Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1538/12.2TBBRG-A.G1
Relator: JORGE TEIXEIRA
Descritores: CONDOMÍNIO
DELIBERAÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
QUESTÃO NOVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/22/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I- A acta da reunião da assembleia do condomínio que tiver deliberado as contribuições a pagar pelos condóminos, nos termos do art.º 6º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 268/94, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte, desde que esteja assinada por todos os condóminos que nela participaram e deixaram de pagar (art.º 1º do Dec. Lei n.º 268/94).

II- No âmbito da acta, enquanto título executivo, cabem o montante das “contribuições devidas ao condomínio”, nelas se incluindo as despesas necessárias à conservação e à fruição das partes comuns do edifício, as despesas com inovações, as contribuições para o fundo comum de reserva, o pagamento do prémio de seguro contra o risco de incêndio, as despesas com a reconstrução do edifício e as penalizações ou penas pecuniárias fixadas nos termos do art.º 1434º do Cód. Civil.

III- Os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, pois que a diversidade de graus de jurisdição determina, em regra, que os tribunais superiores sejam apenas confrontados com questões que as partes discutiram nos momentos próprios.

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: AA.

Recorrido: BB.

Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão – 2ª Secção de Execução.

Por apenso aos autos de execução que BB intentou contra AA, veio esta deduzir oposição à execução invocando:

- A inexistência de título executivo por a acta da Assembleia de Condóminos de 21.01.2012 se reportar a uma Assembleia reunida “em segunda convocatória” realizada 1h15m após a hora designada para a primeira Assembleia (20h) em violação do art. 5º, nº 3 do Regulamento, pelo que, não tendo sido regularmente realizada a segunda convocatória e realizada a segunda assembleia, não poderia esta deliberar por maioria simples de votos dos condóminos presentes ou representados, desde que representem, pelo menos, um quarto dos votos, 25% ou 250 votos; não consta da acta a deliberação da Assembleia de Condóminos quanto à fixação do montante das contribuições e respectivo prazo de pagamento; não foi junto ao requerimento executivo qualquer anexo onde conste os valores em débito;

- Consta da acta que os débitos estariam computados até 31.12.2010 mas no requerimento executivo peticionam-se as quotas de condomínio até 03.01.2012, o que excede o que resulta do título;

- A acta não documenta nem indica os valores parcelares devidos pelos condóminos, a título de despesas, fundo de reserva comum e seguro, nem a quota ou fracção a cargo da oponente nem a respectiva data de vencimento;

- A oponente não se encontra em mora por não ter sido junta qualquer interpelação, não sendo devida qualquer quantia a título de juros moratórios nem penalidade;

- A acta indica a votação mas não está assinada, constando apenas uma lista de presenças;

- Existe prescrição do direito da exequente exigir dívidas de condomínio anteriores a 27.03.2007 e de reclamar juros moratórios e penalidades referentes às participações condominiais com mais de 5 anos;

- Por transacção homologada no processo nº 8483/04.3TBBRG, a administração do condomínio comprometeu-se a executar obras de eliminação de danos provocados nas fracções FO, FM e DP, ficando o pagamento dos valores respeitantes a comparticipações de condomínio acordados condicionados à realização daquelas obras;

- Não tendo as obras sido realizadas, a fracção FO encontra-se devoluta para arrendar desde início de 1999, cujo valor de renda ascenderia a € 324,22, devido ao estado de degradação dos revestimentos das paredes e tectos provocado por infiltrações de águas pluviais que se verificam nas partes comuns pelo que a exequente é devedora do valor global das rendas que deixou de receber, valor a ser liquidado em execução de sentença, operando-se a compensação.

Admitida a oposição à execução, veio a exequente contestá-los impugnando a factualidade alegada pela oponente, alegando, para o efeito que:

- O art. 5º, nº 3 do Regulamento do condomínio estabelece o limite máximo, não o mínimo, após o qual estão reunidas as condições para a deliberação;

- Por lapso não juntou a listagem dos débitos, cuja existência decorre da própria acta, à qual procedeu com a contestação;

- A acta foi remetida por via postal aos condóminos, entre os quais se inclui a executada;

- A executada foi interpelada para pagar as prestações em dívida pelo menos em 04.11.2009, 30.12.2009, 26.01.2010, 28.05.2010, 10.01.2011, 07.02.2011, 18.01.2012 e 07.02.2012, o que interrompeu o prazo de prescrição;

- As obras de impermeabilização já estão concluídas há muito tempo, devendo-se a falta de arrendamento a falta de vontade da executada ou a dificuldades do mercado.

Findos os articulados foi proferido despacho saneador, onde se considerou improcedente a excepção de inexistência de título executivo e remeteu-se o conhecimento das questões relativas à prescrição e à compensação para a sentença.

Na sequência de questão suscitada pela Executada, que invocou a excepção da inexistência de título executivo, que foi julgada improcedente no despacho saneador, com os fundamentos constantes do despacho de fls. 133 dos autos.

Realizado o julgamento, foi proferido despacho que respondeu à matéria de facto controvertida, sendo proferida sentença que julgou parcialmente procedente a oposição, ordenando o prosseguimento da execução apenas quanto à quantia de € 53.364,37, acrescida de juros vencidos e vincendos.

Inconformado com tais decisões, apela a Opoente, e, pugnando pelas respectivas revogações, formula nas suas alegações as seguintes conclusões:

“1. A douta sentença recorrida partiu de um pressuposto erróneo e contraditório, pois que, por um lado, julga provado que as obras executadas no interior da fracção FO foram efectuadas pela Recorrente, mas por outro lado considera não provado que a administração do condomínio não efectuou as obras constantes da transacção, para além das referidas no facto provado 9º.

2. A análise global dos depoimentos das testemunhas EE e FF, conjugadas com o teor dos documento constante a fls. 255 dos autos (junto pela Recorrente no seu requerimento datado de 30.06.2014), bem como com o teor do relatório elaborado pelo Eng. GG (junto pela Recorrente na audiência de julgamento realizada em 08.04.2014) impõem a alteração da matéria de facto julgada provada, nos termos do art. 662.º do CPC, no sentido de julgar provado que a Recorrida não efectuou quaisquer das obras a que se obrigou na transacção celebrada pelas partes, em 24.01.2007, homologada por sentença no âmbito do processo n.º 8434/04.3TBBRG que correu termos na Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Braga.

3. Em sentido contrário, os depoimentos das testemunhas CC e DD não são aptos a contradizer a descrição factual referida pelas testemunhas EE e FF.

4. A testemunha CC limitou-se a referir que foram entregues duas chaves pela Recorrente, no seu estabelecimento comercial para serem entregues à administração do condomínio; desde o momento da sua entrega desconhece o destino dado a essas chaves, sem contudo conseguir precisar se a Recorrida executou quaisquer obras nas fracções da Recorrente. Tendo a Recorrida se obrigado, no âmbito da já indicada transacção homologada por sentença, a executar obras no interior de três fracções propriedade da Recorrente, mas só tendo aquela testemunha entregue à Recorrida duas chaves, então torna-se claro que, a Recorrida tão pouco entrou no interior de uma das fracções, não tendo, nesta medida executado as obras a que se obrigou.

5. Por outro lado, a testemunha DD não pode merecer qualquer credibilidade pelo Tribunal, pois que o seu testemunho mostrou-se incoerente, contraditório e parcial, procurando, na verdade, fazer a defesa pessoal da sua própria conduta, à data dos factos, enquanto administrador do condomínio descrito nos autos.

6. Esta testemunha contradiz-se a si própria; contradiz o testemunho do Sr. CC; contradiz também, a Recorrida; sendo que é também manifesto que o depoimento ora escalpelizado é contraditório com o teor dos testemunhos de EE e FF.

7. A Recorrida foi notificada para juntar ao presente processo os documentos contabilísticos que suportam os custos da execução das obras alegadamente por si efectuadas nas fracções da Recorrente. A não junção de tais documentos impossibilita a realização da prova sobre a realização de quaisquer obras executadas pela Recorrida nas fracções da Recorrente.

8. Perante a impossibilidade da verificação dos documentos que a Recorrida deveria ter em sua posse (caso os mesmos existissem), a omissão da junção desses mesmos documentos deveria ser apreciada nos termos do disposto no n.º 2 (parte final) do art. 417.º do CPC, o que deveria determinar a inversão do ónus da prova quanto à questão de saber se a Recorrida executou as obras descritas na transacção homologada por sentença no processo n.º 8483/04.3TBBRG, nos termos preceituados no n.º 2 do art. 344.º do CC, conforme, aliás, requerido pela Recorrente no seu requerimento datado de 30.06.2014.

