Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2050/12.5TJVNF.G1
Relator: JOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Descritores: MATÉRIA DE FACTO
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
ALTERAÇÃO OFICIOSA DOS FACTOS
DANO BIOLÓGICO
PERDA DA CAPACIDADE AQUISITIVA
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/18/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1- Nos casos em que os factos dados como provados e não provados assentaram em elementos probatórios subtraídos ao princípio da livre apreciação da prova, independentemente da impugnação que desses factos seja feita pelos recorrentes, detetado pelo tribunal superior que aquela matéria dada como provada e/ou não provada viola regras de direito probatório, essa Instância Superior (após observância do princípio do contraditório – se for o caso), terá oficiosamente que alterar essas respostas e torná-las conformes às regras do direito probatório aplicável. É o caso daquelas respostas se encontrarem desconformes a acordo, exarada em ata de audiência final, celebrado entre as partes, em que estas consideraram verificada (considerando-a provada) determinada matéria, ou dessas respostas se mostrarem desconformes ao teor da transação celebrada entre as partes em sede de procedimento cautelar apenso, e aí homologado por sentença transitada em julgado.

2- O conceito de “dano biológico” surgiu em Itália e no ordenamento jurídico nacional não existe consenso quanto à forma de ressarcimento desse dano: a posição maioritária é que esse dano deve ser valorado na vertente patrimonial; outra corrente sufraga que esse dano carece de ser valorada na vertente patrimonial ou na não patrimonial, conforme a apreciação casuística do caso; uma terceira corrente entende que se está perante um tertium genus, não subsumível à categoria dos danos patrimoniais ou não patrimoniais, devendo ser indemnizado de per se.

3- O dano biológico, na medida em que constitui uma lesão de bens eminentemente pessoais do lesado (a saúde), determinando-lhe uma deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do seu corpo no desenvolvimento de todas as suas atividades (sejam profissionais, lazer, familiar e demais dimensões da sua vida), carece de ser, sempre, indemnizado na vertente patrimonial, independentemente de ter ou não repercussões negativas a nível salarial ou na atividade profissional do lesado, mesmo que este último não desempenhe, à data do evento, atividade profissional remunerada e, ainda que se trate de pessoa já reformada.

4- O cálculo dessa indemnização (frustração da capacidade de ganho futura) é feito por recurso à equidade, devendo como critério objetivador, instrumental e orientador, ter-se presente as fórmulas matemáticas seguidas pela jurisprudência.

5- A compensação de 45.000,00 euros revela-se adequada, proporcional e suficiente para compensar a lesada pelos danos morais sofridos, em consequência de intervenção cirúrgica estética realizada aos seios que, por erro médico, lhe determinou que, durante mais de quatro anos, se tivesse visto confrontada com um quadro de dor, tomada constante de analgésicos e anti-inflamatórios, deslocações frequentes a hospitais para tratamentos, insegurança por ver o seu quadro clínico não resolvido e a agravar-se, determinando-lhe a realização de seis intervenções cirúrgicas aos seios, ficando sem peito durante quase nove meses e com uma extensa cicatriz, além de ter ficado com uma incapacidade permanente de 11,8 pontos e com um prejuízo sexual de grau 2, numa escala de 7 graus de gravidade crescente, e que se sentiu (e sente) afetada na sua estética, auto-estima, não conseguindo ir à praia ou vestir “biquíni”, sequer praticar desporto, vivendo atormentada com a perceção de que o seu corpo se encontra deformado, sentindo vergonha de o ver e exibir, além de sentir tristeza, revolta e amargura, o que gerou o seu afastamento dos filhos e do marido.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO

1º Recurso
Recorrente: X – Companhia de Seguros, S.A
Recorrida: Maria.

2º Recurso
Recorrente: Maria
Recorridos: X – Companhia de Seguros, S.A., Y – Prestação Médico Cirúrgicos, Lda. e E. M..
*
MARIA, residente na Rua …, Mirandela, instaurou a presente ação declarativa, com processo comum na forma ordinária contra X – Companhia de Seguros, S.A. (anteriormente designada por W PORTUGAL – Companhia de Seguros, S.A.), com sede na Rua …Porto; Y – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICO CIRÚRGICOS, Lda., com sede na Av. … Vila Nova de Famalicão; e E. M., médico, com domicílio profissional na 2.ª Ré, pedindo a condenação solidária destes a pagar-lhe:

a- a quantia de € 100.000,00, a título de indemnização por danos patrimoniais (danos emergentes e lucros cessantes);
b- a quantia de € 200.000,00, a título de compensação por danos não patrimoniais; e
c- juros de mora, a contar da citação, até efetivo e integral satisfação.
Para tanto alega, em síntese, ter sido submetida a uma mamoplastia na Clínica Ré, tendo essa intervenção sido levada a cabo pelo Réu E. M.; na sequência da cirurgia, acordou com dores, não conseguia levantar o braço e desmaiava; porque não melhorava, contactou o Réu médico, o qual, por intermédio da sua assistente, aconselhou-a a fazer medicação para as dores e para a febre; tinha dois caroços por baixo do braço direito entre o peito e a axila, tendo o Réu médico recomendado que efetuasse massagem, o que não conseguia, por as dores serem insuportáveis; a situação não melhorou, tendo-lhe aparecido uma bolha junto da cicatriz; foi medicada com antibióticos e fez tratamento para drenar o pus; porque não melhorava, em novembro de 2010, fez cirurgia para remover a prótese, porque o Réu médico suspeitava de infeção provocada pela mesma; em dezembro de 2010, foi sujeita a nova cirurgia para recolocar a prótese, mas as dores continuaram e agravaram-se, bem como a mobilidade do braço direito, continuando iguais os caroços; contactou a sua médica de família, que detetou uma infeção, tendo o Réu médico receitado, de novo, antibióticos e anti-inflamatórios; em 01.02.2011, deslocou-se a Coimbra, onde foi vista por outra médica, tendo sido sujeita a nova cirurgia de remoção da prótese, tendo-se detetado a existência de duas compressas compactadas e infetadas entre o seio e a axila.
Mais alega ter ficado sem peito durante nove meses, período durante o qual colocou um expansor mamário, o que a obrigou, até fevereiro de 2012, a constantes deslocações de Mirandela a Coimbra;
Sentiu sempre dores e mau estar;
Terá de ser sujeita a nova cirurgia para a recolocação da prótese;
À data da mamoplastia, era gerente comercial e auferia a quantia mensal de € 571,00;
Perdeu o apetite sexual e sente vergonha do seu corpo, quer perante o marido, quer perante familiares ou amigos.

A 2ª e o 3º Réus contestaram, impugnando parte da matéria alegada pela Autora e sustentando que os montantes indemnizatórios reclamados são exagerados e injustificados.
Concluem, pedindo que a ação seja julgada em conformidade com a prova produzida.

A 1ª Ré seguradora contestou, aceitando a existência do contrato de seguro invocado pela Autora, defendendo-se, contudo, por exceção, sustentando que aquele contrato não garante a responsabilidade civil emergente de perdas indiretas de qualquer natureza, lucros cessantes e paralisações, concluindo que a indemnização reclamada pela Autora não se encontra abrangida pela garantia conferida pelo contrato de seguro.
Impugnou parte da factualidade alegada pela Autora e reputou por exageradas as indemnizações que reclama;
Excecionou sustentando ter pago à Autora a quantia de 15.000,00 euros, a qual deverá ser atendida no cômputo da indemnização a fixar àquela.
Conclui pedindo que a ação seja julgada conforme o que for provado e o direito aplicável.

Convidou-se a Autora a suprir insuficiências da matéria fáctica alegada, convite este que a mesma acatou.

Dispensou-se a realização de audiência prévia, fixou-se o valor da ação, proferiu-se despacho saneador, fixaram-se os factos já assentes e a base instrutória, tendo a Ré seguradora apresentado reclamação, que não foi atendida.

Realizou-se audiência final, constando da ata de audiência de fls. 426 a 428 o seguinte:
Autora e Réus admitem por acordo, que no dia 12/11/2014, a Autora foi submetida a uma substituição de um expansor mamário por prótese da mama direita e substituição de prótese PIP da mama esquerda, para se igualar a simetria”.

Nessa sequência, solicitou-se ao GML esclarecimentos relativamente à perícia que realizou e a que se submeteu a Autora, que os prestou.

Concluída audiência final, proferiu-se sentença, que consta da seguinte parte disjuntiva:

“Em face de todo o exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente, e, em consequência:

a) Condeno solidariamente os Réus Y – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICO CIRÚRGICOS, LDA, E. M. e W PORTUGAL – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., no pagamento à Autora MARIA:

1. Da quantia compensatória de € 60.000,00 (sessenta mil euros), a título de danos não patrimoniais, sobre a qual acrescem juros moratórios, à taxa legal aplicável aos juros civis, desde a presente data até integral pagamento;
2. Da quantia indemnizatória de € 9.354,45 (nove mil trezentos e cinquenta e quatro euros e quarenta e cinco cêntimos), a título de danos patrimoniais (despesas médicas, medicamentosas, com cirurgias e portagens), sobre a qual acrescem juros moratórios desde a citação até integral pagamento;
3. Da quantia que se vier a liquidar no respetivo incidente, quanto às despesas de combustível efetuadas entre Mirandela e Coimbra, e Mirandela e Vila Nova de Famalicão, para tratamento das lesões, com o limite do pedido deduzido nesta lide;
4. Da quantia de € 32.500,00 (trinta e dois mil e quinhentos euros), a título de dano biológico, sobre a qual acrescem juros moratórios, à taxa legal aplicável aos juros civis, desde a presente data até integral pagamento;
b) Determino que às quantias fixadas em a) seja deduzido o montante de € 15.000,00 (quinze mil euros), já adiantado pela Ré W PORTUGAL – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.;
c) Condeno solidariamente os Réus Y – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICO CIRÚRGICOS, LDA, e E. M. no pagamento à Autora MARIA, a título de perdas salariais, a quantia de € 12.562,00 (doze mil quinhentos e sessenta e dois euros), sobre a qual acrescem juros moratórios, à taxa legal aplicável aos juros civis, desde a citação até integral pagamento;
d) Absolvo os Réus do restante peticionado”.

