Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2820/11.1TBBRG-A.G1
Relator: ROSA TCHING
Descritores: EXONERAÇÃO DO PASSIVO
ACUMULAÇÃO DE JUROS
CIRE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/10/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1º- Do atraso do devedor na apresentação à insolvência e da consequente acumulação de juros de mora vencidos, não se pode, sem mais, concluir que daí adveio prejuízo para os credores.

2º- O prejuízo para os credores previsto na alínea d) do nº1 do artigo 238º do C.I.R.E. abrange qualquer hipótese de redução da possibilidade de pagamento dos créditos, provocada pelo atraso na apresentação à insolvência, desde que concretamente apurada, em cada caso.
Decisão Texto Integral: Isabel M..., divorciada, contribuinte fiscal ..., residente na Rua ..., S. Vicente, Braga, declarada insolvente por sentença datada de 05 de Maio de 2011, veio requerer, no dia 26 de Abril de 2011, a exoneração do passivo restante, ao abrigo do disposto no arts. 235º e ss. do CIRE.
A requerente prestou a declaração aludida no art. 236º, nº 3, do CIRE.

O administrador da insolvência pronunciou-se a favor da concessão da exoneração do passivo restante.

Os credores Banco Mais, SA, Banco BNP Paribas Personal Finance, SA e Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional, pronunciaram-se contra a exoneração do passivo restante.


Foi proferida decisão que, considerando verificada a situação indicada na alínea d) do nº 1, do art. 238º, do CIRE, indeferiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante.

Não se conformando com esta decisão, dela apelou a requerida, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
“1º - A recorrente, em matéria de indeferimento liminar, quanto à exoneração do passivo restante encontra-se sujeita ao disposto na 2º parte da al. d) do n.º1 do art. 238.º do CIRE.
2º- Argumentou que o pedido era tempestivo, que não fornecera nos últimos três anos anteriores aos da propositura da presente acção informações falsas ou incompletas sobre a sua situação económica, não beneficiara da exoneração do passivo nos 10 anos anteriores, não incumprira o dever de se apresentar à insolvência, não tivera culpa na criação da situação de insolvência e não fora condenada por qualquer dos crimes referidos no art. 227º e 228º do Código Penal.
3º- Conforme se estipula no n.º3 do art. 236 do CIRE, no requerimento de exoneração a recorrente alegou, além do mais, que preenche todos os requisitos necessários para, conjuntamente com a apresentação à insolvência, lhe ser concedida a dita exoneração, declarando que se dispõe a observar, integralmente, todas as condições legalmente exigidas para a concessão efectiva da dita exoneração, nos termos do disposto no art. 239.º (ou seja, mediante a cessão do rendimento disponível dos devedores durante os cinco anos subsequentes ao encerramento dos autos de insolvência).
4º- São de verificação cumulativa os pressupostos de indeferimento liminar enunciados no art. 238º, nº1, al. d) do CIRE.
5 º- O único prejuízo que os credores (todos instituições bancárias) podem ter tido com essa demora foi o agravamento do passivo destes, pelo acrescer de juros de mora entretanto vencidos, não tendo existido qualquer delapidação de património próprio. Na verdade, a recorrente declarou e alegou que preenche os requisitos para a exoneração do passivo restante, não se verificando qualquer das situações previstas do art. 238.º do CIRE: dos autos nenhuns indícios constam no sentido da recorrente ter delapidado qualquer património e tal ocorrência tal como outros prejuízos não podem ser presumidos se sobretudo não forem alegados, e o certo é que ninguém no processo os alegou. O mero atraso na apresentação à insolvência não deve levar ao indeferimento “liminar” de que fala o art. 238º do CIRE, desacompanhado da constatação de prejuízos dele decorrente para os credores.
6º- O devedor pessoa singular que não seja titular de uma empresa na data em que incorre em situação de insolvência, sobre quem não recai aquele dever de apresentação, mantém legitimidade para requerer a declaração da sua insolvência a todo tempo, sem sujeição a qualquer prazo. È a conclusão que se retira do que a este respeito se recorda aqui o decidido no Ac. da R. Coimbra de 26/05/2009 ( Proc. n.º 1526/09.6TBLRA.C1, in www.dgsi.pt onde se determinou que “ o incumprimento de dever de apresentação à insolvência dentro dos 60 dias seguintes à data do conhecimento da situação de insolvência não retira ao devedor legitimidade para se apresentar em data posterior, não sendo de caducidade aquele prazo”.
7º - A recorrente evidencia através do processo respeito pela rectidão de procedimentos, pelo que o tribunal no conjunto devia e podia ponderar no juízo de probabilidade quanto ao merecimento da oportunidade concedida á recorrente, que ainda é jovem e permanecerá por certo durante muito tempo no ensino.
8º - Merecendo toda a censura o despacho recorrido, o tribunal “à quo” violou entre outros as seguintes disposições legais, 18.º n.º2, e 238.º n.º1 alínea d) todos do CIRE. “