9. A douta sentença a quo andou mal ao julgar não provados os seguintes factos: “A fracção FO é muito procurada devido à sua localização; Encontra-se devoluta para arrendar desde o início de 1999 devido ao estado de degradação dos revestimentos das paredes e tectos provocado pelas infiltrações de águas pluviais que se verificam nas partes comuns e que não foram eliminadas pela exequente; Por tal motivo a oponente deixou de receber rendas desde o início do ano de 1999; Após a pintura das paredes do imóvel a oponente arrendou-o por valor muito abaixo dos preços praticados no mercado, considerando a localização da fracção, devido ao seu estado de degradação.”

10. A prova produzida no processo, designadamente o teor dos depoimentos das testemunhas GG, EE e HH, conjugados com a análise ao relatório pericial elaborado em sequência da realização de uma vistoria à fracção FO do edifício situado na rua Justino Cruz, n.º 111, na cidade de Braga (junto pela Recorrente na audiência de julgamento realizada em 08.04.2014), o auto de vistoria à indicada fracção FO, realizado pela Câmara Municipal de Braga, em 07.04.2004 (que integra o documento anteriormente referido), assim como relatório pericial efectuado no âmbito do processo judicial nº 8483/04.3TBBRG (junto ao presente processo pela Recorrente por requerimento da Recorrente datado de 27.05.2014) permitem a verificação, pelo Tribunal ad quem dos seguintes factos: i) a fracção da Recorrida é muito procurada devido à sua localização; ii) o imóvel em causa encontra-se devoluto desde o início de 1999 devido ao estado de degradação dos revestimentos das paredes e tectos provocado pelas infiltrações de águas pluviais que se verificam nas partes comuns do prédio tendo ademais não sido concedida a licença de utilização sobre o imóvel pela entidade administrativa competente; iii) a ocupação do imóvel para os fins a que o mesmo se destina apenas foi possível após a execução de obra de restauro de paredes e tectos executadas pela Recorrente em Março de 2009; iv) considerando as características e localização da fracção o valor de mercado da renda mensal que a Recorrente poderia cobrar ascenderia a um valor médio de € 325,00; v) a reparação parcial das anomalias verificadas na fracção permitiu que a mesma fosse arrendada em Março de 2014, mas por um valor inferior ao seu justo valor de mercado, considerando as anomalias que persistem no chão; vi) desde Fevereiro de 2014 a Recorrente aufere uma renda mensal no valor de € 125,00 (cento e vinte e cinco euros) pelo arrendamento do imóvel.

11. As indicadas supra testemunhas foram as únicas que demonstraram deter um conhecimento sobre a questão de saber sobre o valor comercial do arrendamento da fracção em causa, bem como o período em que esta fracção se encontrou desocupada e as respectivas causas motivadoras desse facto, sendo o seu depoimento isento e congruente, pelo que deveriam merecer outra valoração pelo Tribunal a quo.

12. No caso em apreço ter-se-á que concluir da análise global e integral da prova revisitada no presente recurso, conjugada com a demais produzida nos autos, impõem a modificação da factualidade julgada pelo Tribunal a quo, pois da análise desta prova resulta a conclusão de ter havido erro de julgamento traduzido na desconformidade flagrante entre os elementos probatórios e a douta decisão sob recurso.

DA APLICAÇÃO DO DIREITO AOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS:

Da prescrição:

13. As prestações condominais aqui discutidas, por se mostrarem divididas em duodécimos, prescrevem no prazo de cinco anos, nos termos do art. 310°, al. g) do CC. Neste sentido, vide “Propriedade horizontal”, por Jorge Alberto Aragão Seja, 2.ª edição, Coimbra, 2002, pág. 131.

14. Sendo manifesto, perante a fundamentação extraída da douta sentença a quo que a julgada interrupção do prazo de prescrição do direito aqui discutido não vem sustentada no art. 323º do CC, também não existe sustento para julgar que a prescrição se interrompeu pelo reconhecimento da dívida por banda do recorrente, nos termos do art. 325º do Código Civil.

15. O reconhecimento do direito, para efeito de interrupção da prescrição, traduz-se na confissão ou declaração da sua existência, desde que praticado pelo devedor perante o titular do crédito. Nesta medida, para haver reconhecimento com eficácia de interrupção da prescrição, é necessário que haja, ao menos, através de factos, afirmações pessoais, comportamentos ou atitudes, o propósito de reconhecer o direito da parte contrária (cf. Acórdãos do S.T.J. de 16.04.1991 e de 11.11.1997, ambos consultáveis in www.dgsi.pt).

16. No caso sub judice inexiste qualquer acto praticado pela Recorrente no sentido de reconhecimento do direito invocado pela Recorrida, não tendo as interpelações a que alude a douta sentença a quo a virtualidade de interromper o prazo de prescrição para o exercício do direito aqui discutido.

17. A presente acção executiva entrou em juízo em 01.03.2012, pelo que considerando a regra insípida no n.º 2 do art. 323.º do CC dever-se-á determinar a prescrição do direito da Recorrente em exigir as alegadas dívidas de condomínio que se venceram em momento anterior a 01.04.2007.

18. Do mesmo modo, encontra-se extinto, pelo decurso do prazo de prescrição, o direito de a Exequente reclamar os juros moratórios e penalidades referentes às participações condominiais com mais de cinco anos.

19. Ao julgar improcedente a excepção peremptória de prescrição arguida, o Tribunal ad quo fez uma incorrecta aplicação do disposto nos arts. 310.º, 323.º e 325.º, todos, do CC.

Das penalizações aplicadas sobre as alegadas dividas das comparticipações de condomínio:

20. Resulta da interpretação que se retira do n.º 1 do art. 6.º do DL 268/94 que a acta da assembleia de condóminos apenas constitui título executivo quanto às quantias que estejam relacionadas com as despesas correntes do condomínio e com as que são necessárias à sua conservação e fruição, excluindo-se, nesta medida, as penalizações. Neste sentido vide os seguintes Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra: Acórdão de 14.12.2010 (proc. n.º 78/10.9TBMGR) e Acórdão de 04.06.2013 (proc. n.º 607/12.3TBFIG-A.C1), em que é Relator Armindo Oliveira, ambos disponíveis in www.dgsi.pt.

21. A douta decisão sob recurso fez, assim, uma incorrecta interpretação do n.º 1 do art. 6.º do DL DL 268/94.

22. Não tendo sido invocada a presente matéria em sede de oposição à execução, foi alegada no âmbito das alegações finais previstas no art. 604.º, n.º 3 al. e) do CPC, pelo que não poderia o M.mo Julgador a quo deixar de se pronunciar sobre a insuficiência do título executivo no que concerne ao valores referentes às penalidades por atrasos no pagamento das prestações condominais e, nessa medida a sentença objecto de recurso padece de nulidade, nos termos previstos no art. 615.º, n.º 1, al. d), a qual aqui expressamente se invoca.

23. Nos termos do disposto no art. 734.º do CPC, conjugado com o art. 726.º, n.º2, al. a), também, do CPC a questão de saber sobre a insuficiência do título executivo é do conhecimento oficioso do Tribunal, pelo que, a douta sentença a quo, ao ordenar o prosseguimento da execução para pagamento das penalidades peticionadas pela Recorrida, violou as normas legais supra citadas.

Da inexistência de título executivo – falta de requisitos legais:

24. A acta de assembleia de condóminos dada à execução não constitui título executivo bastante para compelir o condómino a pagar qualquer valor devido ao condomínio, em qualquer um dos períodos descritos no requerimento executivo.

25. As contribuições devidas previstas no art.º 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro, terão de ser entendidas como contribuições que vierem a ser devidas e não como contribuições em dívida. Ou seja título executivo é aquela acta de assembleia de condóminos que aprova o orçamento para o ano em curso no suposto que reúna as condições legais para tanto e o condómino não venha a pagar os valores que são da sua responsabilidade e não uma acta que a posteriori venha a deliberar que determinado condómino não pagou no passado certos valores que deveria ter pago.

26. Esta interpretação resulta, desde logo, pelo argumento literal da parte final da norma: “constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.”

27. Por outro lado, a fonte da obrigação pecuniária do condómino deriva da sua aprovação em assembleia de condóminos, consubstanciada na respectiva acta, que aprova e fixa o valor a pagar, correspondente à sua quota-parte para as despesas comuns, e não da declaração feita pelo administrador em assembleia de condóminos de que o condómino deve determinado montante ao condomínio, ou seja, que não pagou importâncias anteriormente fixadas.

28. É, por seu turno, título executivo, nos termos do art. 6.º/1 do DL 268/94 de 25.10, a acta de reunião de assembleia de condóminos que tiver sido assinada por quem tenha servido de presidente da reunião e que tiver sido subscrita por todos os condóminos que tenham participado na reunião e não uma qualquer folha em formato excel elaborada pela Administração do Condomínio.