Inconformada com o assim decidido, a Ré Seguradora veio interpor recurso, apresentando as seguintes conclusões:

1.) Resulta provado na douta sentença que: A Autora terá, ainda, que ser submetida a nova cirurgia para remoção do “expansor” e aplicação de duas próteses (…) vai ser obrigada a retirar outra (prótese) colocada no peito esquerdo por razões de simetria (factos provados sob os números 51 e 53).
2.) Também está dado como provado em 88 que: No dia 12.11.2014, a Autora foi submetida a uma substituição de um expansor mamário por prótese da mama direita e substituição de prótese PIP da mama esquerda para igualar a simetria.
3.) Da análise conjugada de toda a prova produzida resulta que a intervenção a que se referem os factos 51 e 53 da douta matéria de facto provada, foi já realizada, tal como foi estabelecido por acordo e documentado a fls. 426 e seguintes.
4.) As partes em audiência de julgamento manifestaram a sua vontade de excluírem da Base Instrutória a matéria a que se refere o artigo 45 e consequentemente a do artigo 47, fazendo constar, em sua substituição, a matéria que foi julgada assente em 88.
5.) Resulta da matéria julgada provada uma contradição evidente entre os números 51 e 53 e o número 88.
6.) A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, impondo-se excluir a matéria assente sob os números 51 e 53, tal como resulta do acordo das partes documentado a fls. 426 e seguintes (artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil)
7.) Julgou-se provado – facto assente sob o número 86 – que: No processo apenso, foi homologado o acordo através do qual a Ré pagou à Autora a quantia de € 10.000,00, para custear as despesas com a intervenção cirúrgica (para remoção do expansor e colocação de duas próteses).
8.) Resulta da sentença homologatória de 17 de março de 2014, proferida no apenso «A» que: A requerente reduz o pedido à quantia de € 10.000,00 a qual se destina em primeira linha a custear as despesas com a intervenção cirúrgica que refere na presente providência». Acrescentando-se, expressamente, que se atendesse ao valor acordado como liquidação provisória a imputar na indemnização a liquidar nos autos principais.
9.) Dos autos de procedimento cautelar não resulta que a quantia de € 10.000,00 destinou-se a custear as despesas com a intervenção cirúrgica, cujo montante se desconhece.
10.) Pelo que não pode julgar-se como provado o que resulta do ponto 86 da douta matéria de facto assente.
11.) Acresce que o tribunal de primeira instância ao julgar provado o facto 86 teve em consideração factos essenciais que não foram alegados pelas partes.
12.) A consideração oficiosa de factos essenciais que sejam complemento ou concretização dos alegados não pode ser feita sem que as partes se pronunciem sobre ela, ou seja, o juiz, ante a possibilidade de tomar em consideração tais factos, tem que alertar as partes sobre essa sua intenção operando o exercício do contraditório e dando-lhe a possibilidade de arrolar novos meios de prova sobre eles (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15 de Setembro de 2014, processo 3596/12.TJVNF.P1).
13.) Razão pela qual também terá que ser excluída a matéria de facto constante do ponto 86 dos factos provados.
14.) Crê a recorrente que ponderado o princípio da igualdade e analisando comparativamente os valores arbitrados em outras situações equivalentes, o valor fixado para ressarcir os danos não patrimoniais sofridos pela recorrida, de € 60.000,00, é excessivo.
15.) Da douta sentença em apreciação resulta que a recorrida sofreu dores (quantificadas em grau 3 numa escala de 7 pontos), teve infeção persistente, a envolver a administração de antibióticos (alguns injetáveis) e a realização de tratamentos a implicar constante ingerência no seu corpo (com realização de drenagens, colocação de expansor, etc); foi sujeita a sucessivas intervenções (3 realizadas na R. clínica; 3 realizadas pela Dra. P. M. – retirada da prótese e das compressas; colocação de expansor; recolocação de próteses), das quais a dor não esteve dissociada (pelo menos, nas primeiras quatro); ficou com tecido cutâneo necrosado (com o receio e a angústia que isso envolve); teve necessidade contínua de contacto com ambiente clínico ou hospitalar; durante cerca de 9 meses ficou sem um dos seios; ficou sem trabalhar, pelo menos, desde a primeira cirurgia até à instauração da ação, esteve triste e desesperada; teve a relação com o seu corpo comprometida, limitando a sua exposição, inclusive na relação íntima com o seu marido, ficando afetada com o prejuízo na actividade sexual de grau 2 numa escala de 7 pontos.
16.) Sem querer desvalorizar o sofrimento da recorrida, e mesmo atendendo às decisões citadas pela douta sentença em apreciação, a indemnização que foi fixada afasta-se dos parâmetros que têm vindo a ser adotados pela jurisprudência.
17.) A douta sentença em apreciação fixou uma compensação para os danos não patrimoniais de € 60.000,00, fundamentando esta quantia citando dois arestos, um do Tribunal da Relação de Guimarães de 7 de outubro de 2010 e um outro do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de maio de 2014, que correspondem a situações muito mais gravosas e que implicaram um maior sofrimento do que aquele que vivenciou a recorrida.
18.) A recorrente entende que a decisão proferida terá que ser substituída por outra que fixe a compensação por danos não patrimoniais em valor que não exceda € 30.000,00.
19.) Alteração que se impõe atendendo a situações que manifestam um sofrimento idêntico ao da recorrida, aqui se exemplificando com a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa de 6 de novembro de 2013, processo 586/10.6TVLSB.L1-8 e a que se descreve no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de fevereiro de 2015, processo 99/12.7TCGMR.G1.S1.
20.) Se o défice funcional não se repercute na efetiva capacidade da vítima vir a desempenhar a sua atividade profissional ou na sua capacidade de ganho, embora ocorra uma sobrecarga de esforço para a produção do mesmo resultado, em consequência da afetação de que ficou a padecer, o dano não tem uma feição estritamente patrimonial (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 10 de dezembro de 2012, processo n.º 2604/09.7TBPVZ.P1).
21.) O Tribunal a quo aceitou a conceção do corpo como “instrumento de trabalho” e também neste sentido aceitou que determinadas lesões afetem a capacidade produtiva, que se tenha de despender maior esforço e energia para que essa capacidade não se altere.
22.) Daí ter considerado tratar-se de um dano patrimonial, conclusão de que discorda a recorrente.
23.) «Tendo resultado provado que a IPP de 12 pontos que o autor ficou a padecer é compatível com o exercício da sua atividade profissional habitual, e não estando provado que esse défice tenha reduzido a sua capacidade de ganho em 12%, nenhuma relevância tem, para a fixação da indemnização o montante da sua retribuição profissional, posto que o que está em causa não é a sua específica atividade, mas antes a sua atividade em geral. Resultando dos autos apenas que em virtude das sequelas das lesões provocadas no acidente o autor passou a ter que empregar “esforços suplementares”, resta recorrer à equidade para determinar o quantum indemnizatório – artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil, afigurando-se adequado o montante fixado pela Relação de € 25.000,00». (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de fevereiro de 2015, processo 99/12.7TCGMR.G1.S1).
24.) Se se entender diferentemente, tal como resulta da douta sentença, se se defender tratar-se de um dano patrimonial futuro, mesmo nesta hipótese o valor alcançado não se afigura adequado.
25.) A douta sentença teve em consideração a retribuição anual, multiplicando-a por 30 anos (por ter entendido ser este o tempo estimado para atingir a esperança média de vida) e considerou uma afetação permanente física e psíquica de 11,80 pontos.
26.) O resultado assim obtido foi corrigido para mais em razão da equidade, por se ter atendido à variabilidade do mercado de trabalho e à potencialidade de crescimento da actividade profissional (em termos de normalidade), a eventual melhoria de condições de vida do país e da sociedade e do aumento da produtividade e da inflação.
27.) Para além de serem hoje extremamente discutíveis os critérios que foram atendidos para corrigir para mais a indemnização obtida, a douta sentença desconsiderou a circunstância de a indemnização ser paga de uma só vez.
Sendo evidente a vantagem económica que resulta da obtenção imediata deste rendimento, com a inerente possibilidade de dele dispor de forma a rentabilizar e mesmo capital.
28.) Por outro lado a esperança média de vida para as mulheres nascidas em 1968 não é de 84 anos.
29.) Para o cálculo da esperança médica de vida não é indiferente o ano de nascimento, sendo que, para as mulheres nascidas em 1968, a esperança média de vida é de 70,3 anos. Apenas as mulheres nascidas em 2014 podem esperar viver em média até os 83,2 anos.
30.) Sendo errados os pressupostos de cálculo da indemnização fixada, não poderia deixar de resultar excessivo o montante assim fixado, existindo uma errada aplicação do disposto nos artigos 483.º, 562.º, 563.º e 566.º, do Código Civil.
31.) Crê a recorrente não estar provado que a quantia de € 10.000,00 paga no procedimento cautelar destinou-se a custear as despesas com uma intervenção cirúrgica, resultando assim a necessidade de alteração do decidido quanto à não dedução daquela quantia à indemnização a fixar nestes autos.
32.) De todo modo, se se entender manter inalterável a decisão da matéria de facto, não pode manter-se o decidido.
33.) Tal como resulta da fundamentação da douta sentença, o custo da cirurgia não foi peticionado nos presentes autos.
34.) Existe violação do preceituado no artigo 5.º, n. 1, do Código de Processo Civil, o qual atribui exclusivamente às partes a delimitação dos termos do litígio mediante a causa de pedir e o pedido – princípio do pedido que advém do princípio do dispositivo.
35.) O juiz não pode pronunciar-se sobre mais do que foi pedido (artigo 699.º, n.º 1, do mesmo diploma).
36.) Tendo-o feito, verifica-se que o segmento da sentença que decidiu ordenar que não se deduz a quantia arbitrada no procedimento cautelar à indemnização fixada, é nulo por força do artigo 615.º, n.º 1, alíneas d) e e), do Código de Processo Civil.

Irresignada com aquela sentença quanto à quantia que lhe foi arbitrada a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, também a Autora veio dela interpor recurso, apresentando as conclusões que se passam a enunciar:

1. Estão preenchidos todos os requisitos essenciais para existência de responsabilidade civil e obrigação de indemnizar por parte dos RR.
2. Existe elevado grau de culpa do médico que fez a cirurgia a Autora.
3. Na fixação do montante dos danos não patrimoniais - entendida esta indemnização como compensação destinada a facultar à lesada uma importância em dinheiro apta a proporcionar-lhes alegrias e satisfações que lhes façam esquecer ou mitigar o sofrimento físico e moral provocado pelo “acidente” deve ser fixado no montante mínimo de € 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil euros).
4. Existem nos autos, nomeadamente, nos depoimentos prestados, nos documentos juntos, nos relatórios médicos, matéria e fundamentos que permitem e justificam atribuição de um valor superior a título de danos não patrimoniais a autora/recorrente.
5. O tribunal “a quo” não fez uma análise criteriosa e rigorosa dos documentos, designadamente dos relatórios médicos e não valorou devidamente os danos não patrimoniais sofridos pela autora/recorrente.
6. Existe erro notório na apreciação da prova nomeadamente dos relatórios médicos face a extensão dos danos que a Autora, sofreu, sofre e vai continuar a sofrer.
7. Em face do que supra exposto, a sentença recorrida viola, por errada interpretação ou aplicação, a prova documental e prova testemunhal, pelo que, deu origem a uma sentença errada, injusta e ilegal que cumpre revogar na parte da atribuição de apenas 60.000,00 a título de danos não patrimoniais.
8. A quantia de e 60.000,00 a título de danos não patrimoniais é manifestante insuficiente e diminuta para compensar os graves e elevados danos não patrimoniais sofridos pela Autora/recorrente.
9. Existem fundamentos de facto e de direito para dar provimento à pretensão da Autora.
Ao decidir em contrário, nesta parte a douta sentença recorrida, violou o disposto nos artigos arts. 483º, 487º, 496º, 564º e 566º todos do CC, que urge revogar.