A final, pede seja revogada a sentença recorrida e a sua substituição por outra que defira a requerida exoneração do passivo restante.

O Digno Magistrado do Ministério Público contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

Os factos dados como provados na 1ª instância são os alegados pela autora e supra descritos que constam do relatório.
1. Isabel M... nasceu no dia 08 de Julho de 1967…
2. Casou com Eugénio M... em 22 de Novembro de 1997…
3. E divorciou-se no dia 13 de Julho de 2010.
4. A Isabel M... é professora, auferindo a quantia ilíquida mensal de € 1.373,13.
5. A Isabel M... não tem antecedentes criminais registados.
6. A insolvente é comproprietária da fracção designada pela letra Z, correspondente a uma habitação, no terceiro andar direito trás, do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Braga, sob o nº 781/... (S. Vítor), inscrita na matriz predial urbana sob o art. 4...…
7. E do veículo automóvel Audi de matrícula ...-VE.
8. A Isabel M... celebrou com o Banco BNP Paribas Personal Finance, SA, em Novembro de 2005, o contrato de Mútuo com reserva número 5... que visou a aquisição do veículo Audi A4 1.9 TDI, cujo montante financiado ascendeu a € 18.731,25 (dezoito mil setecentos e trinta e um euros e vinte e cinco cêntimos), a ser pago em 72 prestações…
9. A Isabel M... subscreveu uma livrança em branco com pacto de preenchimento estabelecido contratualmente para avalizar a operação financeira aludida em 8.
10. A Isabel M... deixou de pagar as prestações acordadas no âmbito do contrato aludido em 8, no dia 05 de Maio de 2008.
11. No dia 22 de Novembro de 2006, Isabel M... e Eugénio M... celebraram com o Banco Credibom, SA, um contrato de crédito mediante o qual este entregou-lhes a quantia de €15.411,16 (quinze mil quatrocentos e dezasseis cêntimos) destinada a empreitadas (obras habitação), obrigando-se aqueles a restituírem-na em 72 prestações mensais no valor de € 322,20 (trezentos e vinte e dois euros e vinte e dois cêntimos).
12. Para garantia do pontual pagamento do capital mutuado e respectivos encargos, a insolvente subscreveu uma livrança caução em branco.
13. A insolvente nunca efectuou qualquer pagamento no âmbito do contrato identificado em 11.
14. A Isabel M... e Eugénio M... celebraram com a Caixa Geral de Depósitos, no dia 12 de Abril de 2007, dois contratos de mútuo com hipoteca, pelos quais esta instituição bancária entregou-lhes a quantia global de € 150.353,75 (cento e cinquenta mil trezentos e cinquenta e três euros e setenta e cinco cêntimos), para aquisição de imóvel para habitação própria e permanente e financiamentos de investimentos múltiplos não especificados em bens imóveis…
15. A Isabel M... deixou de cumprir as obrigações decorrentes dos contratos identificados em 14, desde 05 de Maio de 2010.
16. No dia 09 de Dezembro de 2008, a Isabel M... e Eugénio M... compraram o veículo de marca Peugeot, modelo 307, 1.4 HDI, de matrícula ...-VJ, pelo preço de € 11.759,00, à Garagem G....
17. A Isabel M... e Eugénio M... não pagaram o preço do veículo de matrícula ...-VJ que deveria ter sido entregue no dia 09 de Dezembro de 2008.
18. A Isabel M... não pagou à Fazenda Nacional a quantia de € 2.238,15 (dois mil duzentos e trinta e oito euros e quinze cêntimos) relativa ao IRS de 2008.
19. A Isabel M... é titular da conta de depósitos à ordem nº 1-93... sediada no Banco Comercial Português, SA, que apresentava o saldo devedor de € 42.301,64 (quarenta e dois mil trezentos e um euros e sessenta e quatro cêntimos) no dia 28 de Outubro de 2010, nunca tendo sido pago tal montante.
20. O Banco Comercial Português, SA é portador de uma livrança no valor de € 17.938,01, subscrita pela Isabel M... em 21 de Dezembro de 2006 e vencida no dia 30 de Outubro de 2009.
21. O Banco Comercial Português, SA concedeu um crédito de € 15.000,00 à Isabel M..., associado à conta dinâmica nº 453..., em 15 de Janeiro de 2009, tendo-se verificado o incumprimento das obrigações assumidas por esta desde 20 de Fevereiro de 2009.
22. O Banco Mais, SA é portador de uma livrança subscrita pela Isabel M... em 06 de Julho de 2009, vencida em 30 de Julho de 2009, no valor de € 10.114,92 (dez mil cento e catorze euros e noventa e dois cêntimos).
23. A Isabel M... requereu a sua insolvência no dia 26 de Abril de 2011.
24. Por sentença datada de 05 de Maio de 2011, foi declarada a insolvência da Isabel M....
25. A Isabel M... é Ré ou executada nas acções identificadas a fls. 6 e 7 e 154.