29. Assim, não constando a relação de pretensos valores em divida na acta, mas em documento estranho à acta, donde não consta a assinatura dos condóminos presentes não se poderá concluir que a acta dada como título executivo nos autos documenta deliberações onde sejam quantificados os valores em dívida pelo condómino devedor.

30. Andou mal o Tribunal ad quo ao julgar que as actas dadas à execução assumem força de título executivo, fazendo uma errónea interpretação do art. 6.º/ 1 do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro.

Da excepção do não cumprimento:

31. A Recorrida arroga-se, no presente processo, titular de um direito sobre a Recorrente, sem que no entanto cuidasse previamente de cumprir as obrigações que assumiu perante o seu condómino, aqui Recorrente.

32. A factualidade julgada provada pela douta sentença a quo demonstra que a Recorrida não cumpriu a sua obrigação assumida, no âmbito do processo judicial nº 8483/04.3TBBRG, porquanto esta não lixou nem envernizou o chão da fracção FO (vide matéria de facto provada sob o p. 9), sendo que a realidade factual é bem mais gritante, pois - como já demonstrado em sede de impugnação da matéria facto - a Recorrida não executou quaisquer das obras a que se obrigou perante a Recorrente.

33. Conquanto o art. art.º 428.º do CC se refira aos contratos sinalagmáticos (com obrigações recíprocas), atendendo à natureza das relações condominiais, em que existe um nexo de reciprocidade (sinalagma funcional), é de admitir a invocabilidade da excepção do não cumprimento do contrato, desde que se verifiquem os restantes requisitos.

34. Acresce que, no presente caso, além das normais obrigações e direitos de cada uma das partes, enquanto administrador de condomínio e condómino, as partes expressamente celebraram um acordo, o qual prevê primeiramente o cumprimento de uma obrigação por parte da Recorrida.

35. A douta sentença a quo fez uma aplicação do art. 428.º do CC, porquanto deveria ser reconhecido o direito da Recorrente em recusar o cumprimento da obrigação aqui discutida – como o fez – enquanto a Recorrida não cumprir a sua obrigação.

Da compensação:

36. Pelos factos e fundamentos expostos, em sede de impugnação da matéria de facto a Recorrente é credora da Recorrida pelo valor global das rendas que a esta deixou de receber, cuja determinação do valor - por não se encontrar quantificável à data da junção ao processo da oposição – se requereu fosse determinado em sede de liquidação de sentença.

37. Conforme decidido pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 13.04.2010 (proc. n.º 605/05.3TBSJM-B.P1) “de acordo com o disposto no n°3 do art. 847° que a iliquidez da divida não impede a compensação, podendo a liquidação ser relegada para execução de sentença.”

38. Este direito da Recorrente deveria ser reconhecido e compensado com qualquer eventual crédito que viesse a ser reconhecido à Recorrida e até ao limite deste, pelo que, não assim decidindo a douta sentença a quo fez uma incorrecta interpretação do art. 847.º do CC.”

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O Apelado apresentou contra alegações concluindo pela improcedência da apelação interposta.

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Colhidos os vistos, cumpre decidir.

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II- Do objecto do recurso.

Sabendo-se que o objecto do recurso é definido pelas conclusões no mesmo formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso, as questões decidendas são, no caso, as seguintes:

- Apreciar a decisão da matéria de facto, apurando se ela deve ou não ser alterada.

- Apreciar se, na hipótese de alteração da matéria de facto tida como demonstrada, deverá ser alterada a decisão recorrida.

- Analisar da verificação da excepção da prescrição.

- Analisar da falta ou insuficiência de título com relação às penalizações aplicadas sobre as dívidas de condomínio.

- Analisar da inexistência do título executivo.

- Analisar da verificação da excepção de não cumprimento.

- Analisar da excepção da compensação.

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III- FUNDAMENTAÇÃO.

Fundamentação de facto.

A factualidade dada como provada e não provada na sentença recorrida é a seguinte:

Factos Provados.

1. No processo executivo que move à executada/oponente, a exequente deu à execução a acta de condomínio nº 43 datada de 21.01.2011, a qual consta de fls. 6 a 14 dos autos principais e cujo teor se dá por integralmente reproduzido, anexa à qual se encontra a listagem dos débitos que se reportam até 31.12.2010, que consta de fls. 43 a 96 cujo teor se dá por integralmente reproduzido, da qual consta o débito da embargante da quantia global de € 35.576,25 relativa às fracções EC, FO, DO e DP;

2. Ao prédio onde se inserem as fracções da oponente aplica-se o Regulamento que consta de fls. 15 a 27 dos autos principais cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

3. A oponente foi interpelada para pagar as prestações em dívida em 04.11.2009, 30.12.2009, 26.01.2010, 10.01.2011, 07.02.2011, 18.01.2012 e 07.02.2012 (cfr. fls. 97 a 103);

4. Na acção ordinária nº 8483/04.3TBBRG em que era A a ora exequente e R a ora executada foi celebrada, em 24.01.2007, a transacção que consta de fls. 125 a 127 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

5. José Manuel Gonçalves remeteu à exequente os fax de 01.02.2010 que constam de fls. 190 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

6. Relativamente à fracção FO, com data de 5 de Fevereiro de 2014, foi celebrado o contrato de arrendamento que consta de fls. 191 a 193, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

7. As obras de impermeabilização e conservação da área onde estão situadas as fracções da oponente estão concluídas desde data anterior a 18 de Março de 2009;

8. Em 18 de Março de 2009, a embargante procedeu à pintura das paredes da fracção FO no que despendeu € 122,12;

9. A Administração do Condomínio não lixou nem envernizou o chão da fracção FO.

Factos não provados:

1. A administração do condomínio não efectuou as obras constantes da transacção, para além das referidas no facto provado 9º;

2. Por esse motivo a oponente não pagou os valores reclamados;

3. A fracção FO é muito procurada devido à sua localização;

4. Encontra-se devoluta para arrendar desde o início de 1999 devido ao estado de degradação dos revestimentos das paredes e tectos provocado pelas infiltrações de águas pluviais que se verificam nas partes comuns e que não foram eliminadas pela exequente;

5. Por tal motivo a oponente deixou de receber rendas desde o início do ano de 1999;

6. Após a pintura das paredes do imóvel a oponente arrendou-o por valor muito abaixo dos preços praticados no mercado, considerando a localização da fracção, devido ao seu estado de degradação;

7. Em 6 de Junho de 2011 a exequente solicitou, por via postal, a todos os condóminos que informassem a Administração da conformidade das obras executadas pelo condomínio ou da necessidade de quaisquer outras, sem que tal missiva merecesse qualquer resposta por parte da executada.

Fundamentação de direito.

Apreciaremos em primeiro lugar a impugnação da matéria de facto pretendida pelos Apelantes, pois sem a fixação definitiva dos factos provados e não provados não é possível extrair as pertinentes consequências à luz do direito.

Ora, como resulta do disposto nos artigos 640 e 662º do C.P.C., o recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto deve não só identificar os pontos de facto que considera incorrectamente como também especificar concreta e individualizadamente o sentido da resposta diversa que, em seu entender, a prova produzida permite relativamente a cada um dos factos impugnados.

A impugnação da matéria de facto traduz-se no meio de sindicar a decisão que sobre ela proferiu a primeira instância.

Pretende-se que a Relação reaprecie e repondere os elementos probatórios produzidos nos autos, averiguando se a decisão da primeira instância relativa aos pontos de facto impugnados se mostra conforme às regras e princípios do direito probatório, impondo-se se proceda à apreciação não só da valia intrínseca de cada um dos elementos probatórios, da sua consistência e coerência, à luz das regras da normalidade e da experiência da vida, mas também da sua valia extrínseca, ou seja, da sua consistência e compatibilidade com os demais elementos.

Como é consabido, os meios probatórios têm por função a demonstração da realidade dos factos, sendo que, através da sua produção não se pretende criar no espírito do julgador uma certeza absoluta da realidade dos factos, o que, obviamente implica que a realização da justiça se tenha de bastar com um grau de probabilidade bastante, em face das circunstâncias do caso, das regras da experiência da comum e dos conhecimentos obtidos pela ciência.

Mas, como é óbvio, e convirá realçar, a liberdade na apreciação da prova não equivale a uma apreciação arbitrária das provas produzidas, uma vez que o inerente dever de fundamentação do resultado alcançado impedirá a possibilidade de julgamentos despóticos.

Na avaliação da prova testemunhal a fonte do conhecimento dos factos narrados pela testemunha é um elemento da maior importância para o julgador aferir da credibilidade do relato.

