trouxe ao processo na sua contestação. É verdade que os pagamentos foram efectuados em nome do autor, mas sobre essa circunstância o réu contou deu uma explicação , a qual atendendo a que se trata de veículo que foi importado pelo autor nos convence como real. A confirmar esta versão temos ainda a circunstância de que um dos documentos comprovativos do pagamento ter sido junto pelo réu, tendo o autor apenas junto documento comprovativo do pagamento de uma das partes.
Se foi o autor que pagou o carro na sua totalidade que razão existe para o documento do pagamento de parte do preço estar na posse do réu?
E porque o autor apenas juntou o comprovativo do pagamento da outra parte?
O autor não explicou estas realidades, mas o réu contou que assim ocorreu porque o réu pagou diretamente a parte de cujo documento tem prova ao stand na Alemanha e a outra parte pagou-a ao autor. Explicação lógica esta perante a junção dos documentos que foi feita.
De forma contrária, o autor veio trazer ao processo uma versão sem prova, pois em nada coincidente com todos os documentos juntos aos autos, nos termos já referidos, que ninguém presenciou e mais do que isso remeteu-se ao silêncio após a junção pelo réu aos autos de todos os documentos supra descritos .
Em nosso entender a adopção deste comportamento por parte do autor, que estava sujeito ao ónus da prova no que reporta à existência da compra e venda e entrega do veículo, tem de ser por nós relevada.
De facto, o comportamento lógico e expectável é o de que a parte que disponha de contra afirmações ou provas infirmadoras não deixe passar em branco a oportunidade de as esgrimir. A circunstância de recair sobre uma das partes o ónus da alegação e prova não permite (como acontece quanto ao pagamento do preço) que a contraparte se refugie num ensurdecedor silêncio sistemático. Sendo, em princípio o autor que mais necessidade tem de ser claro e explicito quanto ás razões e provas que suportam a pretensão que deduz, tal conduta omissiva gerará fundada suspeita e poderá ser valorada contra os seus interesses processuais.
Exigência acrescida no caso em apreço, quando o autor se dedica à importação e compra e venda de veículos automóveis, portanto é pessoa que conhece bem este tipo de negócios, como se processam que documentos são relevantes e os efeitos que produzem.
Com todo este saber não ficamos convencidos que o autor tenha entregue o veículo e documentos necessários à transferência da sua propriedade sem garantir o pagamento do preço. Melhor dizendo, o autor não nos convenceu dessa possível realidade.
A propósito, não há-de esquecer-se que o preço corresponde à contrapartida da transmissão da propriedade da coisa e que o contrato de compra e venda é em regra um contrato de execução instantânea: a conduta exigível do vendedor- i.e, a entrega da coisa- e a conduta exigível do comprador – i.e o pagamento do preço, esgotam-se num único acto ou num único momento.
Pelo que, neste contexto, tendo em consideração toda a base factual descrita e o comportamento omissivo do autor quanto à existência dos ditos documentos na posse do réu e em nome deste, entende-se que a presunção do pagamento do preço desta compra por parte do réu tem base factual, nos termos já mencionados.
Assim aos quesitos 5.6.e7. responde-se da seguinte forma
Provado que:
O réu pagou ao autor o preço da compra referido em 1) .
Em conclusão ; é a seguinte a decisão deste Tribunal à base instrutória ( seguindo a enumeração que da mesma consta – foi omitido o nº2 para evitar confusões)
Artº1: Provado que em Abril/Maio de 2008 o autor declarou vender ao réu e este comprar o veículo identificado em, B), veículo com o esclarecimento que nessa autora o veículo foi entregue ao réu.
Artº 3 : Provado
Artº 4: Não provado
Artº 5º, 6º, e 7º: Provado que o réu pagou ao autor o preço da compra mencionada nos supra nº 1) .

Considerando o exposto, importa fazer uma síntese decisiva:
Convolado o procedimento injuntivo em acção ordinária, por ter sido apresentada contestação, ocorreu transmutação processual desaparecendo a injunção.
Encontrando-nos perante a normal tramitação de um processo comum, deverá, neste âmbito, ser discutida e apreciada a relação jurídica substantiva - sinteticamente gizada.
Para ser atendida a prescrição presuntiva deve o réu devedor, na contestação, invocar o pagamento efectivo em simultâneo com a prescrição presuntiva.
A utilização pelas Relações de presunções naturais ou judiciais é lícita, mas tem como limite a exigência de uma congruência com a matéria de facto fixada através da livre valoração da prova produzida, com imediação e oralidade, em audiência,

DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção cível em considerar procedente por provado este recurso, o que determina a improcedência por não provada desta acção absolvendo o réu do pedido.
Custas afinal a pagar pelo autor
Guimarães, 30 de Janeiro de 2014
Maria Purificação Carvalho
Espinheira Baltar
Henrique Andrade