FUNDAMENTAÇÃO:

Como é sabido, o âmbito do recurso determina-se pelas conclusões da alegação do recorrente – art. 660º, n.º2, 684º, n.º3 e 690º, n.º1, todos do C. P. Civil - , só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, ainda que outras, eventualmente, tenham sido suscitadas nas alegações propriamente ditas.

Assim, a única questão a decidir traduz-se em saber se é de deferir o pedido de exoneração do passivo restante formulado pelo insolvente.

Sustenta a insolvente/apelante que o despacho recorrido não contém factos suficientes que justifiquem o indeferimento liminar do seu pedido de exoneração do passivo restante.
Isto porque o mero atraso na apresentação à insolvência não deve levar ao indeferimento “liminar” de que fala o art. 238º do CIRE, desacompanhado da constatação de prejuízos dele decorrente para os credores.
E se é certo que, no caso dos autos, tal atraso acarretou para as instituições bancárias uma acumulação de juros vencidos, a verdade é que nenhuma destas credoras alegou quaisquer prejuízos daí advenientes.
Vejamos, então, se lhe assiste razão.
A concessão efectiva da exoneração do passivo depende da observância dos requisitos substanciais e trâmites processuais estabelecidos nos arts. 236º a 238º do C.I.R.E., pressupondo, de harmonia com o disposto no art. 237º, al. a), que não ocorra nenhum dos fundamentos que, nos termos das alíneas a) a g) do nº1 do art. 238º, determinam o indeferimento liminar do pedido.
Com excepção da alínea a), respeitante a um aspecto que tem também incidências processuais – o prazo em que deve ser formulado o pedido -, tratam-se de causas que têm natureza substantiva, reportando-se a comportamentos do devedor que justificam a não concessão da exoneração .
Uma vez que a inexistência dos fundamentos enunciados nas alíneas a), b), c), f), e) e g) do nº1 citado art. 238º não foi questionada pela Mmª Juíza a quo nem pela insolvente/apelante, centraremos a nossa atenção na alínea d), posto que o tribunal recorrido indeferiu liminarmente o pedido de exoneração formulado pela insolvente com base no comportamento da devedora previsto nesta alíneas.
Segundo o disposto na citada alínea d), o pedido de exoneração é liminarmente indeferido se se verificarem, cumulativamente, as seguintes condições:
1) o devedor tiver incumprido o dever de apresentação à insolvência ou, não estando obrigado a se apresentar, se tiver abstido dessa apresentação nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência;
2) daí tiver decorrido prejuízo para os credores;
3) sabendo o devedor, ou não podendo ignorar sem culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica.
A este respeito, defende a insolvente/apelante que dos factos provados não resulta comprovado nenhum prejuízo adveniente para os credores do atraso na sua apresentação à insolvência.
Isto porque, por um lado, o simples avolumar dos juros não pode ser tido como prejuízo.
E, por outro lado, só ocorre tal prejuízo quando, depois, de estar consolidada a situação de insolvência, o devedor contraiu novas dívidas (de capital) ou dissipou património, reduzindo, deste modo, a garantia patrimonial dos credores, o que não aconteceu no caso dos autos.