Como refere Alberto dos Reis, “Tem a maior importância esta exigência da lei, porque a razão da ciência é um elemento de grande valor para a apreciação da força probatória do depoimento…Desceu a lei a estas minúcias, porque uma vez destruída ou abalada a razão da ciência, o depoimento perde o valor ou fica notavelmente enfraquecido; e para a parte contrária poder atacar a razão da ciência e o tribunal poder avaliar até que ponto é exacta a razão invocada, muito interessa saber as condições e circunstâncias especiais de que a testemunha se socorre para justificar o seu conhecimento”. Cfr. A. dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. IV, pág. 422, da ed. de 1951.

Mas, e à luz de tudo o exposto, passemos agora à análise da decisão da matéria de facto, averiguando, se as respostas impugnadas foram ou não proferidas de acordo com as regras e princípios do direito probatório.

Ora, como resulta do supra exposto, o apelante impugna a materialidade fixada na decisão recorrida com os seguintes fundamentos:

A- Em seu entender, a sentença recorrida terá partido de um pressuposto erróneo e contraditório, pois que, por um lado julga provado que as obras executadas no interior da fracção FO foram efectuadas pelo Recorrente, mas, por outro, considera não provado que a administração do condomínio não efectuou as obras constantes da transacção, para além das referidas no facto provando 9).

Acresce ainda que, é também seu entendimento o de que a prova testemunhal e documental produzida no processo impõe a alteração da decisão da matéria de facto, na parte que considera não provados os factos que a seguir se descreverão, e que deveriam ter sido considerados como provados:

“- A administração do condomínio não efectuou as obras constantes da transacção, para além das referidas no facto 9;

- Por esse motivo a oponente não pagou os valores reclamados”.

B- Por outro lado, a decisão recorrida considerou como não provados os factos ínsitos sob os números 3) a 6), inclusive, sendo que, em seu entender, em respeito pela integridade da prova produzida deveria tê-los dado como provados.

Tais factos têm o seguinte teor:

“3. A fracção FO é muito procurada devido à sua localização;

4. Encontra-se devoluta para arrendar desde o início de 1999 devido ao estado de degradação dos revestimentos das paredes e tectos provocado pelas infiltrações de águas pluviais que se verificam nas partes comuns e que não foram eliminadas pela exequente;

5. Por tal motivo a oponente deixou de receber rendas desde o início do ano de 1999;

6. Após a pintura das paredes do imóvel a oponente arrendou-o por valor muito abaixo dos preços praticados no mercado, considerando a localização da fracção, devido ao seu estado de degradação”.

A sustentar a sua pretensão impugnatória, e no que concerne aos concretos meios probatórios produzidos, invocam os Recorrentes dos meios probatórios que aduzem (depoimentos das testemunhas EE, FF, GG e HH e prova documental - transacção judicial referida nos factos provados) resulta consistentemente sustentada a demonstração dos aludidos factos.

A propósito da materialidade em referência e objecto de impugnação refere-se na aludida motivação o seguinte:

“(…)

Os factos provados 7º, 8º e 9º e não provado 1º decorreram do teor do documento de fls. 255, confirmado pela testemunha FF que procedeu à pintura da fracção FO em 2009, quando se encontrava resolvido o problema das infiltrações.

Da articulação do exposto com o teor do email de fls. 190 verso concluímos que, pelo menos, em 18 de Março de 2009 as obras de impermeabilização e conservação estavam concluídas, tornando a fracção FO apta a ser arrendada, pelo menos, em 1 de Fevereiro de 2010.

Com efeito, em conformidade com as regras da experiência e normalidade do acontecer, só se procede à pintura de uma fracção depois de resolvidos os problemas de fundo, sob pena de eles voltarem a surgir, o que não sucedeu, conforme confirmado pela testemunha HH (interveio no contrato de arrendamento de fls. 191 a 193 como fiador e é sócio gerente da “Momento Salutar, Lda”) que referiu a inexistência de problemas de humidade e justificou o facto de o pavimento se encontrar danificado com o desgaste do mesmo.

Acresce ao exposto que, considerando o valor despendido pela oponente na pintura das paredes, o mesmo traduziu-se apenas num “melhoramento” prévio ao arrendamento.

Do depoimento da testemunha HH, do teor do relatório de fls. 172 a 175 e do depoimento da testemunha Eng. II, testemunha que o subscreveu, resulta que o chão da fracção FO está danificado, não está nas condições ideais, o que desvaloriza o imóvel, mas não impede a sua utilização.

Não obsta ao exposto o depoimento da testemunha JJ que faz as reparações das lojas da executada e que descreveu o estado de uma fracção por si visitada em Setembro de 2013 e que não soube identificar (escorria água pelas paredes, a água estava espalhada pelo tecto, estava tudo alagado em virtude de infiltrações), dado que, considerando o exposto, é forçoso concluir que o mesmo não visitou a fracção FO.

Por conseguinte, apesar da mencionada desvalorização da fracção FO, em virtude do desgaste do chão decorrente de a exequente não o ter lixado nem envernizado, a oponente não logrou provar que a fracção está devoluta nem que, por tal motivo, deixou de receber rendas (cfr. factos não provados 2º a 5º).

Antes, resultou da prova produzida, nos termos infra expostos, que a oponente não paga o condomínio relativo às fracções de que é proprietária com a justificação de que a exequente não procedeu à realização de obras no interior da fracção FO, o que faz intencionalmente, por se ter colocado estrategicamente em tal situação, e utiliza-a como pretexto do seu incumprimento.

Na verdade, dos depoimentos das testemunhas KK, CC, proprietário de um café, e DD, condómino e administrador do condomínio de 1998/1999 a 2006/2007, resulta que a oponente procedeu à entrega da chave da fracção ao Sr. CC (em conformidade com a cláusula 4ª de fls. 126), o qual a entregou ao condomínio para que mandasse alguém arranjar a fracção e, feitas as obras, a chave foi devolvida ao Sr. CC para que a executada as levantasse, o que nunca aconteceu, não tendo a executada procedido à verificação das obras, apesar de terem sido marcadas duas datas nas quais a executada não compareceu nem mandou ninguém em sua representação (conforme referido pela testemunha DD).

Ora, ao não levantar a chave nem verificar as obras efectuadas no interior da fracção FO, a oponente provocou a justificação que ansiava para não pagar as prestações do condomínio das fracções DO, DP, EP e FO que, mesmo pagando antes do incumprimento a que se reportam os presentes autos, nunca o fez atempadamente (conforme referido pela testemunha DD).

A corroborar o exposto temos as declarações de parte do legal representante da oponente que se manteve numa estratégica posição de alheamento e ignorância de todos os assuntos relacionados com a fracção FO (ex: deixou a chave não sabe onde, não sabe desde quando é que não paga o condomínio, não recebe as convocatórias para as Assembleias, não sabe se são enviadas).

Não obsta ao exposto o facto de a exequente não ter procedido à junção dos documentos contabilísticos que suportam os custos da execução das obras na fracção FO atenta a justificação apresentada e o facto de a exequente ter logrado provar que efectuou tais obras (excepto as relativas ao chão da fracção) com recurso a outros meios de prova nos termos supra expostos.

(…)

No que concerne ao teor do referido no ponto A) da impugnação, cumprirá começa por referir que, efectivamente, como e bem salienta a Recorrido, não foi dado como demonstrado na decisão recorrida que “as obras executadas no interior das fracções FO foram efectuadas pela Recorrente”, mas somente que a Recorrente “procedeu à pintura das paredes da fracção FO”, pelo que, se poderá não revestir absoluta legitimidade a conclusão de que quaisquer outros problemas de que a fracção enfermava já se encontravam solucionados, dúvidas se não podem colocar, no entanto, de que, se assim não sucedia, não foram suscitados.

Com efeito, e como igualmente salienta o Recorrido, deu-se apenas como indemonstrado na decisão recorrida que, além de não ter lixado nem envernizado o chão da fracção FO, o Recorrido não tenha também efectuado as demais obras constante da transacção a que se alude nos autos – com excepção das pintura das paredes, que logrou demonstrado ter sido efectuada pelo Recorrente -, e que se reporta igualmente a obras a efectuar em várias outras fracções, que não a FO, e logo e, igualmente, que tenha sido por essa razão que o Opoente não efectuou o pagamento dos valores reclamados, por não ter logrado adesão de prova.

Acresce que, como é consabido, a convicção do julgador, não se reconduz a uma qualquer convicção subjectiva, mas antes numa convicção objectivável e motivável, fruto de um processo que apenas se completa e alcança por via racional, fundada nas regras da lógica e da experiência comum, do bom senso e, sempre que necessário, do conhecimento da ciência, terá de ser clara e inequivocamente explicitada, em ordem a, por um lado, promover a persuasão, o convencimento e a anuência das partes, e, por outro, a permitir também que a análise crítica dos elementos probatórios produzidos no processo seja controlada ou sindicada, igualmente de uma forma racionalmente fundada, quer pelas partes, como ainda pelo tribunal superior.