A Autora apresentou contra-alegações quanto ao recurso interposto pela Ré seguradora, apresentando as conclusões que se seguem:

1. Carecem de fundamento factual e legal as alegações de recurso apresentada pela Recorrente.
2. A Ré/Recorrente apenas discorda, por discordar, da prolatada decisão de forma genérica e abstracta, com deficiente subsunção do direito aos factos provados.
3. Não deve ser alterada a resposta dada ao ponto 86º dos factos dados como provados.
4. A motivação das alegações, está em manifesta e evidente contradição e dissonância com as “extensas” conclusões.
5. O tribunal fez uma correcta, criteriosa e adequada apreciação da prova produzida em sede de audiência de julgamento, apreciou convenientemente a matéria de facto.
6. O valor atribuído em sede de danos patrimoniais de 60.000€ é manifestamente insuficiente para a dimensão dos danos sofridos pela autora.
7. Existe doutrina e jurisprudência que atribui em casos semelhantes valores superiores.
8. Finalmente a decisão proferida na sentença decretada quanto a esta parte/matéria, deverá alterar-se, no sentido do aumento da indemnização, e não no sentido da redução dos valores afixados em virtude dos danos não patrimoniais, devendo-se julgar este recurso improcedente por não provado, por carência de fundamentos de facto e de direito.
9. Já quanto ao valor do dano biológico está bem arbitrado e deve ser mantido.
Pelo exposto, deve negar-se provimento ao recurso interposto pela Ré/ Recorrente, por carência de fundamentos de facto e de direito.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, não podendo o Tribunal da Relação conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
No seguimento desta orientação as questões que se encontram submetidas à apreciação deste tribunal reconduzem-se ao seguinte:

a- se o segmento da sentença que ordenou a não dedução da quantia arbitrada à Autora no procedimento cautelar à indemnização que lhe foi fixada nos presentes autos é nula nos termos do art. 615º, n.º1, als. d) e e) do CPC;
b- se o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na fixação da matéria de facto vertida:
b.1- nos pontos 51º e 53º dos factos provados e se essa materialidade fáctica se encontra em contradição com os factos que deu como provados no ponto 88º e com o acordo das partes documentado na ata de audiência final de fls. 426 e seguintes;
b.2- no ponto 86º dos factos dados como provados e se se impõe dar como provado que os 10.000,00 euros foram pagos pela Ré seguradora como liquidação provisória a imputar na indemnização a liquidar à Autora nos autos principais;
c- se o mesmo tribunal incorreu em erro de direito ao reconduzir o dano biológico sofrido pela Autora à categoria de dano patrimonial;
d- caso a questão anterior mereça resposta negativa, se esse tribunal incorreu em erro de direito na fixação da indemnização devida à Autora pelo dano biológico sofrido, a título de dano patrimonial, ao considerar como esperança média de vida daquela os 84 anos, quando essa esperança de vida, atenta a sua data de nascimento, ascende a 70,3 anos, e ao desconsiderar que a mesma irá receber a indemnização por esse dano patrimonial de uma só vez e se, por via disso, se se impõe reduzir o valor indemnizatório que lhe foi arbitrado a título de dano biológico, na vertente de dano patrimonial (frustração da capacidade de ganho futura), por ser excessivo; e
c- se aquele tribunal incorreu em erro de direito ao arbitrar 60.000,00 euros, a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pela Autora, uma vez que esse montante pecará por excesso (na tese da recorrente seguradora, devendo essa compensação ser reduzida para 30.000,00 euros) ou por insuficiência (na tese da recorrente Autora, que propugna a respetiva elevação para 175.000,00 euros);
**
A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O tribunal a quo considerou provada e não provada a matéria que se passa a enunciar:

§ Factos provados
§ Oriundos da matéria assente:

1. No dia 5-8-2010, a Autora foi submetida a uma mamoplastia na clínica “Y – Prestação de Serviços Médico-Cirúrgicos, Lda.” – al. A).
2. Tal intervenção foi levada a cabo pelo cirurgião plástico Dr. E. M., que exerce a sua atividade profissional na aludida clínica – al. B).
3. Por tal intervenção, a Autora pagou 2.750 € - al. C).
4. Entre “W Portugal, S.A.” e o aludido Dr. E. M. foi celebrado o contrato de seguro titulado pela apólice nº ..., junto a fls. 122 e segs., através do qual este transferiu para aquela a responsabilidade civil pelos seus atos médicos – al. D).
5. Resulta do art. 5º, al. i), das Condições Gerais do aludido contrato de seguro que o mesmo não garante a responsabilidade civil emergente de “perdas indirectas de qualquer natureza, lucros cessantes e paralisações” – al. E).
6. Por via daquele contrato de seguro, a W Portugal, na sequência da intervenção aludida em A), entregou à Autora a quantia de 15.000 € – al. F).

§ Oriundos da base instrutória:

7. Nas horas seguintes ao “despertar da anestesia” aplicada no âmbito da intervenção aludida em 1., a Autora começou a sentir dores no seio direito, justamente um dos locais corporais onde foi intervencionada – artigo 1º.
8. No dia 7-8-2010, a Autora deslocou-se à aludida Clinica “Y” para lhe retirarem os drenos, então relatando ao Dr. E. M. que sentia muitas dores, desmaiava com frequência e não conseguia levantar o meu braço direito – artigo 2º.
9. Ao que o médico respondeu que tais seriam reações normais à intervenção cirúrgica – artigo 3º.
10. Passados alguns dias, e como a Autora não sentia melhoras e estava em estado febril, ligou diretamente para o Dr. E. M. – artigo 4º.
11. Porém, o Dr. E. M. não atendeu nem retribuiu a chamada por se encontrar de férias – artigo 5º.
12. Tendo a Autora ligado para uma assistente dele, que a aconselhou a tomar medicação para a febre e as dores – artigo 6º.
13. No dia 21-8-2010, a Autora deslocou-se à Clínica “Y” para retirar os pontos, então voltando a reiterar ao Dr. E. M. que continuava com dores e que não conseguia levantar o braço – artigo 7º.
14. Mais o informando que sentia dois “caroços” por debaixo do braço direito entre o peito e a axila – artigo 8º.
15. Ao que o médico respondeu que tal seria normal, mais lhe recomendando que “massajasse que os caroços, que acabavam por desaparecer” – artigo 9º.
16. Tendo a Autora informado que não conseguia massajar os “caroços” porquanto tal ato lhe causava dores insuportáveis – artigo 10º.
17. No dia 27-8-2010, a Autora detetou uma bolha junto à cicatriz – artigo 11º.
18. Tendo telefonando, de imediato, ao Dr. E. M., o qual não se encontrava disponível – artigo 12º.
19. Pelo que a Autora se deslocou a um Posto de Enfermagem, em Lisboa, onde foi vista por um Enfermeiro – artigo 13º.
20. O qual, face à quantidade de “pus” saído dessa bolha, pediu à Autora que entrasse em contacto com o Dr. E. M. com urgência – artigo 14º.
21. De imediato, a Autora contactou o Dr. E. M., que lhe receitou então antibióticos injetáveis, por ser o mais forte para combater a infeção – artigo 15º.
22. Nesse mesmo dia, a Autora foi vista em Famalicão pelo Dr. E. M., que a examinou e decidiu, face a gravidade da situação, que lhe faria uma série de tratamentos para excluir a hipótese de nova cirurgia – artigo 16º.
23. Tais tratamentos consistiam em espremer o seio e seringas para injetar desinfetante para drenar o “pus” que nunca acabava – artigo 17º.
24. A Autora deslocou-se de Mirandela, onde reside, a Famalicão, durante três meses, para se submeter a tais tratamentos – artigo 18º. 25. Tais tratamentos provocavam-lhe dores – artigo 19º.
26. Apesar destes tratamentos, mantinham-se os caroços por baixo da axila, bem como falta de mobilidade no braço direito – artigo 20º.
27. O que provocava dores constantes e permanentes à Autora – artigo 21º.
28. Face a manutenção daquela situação, em novembro de 2010, o Dr. E. M. efetuou nova cirurgia para remover a prótese, pois suspeitava de qualquer infeção provocada pela mesma – artigo 22º.
29. Entre a primeira e esta segunda intervenções cirúrgicas, a Autora esteve sempre a tomar antibióticos e anti-inflamatórios – artigo 23º.
30. Após esta intervenção cirúrgica, a Autora ficou sem a prótese durante um mês – artigo 24º.
31. E continuou com dores e a tomar antibióticos – artigo 25º.
32. Em dezembro de 2010 a Autora foi, novamente, submetida a uma nova cirurgia realizada nesta clínica e pelo Dr. E. M. para recolocar a prótese – artigo 26º.
33. Apesar das aludidas intervenções e tratamentos, as dores continuaram e eram cada vez mais fortes – artigo 27º.
34. E a mobilidade do seu braço direito piorou – artigo 28º.
35. E continuou a deslocar-se, durante um mês, de Mirandela a Famalicão, todas as semanas, sendo, em algumas dela, duas vezes, para se submeter aos mesmos tratamentos – artigo 29º.
36. O Dr. E. M. dizia e afiançava sempre que o peito estava a melhorar – artigo 30º.
37. No entanto, os “caroços” continuavam iguais – artigo 31º.
38. Entretanto, a Autora contactou a sua médica de família, Dra. T. M., que, no imediato, detetou uma infeção – artigo 32º.
39. Tendo o Dr. E. M., informado deste facto pela aludida médica, lhe voltado a prescrever a toma de antibióticos e de anti-inflamatórios – artigo 33º.
40. No dia 1-2-2011, a Autora deslocou-se a Coimbra para ser vista de urgência por uma médica sua conhecida, a Drª P. M. – artigo 34º.
41. Esta médica, após examinar a Autora, também confirmou a existência de uma infeção – artigo 35º.
42. Em virtude desta infeção, a Autora ficou com o tecido do seio necrosado – artigo 36º.
43. No dia 2-2-2011, a Autora realizou nova cirurgia para a remoção da prótese e limpeza da ferida na “Clínica MC”, em Coimbra – artigo 37º.
44. Então se tendo detetado a existência de duas compressas compactadas e infetadas entre o seio e a axila – artigo 38º.
45. As quais constituíam os tais “caroços” de que a Autora se queixava – artigo 39º.
46. Por causa disso, a Autora voltou a ficar sem um peito durante quase 9 meses – artigo 40º.
47. Bem como com uma cicatriz de grandes dimensões – artigo 41º.
48. No dia 26-10-2011, a Autora volta a ser submetida a nova cirurgia pela Drª P. M. para a colocação de um “expansor mamário”, com o objetivo de fazer a expansão da pele entretanto retirada – artigo 42º.
49. Este tratamento teve que ser feito todas as semanas em Coimbra – artigo 43º.
50. O que implicou que a Autora se deslocasse de Mirandela a Coimbra todas as semanas até fevereiro de 2012 – artigo 44º.
51. A Autora terá, ainda, que ser submetida a nova cirurgia para a remoção do “expansor” e aplicação de duas próteses – artigo 45º.
52. Uma vez que a pele não obteve a elasticidade suficiente, devido ao tecido necrosado e à infeção – artigo 46º.
53. Pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razões de simetria – artigo 47º.
54. Durante todo o período de tempo acima mencionado, a Autora sentiu dores e mau estar – artigo 48º.
55. E sentiu-se afetada na sua estética e na sua autoestima – artigo 49º.
56. Não conseguindo ir à praia ou vestir um “biquíni” – artigo 50º.
57. Nem praticar desporto – artigo 52º.
58. Vive atormentada com a perceção de que o seu corpo se encontra distorcido e deformado – artigo 52º.
59. Sente vergonha de ver e exibir o seu corpo – artigo 53º.
60. Os danos físicos sofridos pela Autora são irreparáveis e irreversíveis em 11,80 pontos – artigo 54º.
61. E vão acompanhá-la, nesse grau, até aos últimos dias de vida – artigo 55º.
62. Nas deslocações efetuadas entre a residência da Autora, em Mirandela, Vila Nova de Famalicão e Coimbra, acima referidas, bem como com as cirurgias e os tratamentos a que foi sujeita, a despendeu:
- em agosto 2010: 2.886,13;
- em setembro 2010: 132,60 €;
- em outubro 2010: 166,38€;
- em novembro 2010: 133,09€;
- em dezembro 2010: 300,87€;
- em janeiro 2011: 132,92€;
- em fevereiro 2011: 1.334,60€;
- em março 2011: 1.408,86€; e
- entre abril 2011 e dezembro 2011: 2.859,00€ – artigo 56º/parte.
63. A Autora efetuou deslocações para receber tratamentos e fazer cirurgias, a Vila Nova de Famalicão e Coimbra, gastando em combustível montante não concretamente apurado – artigo 56º/parte.
64. A Autora exercia funções como vendedora/comercial na empresa “E. – Comércio P/grosso de Produtos Alimentares, Lda.”, com sede em Mirandela – artigo 57º.
65. Em consequência da total incapacidade que lhe adveio das lesões acima descritas, a Autora deixou de trabalhar desde a realização da intervenção aludida em 1. (até à instauração da presente ação) – artigo 58º.
66. A Autora auferia, a título de vencimento, a quantia mensal de 571 € – artigo 59º.
67. Por força dos factos acima descritos, a Autora sentiu tristeza – artigo 63º.
68. Sente-se revoltada e amargurada – artigo 64º.
69. O que gerou o afastamento dos seus filhos e marido – artigo 65º.
70. A Autora ficou com prejuízo da sua atividade sexual em grau 2 numa escala de 7 pontos – artigo 66º/parte.
71. O que lhe gera sofrimento e dor – artigo 67º.
72. A mamoplastia aludida em 1. não era uma cirurgia normal de mamoplastia de aumento, antes compreendendo uma troca de próteses introduzidas muitos anos antes – artigo 69º.
73. Pretendendo a Autora, ao mesmo tempo, um aumento do seu tamanho – artigo 70º.
74. As primeiras próteses tinham sido introduzidas por via axilar – artigo 71º.
75. Quando se pretendeu fazer a remoção pela mesma via da prótese da mama direita, essa prótese estava já completamente desfeita, saindo aos pedaços – artigo 72º.
76. Para melhor visualização e para a sua completa extração, houve que fazer uma nova abordagem via inframamária – artigo 73º.
77. Tendo sido, nessa altura, que, para estancar eventual hemorragia, foram colocadas compressas na zona axilar do lado direito – artigo 74º.
78. Após a realização de uma cirurgia do tipo a que a Autora foi sujeita, o paciente pode ser afetado por dor – artigo 75º/parte.
79. As dificuldades em elevar os braços podem ocorrer após uma cirurgia do tipo a que a Autora foi submetida – artigo 76º/parte.
80. Em grande parte das doentes que fazem este tipo de cirurgia por via axilar, podem surgir fibroses, ou seja, os acima aludidos “caroços” – artigo 77º.
81. Essas fibroses são tratadas através de massagem – artigo 78º.
82. A infeção que afetou a Autora, só por si, não significava que tivesse ficado alojada na axila qualquer corpo estranho – artigo 79º.
83. Na ecografia surge referido que “No QSE (quadrante superior externo) da mama direta observa-se imagem compatível com processo fibrótico sequelar, com 38 mm de diâmetro” – artigo 82º/parte.
84. Após a remoção da prótese, entre 05.11.2010 e 17.12.2010, houve melhoria da sintomatologia – artigo 81º/parte.
85. O que levou o Réu E. M. a pensar, nesse período de tempo, que o problema podia residir na prótese – artigo 82º.