Que dizer?

Desde logo que perfilhamos o entendimento explanado no Acórdão do STJ, de 21.10.2010 , no sentido de que “se no regime anterior, estabelecido no Código dos Processos Especiais de Recuperação de Empresa e de Falência , se podia por a hipótese de quanto mais tarde o devedor se apresentasse à insolvência, mais tarde cessaria a contagem de juros, com o consequente aumento do volume da dívida, no regime actual , (…) , tal hipótese não tem cabimento, uma vez que os credores continuam a ter direito aos juros, com a consequente irrelevância do atraso da apresentação à insolvência para o avolumar da dívida”.
Dai considerarmos, tal como defende a insolvente/apelante, que do atraso na apresentação à insolvência e da consequente acumulação de juros de mora vencidos, não se pode, sem mais, concluir que daí adveio prejuízo para os credores.
Todavia, julgamos não assistir-lhe razão quando afirma que, não resultando dos factos assentes que tivesse praticado quaisquer actos delapidadores do seu património, indemonstrado fica o prejuízo dos credores.
Em primeiro lugar porque, conforme se escreve no Acórdão do STJ, de 03.11.2011 , o prejuízo para os credores previsto na alínea d) do nº1 do artigo 238º do C.I.R.E. “abrange qualquer hipótese de redução da possibilidade de pagamento dos créditos, provocada pelo atraso na apresentação à insolvência, desde que concretamente apurada, em cada caso”.
Em segundo lugar porque, se é certo ter a insolvente deixado de cumprir, no dia 5 de Maio de 2010, as obrigações assumidas junto da Caixa Geral de Depósitos, SA, no âmbito dos dois contratos de mútuo da quantia de € 150.353,75 com hipoteca celebrados com esta instituição bancária no dia 12 de Abril de 2007, não menos certo é resultarem dos factos assentes que, já no ano de 2008, as dívidas vencidas da insolvente ascendiam ao montante global, de, pelo menos, € 45.901,41.
Com efeito, provado ficou que, em 5 de Maio de 2008, a insolvente deixou de pagar as prestações acordadas no âmbito do contrato Mútuo, do montante de € 18.731,25, que celebrou com o Banco BNP Paribas Personal Finance, SA em Novembro de 2005 e que visou a aquisição do veículo Audi A4 1.9 TDI.
Mais se provou que, naquele mesmo ano, a insolvente ainda não havia iniciado o pagamento de nenhuma das 72 prestações mensais, no valor de € 322,20, acordadas no âmbito do contrato de crédito do montante de €15.411,16 que, em 22 de Novembro de 2006, juntamente com Eugénio M... celebrou com o Banco Credibom, SA, para a realização de obras em habitação.
E que também não pagou o preço de € 11.759,00 relativo ao veículo de marca Peugeot, modelo 307, 1.4 HDI, que juntamente com o Eugénio M... comprou, em 9 de Dezembro de 2008, à Garagem G....
Ora, perante este avolumar de dívidas e tendo em conta que a insolvente tinha como única fonte de rendimento a remuneração por ela auferida no montante mensal ilíquido de € 1,373,13, julgamos que a conclusão a retirar é a de que, já no ano de 2008, a insolvente não só se encontrava impossibilitada de cumprir as dívidas vencidas no montante de € 45.901,41 como também não podia ignorar que não existia qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica, tudo indicando que ser seu dever apresentar-se á insolvência decorridos os primeiros seis meses do ano de 2009.
A verdade é que não só não o fez, como também não pagou à Fazenda Nacional a quantia de € 2.238,15 relativa ao IRS de 2008, nem se inibiu de, em 15 de Janeiro de 2009, contrair junto do Banco Comercial Português, SA novo empréstimo de € 15.000,00 Leite (em relação ao qual entrou em incumprimento desde 20 de Fevereiro de 2009), e de, em 6 de Julho de 2009, subscrever, a favor do Banco Mais, SA, uma livrança, no valor de € 10.114,92, e com vencimento em 30 de Julho de 2009.
Mas se assim é, torna-se claro que com o seu atraso na apresentação à insolvência, a insolvente aumentou o seu passivo para € 73.254,48, agravando, deste modo, a sua situação de insolvência e com isso reduziu ainda mais a possibilidade de pagamento dos créditos anteriormente concedidos pelo Banco BNP Paribas Personal Finance, SA e pelo Banco Credibom, SA, bem como da dívida contraída para a Garagem G..., com prejuízo para estes credores e para os seus novos credores Banco Comercial Português, SA. e Banco Mais, SA.,