Nesta actividade, com excepção dos casos em que a lei exige, para prova do facto, determinado meio probatório, não está o tribunal submetido a critérios ou regras pré-estabelecidas, devendo, considerá-las a todas, apreciá-las em conjunto, fazer a sua análise crítica, tendo em conta as regras da ciência, da lógica e da experiência comum a todo o homem médio.

O recurso da matéria de facto não tem por objecto a realização de um novo julgamento fundado numa nova convicção, mas apenas apreciar a razoabilidade da convicção formada pelo tribunal recorrido relativamente aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados, com base na avaliação das provas que considera determinarem uma diversa.

E, sempre que o tribunal recorrido tiver atribuído credibilidade, ou não, a uma determinada fonte de prova testemunhal ou por declarações, porque tal opção se baseia na imediação da prova, o tribunal de recurso só a pode censurar quando for feita a demonstração de que a opção tomada viola as regras da experiência comum.

“A credibilidade em concreto de cada meio de prova tem subjacente a aplicação de máximas da experiência comum que enformam a opção do julgador. A sua aplicação está, sem dúvida, fora de qualquer controle, mas a legalidade daquela regra da experiência, como norma geral e abstracta, poderá eventualmente ser questionada caso careça de razoabilidade. Assim, a determinação da credibilidade está condicionada pela aplicação de regras da experiência que têm de ser válidas e legítimas dentro de um determinado contexto histórico e jurídico”. Cfr. Acórdão do S.T. J., de 14-03-2007, Processo n.º 21/07, 3.ª Secção, Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça.

Através das provas não se procura criar no espírito do julgador a certeza absoluta da realidade dos factos, pois que, “se a prova em juízo de um facto reclamasse a certeza absoluta da verificação do facto, a actividade jurisdicional saldar-se-ia por uma constante e intolerável denegação de justiça” Cfr. A. Varela, RLJ, Ano 116, p. 339., o que, evidentemente, implica que a justiça tenha de se bastar com um grau de probabilidade bastante, face às circunstâncias do caso, às regras da experiência da vida e aos ensinamentos da ciência.

A prova como demonstração efectiva da realidade de um facto não é certeza lógica mas tão-só um alto grau de probabilidade suficiente para as necessidades práticas da vida (certeza histórico-empírica) Cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 191..

Ora, tecidos estes considerandos, e revertendo à análise da situação em apreço, não pode esquecer-se que foi o tribunal recorrido quem beneficiou da imediação proporcionada pela produção dos meios probatórios e aferiu do grau de credibilidade que cada um lhe mereceu, tendo feito constar da motivação da decisão as razões que o levaram a considerar credíveis e consistentes os meios probatórios aduzidos, e o sentido com que os valorou, em detrimento de parte respectivo teor literalmente expresso por algumas dessas testemunha, designadamente, pelas referidas em sustentação da impugnação efectuada, cujos depoimentos, embora formalmente corroborantes da demonstração dos factos objecto de impugnação, não se revestiram da credibilidade e da consistência necessária passível de sustentar a infirmação da prova efectuada pelo tribunal recorrido, e de levar a uma decorrente e fundamentada convicção positiva sobre tal materialidade.

Na verdade, a motivação da decisão recorrida, além de uma aprofundado correlacionamento de toda a prova produzida, reveste-se de uma incontroversa e sólida consistência e coerência, à luz da aplicação da regras da experiência, deixando bem patente as razões por que se não revestira de adequada credibilidade e solidez os depoimentos da testemunhas aduzidos em sustentação da impugnação factual efectuada, para poderem alicerçar uma convicção positiva sobre a verificação dessa mesma materialidade objecto de impugnação.

Com efeito, pese embora o teor dos depoimentos das testemunhas supra referidas e que serviram de fundamento à impugnação, como, e com toda a pertinência, se refere na motivação da decisão, “em conformidade com as regras da experiência e normalidade do acontecer, só se procede à pintura de uma fracção depois de resolvidos os problemas de fundo, sob pena de eles voltarem a surgir”, e que, considerando o valor despendido pela oponente na pintura das paredes, o mesmo traduziu-se apenas num “melhoramento” prévio ao arrendamento, bem assim que resultou da prova produzida, (…) “que a oponente não paga o condomínio relativo às fracções de que é proprietária com a justificação de que a exequente não procedeu à realização de obras no interior da fracção FO, o que faz intencionalmente, por se ter colocado estrategicamente em tal situação, e utiliza-a como pretexto do seu incumprimento”, pois que, “dos depoimentos das testemunhas KK, CC, proprietário de um café, e DD, condómino e administrador do condomínio de 1998/1999 a 2006/2007, resulta que a oponente procedeu à entrega da chave da fracção ao Sr. CC (em conformidade com a cláusula 4ª de fls. 126), o qual a entregou ao condomínio para que mandasse alguém arranjar a fracção e, feitas as obras, a chave foi devolvida ao Sr. CC para que a executada as levantasse, o que nunca aconteceu, não tendo a executada procedido à verificação das obras, apesar de terem sido marcadas duas datas nas quais a executada não compareceu nem mandou ninguém em sua representação (conforme referido pela testemunha DD)”.

Ora, como resulta do todo evidente, a acentuada coerência e consistência da prova em que o tribunal recorrido alicerçou a sua convicção negativa sobre a factualidade objecto de impugnação, resultante do correlacionamento de vários dos meios de prova produzidos e da conformidade da sua interpretação com as mais elementares regras da experiência comum, de modo algum pode ser infirmada exclusivamente por depoimentos que se não revestiram da segurança e consistência capaz infirmar aqueles meios probatórios e levar à construção de uma convicção positiva sobre essa mesma materialidade.

Aliás, a Recorrente omite a efectuação de explanação crítica e sustentada dessa prova produzida em que se fundamenta, tendente a, de modo claro e linear, deixar bem explicitadas as razões da sua discordância com a decisão recorrida, de molde a que se entendesse, por um lado, por que razões entende que, com fundamento nos mesmos meios probatórios que aduz em sustentação da impugnação e de que o tribunal também se serviu, devem ser extraídas conclusões diversas das retiradas na decisão recorrida, considerando-se demonstrados os factos aí tidos como indemonstrados, e, por outro, esclarecer por que razões errou o tribunal na interpretação que fez desses meios de prova.

Por outro lado, não alegou também o Recorrente por que razões deveria o tribunal ter conferido credibilidade ao conteúdo desses mesmos depoimentos, em que se pretende alicerçar a sua impugnação, pois que, de um modo perfeitamente coerente e fundado, deixou o tribunal claramente expressas as razões por que considerou não possuírem suficiente credibilidade e consistência, os depoimento de tais testemunhas, relativamente a essa factualidade em referência, para alicerçarem a sua convicção positiva sobre a sua verificação.

E, concluiremos nós, sem a efectuação dessa necessária e imprescindível análise crítica do substrato probatório produzido, comprometido ficará o sucesso de qualquer impugnação factual.

Assim sendo, considerado que as conclusões retiradas pelo tribunal encontram indubitavelmente suporte válido na prova produzida, e que, por outro lado, em nada conflituam com a experiência comum, incontornável resulta também, por decorrência, que, com a relevância que, contextualmente, assumiram, no âmbito da valoração de toda a prova produzida, os meios probatórios aduzidos pelo Recorrente, em sustentação da impugnação que efectuou, nos moldes em que efectivamente o foram, de modo algum se revestem de uma solidez e consistência, adequada a conferir-lhes um grau de credibilidade que os torne passíveis de sustentar a pretendida alteração da matéria factual em apreço.

Em consonância com tudo o acabado de expender, e pelas razões expostas, somos de entender que a conjugação de todo este substrato probatório comporta e alicerça de modo consistente a convicção do tribunal sobre matéria fáctica objecto da presente impugnação.

Improcede, assim, nesta parte, a presente apelação.

Invoca ainda a Recorrente a excepção da prescrição, alegando como fundamento que as prestações condominais aqui em referência, por se mostrarem divididas em duodécimos, prescrevem no prazo de cinco anos, nos termos do art. 310°, al. g) do CC..

Em seu entender não existe fundamento para julgar que a prescrição se interrompeu pelo reconhecimento da dívida por banda do recorrente, nos termos do art. 325º do Código Civil, pois que, o reconhecimento do direito, para efeito de interrupção da prescrição, traduz-se na confissão ou declaração da sua existência, desde que praticado pelo devedor perante o titular do crédito.

E assim sendo, para haver reconhecimento com eficácia de interrupção da prescrição, é necessário que haja, ao menos, através de factos, afirmações pessoais, comportamentos ou atitudes, o propósito de reconhecer o direito da parte, sendo, assim, manifesto, perante a fundamentação extraída da sentença a quo, que a julgada interrupção do prazo de prescrição do direito aqui discutido não vem sustentada no art. 323º do CC..