§ Considerados nos termos do artigo 607º/4, do CPCiv:

86. No processo apenso, foi homologado o acordo através da qual a Ré pagou à Autora a quantia de € 10.000,00, para custear as despesas com a intervenção cirúrgica (para remoção do expansor e colocação de duas próteses) – cfr. sentença homologatória de 17.03.2014, proferida no apenso «A».
87. A dor a que se alude na resposta ao artigo é normalmente ligeira, e deve melhorar com o uso de analgésicos comuns – facto instrumental decorrente da instrução da causa.
88. No dia 12.11.2014, a Autora foi submetida a uma substituição de um expansor mamário por prótese da mama direita e substituição da prótese PIP da mama esquerda, para se igualar a simetria – facto admitido por acordo pelas partes na diligência documentada a fls. 426 e ss. (vd. maxime fls. 427).
89. Nos relatórios periciais consta, na parte relativa aos elementos de identificação, que a Autora nasceu a 01.08.1968 e que tinha 42 anos à data da primeira cirurgia – facto instrumental decorrente da instrução da causa (cfr. maxime fls. 375 a 376).
*
b. Factos não provados:

90. A irreversibilidade das lesões (para toda a vida) é em grau superior ao que se fez constar na resposta ao artigo 54º - artigo 54º/parte.
91. A intervenção aludida em 1. e as lesões daí provenientes causaram à Autora risco de vida – artigo 68º.
92. A Autora recebia subsídio de Natal e de férias – artigo 60º.
93. Bem como outras quantias referentes a remuneração de trabalho extraordinário – artigo 62º.
94. Se não fosse a aludida incapacidade, a Autora iria subir de categoria dentro daquela empresa, designadamente, alcançando o cargo de encarregada geral – artigo 62º.
95. A Autora perdeu o apetite sexual para o resto da sua vida – artigo 66º/parte.
96. Após a realização de uma cirurgia do tipo a que a Autora foi sujeita, a dor a que se alude na resposta ao artigo 75º ocorre sempre – artigo 75º/parte.
97. As dificuldades a que se alude na resposta ao artigo 76º são correntes e normais – artigo 76º/parte.
98. A melhoria a que se refere na resposta ao artigo 81º foi significativa – artigo 81º/parte.
*
B- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Sustenta a apelante seguradora que o segmento da sentença que decidiu ordenar a não dedução da quantia arbitrada à Autora no procedimento cautelar à indemnização que lhe foi arbitrada naquela sentença, é nulo por força do art. 615º, n.º1, alíneas d) e e) do Código de Processo Civil (doravante CPC), argumentando que, naquela sentença, o juiz conheceu de questão de que não podia tomar conhecimento, além de que julgou ultra petitum uma vez que condenou-a para além do pedido formulado pela Autora, com o que violou o princípio do pedido, emanação do princípio do dispositivo, consagrado no art. 5º, n.º 1 do CPC, bem como o disposto nos arts. 608º, n.º 2, n.º 2 e 609º, n.º 1 do CPC.
Sabendo-se que o vício da nulidade da sentença, a verificar-se, sem prejuízo de que esses vícios, sempre que possível, deverem ser suprimidos pela Relação a partir dos elementos contantes do processo ou da gravação (cfr. art. 662º, n.º 2, al. c) do CPC), poderão determinar, quando essa supressão não seja possível, a anulação da sentença, com eventual renovação da prova produzida ou de produção de nova prova ou, ainda, a ampliação da matéria de facto, do que poderão resultar prejudicados a apreciação dos demais fundamentos de recurso que vêem aduzidos pela Seguradora apelante, incumbe, em primeiro lugar, apreciar esses invocados vícios determinativos de nulidade da sentença recorrida(1).

B.1- Dos vícios da nulidade da sentença em geral.

Expressa o referido art. 615º, n.º 1, que a sentença é nula quando: a) não contenha a assinatura do juiz; b) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre as questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e/ou e) o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
Este preceito enumera de forma taxativa as causas de nulidade da sentença e conforme decorre do seu teor, os vícios determinativos de invalidade da sentença reportam-se a vícios relativos à estrutura ou aos limites daquela, tratando-se, por outras palavras, de defeitos de atividade ou de construção da própria sentença proferida.
Respeitam a vícios da estrutura da sentença os fundamentos enunciados nas alíneas b) - falta de fundamentação e c) - oposição entre os fundamentos e a decisão -; e respeitam a vícios atinentes aos limites da sentença, os enunciados nas alíneas d) - omissão ou excesso de pronúncia - e e) - pronuncia ultra petitum.
Tais vícios “afetam formalmente a sentença e provocam a dúvida sobre a sua autenticidade, como é o caso da falta de assinatura do juiz, ou a ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que se decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz logicamente a resultado oposto do adotado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões que deveria conhecer (omissão de pronuncia)” (2).
Diferentemente dos vícios que se acabam de enunciar, são os erros de julgamento (error in judicando), os quais contendem com erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de uma distorção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error juris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa.
Nos erros de julgamento assiste-se a uma deficiente análise crítica das provas produzidas ou a uma deficiente enunciação e/ou interpretação dos institutos jurídicos aplicados ao caso concreto, sendo que esses erros, por não respeitarem já a defeitos que afetam a própria estrutura da sentença, mas ao mérito da relação material controvertida nela apreciada, não a inquinam de invalidade, mas de error in judicando atacáveis em via de recurso (3).
Resulta do que se vem dizendo, impor-se estabelecer uma distinção rigorosa entre os vícios determinativos de nulidade da sentença, daqueles outros que consubstanciam meros erros de julgamento, não determinativos da invalidade da sentença, mas atacáveis em vias de recurso, onde a decisão será reponderada e, caso assista razão à recorrente, será revogada e substituída por outra que se mostre conforme aos factos provados e não provados e/ou ao direito efetivamente aplicável ao caso.
Os vícios que a recorrente assaca à sentença recorrida e que alegadamente determinarão a nulidade do segmento decisório nela proferido que decidiu que não se deduz a quantia arbitrada à Autora no procedimento cautelar apenso à indemnização que foi fixada à última nessa sentença é, por um lado, o vício decorrente da circunstância de supostamente nela o tribunal a quo ter conhecido de questão de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) e, por outro, de alegadamente ter condenado a recorrente seguradora para além do pedido (condenação ultra petitum).

B.1.2- Da nulidade da sentença com fundamento em excesso de pronúncia.

