Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
583/14.8TBFAF-A.G1
Relator: ESPINHEIRA BALTAR
Descritores: PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
PRAZO
NORMA IMPERATIVA
HOMOLOGAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/05/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1. O prazo das negociações para a obtenção dum plano envolve o processo de aprovação, cuja violação implica a recusa da sua homologação.
2. Atendendo à natureza imperativa das regras procedimentais, a sua violação põe em causa o fim preconizado pelo processo especial de recuperação, que visa a aprovação dum plano, num determinado prazo.
Decisão Texto Integral: Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães

Nos presentes autos de processo especial de revitalização (PER), proferido despacho inicial em 07.05.2014 (fls. 303-304), publicado em 07.05.2014, foi apresentada pelo Sr. Administrador Judicial Provisório a lista provisória de créditos nos termos do artigo 17.º – D, n.º 3 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas em 04.06.2014 (fls. 348 e ss.).
Em 05.06.2014 foi publicada no Portal Citius a lista provisória de créditos (fls. 384), sendo que, em 15.07.2014 foi publicada novamente no Portal Citius uma lista provisória de créditos rectificada (fls. 393 e 511)
Foram apresentadas impugnações.
Nos termos do artigo 17.º-D, n.º 5 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas foi o prazo de conclusão das negociações prorrogado por um mês (fls. 530).
Em 29.09.2014 foi pela devedora junto aos autos o Plano de Revitalização aprovado (fls. 567 e ss.).
Em 29.09.2014, o Sr. Administrador Judicial Provisório juntou aos autos documento com o resultado da votação (fls. 604 e ss.).

A final foi proferida decisão que recusou a homologação do plano de recuperação aprovado por maioria, devido a ter ultrapassado o prazo de 3 meses previsto no artigo 17-D n.º 5, conjugado com o artigo 17-G n.º 1 do CIRE.

Inconformada com o decidido, a devedora e requerente do processo especial de revitalização reclamou da decisão invocando lapso na contagem do prazo. Mas o tribunal concluiu que o lapso existente não afecta o cerne da decisão, uma vez que o prazo foi ultrapassado em alguns dias, mantendo a recusa de homologação.

Inconformada, interpôs recurso de apelação, formulando conclusões.
Não houve contra-alegações.
Das conclusões do recurso ressaltam as seguintes questões, a saber:
1.Se o prazo de 2 meses com um mês de prorrogação para as negociações engloba já a aprovação do plano especial de recuperação das empresas.
2.Se a decisão recorrida viola os princípios orientadores do plano especial de recuperação das empresas, com destaque para o interesse dos credores e do interesse público.
3. Se se traduz numa nulidade secundária que não interfere com o exame da causa. – artigo 195 do CPC.

Damos como assente a matéria acima relatada.

1.A questão que se discute nos autos centra-se em saber se o processo negocial, com vista à aprovação dum plano de recuperação das empresas, engloba a sua aprovação por unanimidade ou por maioria, ou se ao prazo das negociações se soma o prazo para aprovação do plano saído das negociações, ou seja, se estamos perante dois prazos autónomos.
Esta questão tem dividido a jurisprudência das Relações em duas correntes, em que uma defende que o prazo para as negociações envolve todo o processo negocial entre o devedor e os credores com superintendência do AJP, em que está implícito o processo de votação, apoiando-se na natureza especial do processo de revitalização, em que predominam os prazos curtos, e as consequências nefastas para os credores, enquanto está pendente o referido processo, não podendo exercer os seus direitos contra o devedor. Considera que todas as normas procedimentais são de natureza imperativa, vinculando as partes e o tribunal no momento da sua fiscalização, cuja violação é considerada não negligenciável, para os termos e efeitos do disposto no artigo 215 do CIRE (conf. Ac. RL. 13/03/2014, Ac. RP.19/11/2013,Ac. RP. 10/09/2014, Ac. RP. 7/06/2014, Ac. RC. 12/03/2013, Ac. RC. 21/10/2014, Ac. RG.10/04/2014, todos publicados em www.dgsi.pt). A outra corrente considera que o prazo das negociações não é peremptório, podendo ser ultrapassado desde que justificado e, no caso de haver acordo, o processo atingiu o seu fim, pelo que a sua violação não afecta o exame da causa (Ac. RL. 9/12/2014, Ac. RL. 10/04/2014, publicados em www.dgsi.pt). E cada uma das correntes tem efeitos contrários quanto à recusa ou homologação do plano aprovado com violação do prazo. A primeira recusa a homologação do plano acordado por violação não negligenciável de regras procedimentais, enquanto a outra homologa o acordo porque entende que se atingiu o fim do processo, não influenciando o exame da causa.