A prescrição tem a sua ratio na circunstância de o lesado não exercitar o seu direito no respectivo prazo, impondo-se, por razões de interesse e ordem públicas, que já não o possa exercer, tutelando-se dessa forma a certeza do direito e a segurança do comércio jurídico. Cfr. Ac. Rel. Porto de 4.3.99,C.J. 1999,1,173.

De acordo com o disposto no artº 310º, alínea g), do Código Civil, “Prescrevem no prazo de cinco anos quaisquer outras prestações”, que não as previstas nas restante alíneas deste preceito, “periodicamente renováveis”.

Ora, como decorre dos factos tidos como demonstrados, a Oponente foi interpelada para pagar as prestações em dívida em 4/11/2009, 30/12/2009, 26/01/2010, 10/01/2011, 7/02/2011, 18/01/2012 e 7/02/2012.

De acordo com o disposto no artº 323º, nº1, do C.C, a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima directa ou indirectamente a intenção de exercer o direito.

Assim, forçoso é concluir, face ao exposto e ao abrigo dos citados preceitos legais, que não se verifica a invocada prescrição dos créditos invocados, uma vez aquando da verificação das interpelações e, designadamente, da primeira que foi efectuada, não haviam ainda decorrido o prazo de prescrição de cinco anos coma relação a qualquer das prestações, reportadas todas elas a um período situado entre 4/11/2009 e 7/02/2012.

E, sendo certo que houve interpelações para pagamento dos créditos invocados, por parte do Recorrido, como e bem refere este último, ao considerar que o pagamento dos valores respeitantes às comparticipações de condomínio ficou submetido à condição da realização da realização das aludidas obras, e bem assim, em razão do seu silêncio, face às sucessivas interpelações que lhe foram feitas, reconheceu o direito do Recorrido, mesmo que tão só de um modo tácito.

Improcede, assim, também quanto a este aspecto, a presente apelação.

Mais alega o recorrente resultar da interpretação que se retira do n.º 1 do art. 6.º do DL 268/94 que a acta da assembleia de condóminos apenas constitui título executivo quanto às quantias que estejam relacionadas com as despesas correntes do condomínio e com as que são necessárias à sua conservação e fruição, excluindo-se, nesta medida, as penalizações.

Assim, em seu entender, a douta decisão sob recurso fez uma incorrecta interpretação do n.º 1 do art. 6.º do DL DL 268/94.

E, sendo certo que não tendo sido invocada tal matéria em sede de oposição à execução, foi alegada no âmbito das alegações finais previstas no art. 604.º, n.º 3 al. e) do CPC, pelo que não poderia o M.mo Julgador a quo deixar de se pronunciar sobre a insuficiência do título executivo no que concerne ao valores referentes às penalidades por atrasos no pagamento das prestações condominais e, nessa medida a sentença objecto de recurso padece de nulidade, nos termos previstos no art. 615.º, n.º 1, al. d), a qual aqui expressamente se invoca.

Por outro lado, mesmo que assim se não entenda, nos termos do disposto no art. 734.º do CPC, conjugado com o art. 726.º, n.º2, al. a), do CPC, sempre a questão de saber sobre a insuficiência do título executivo é do conhecimento oficioso do Tribunal, pelo que, a sentença a quo, ao ordenar o prosseguimento da execução para pagamento das penalidades peticionadas pela Recorrida, violou as normas legais supra citadas.

Ora, sendo certo que a jurisprudência se divide quanto a esta questão, parece-nos, contudo de maior consistência a posição que vai no sentido de considerar que acta da assembleia de condóminos pode constituir título executivo no que concerne às penalizações.

Na verdade, sendo um título executivo por força de lei – art. do art.º 6º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 268/94 -, contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte, a acta da reunião da assembleia do condomínio que tiver deliberado as contribuições a pagar pelos condómino, deverá estender a sua força executiva a todos os condóminos, mesmo que não tenha estado presente nessa assembleia, e quer tenham votado ou não favoravelmente a deliberação aprovada, e quer tenham assinado ou não a acta, uma vez que a força executiva da acta não tem a ver com a assunção pessoal da obrigação consubstanciada na assinatura dela, mas sim com a eficácia imediata da vontade colectiva definida através da deliberação nos termos legais, exarada na acta.

No âmbito da acta, enquanto título executivo, cabem o montante das “contribuições devidas ao condomínio”, devendo esta expressão ser entendida em sentido amplo, ou seja, nela se devendo incluir as despesas necessárias à conservação e à fruição das partes comuns do edifício, as despesas com inovações, as contribuições para o fundo comum de reserva, o pagamento do prémio de seguro contra o risco de incêndio, as despesas com a reconstrução do edifício e as penas pecuniárias fixadas nos termos do art.º 1434º do Cód. Civil, bem como, as contribuições devidas e em dívida ao condomínio, isto é, vencidas e não pagas.

E assim sendo, reconduzindo-se as penalizações a sanções pelo inadimplemento por parte dos condóminos das obrigações de entrega de valores estipulados pela assembleia como correspondentes às respectivas comparticipações, reconduzem-se ou integram, inquestionavelmente, o conceito de "contribuições devidas ao condomínio" constante da parte inicial do nº1 do referido artº 6º, sendo essa a razão por que as actas de reunião das assembleias de condóminos constituem título executivo, no que concerne a esses valores das penalizações. Cfr. neste sentido Acórdãos de 5/06/2011 e 2/03/2008, das Relações de Coimbra e do Porto, proferidos nos processos nºs 455/2001 e 0850758, respectivamente.

Improcede, pois, nesta parte, a presente apelação.

Alega a Recorrente que acta de assembleia de condóminos dada à execução não constitui título executivo bastante para compelir o condómino a pagar qualquer valor devido ao condomínio, em qualquer um dos períodos descritos no requerimento executivo, uma vez que, as contribuições devidas previstas no art.º 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro, terão de ser entendidas como contribuições que vierem a ser devidas e não como contribuições em dívida, ou seja, título executivo será apenas aquela acta de assembleia de condóminos que aprova o orçamento para o ano em curso no suposto que reúna as condições legais para tanto e o condómino não venha a pagar os valores que são da sua responsabilidade e não uma acta que a posteriori venha a deliberar que determinado condómino não pagou no passado certos valores que deveria ter pago.

Em seu entender, esta interpretação resulta, desde logo, do argumento literal da arte final da norma, onde se refere que “constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte” e, por outro lado, a fonte da obrigação pecuniária do condómino deriva da sua aprovação em assembleia de condóminos, consubstanciada na respectiva acta, que aprova e fixa o valor a pagar, correspondente à sua quota-parte para as despesas comuns, e não da declaração feita pelo administrador em assembleia de condóminos de que o condómino deve determinado montante ao condomínio, ou seja, que não pagou importâncias anteriormente fixadas.

Assim, não constando a relação de pretensos valores em divida na acta, mas em documento estranho à acta, donde não consta a assinatura dos condóminos presentes não se poderá concluir que a acta dada como título executivo nos autos documenta deliberações onde sejam quantificados os valores em dívida pelo condómino devedor.

Ora, como se refere no Acórdão da Relação de Lisboa, de 8/07/2008, “a acta da reunião da assembleia do condomínio que tiver deliberado as contribuições a pagar pelos condóminos, nos termos do art.º 6º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 268/94, constitui título executivo (…) contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte, desde que esteja assinada por todos os condóminos que nela participaram e deixaram de pagar (art.º 1º do Dec. Lei n.º 268/94”), sendo que, “a sua força executiva estende-se a todos os condóminos, mesmo que não tenha estado presente nessa assembleia, e quer tenham votado ou não favoravelmente a deliberação aprovada, e quer tenham assinado ou não a acta, uma vez que a força executiva da acta não tem a ver com a assunção pessoal da obrigação consubstanciada na assinatura dela, mas sim com a eficácia imediata da vontade colectiva definida através da deliberação nos termos legais, exarada na acta”.

E – continua – “no âmbito da acta, enquanto título executivo, cabem o montante das “contribuições devidas ao condomínio”. Esta expressão deve ser entendida em sentido amplo. Nela se devem incluir as despesas necessárias à conservação e à fruição das partes comuns do edifício, as despesas com inovações, as contribuições para o fundo comum de reserva, o pagamento do prémio de seguro contra o risco de incêndio, as despesas com a reconstrução do edifício e as penas pecuniárias fixadas nos termos do art.º 1434º do Cód. Civil. Na expressão “contribuições devidas ao condomínio” cabem as contribuições devidas e em dívida ao condomínio, isto é, vencidas e não pagas”. Cfr. Acórdão da Relação de Lisboa, de 8/07/2008, proferido no processo nº 9276/2007-7, in www.dgsi.pt.