Alega a apelante seguradora que a sentença proferida pelo tribunal a quo viola o disposto no art. 615º, n.º 1, al. d) do CPC.
Neste normativo encontram-se previstas duas causas de nulidade da sentença, a saber: a nulidade decorrente da omissão de pronúncia e aquela que decorre de excesso de pronúncia.
Devendo o tribunal conhecer de todas as questões que lhe são submetidas (art. 608º, n.º 2 do CPC), isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e de todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer, o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cuja conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão, constitui nulidade por omissão de pronúncia, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da sentença, que as partes hajam invocado, uma vez que o juiz não se encontra sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5º, n.º 3 do CPC).
Acresce que como já referia Alberto dos Reis (4), impõe-se distinguir, por um lado entre “questões” e, por outro, “razões ou argumentos”. “…Uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, outra invocar razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção (…). São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer a questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte.
Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar as suas pretensões”. Ora, apenas a não pronúncia pelo tribunal quanto a questões que lhe são submetidas determina a nulidade da sentença, mas já não a falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões.
Já ocorre excesso de pronúncia quando o juiz conheça de causas de pedir não invocadas ou de exceções não deduzidas pelas partes e que estejam na exclusiva disponibilidade destas (art. 608º, n.º 2 do CPC) (5).
Como ficou dito, a apelante seguradora invoca que o segmento da sentença que ordenou que não se deduza a quantia arbitrada no procedimento cautelar à indemnização que arbitrou à Autora nesse sentença, é nulo em virtude de, ao assim decidir, o tribunal a quo alegadamente ter conhecido de questão de que não podia conhecer.
A apelante argumenta que aquela decisão assentou nos factos julgados provados no ponto 86º dessa sentença e que essa materialidade fática consubstancia factos essenciais que não foram alegados pelas partes, ainda que, no entender do tribunal a quo resultem provados na instrução e julgamento da causa.
Argumenta ainda, que para além de entender que tais factos não resultaram provados, sempre os mesmos não podem ser tomados em consideração por esse tribunal na decisão a proferir por aquele tribunal quanto à decisão sobre a matéria de facto, por se tratar de factos essenciais não alegados pela Autora.
Estando toda a atividade do juiz sujeita ao princípio do dispositivo nos termos do qual “as partes dispõem do processo, como da relação jurídica material”, sendo o processo “coisa ou negócio das partes”, tratando de “um duelo entre as partes, que apenas tem de decorrer segundo certas normas”, cabendo ao juiz controlar “a observância dessas normas e assinalar e proclamar o resultado”, decorrendo deste princípio, como consequências, que o processo só se inicia sob o impulso da parte, mediante o respetivo pedido (princípio do pedido), cabendo às partes, através do pedido e da defesa, circunscrever o thema decidendum, de onde o “juiz não tem que saber se, porventura, à situação das partes conviria melhor outra providência que não a solicitada, ou se esta poderia fundar-se noutra causa pretendi, além de que cabe às partes o ulterior andamento do processo (impulso processual subsequente), cumprindo-lhes continuamente estimular o desenvolvimento do processo, bem como às partes assiste o direito de porem termo ao processo por desistência da instância ou determinar o conteúdo da sentença de mérito a proferir, mediante desistência do pedido e transação e, finalmente, a “adução do material de facto a utilizar pelo juiz para a decisão do litígio só compete às partes, competindo-lhes proporcionar ao juiz, mediante as suas afirmações de facto e as provas que tragam ao processo a base factual da decisão”, não sendo consentido ao juiz indagar de “modo autónoma a verdade”, só podendo ter em conta os factos alegados pelas partes e as provas por elas produzidas” (6), e não obstante, no ordenamento jurídico processual civil nacional, desde há muito o referido princípio do dispositivo tenha sido temperado pelo princípio do inquisitório, vertente esta que, inclusivamente, foi aprofundada com a alteração introduzida ao CPC pela revisão operada pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, se bem atendemos os argumentos aduzidos pela apelante seguradora, esta sustenta que o juiz pronunciou-se sobre questões de que não podia tomar conhecimento com os seguintes fundamentos:
No art. 35º, a Autora alegou que terá que ser submetida a nova cirurgia para remoção do “expansor” e aplicação de duas próteses visto que a pele não obteve a elasticidade suficiente (devido ao tecido necrosado e à infeção), pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razões de simetria.
Esta matéria veio a ser julgada provada pelo tribunal a quo nos pontos 51º e 53º da matéria de facto que deu como assentes, onde julgou provado que “A Autora terá, ainda, que ser submetida a nova cirurgia para a remoção do expansor e aplicação de duas próteses, pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razões de simetria””.
Acontece que a par desta matéria que assim deu como provada, com o argumento de que essa matéria resultou da instrução da causa e invocando o disposto no n.º 4 do art. 607º do CPC, no ponto 86º da matéria de facto dada como provada, para além daquela matéria que deu como assente, o tribunal a quo deu, ainda, como provado que: “No processo apenso, foi homologado o acordo através do qual a Ré pagou à Autora a quantia de 10.000,00 euros, para custear as despesas com a intervenção cirúrgica (para remoção do expansor e colocação de duas próteses) – cfr. sentença homologatória de 17/03/2014, proferida no apenso A”.
Para além de não ser certo, na perspetiva da apelante, que aquela quantia de 10.000,00 euros que pagou à Autora se destinava a custear as despesas com a intervenção cirúrgica, em nenhum momento a última alegou que essa quantia lhe tivesse sido paga pela seguradora apelante para custear a referida intervenção cirúrgica para remoção do expansor e colocação de duas próteses mamárias, pelo que consubstanciando estes factos dados como provados naquele art. 86º, factos essenciais integrativos da causa de pedir invocada pela Autora para sustentar o pedido indemnizatório que vem exercer nos autos contra as Rés, os mesmos careciam, nos termos do disposto no art. 5º, n.º 1 do CPC, de ter sido alegados pela Autora, pelo que não o tendo sido, o tribunal não podia dar aqueles factos vertidos no referido ponto 86º como assentes, sequer podia decidir que aqueles dez mil euros que a apelante pagou à Autora não seriam deduzidos ao montante indemnizatório que o tribunal arbitrou à última na sentença recorrida, pelo que ao fazê-lo, na perspetiva da recorrente seguradora, o tribunal a quo conheceu de questão que não podia tomar conhecimento, isto é, incorreu em excesso de pronuncia, determinativa de nulidade desse segmento decisório, mas, antecipe-se, desde já, sem razão.