Aderimos à corrente jurisprudencial que considera as regras procedimentais normas imperativas, cuja violação leva à recusa da homologação. E isto por entendermos que o processo especial de recuperação foi criado com vista a fomentar a recuperação das empresas por via negocial, em que se dá prevalência à manutenção das empresas que se manifestem, ainda, com viabilidade económica. Mas este processo deve correr dentro de determinados prazos, muito curtos, que foram pensados de molde a equilibrarem os interesses do devedor, dos credores e da economia em geral. O legislador quis um processo rápido, incentivando os intervenientes a encontrem, de forma célere, uma solução viável, ou a decidirem pela inviabilidade, para evitar o arrastamento das negociações, porque está em causa o exercício dos direitos de crédito dos credores em geral, que fica suspenso.

No caso em apreço, está em discussão o prazo de 10 dias que sucedeu ao das negociações de 90 dias. E isto, porque a apelante entende que é um prazo autónomo do das negociações e, como não foi ultrapassado, não há violação do prazo para a obtenção do plano aprovado. Ele foi aprovado com maioria relativa, atingindo-se a finalidade do processo, pelo que deveria ser homologado e não recusada a homologação, por se ter violado as regras procedimentais, como o decidiu o tribunal recorrido.

Porém, face à posição que tomamos sobre o assunto, julgamos que o processo negocial envolve todo o processo para a obtenção do acordo, incluindo o processo de aprovação, pelo que o prazo em causa é apenas o de 3 meses, em que houve a prorrogação de um mês. A apresentação do plano, mesmo aprovado, para além deste prazo, é intempestiva, pelo que não tinha o tribunal outra solução que não fosse recusar a homologação e considerar o processo encerrado nos termos do artigo 17 – G do CIRE.

Mesmo na perspectiva da corrente jurisprudencial que considera que o prazo em causa não é peremptório, exige uma justificação para a sua violação, o que não ocorreu no caso. Daí que, mesmo seguindo esta posição, o caso seria sempre de recusa de homologação, por falta de justificação na apresentação tardia do plano aprovado.

2 e 3. Face ao decidido em 1, julgamos que não há violação dos princípios orientadores do processo especial de recuperação das empresas, na medida em que esses princípios estão plasmados nas normas que dão forma ao respectivo processo e justificam a sua imperatividade. Atendendo à sua natureza, a sua violação implica sempre uma afectação do exame da causa, na medida em que se pretende um acordo dentro dos prazos estipulados. Os prazos são essenciais ao fim preconizado. Só em situações excepcionais de justo impedimento é que justificaria a sua violação.

Concluindo: 1. O prazo das negociações para a obtenção dum plano envolve o processo de aprovação, cuja violação implica a recusa da sua homologação. 2. Atendendo à natureza imperativa das regras procedimentais, a sua violação põe em causa o fim preconizado pelo processo especial de recuperação, que visa a aprovação dum plano, num determinado prazo.

Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes da Relação em julgar improcedente a apelação e, consequentemente, confirmam a decisão recorrida.
Custas a cargo da apelante.
Guimarães, 05/03/2015
Espinheira Baltar
Henrique Andrade
Eva Almeida