Ora, e como se refere na decisão recorrida, a acta de reunião de condóminos, de entre todos os requisitos expressamente exigidos, apenas não faz menção expressa à divida, remetendo quanto a este aspecto para o anexo junto pelo Exequente na resposta.

E assim sendo, dúvidas não podem restar de que tal acta constitui um título executivo, tanto quanto é certo que, como se refere no Acórdão do S.T.J., de 14/02/2014, “para constituir título executivo, a acta da assembleia de condóminos tem de permitir, de forma clara e por simples aritmética, a determinação do valor exacto da dívida de cada condómino, não dependendo, pois, a respectiva força executiva, da assinatura de todos os condóminos (ainda que participantes), nem de, nela, ser explicitado aquele valor”.

(…)

“A exequibilidade desse título não demanda, necessariamente, a menção, na acta, do quantitativo exacto relativo à dívida de cada condómino, nomeadamente do condómino contra quem o administrador venha a instaurar a execução: necessário é que haja sido aprovado o montante certo da contribuição ou da despesa global de modo que, pela simples aplicação da permilagem relativa a cada fracção da propriedade (ou de outro critério que haja sido aprovado), se determine o «quantum» devido por cada condómino.

Afigura-se-nos não poder ser defendida diferente interpretação do correspondente regime legal, pelas seguintes e essenciais razões:

- Desde logo, em homenagem ao elemento literal da interpretação da lei, já que a expressão empregue pelo legislador foi a de “deixar de pagar”, o que consente uma projecção “in futurum”, quando teria sido muito mais apropriada a expressão “tenha deixado de pagar”, caso tivesse em mente a omissão de pagamento de prestações já vencidas, com possibilidade da respectiva quantificação exacta, desde logo, na própria acta que constitui a fonte da obrigação exequenda;

- Depois, e muito mais decisivamente, porque só a propugnada interpretação se compatibiliza com o propósito legislativo subjacente à criação deste novo título executivo – elemento teleológico da interpretação (art. 9º, nº1, do CC) –, dotando o condomínio dum instrumento célere e eficaz para a prossecução e realização das atribuições a seu cargo, dispensando-o do recurso a fastidiosas, longas e desgastantes acções declarativas, em ordem ao cumprimento coercivo das obrigações impendentes sobre condóminos recalcitrantes, oportunistas e relapsos;

- Ainda porque para uma acta de assembleia de condóminos constituir título executivo não é necessário que, na mesma, se encontre já liquidada a dívida do condómino executado, já que é impossível fazer constar, desde logo, do documento que cria a obrigação de efectuar pagamentos futuros o valor daqueles que, nesse mesmo futuro, virão a ser incumpridos;

- Caso o condomínio tenha incorrido em lapso, instaurando execução indevida, sempre o condómino perseguido poderá deduzir oposição à execução, nesta fazendo prevalecer a regularidade da sua situação perante o exequente, com as inerentes consequências legais;

- A interpretação perfilhada é a única que permite considerar que, no caso, o legislador consagrou a solução mais acertada e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9º, nº3, do CC), uma vez que a adversa, como, de resto, os presentes autos evidenciam, teria o condão de estimular a tendencial eternização de conflitos surgidos no seio do condomínio por não serem, atempadamente, pagas as prestações a cargo dos respectivos condóminos”.

Destarte, e à luz do exposto, legítimo nos parece concluir que, contanto que a acta permita efectuar a determinação do valor exacto da dívida de cada condómino, ou seja, quando dela constem devidas ao condomínio ou quaisquer outros montantes referidos no art.º 6º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 268/94, que sejam certos, exigíveis e líquidos (art.º 802º do Cód. Proc. Civil), inquestionável resulta a sua relevância como título executivo, sendo indiferente ou irrelevante que a determinação de um tal valor seja efectuada por remissão para outros documentos, como sucedeu na presente situação.

E assim sendo, improcede igualmente nesta parte a presente apelação.

Mais alega a Recorrente que a factualidade julgada provada pela douta sentença a quo demonstra que a Recorrida não cumpriu a sua obrigação assumida, no âmbito do processo judicial nº 8483/04.3TBBRG, porquanto esta não lixou nem envernizou o chão da fracção, sendo que a realidade factual é bem mais gritante, pois a Recorrida não executou quaisquer das obras a que se obrigou perante a Recorrente.

E conquanto o art. art.º 428.º do CC se refira aos contratos sinalagmáticos (com obrigações recíprocas), atendendo à natureza das relações condominiais, em que existe um nexo de reciprocidade (sinalagma funcional), é de admitir a invocabilidade da excepção do não cumprimento do contrato, desde que se verifiquem os restantes requisitos.

Assim, e reportando à presente situação, uma vez que além das normais obrigações e direitos de cada uma das partes, enquanto administrador de condomínio e condómino, as partes expressamente celebraram um acordo, que prevê primeiramente o cumprimento de uma obrigação por parte da Recorrida, deveria a decisão recorrida ter reconhecido o direito da Recorrente em recusar o cumprimento da obrigação aqui discutida – como o fez – enquanto a Recorrida não cumprir a sua obrigação, nos termos do disposto noa artigo 428, do C. Civil.

Ora, como e bem salienta o Recorrido, esta questão agora suscitada pelo Recorrente, da eventual verificação da excepção do não cumprimento, não o foi em sede de oposição à execução e, por decorrência, também não foi, nem podia ter sido conhecida pela decisão recorrida.

Como é notório, por decorrência do princípio do dispositivo, se por um lado, a decisão a proferir em 1ª instância apenas se pode pronunciar sobre a factualidade que tiver sido alegada pelas partes, e incidir sobre as questões concretas por elas suscitadas, por outro, também a decisão do recurso somente poderá abordar questões sobre as quais tenha incidido a decisão recorrida, isto, como é óbvio, sem embargo das questões de conhecimento oficioso.

Com efeito, e como é consabido, os recursos ordinários mais não visam do que permitir que um tribunal hierarquicamente superior proceda à reponderação da decisão recorrida, o que tem directo reflexo na delimitação das questões que lhe podem ser dirigidas.

O ponto de partida do recurso é sempre uma decisão que recaiu sobre determinadas questões, visando-se com ele apreciar da manutenção, alteração ou revogação daquela, razão pela qual, enquanto meio de impugnação de uma decisão judicial, o recurso apenas pode incidir, em regra, sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo o tribunal ad quem confrontar-se com questões novas Cfr. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, pg. 94. .

Os recursos constituem, assim, mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, pois que a diversidade de graus de jurisdição determina, em regra, que os tribunais superiores sejam apenas confrontados com questões que as partes discutiram nos momentos próprios Cfr. Abrantes Geraldes, obra e local supra referidos..

E apenas podem ser excepcionadas desta regra aquelas situações em que essas questões novas sejam de conhecimento oficioso e o processo contenha os elementos imprescindíveis.

Uma tal regra encontra a sua justificação no princípio da preclusão, quer por desprezar a finalidade dos recursos (art. 627º, nº 1 do C.P.C.), quer para não impedir a supressão de graus de jurisdição.

E, assim sendo, podemos então concluir que os recursos se destinam a sindicar as decisões impugnadas, estando, assim, a intervenção do tribunal “ad quem” circunscrita às questões que dela foram objecto, ou dito de outra forma, está-lhe vedado apreciar quaisquer outras, salvo se de conhecimento oficioso Cfr. Ac. do S.T.J., de 20 de Maio de 2009, in www.dgsi.pt., uma vez que, nas questões novas, a parte submete a um tribunal de recurso questão que ao tribunal recorrido não cumpria conhecer, porque não lhe fora colocada.

Ora, compulsados os autos e, designadamente, articulados apresentados pelo Recorrente, não foi invocada a verificação da aludida excepção e, consequentemente, também a sentença proferida não poderia ter incidido ou abordado esta questão, como de facto não abordou.

As alegações de recurso mostram-se, por isso, ampliadas relativamente aos fundamentos alegados no articulado na oposição, pois que, apenas vieram agora os Recorrentes, nas alegações de recurso, ex novo, conferir relevância à materialidade em que pretendem alicerçar a aludida excepção de não cumprimento, como fundamento da oposição.

Não tendo sido invocada tal excepção pela Recorrente, como evidente resulta que uma tal questão, também não foi, nem poderia ter sido, apreciada pela decisão recorrida.

Assim, atento a que, por um lado, esta questão suscitada pela Recorrente no presente recurso, atinente à excepção de não cumprimento, não constitui uma questão de oficioso conhecimento, e, por outro, representa uma “questão nova”, está, como é óbvio, este tribunal impedido de se pronunciar sobre ela.

E, desse logo e por essa razão, estando o objecto do recurso delimitado, por um lado, pelas conclusões das alegações e, por outro, pela impossibilidade de serem apreciadas questões novas, improcede, sem mais, também nesta parte, a presente apelação.