Vejamos.
Não há dúvidas que o princípio do dispositivo é ainda pedra angular do sistema nacional processual civil.
Assim, estabelece o art. 607º, n.º 4 do CPC, que “na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras da experiência”.
Este comando legal carece, contudo, de ser conjugado com o estatuído nos arts. 5º, 552º, n.º 1, al. d) e 572º, al. c) do CPC.
Preceitua aquele art. 5º que: “1- Às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas. 2- Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: a) os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; c) os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções”.
Já o art. 552º, n.º 1, al. d) reza que “Na petição, com que propõe a ação deve o autor expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à ação”.
Por último, o art. 572º, al. c) estatui que “Na contestação deve o réu expor os factos essenciais em que se baseiam as exceções deduzidas, especificando-as separadamente, sob pena de os respetivos factos não se considerarem admitidos por acordo por falta de impugnação”.
Decorre da conjugação destes normativos que com o intuito de aumentar os poderes do tribunal sobre a matéria de facto e de flexibilizar a sua alegação pelas partes, a atual lei processual civil partiu de uma distinção entre factos essenciais, instrumentais e complementares ou concretizadores.
Os “factos essenciais” são aqueles que integram a causa de pedir ou o fundamento da exceção e cuja falta determina a inviabilidade da ação ou da exceção.
Já os “factos instrumentais, probatórios ou acessórios” são aqueles que indiciam os factos essenciais e que podem ser utilizados para a prova indiciária destes últimos.
Finalmente, são “factos complementares e factos concretizadores” aqueles cuja falta não constitui motivo de inviabilidade da ação ou da exceção, mas que participam de uma causa de pedir ou de uma exceção complexa e que, por isso, são indispensáveis à procedência dessa ação ou exceção (7).
Seguindo a lição de Teixeira de Sousa (8), “a cada um destes factos corresponde uma função distinta: os factos essenciais realizam uma função constitutiva do direito invocado pelo autor ou da exceção deduzida pelo réu; sem eles não se encontra individualizado esse direito ou exceção, pelo que a falta da sua alegação pelo autor determina a ineptidão da petição inicial por inexistência de causa de pedir; os factos complementares possibilitam, em conjugação com os factos essenciais de que são complemento, a procedência da ação ou da exceção: sem eles a ação ou exceção não pode ser julgada procedente; por fim os factos instrumentais destinam-se a ser utilizados numa função probatória dos factos essenciais ou complementares”.
Quanto aos factos essenciais, ou seja, os factos que integram a causa de pedir do direito que o autor exerce nos autos, ou que integram a exceção que o réu pretenda opor ao exercício desse direito pelo autor, com vista a impedir, modificar ou extinguir esse direito, os mesmos carecem de ser alegados pelo autor e pelo réu, respetivamente, na petição inicial ou na contestação (cfr. arts. 552º, n.º 1, al. d) e 572º, al. c) do CPC).
Em relação aos factos essenciais, continua, assim, a vigorar, em pleno, o princípio do dispositivo, pelo que às partes incumbe alegar esses factos, sob pena de o juiz não poder dar como provados os mesmos em sede de sentença e isto ainda que esses factos venham a ser demonstrados por prova documental ou de outra natureza qualquer carreada para os autos na sequência da instrução da causa, subtraída ao princípio da livre apreciação da prova pelo tribunal.
Precise-se, aliás, que em relação aos factos essenciais funciona plenamente o princípio da preclusão, pelo que não cuidando o autor em alegá-los em sede de petição inicial ou o réu, em sede de contestação, não pode vir alegá-los em posterior articulado (9).
A ausência da alegação dos factos essenciais pelo autor determina a ineptidão da petição inicial e a ausência da alegação desses factos essenciais consubstanciadores de exceção que o réu pretenda opor ao direito do autor, impede que o tribunal dê como provados esses factos essenciais em sede de sentença, improcedendo a exceção por ausência da alegação (e consequente, prova) dos factos que a integram.
Quanto aos factos instrumentais, os mesmos não carecem de ser alegados pelas partes e podem ser livremente discutidos e apreciados na audiência final (parte final do n.º 2 do art. 574º do CPC, onde se vê que que caso esses factos instrumentais tenham sido alegados pelo autor e não tenham sido contestados pelo réu, a admissão dos mesmos pode, inclusivamente, ser afastada por prova posterior). Atenta a função secundária que desempenham no processo, tendentes a justificar simplesmente a alegação ou a prova dos factos essenciais ou complementares, os factos instrumentais não têm de integrar os temas da prova, não devendo, em regra, ser objeto de um juízo probatório específico, isto é, não carecem de ser dados como provados ou não provados na sentença. Esses factos, independentemente de terem ou não sido alegados, desde que resultem da instrução da causa, designadamente da prova produzida em sede de audiência final, o juiz, em associação com as regras da experiência que se traduzem na aplicação de presunção judiciais, deve tomá-los em consideração quando se tratar de motivar a afirmação ou a negação dos factos verdadeiramente relevantes, isto é, devem ser considerados na motivação/fundamentação da prova ou não prova dos factos essenciais ou complementares (art. 607º, n.º 4 do CPC) (10).
Quanto aos factos complementares, os mesmos não carecem de ser alegados pelas partes em sede, respetivamente, de petição inicial ou contestação, devendo o juiz, considerá-los na sentença, desde que resultem da instrução da causa e as partes tenham tido a possibilidade de sobre eles se pronunciarem (art. 5º, n.º 2, al. b) do CPC), ou seja, o tribunal não pode, sem mais, considerá-los como provados ainda que a respetiva prova tenha resultado da instrução da causa, mas deve notificar as partes que irá/poderá considerá-los como provados na sentença que irá proferir para que estas, ao abrigo do princípio do contraditório, tenham possibilidade de se defender.
Decorre do exposto que o comando legal enunciado no n.º 4 do art. 604º do CPC, carece de ser interpretado no sentido de que o juiz, na sentença, não tem de considerar provados e não provados todos os factos alegados pelas partes nos respetivos articulados, e por outro lado, que naquela sentença, tem de considerar factos ainda que não alegados pelas partes nos respetivos articulados, dando-os como provados (caso dos factos complementares ou concretizadores), quando a respetiva prova tenha resultado da instrução da causa ou tenham sido admitidos por acordo ou a respetiva prova resulta de documento ou de confissão reduzida a escrito, desde que tenha sido observado o contraditório.
O juiz tem na sentença que dar como provados ou não provados os factos essenciais alegados pelas partes.
No entanto, quanto aos factos essenciais integrativos da causa de pedir invocada pelo Autor para sustentar o pedido que aduz, ou os factos essenciais integrativos da exceção aduzida pelo Réu na contestação, o tribunal não pode dar como provados esses factos essenciais ainda que os mesmos tenham resultado provados da instrução da causa ou tenham sido admitidos por acordo ou por documento ou por confissão reduzida a escrito, quando esses factos essenciais não tenham sido alegados pelo autor em sede de petição inicial para ancorar a causa de pedir aí aduzida ou pelo réu na contestação para alicerçar a matéria da exceção que aí invocou, sob pena de violação do princípio do dispositivo (arts. 5º, n.º 1, 552º, n.º 1, al. d) e 572º, al. c), todos do CPC).
Precise-se que ao referir-se naquele art. 604º, n.º 4 que o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, ou que estejam provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, tal como resulta do n.º 5 daquele art. 604º, a Lei está a referir-se àqueles casos em que a prova se encontra subtraída ao princípio da livre apreciação da prova.
É que tendo o Autor, em sede de petição inicial, alegado factos essenciais integrativos da causa de pedir que aí aduz para ancorar a sua pretensão de tutela judiciária (pedido) ou tendo o réu, em sede de contestação, invocado os factos essenciais integrativos da exceção que aí invocou para impedir, modificar ou extinguir o direito que o autor vem exercer nos autos contra aquele, nas ações em que vigora o princípio da impugnação especificada e não se tratando de factos que apenas possam ser provados por documentos, esses factos essenciais, caso não sejam impugnados pela contraparte, têm-se como admitidos, não podendo, posteriormente, em sede de instrução da causa ou da prova produzida em audiência final, sobre eles recair prova, e caso recaia, independentemente da prova que venha a ser produzida quanto aos mesmos, esses factos têm-se como assentes.
O que se acaba de dizer é igualmente válido naqueles casos em que os factos essenciais alegados pelas partes só possam ser provados por documento autêntico, pelo que, quanto a esses factos, não vigorando o princípio da livre apreciação da prova, esses factos essenciais têm-se como provados ou não provados em função daquilo que resultar do documento autêntico que tenha sido junto aos autos.
Por outro lado, sendo junto aos autos documento autêntico ou autenticado de cujo teor resulte a confissão de determinado facto por uma das partes, nos termos do disposto nos arts. 371º, n.º 1 (quanto aos documentos autênticos) e 376º (quanto aos documentos autenticados), ambos do CC., se não for arguida a falsidade desses documentos, nos termos do art. 358º, n.º 2, do CC., os factos essenciais confessados pelo confitente nesses documentos, faz prova pleníssima contra o confitente, exceto nos casos enunciados no art. 354º do CC., pelo que, nesses casos, os factos essenciais confessados pelo confitente, independentemente da prova produzida em sede de instrução e julgamento da causa, se têm como provados.
Quanto aos documentos particulares, estando este assinado pelo confitente e não cuidando o último em impugnar a veracidade da letra ou da assinatura, ou caso afirme desconhecer se as mesmas são verdadeiras, apesar destas lhe serem imputadas pelo apresentante do documento, nos termos do disposto nos arts. 358º, n.º 2 e 374º do CC., exceto nos casos enunciados no aludido art. 354º (em que não é admissível a confissão ou esta seja insuficiente por lei para se considerar provado o facto confessado), os factos essenciais confessados pelo confitente nesse documento, fazem prova pleníssima contra o confitente, pelo que, nesses casos, os factos essenciais confessados pelo confitente, independentemente da prova produzida em sede de instrução e julgamento da causa, se têm como provados.
Sendo requerido depoimento de parte ou declarações de parte, caso o depoente ou declarante confesse factos essenciais e essa confissão seja reduzida a escrito, exceto nos casos enunciados naquele art. 354º do CC, esses factos essenciais assim confessados, nos termos do art. 358º, n.º 1 do CC, faz prova pleníssima contra o confitente, pelo que, nesses casos, os factos essenciais confessados pelo confitente, independentemente da prova produzida em sede de instrução e julgamento da causa, se têm como provados.
O que se acaba de referir quanto aos factos essenciais é igualmente válido quanto aos factos complementares ou concretizados, contanto, quanto a estes, quando não alegados, a respetiva prova resulte da instrução da causa e quanto a eles tenha sido observado pelo juiz o princípio do contraditório.
Em relação aos factos instrumentais, ainda que tenham sido alegados pelas partes, o tribunal não os tem de dar como provados ou não provados na sentença.
Esses factos instrumentais, quer tenham sido alegados pelas partes, quer não o tenham sido, desde que a respetiva prova resulte demonstrada da instrução da causa, carecem de ser considerados pelo tribunal na sentença em sede de motivação das respostas dadas como provadas e não provadas em relação aos factos essenciais e/ou complementares ou concretizadores.
Os factos instrumentais, ainda que alegados pelas partes no respetivo articulado, quando não sejam impugnados pela contraparte, a admissão dos mesmos por esta pode ser afastada por prova posterior (art. 574º, n.º 2 do CPC).
Note-se que estas regras, porque foram introduzidas pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, entrado em vigor em 01/09/2013 (art. 8º da Lei n.º 41/2013) e, por conseguinte, em data posterior à propositura da presente ação, não são aplicáveis aos articulados apresentados pelas partes nos presentes autos, mas já são aplicáveis ao julgamento e à sentença, respetivamente, realizado e proferida nos presentes autos, uma vez que este julgamento foi realizado e a sentença neles prolatada, foi proferida, em plena vigência da referida Lei n.º 41/2013, que alterou o CPC. (art. 5º, n.ºs 1 a 4 da Lei n.º 41/2013), pelo que aquelas regras são plenamente aplicáveis ao julgamento e à sentença proferida nos presentes autos.
Assente nestas premissas, pretendendo, nos presentes autos, a Autora ser indemnizada pelos Réus demandados, onde se integra a apelante seguradora, por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu em consequência do erro médico que imputa ao Réu E. M., sem dúvida alguma que a sua pretensão indemnizatória em ser indemnizada por esses danos patrimoniais e não patrimoniais que irá sofrer em consequência da nova cirurgia que terá de realizar para remoção do expansor e aplicação de duas próteses mamárias, constitui factos essenciais dessa pretensão indemnizatória que deduz e, como tal, esses factos essenciais têm de ser alegados pela Autora apelada em sede de petição inicial.

Acontece que como vem dito, a Autora/apelada alegou esses factos essenciais dessa pretensão indemnizatória no art. 35º da petição inicial, pelo que, a nosso ver, a questão não se reconduz à circunstância do tribunal a quo ter considerado na sentença recorrida factos essenciais não alegados pela Autora, uma vez que esses factos foram efetivamente por ela alegados naquele ponto 35º da petição inicial.
Precise-se que ainda que a tese da apelante seguradora fosse certa, que não é, a circunstância do tribunal ter dado pretensamente como provados factos essenciais, não alegados pela Autora, para fundamentar a condenação daquela apelante no pagamento da indemnização reclamada pela última, contanto que o pedido indemnizatório arbitrado à Autora apelada não ultrapassasse o montante global de 300.000,00 euros do pedido indemnizatório por esta formulado, que não ultrapassa, já que o pedido indemnizatório arbitrado na sentença recorrida fica à quem desses 300.000,00 euros, não se estaria perante qualquer situação de excesso de pronuncia por parte do tribunal a quo, sequer de condenação ultra petitum, determinativo de nulidade do segmento da sentença que decidiu ordenar que não se deduz a quantia de dez mil euros arbitrada à Autora no procedimento cautelar à indemnização fixada àquela na sentença recorrida por excesso de pronuncia ou por condenação para além do pedido, mas perante um eventual error in judicando, invocável e sanável em via e recurso.
Com efeito, caso aquela decisão assentasse no arbitramento de uma indemnização à Autora apelada, ancorada em factos essenciais que esta última não tivesse cuidado em alegar em sede de petição inicial, estaríamos indiscutivelmente perante uma situação de error in judicando, na sua vertente de error facti, dado que o tribunal a quo teria ancorado a sua decisão em factos essenciais não alegados pela Autora apelada e, consequentemente, existira da parte deste um vício decorrente da circunstância de ter dado matéria como provada em desconformidade com o direito aplicável aos autos, logo, erro de julgamento, e não perante qualquer situação de nulidade por excesso de pronúncia ou condenação além do pedido.
Acontece que, no caso em análise, não é nada disto que, salvo o devido respeito por entendimento contrário, acontece nos autos, isto é, o tribunal a quo, ao decidir pela não dedução da quantia arbitrada no procedimento cautelar à indemnização fixada à apelada Autora na sentença recorrida, e ao arbitrar-lhe uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que irá sofrer por via daquela intervenção cirúrgica futura a que terá de ser submetida, não assentou essa condenação manifestamente em factos essenciais pretensamente não alegados nos autos pela apelada.
O que acontece nos autos é que tendo a Autora instaurado a presente ação em 15/06/2012 (cfr. fls. 100), a mesma, em 26/02/2014 (cfr. fls. 25 dos autos de providência), ou seja, em plena pendência dos autos principais, instaurou contra os mesmos Réus, providência cautelar para arbitramento de reparação provisória, em que alega, além do mais, “que terá, ainda que ser submetida a nova cirurgia para a remoção do expansor e aplicação de duas prótese visto que a pele não obteve a elasticidade suficiente (devido ao tecido necrosado e à infecção), pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razões de simetria” (art. 35º da petição de providência, matéria esta que, como se viu, já tinha sido por ela alegada em sede de petição inicial na ação principal no respetivo art. 35º).
Nessa providência cautelar, aquela Autora apelada alegou, ainda, que “não tem dinheiro, nem outros meios financeiros para a realizar (a intervenção cirúrgica), além de que o seu parco salário que vem a auferir, é manifestamente insuficiente para cobrir todas as suas despesas com tratamentos, consultas médicas, inclusive de psiquiatria, medicamentos, como suportar as despesas de alimentação num agregado familiar com dois filhos a estudar” (arts. 6º a 38º da petição de providência cautelar), e sustenta que “carece urgentemente de uma intervenção cirúrgica, mas não tem dinheiro para a realizar, e por outro lado o processo de indemnização ainda vai levar mais algum tempo, tempo que, face à saúde e necessidade de uma intervenção cirúrgica, a Requerente não tem (arts. 39º a 40º da petição de providência cautelar).
Concretizando essa sua alegação, naqueles autos de providência cautelar, a Autora apelada, ali requerente, alega, ainda, que “tem necessidade urgente de efetuar uma nova cirurgia em Coimbra para remoção do expansor e aplicação de duas próteses visto que a pele não obteve a elasticidade suficiente (devido ao tecido necrosado e à infecção), pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razão de simetria, sendo certo que a Requerente já deveria ter feito esta cirurgia para a sua saúde, o seu bem-estar físico e psíquico, mas não tem condições financeiras de a fazer, pois que os seus únicos rendimentos são um parco salário de cerca de 800,00 euros, portanto tem sido esta a única receita da Requerente desde o erro médico, valor este que é manifestamente insuficiente para custear as muitas e indispensáveis despesas que a Requerente, tem diariamente, como tratamentos, medicamentos, consultas médicas, transportes, etc…., pois continua a precisar tratamentos e acompanhamento médico e medicamentoso, ajuda de terceiros, despesas para poder retomar a sua vida com todas estas condicionantes, sequelas físicas e psíquicas causadas pelo erro médico. Em consequência da sua incapacidade parcial para o trabalho, a Requerente não consegue com cerca de 800,00 euros garantir assim o sustento do seu agregado familiar, bem como realizar e custear a intervenção cirúrgica que carece de efetuar. Agora a requerente, sem a comparticipação da requerida seguradora não tem condições de suportar as despesas diárias e da intervenção cirúrgica e/ou intervenções cirúrgicas que porventura terá ainda de fazer, de modo que já teve de recorrer a empréstimos de amigos e familiares, para poder comprar medicamentos, alimentação, etc.. Está assim, a requerente numa situação de total aflição para sobreviver e continuar a tratar da sua saúde … O objetivo da presente providência é de garantir a sobrevivência da requerente e realização da intervenção cirúrgica supra identificada, até decisão final da ação principal, pois até lá, não tem condições financeiras para tratar a sua saúde, nem sequer sobrevir, dados os seus gastos elevados, todos os meses … Carece assim, a requerente de uma quantia mensal de cerca de 1.000,00 euros (…) para fazer face às despesas com a intervenção cirúrgica a realizar, despesas médicas e medicamentosas, próteses, tratamentos e demais despesas do quotidiano, com o seu agregado familiar, em suma, sobreviver até à reparação final todos os anos” (cfr. arts. 47º a 66º da petição inicial de providência cautelar).
Nessa providência cautelar, a requerente conclui a petição inicial aí apresentada, pedindo que fosse “ordenado o imediato pagamento à Requerente, da quantia de 1.000,00 euros (mil euros) – sob forma de renda mensal, até decisão final da ação principal, sendo este valor a deduzir no montante final a pagar pela requerida à requerente, com todas as demais e legais consequências” – cfr. fls. 22.
No âmbito dessa providência cautelar, requerente e requeridos vieram a celebrar a transação de fls. 30 a 33, em 14/03/2014, onde acordaram, além do mais, no seguinte:


a) A requerente reduz o pedido à quantia de 10.000,00 euros (dez mil euros), a qual se destina em primeira linha a custear as despesas com a intervenção cirúrgica que refere na presente providência.
b) A requerente compromete-se a realizar a referida cirurgia e a dar do facto imediato conhecimento nos autos principais, juntando comprovativo.
(…)

a) A requerente com o recebimento da quantia mencionada no artigo 1º declara que nada mais tem direito a receber dos requeridos em consequência da presente providência cautelar.
b) Só a partir de abril de 2015 poderá a requerente propor nova providência cautelar com fundamento no evento descrito nos autos principais, alegando e demonstrando a situação de necessidade que lhe serve de fundamento.
(…)”

Terminam essa transação, pedindo: “… requerem a V. Exª que nos presentes autos de providência cautelar, se tenha em conta o ora acordado e que o mesmo seja homologado por V. Exa., atendendo-se ao valor acordado como liquidação provisória a imputar na indemnização a liquidar nos autos principais” – cfr. doc. de 30 a 37 dos autos principais.
Essa transação veio a ser homologada por sentença proferida em 17/03/2014, nesses autos de providência cautelar, entretanto transitada em julgado – cfr. doc. de fls. 38 dos mesmos.
Realizada a audiência final no âmbito dos presentes autos principais, conforme se vê da ata dessa audiência de 29 de fevereiro de 2016, Autora e Réus acordaram no seguinte:

Autora e Réus admitem por acordo, que no dia 12/11/2014, a Autora foi submetida a uma substituição de um expansor mamário por prótese da mama direita e substituição de prótese de PIP da mama esquerda, para igualar a simetria” – cfr. fls. 426 a 428 dos autos principais.

Concluída a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 526 a 545 dos autos principais, em que o tribunal a quo deu como provada a seguinte matéria:

51- A Autora terá, ainda, que ser submetida a nova cirurgia para a remoção do “expansor” e aplicação de duas próteses.
53- Pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razões de simetria.
86- No processo apenso, foi homologado o acordo através da qual a Ré pagou à Autora a quantia de 10.000,00 euros, para custear as despesas com intervenção cirúrgica (para remoção do expansor e colocação de duas próteses) – sentença homologatória de 17/03/2014, proferida no apenso A.
Ao dar como provada esta matéria vertida no ponto 86 dos factos assentes, o tribunal a quo manifestamente não incorreu em excesso de pronúncia, sequer deu como provada matéria não alegada pela Autora apelante, sequer ao considerar que a quantia arbitrada no âmbito dos autos de providência cautelar não se deduz à indemnização que arbitrou à Autora apelada naquela sentença proferida nos autos principais, não ocorreu em excesso de pronuncia.
Ao dar como provada aquela materialidade exarada no referido ponto 86º dos factos assentes, aquele tribunal não incorreu em excesso de pronúncia, sequer deu como provados factos essenciais não alegados pela Autora, posto que esta alegou, em sede de petição inicial, a matéria que se deu como provada nos pontos 51º e 53º dos factos assentes naquela sentença e quanto à dada como provada no ponto 86º, a mesma resulta da transação celebrada entre Autora e Réus nos autos de providência cautelar, homologada por sentença homologatória, transitada em julgado, em que acordam que o valor de 10.000,00 euros deverá ser atendido “como liquidação provisória a imputar na indemnização a liquidar nos autos principais”, limitando-se, pois, o tribunal, naquele ponto 86º da matéria que deu como provada, a dar concretização àquilo que ficou acordado e homologado, por sentença transitada em julgado, na sentença proferida nos autos de providência cautelar.
Coisa diversa, é saber se a matéria de facto dada como provada no referido art. 86º espelha a transação celebrada entre as partes em sede de providência cautelar, questão essa que carece de ser apreciada em sede de reponderação da materialidade fáctica dada como provada, onde se imporá alterar a matéria dada como provada, caso se venha a concluir assistir razão à recorrente, o que configurará da parte do tribunal a quo error in judicando, a apreciar e a suprir em sede de recurso, não determinativo de nulidade, parcial ou total, da sentença recorrida.
Não ocorre excesso de pronuncia na medida que ao escrever, naquele sentença, em sede de subsunção jurídica da factualidade apurada: “Como resulta da fundamentação de facto, no processo apenso, foi homologado acordo através da qual pagou à Autora a quantia de 10.000,00 euros, para custear as despesas com uma intervenção cirúrgica. Contudo, a quantia adiantada visou o pagamento dos custos duma cirurgia (para remoção do expansor e colocação de próteses), cujo custo não foi peticionado nestes autos (essa cirurgia só teve lugar em novembro de 2014), razão pela qual não se deduz aquela à indemnização a fixar nestes autos), o tribunal a quo, o que poderá ter incorrido é numa interpretação errónea dos factos que foram alegados pela Autora em sede de petição inicial, da transação celebrada pelas partes nos autos de providência cautelar e aí homologada por sentença transitada em julgado e, finalmente, dos factos acordados pelas partes no âmbito dos presentes autos principais, na ata de audiência final de 29 de fevereiro de 2016, o que tudo, a verificar-se, consubstanciará erro de julgamento por parte do tribunal a quo, e não excesso de pronuncia, determinativa de nulidade do segmento decisório daquela sentença que decidiu ordenar a não dedução da quantia arbitrada no procedimento cautelar à indemnização fixada no âmbito de providência cautelar.
Decorre do que se vem dizendo, improceder a invocada nulidade daquele segmento decisório da sentença recorrida, com fundamento em excesso de pronúncia.
*
B.1.3 – Da nulidade da sentença com fundamento em condenação ultra petitum.

Sustenta a apelante que ao assim decidir, aquele segmento da sentença é nulo por configurar condenação ultra petitum.
Como acima ficou dito, nos termos do disposto no art. 615º, n.º 1, al. e) do CPC., é nula a sentença quando o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido, ou seja, quando viole o disposto no art. 609º, n.º 1 do mesmo Código, onde se estatui que “a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir”.
Conforme resulta do que se vem dizendo, a condenação dos Réus constante da parte disjuntiva da sentença recorrida fica, inclusivamente, àquem do pedido global formulado pela Autora em sede de petição inicial. Logo aquela sentença não condenou os Réus em quantidade superior ao pedido.
A Autora alegou, no art. 35º da p.i., que terá de ser submetida a nova cirurgia para remoção do expansor e aplicação de duas próteses visto que a pele não obteve elasticidade suficiente (devido ao tecido necrosado e à infecção), pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razões de simetria.
Nas quantias indemnizatórias que peticionou, em sede de pedido formulado na petição inicial, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, a Autora incluiu nesse pedido indemnizatório que deduz necessariamente a indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que irá sofrer em consequência daquela nova cirurgia a que terá de ser submetida. Logo, também não ocorre qualquer condenação dos Réus em coisa diversa daquela que tinha sido pedida pela Autora em sede de petição inicial.
Como se deixou enunciado, as questões que a apelante seguradora invoca em sede de nulidade de sentença, quer com fundamento em excesso de pronuncia, quer com fundamento em condenação ultra petitum, reconduzem-se a um eventual error in judicando em que o tribunal a quo poderá ter incorrido na fixação da matéria de facto dada como provada e, bem assim na subsunção jurídica desses factos, os quais serão analisados infra, em sede própria.
Nesta conformidade, na improcedência deste fundamento de recurso, improcede igualmente a exceção da nulidade do segmento da sentença que ordenou a não dedução da quantia arbitrada à Autora no procedimento cautelar à indemnização fixada à mesma na sentença recorrida, com fundamento em condenação dos Réus para além do pedido formulado pela Autora.
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B.1.4- Da impugnação da matéria de facto dada como provada nos pontos 51º, 53º e 86º.