E tudo isto sem contar que, no dia 30 de Outubro de 2009, venceu-se a livrança que, em 21 de Dezembro de 2006, a insolvente havia subscrito a favor do referido Banco Comercial Português, SA, no valor de € 17.938,01, que a conta de depósitos à ordem nº 1-93... de que a insolvente era titular neste mesmo banco, no dia 28 de Outubro de 2010, apresentava um saldo devedor de € 42.301,64 e que, desde 5 de Maio de 2010, a insolvente deixou de cumprir as obrigações relativas ao empréstimo do montante de € € 150.353,75 concedido pela Caixa Geral de Depósitos, no dia 12 de Abril de 2007, no âmbito dos dois contratos de mútuo com hipoteca.
Daí termos por certo que, tendo a insolvente dado entrada do seu requerimento de apresentação à insolvência apenas em 26 de Abril de 2011, tal atraso causou prejuízo aos credores, na medida em que, não o tendo feito atempadamente, obstou a mesma à estabilização do seu passivo e contribuiu para o avolumar dos montantes em dívida.
Acresce ser evidente que quanto mais tarde se proceder à liquidação do património do insolvente para pagamento aos credores, menor é a possibilidade da satisfação destes.
Do mesmo modo e conforme já se deixou dito, não se retira dos elementos constantes dos autos, que, no momento em que deixou de se apresentar à insolvência, a mesma tivesse “qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica”.
É que, como se escreve no Acórdão desta Relação de 4.10.2007 , “ (…) ao falar em « perspectiva séria», o legislador aponta para um juízo de verosimilhança sobre a melhoria económica do insolvente, alicerçada naturalmente em indícios consistentes e não em fantasiosas construções ou optimismo compulsivo”.
Ora, a nosso ver, os factos provados apontam precisamente no sentido inverso, ou seja, para a ausência dessa perspectiva.
Isto porque sobre a fracção designada pela letra Z, correspondente a uma habitação, no terceiro andar direito trás, do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Braga, sob o nº 781/... (S. Vítor), de que a insolvente é comproprietária, impende hipoteca a favor da Caixa Geral de Depósitos.
Porque o veículo automóvel Audi de matrícula ...-VE, de que é também comproprietária, não chegou a ser pago.
E porque a única fonte de rendimento da insolvente é constituída pela remuneração que aufere do exercício da sua profissão de professora, no montante de € 1.373,13, sendo certo que, conforme ela própria alega e resulta do documento junto a fls. 66 dos autos, parte do mesmo ( € 357,03) já se mostra penhorado.
Por outro lado, importa ter presente que, para além da verificação dos requisitos enunciados na citada alínea d) do nº1 do citado art. 238º, o que está verdadeiramente em causa no deferimento do pedido de exoneração do passivo restante, é saber se o devedor teve um comportamento anterior ou actual pautado pela licitude, honestidade, transparência e boa fé no que concerne à sua situação económica e aos deveres associados ao processo de insolvência.
No dizer de Assunção Cristas , tal conduta há-de ser aferida através da ponderação de dados objectivos “passíveis de revelarem se a pessoa se afigura, ou não, merecedora de uma nova oportunidade e apta para observar a conduta que lhe será imposta”.
Mas se assim é, resta-nos, então, concluir que, no caso em apreço, mostra-se suficientemente demonstrada uma actuação anterior do insolvente que é de qualificar como culposa e da qual resultou o agravamento da sua situação de insolvência.
Por tudo isto, consideramos verificados todos os pressupostos enunciados na alínea d) do nº1 do citado art. 238º.
Daí impor-se o indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo restante formulado pela insolvente Isabel M..., pelo que nenhuma censura merece a decisão recorrida que, por isso, será de manter.

Improcedem, pois, todas as conclusões da insolvente/apelante.

DECISÃO:
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação e, consequentemente, em confirmar a decisão recorrida, ainda que com base em fundamentos não inteiramente coincidentes.
Custas pela insolvente.



Guimarães, 10 de Janeiro de 2012