De qualquer forma, e sem embargo desta incontestável conclusão, sempre se dirá que a argumentação da Recorrente estaria votada ao insucesso.

A figura da excepção de não cumprimento do contrato, conhecida na denominação latina como «exceptio non adimpleti contractus» e que, quando reportada ao incumprimento parcial ou defeituoso é também designada por «exceptio non rite adimpleti contractus», encontra-se prevista e regulada nos arts. 428º a 431º.

Segundo o nº 1 do primeiro destes preceitos, “se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo”.

É a partir desta definição (noção) legal que a doutrina e a jurisprudência vêm desenhando e caracterizando este instituto (figura) jurídico.

Desde logo, trata-se de figura que tem o seu campo de aplicação/funcionamento ligado aos contratos sinalagmáticos (que conferem direitos e obrigações a ambos os contraentes) já que permite que uma das partes do contrato recuse a realização da sua prestação enquanto a outra não cumprir a contraprestação respectiva.

Constitui excepção dilatória de direito material, na medida em que, por um lado, se funda em razões de direito material ou substantivo e, por outro, porque não exclui definitivamente o direito da parte contra quem é oposta, antes o paralisa temporariamente - o «excipiens» não nega o direito da parte contrária nem põe em causa o dever de cumprir a prestação; pretende tão-só realizar a sua prestação quando o outro contraente levar também a cabo a respectiva contraprestação. E não é de conhecimento oficioso, tendo se ser invocada expressamente pela parte que dela se quer aproveitar.

Justifica-se por razões de boa fé, de equidade e de justiça, uma vez que visa evitar que uma das partes tire vantagens sem suportar os encargos correlativos. Para que não seja contrária à boa fé, a «exceptio» só pode operar quando se verifique uma tripla relação entre o incumprimento (total ou parcial, ou defeituoso) do outro contraente e a recusa de cumpri por parte do excipiente: uma relação de sucessão, uma relação de causalidade e uma relação de proporcionalidade. A primeira significa que não pode recusar a prestação, invocando a «exceptio», a parte no contrato que primeiramente caiu em incumprimento. A segunda significa que deve haver um nexo de causalidade ou de interdependência causal entre o incumprimento da outra parte e a suspensão da prestação do excipiente. A terceira significa que a recusa do «excipiens» deve ser equivalente ou proporcionada à inexactidão da contraparte que reclama o cumprimento, de tal modo que, se a falta for de pouca relevância, não será legítimo o recurso à «exceptio».

Embora, por regra, tenha o seu campo de aplicação no âmbito das obrigações contratuais essenciais ou principais, nada impede, porém, o seu funcionamento nas obrigações acessórias emergentes do contrato, desde que entre elas haja interdependência e correspectividade.

A «exceptio» desempenha uma dupla função: de garantia e de coerção. No primeiro caso, porque permite ao «excipiens» garantir-se com as consequências, presentes ou futuras, do não cumprimento. No segundo, porque constitui também um meio de pressão sobre o inadimplente, já que este só terá direito a haver do outro a contraprestação se e quando cumprir a prestação a seu cargo. Sobre todas estas características, vide, Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 9ª ed., pgs. 408 a 414; Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, vol. I, 4ª ed. revista e actualizada, pgs. 405 a 407; e Calvão da Silva, in “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, 1987, pgs. 329 a 338].

Como diz claramente Calvão da Silva [obra citada, pgs. 331 e 332 e nota 599] nos seguintes termos: “(…) o princípio da simultaneidade do cumprimento de obrigações recíprocas que servem de causa uma à outra pode, (…), não existir por convenção das partes”, como acontece, por ex., “(…) nos contratos de execução sucessiva (ou prolongada/duradoura, acrescentamos nós) em que a obrigação de uma parte é de cumprimento contínuo e a obrigação da outra parte é periódica ou fraccionada” (como acontece no contrato de empreitada com pagamento do preço em várias prestações/«tranches»).

E logo acrescenta: “sempre que isto aconteça, a «exceptio …» não pode ser invocada pela parte que está obrigada a cumprir em primeiro lugar, mas já o pode ser por aquela cuja prestação deva ser realizada depois da outra parte”. Cfr. Calvão da Silva, in “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, 1987, pgs. 331 e 332.

Contudo, na presente situação, como e bem salienta o Recorrido, o que impede o funcionamento e a procedência da «exceptio» não é (nem poderia ser) a falta de simultaneidade do cumprimento das prestações, mas sim o facto de se não ter demonstrado que o Recorrido não tenha efectuado as obras a que se obrigou e cujo incumprimento poderia alicerçar o eventual funcionamento ou verificação da “exceptio non adimpleti contractus”.

Improcede, pois, neste aspecto a presente apelação.

Por último, invoca ainda a Recorrente em razão dos factos e fundamentos expostos, em sede de impugnação da matéria de facto, é credora da Recorrida pelo valor global das rendas que a esta deixou de receber, cuja determinação do valor - por não se encontrar quantificável à data da junção ao processo da oposição - requereu fosse determinado em sede de liquidação de sentença.

Este direito da Recorrente deveria ter sido reconhecido e compensado com qualquer eventual crédito que viesse a ser reconhecido à Recorrida e até ao limite deste, pelo que, não assim decidindo a douta sentença a quo fez uma incorrecta interpretação do art. 847.º do CC.”

No que concerne a este aspecto apenas se dirá que, não tendo logrado adesão de prova os factos objecto de impugnação e, designadamente, que a administração do condomínio não tenha efectuado as obras constantes da transacção, para além das referidas no facto 9, e bem assim, que a fracção FO se encontre devoluta para arrendar desde o início de 1999 devido ao estado de degradação dos revestimentos das paredes e tectos provocado pelas infiltrações de águas pluviais que se verificam nas partes comuns e que não foram eliminadas pela exequente, e que por tal motivo a oponente tenha deixado de receber rendas desde o início do ano de 1999, não resultando, assim, e por decorrência, demonstrada a existência de qualquer direito de crédito da Recorrente sobre o Recorrido passível de ser compensado com qualquer outro crédito existente na esfera jurídica do Recorrido sobre o Recorrente.

Destarte e pelo exposto, improcede, e na íntegra, a presente apelação.

Sumário - art. 663º, nº 7 do C.P.C..

I- A acta da reunião da assembleia do condomínio que tiver deliberado as contribuições a pagar pelos condóminos, nos termos do art.º 6º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 268/94, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte, desde que esteja assinada por todos os condóminos que nela participaram e deixaram de pagar (art.º 1º do Dec. Lei n.º 268/94).

II- No âmbito da acta, enquanto título executivo, cabem o montante das “contribuições devidas ao condomínio”, nelas se incluindo as despesas necessárias à conservação e à fruição das partes comuns do edifício, as despesas com inovações, as contribuições para o fundo comum de reserva, o pagamento do prémio de seguro contra o risco de incêndio, as despesas com a reconstrução do edifício e as penalizações ou penas pecuniárias fixadas nos termos do art.º 1434º do Cód. Civil.

III- Os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, pois que a diversidade de graus de jurisdição determina, em regra, que os tribunais superiores sejam apenas confrontados com questões que as partes discutiram nos momentos próprios.

IV- DECISÃO.

Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.

Custas pela Apelante.

Guimarães, 22/ 10/ 2015.

Processado em computador. Revisto – artigo 131.º, n.º 5 do Código de Processo Civil.

Jorge Teixeira

Jorge Seabra

José Amaral.

Cfr. A. dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. IV, pág. 422, da ed. de 1951.

Cfr. Acórdão do S.T. J., de 14-03-2007, Processo n.º 21/07, 3.ª Secção, Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça.

Cfr. A. Varela, RLJ, Ano 116, p. 339.

Cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 191.

Cfr. Ac. Rel. Porto de 4.3.99,C.J. 1999,1,173.

Cfr. neste sentido Acórdãos de 5/06/2011 e 2/03/2008, das Relações de Coimbra e do Porto, proferidos nos processos nºs 455/2001 e 0850758, respectivamente.

Cfr. Acórdão da Relação de Lisboa, de 8/07/2008, proferido no processo nº 9276/2007-7, in www.dgsi.pt.

Cfr. Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, pg. 94.

Cfr. Abrantes Geraldes, obra e local supra referidos.

Cfr. Ac. do S.T.J., de 20 de Maio de 2009, in www.dgsi.pt.

Sobre todas estas características, vide, Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 9ª ed., pgs. 408 a 414; Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, vol. I, 4ª ed. revista e actualizada, pgs. 405 a 407; e Calvão da Silva, in “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, 1987, pgs. 329 a 338].

Cfr. Calvão da Silva, in “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, 1987, pgs. 331 e 332.