A apelante seguradora impugna a matéria de facto dada como provada nos pontos 51º, 53º e 86º da sentença recorrida, sustentando que da análise conjugada de toda a prova produzida, a intervenção cirúrgica a que se referem os factos 51º e 53º foi já realizada, tal como foi documentado, por acordo, a fls. 426 e ss.
Mais sustenta que as partes, em audiência final, manifestaram a sua vontade de excluírem da base instrutória a matéria a que se referem os artigos 45º e 47º, fazendo-se constar, em sua substituição: “No dia 12/11/2014, a Autora foi submetida a uma substituição de um expansor mamário por prótese PIP da mama esquerda para igualar da simetria”.
Alega, ainda, que existe contradição entre a matéria de facto dada como provada nos referidos pontos 51º e 53º e aquela que se encontra dada como assente no ponto 86º.
Conclui, pedindo que se altere aquela factualidade dada como assente nos pontos 51º e 53º nos termos que propugna e acima referidos, ao abrigo do disposto no art. 662º, n.º 1 do CPC.
Alega, ainda, que também se impõe a alteração da matéria de facto dada como provada sob o ponto 86º, aduzindo para tanto que, essa factualidade, resulta da transação formalizada nos autos de procedimento cautelar, em que a Autora reduziu o pedido que aí formulou à quantia de 10.000,00 euros, a qual se destina, em primeira linha, a custear as despesas com a intervenção cirúrgica que refere na providência, tendo as partes, nessa transação, expressamente peticionado que se atendesse ao valor acordado como liquidação provisória a imputar na indemnização a liquidar nos autos principais.
Invoca ainda, que naquela providência cautelar, para além da realização da cirurgia, a apelada alegava a sua incapacidade para o trabalho e parcos rendimentos e a necessidade de custear as despesas com a sua vida diária e saúde, bem como a alimentação e educação dos dois filhos.
Conclui que dos autos não resulta que a quantia de 10.000,00 euros se destinou a custear as despesas com a intervenção cirúrgica, pelo que a matéria dada como provada naquele ponto 86º não espelha aquela transação, impondo-se a respetiva alteração no sentido de que aqueles dez mil euros foram pagos à Autora como liquidação provisória a imputar na indemnização a liquidar nos autos principais.
Como é consabido, nos termos do disposto no art. 640º, n.º 1 do CPC., quando for impugnada a decisão da matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
A imposição dos ónus que se acabam de enunciar à parte que pretenda impugnar a matéria de facto dada como provada e/ou não provada assenta na circunstância do legislador ter pretendido impedir que o julgamento a realizar pela Relação em sede de matéria de facto se transformasse numa repetição do julgamento realizado na 1ª Instância e rejeitar a admissibilidade de recurso genéricos, contra a errada decisão da matéria de facto, tendo “o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente”, pelo que se mantém o entendimento que, como tribunal de 2ª instância que é, a Relação deverá ter competência residual em sede de reponderação ou reapreciação da matéria de facto (11), estando subtraída ao seu campo de cognição a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo que não seja alvo de impugnação.
Acresce que tal como se impõe ao juiz a obrigação de fundamentar as suas decisões, também ao recorrente é imposto, como correlativo do princípio da auto-responsabilidade e dos princípios estruturante da cooperação, da lealdade e da boa-fé processuais, a obrigação de fundamentar o seu recurso, demonstrando o desacerto em que incorreu o tribunal a quo em decidir a matéria de facto impugnada em determinado sentido, quando se impunha decisão diversa, devendo no cumprimento desses ónus, indicar não só a matéria que impugna, como a concreta solução que, na sua perspetiva, se impunha que tivesse sido proferida e os concretos meios de prova que reclamam essa solução diversa.
Precise-se que cumprindo a exigência de conclusões nas alegações a missão essencial da delimitação do objeto do recurso, fixando o âmbito de cognição do tribunal ad quem, é entendimento jurisprudencial uniforme que, nas conclusões, o recorrente tem de delimitar o objeto da impugnação de forma rigorosa, indicando os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados.
Já quanto aos demais ónus enunciados no art. 640º, n.ºs 1 e 2 do CPC, os mesmos, porque não têm aquela função delimitadora do âmbito do recurso, mas se destinam a fundamentar o recurso, não têm de constar das conclusões, mas sim das motivações.

Sintetizando, à luz deste regime, seguindo a lição de Abrantes Geraldes (12), sempre que o recurso de apelação envolva matéria de facto, terá o recorrente: a) em quaisquer circunstâncias indicar sempre os concretos factos que considere incorretamente julgados, com a enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; b) especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos; c) relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar, com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos.
O cumprimento dos referidos ónus tem, como alerta Abrantes Geraldes, a justificá-la a enorme pressão, geradora da correspondente responsabilidade de quem, ao longo de décadas, pugnou pela modificação do regime da impugnação da decisão da matéria de facto e se ampliasse os poderes da Relação, a pretexto dos erros de julgamento que o sistema anterior não permitia corrigir; a consideração que a reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida; a ponderação de que quem não se conforma com a decisão da matéria de facto realizada pelo tribunal de 1ª instância e se dirige a um tribunal superior, que nem sequer intermediou a produção da prova, reclamando a modificação do decidido, terá de fundamentar e justificar essa sua irresignação, sendo-lhe, consequentemente, imposto uma maior exigência na impugnação da matéria de facto, mediante a observância de regras muito precisas, sem possibilidade de paliativos, sob pena de rejeição da sua pretensão e, bem assim, concluímos nós, o princípio do contraditório, habilitando a parte contrária de todos os elementos para organizar a sua defesa, em sede de contra-alegações. É que só na medida em que se conhece especificamente o que se impugna e qual a lógica de raciocínio expandido na valoração/conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita a parte contrária a poder contrariá-lo em sede de contra-alegações.
A apreciação do cumprimento das exigências legalmente prescritas em sede de impugnação da matéria de facto deve ser feita à luz de um “critério de rigor” como decorrência dos referidos princípios de auto-responsabilização, de cooperação, lealdade e boa-fé processuais e salvaguarda cabal do princípio do contraditório a que o recorrente se encontra adstrito, sob pena da impugnação da decisão da matéria de facto se transformar numa “mera manifestação de inconsequente inconformismo” (13).
Por último, precise-se que porque se mantêm em vigor os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, e o julgamento humano se guia por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta, o uso pela Relação dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados.
A alteração da matéria de facto só deve, assim, ser efetuada pelo Tribunal da Relação quando, depois de proceder à audição efetiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direção diversa, e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1ª Instância. O que se acaba de dizer encontra sustentação na expressão “imporem decisão diversa” enunciada no n.º 1 do art. 662º, bem como na ratio e no elemento teleológico desta norma.
Deste modo, “em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte” (14).
No caso, analisada a impugnação da matéria de facto operada pela apelante seguradora, impõe-se reconhecer que aquela cumpriu com os ónus que sobre si impendiam e que acima se elencaram em sede de impugnação da matéria de facto, na medida que indica qual a concreta matéria de facto que impugna – a vertida nos pontos 51º, 53º e 86º dos factos dados como provados na sentença recorrida -, qual, a matéria que, na sua perspetiva, devia ter sido dada como provada pelo tribunal a quo em relação a esses concretos pontos e, bem assim quais os concretos fundamentos probatórios que, a seu ver, sustentam essa solução diversa.
No entanto, impõe-se precisar que, no caso, analisados os fundamentos probatórios aduzidos pela apelante, não se está perante nenhum caso a que se reporta o enunciado art. 640º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
Com efeito, os ónus de impugnação da matéria de facto enunciados nesse art. 640º reportam-se aos casos em que a matéria de facto dada como provada e não provada o foi de acordo com o princípio da livre convicção do tribunal – nestes casos, é que o recorrente que pretenda impugnar a matéria de facto dada como provada e não provada terá de cumprir esses ónus, com vista a observar os desideratos acima enunciados.
Já naquelas situações em que a matéria de facto dada como provada e não provada está subtraída ao princípio da livre apreciação da prova e em que, consequentemente, a resposta a essa matéria é “o mero resultado da aplicação de normas sobre prova vinculada que não deixam ao juiz qualquer margem de subjetivismo”, ainda que a recorrente não impugne essa factualidade, a Relação e o Supremo Tribunal de Justiça, devem, ex oficio, alterar a matéria de facto provada e não provada quando, no âmbito da apelação ou da revista, verificarem que a mesma está afetada por erro de direito probatório material, quer na vertente da atribuição de força probatória plena a meios dela destituídas, quer na vertente do desrespeito dessa força probatória (15).
O que se acaba de enunciar, resulta expressamente do estatuído no art. 607º, n.º 5 do CPC., onde se prescreve que “a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes”.
Nos casos em que os factos dados como provados ou não provados estejam subtraídos ao princípio da livre apreciação da prova, reafirma-se, independentemente da impugnação que deles seja feita pelas partes em sede de recurso, interposto que seja esse recurso, detetado que seja pelo tribunal superior que aquelas regras de direito probatório foram infringidas na fixação dessa matéria de facto, o tribunal superior terá, sem mais, ainda que mediante prévia observância do princípio do contraditório enunciado no n.º 4 do art. 3º do CPC, alterar essas respostas, tornando-as conformes às regras do direito probatório (questão de direito) aplicável.
Os vícios que a apelante assaca aos pontos 51º e 53º dos factos dados como provados na sentença recorrida prendem-se em saber se essas respostas se mostram conforme à matéria fixada por acordo entre as partes na ata de audiência final de 29/02/2016 (cfr. fls. 426 a 428), em que declararam o seguinte:

“Autora e Réus admitem, por acordo, que, no dia 12/11/2014, a Autora foi submetida a uma substituição de um expansor mamário por prótese da mama direita e substituição da prótese PIP da mama esquerda, para se igualar a simetria”.
Como se disse, em relação à matéria fixada por acordo das partes, nos termos do art. 607º, n.º5 do CPC, a mesma encontra-se subtraída ao princípio da livre apreciação da prova.
Esse acordo encontra-se exarado num documento autêntico (art. 363º, nº 2 do CC), mais concretamente, na ata de audiência final.
Não tendo sido invocada a falsidade desse ata, nos termos do disposto no art. 371, n.º 1 do CC., o acordo exarada na mesma faz prova pleníssima quanto aos intervenientes nesse acordo, ou seja, em relação à Autora apelada, à seguradora apelante, e os demais Réus intervenientes nesse acordo e que não recorreram.
Significa isto, que aquele acordo que se encontra exarado na ata de audiência final de fls. 426 a 428 se tem como facto assente, isto é, provado, independentemente da prova produzida em audiência final, reportando-se a matéria subtraída ao princípio da livre apreciação da prova.
O que se acaba de enunciar relativamente aos factos dados como provados pelo tribunal a quo em relação aos pontos 51º e 53º da sentença recorrida, também é válido em relação ao ponto 86º dos factos nela dados como provados.
Na verdade, no referido ponto 86º dá-se como provados os termos da transação que foi celebrada pelas partes nos autos de providência cautelar – apenso A -, junta a estes autos de providência cautelar, a fls. 31 a 37, e homologada por sentença aí proferida em 17/03/2014 (cfr. 38), entretanto transitada em julgado. Logo, estamos perante documentos autênticos, cuja falsidade não foi suscitada, pelo que os termos dessa transação encontram-se, em definitivo, provados nos termos que resultam da transação celebrada no âmbito da providência cautelar e isto independentemente da prova produzida em audiência final a propósito dos termos dessa transação.
Destarte, a questão que se suscita nos autos é a de saber se a matéria que foi dada como provada sob os referidos pontos 51, 53º e 86º na sentença recorrida pelo tribunal a quo, se mostra conforme à materialidade fática fixada por acordo, entre as partes, na ata de audiência final de 29/02/2016 e na dita transação entre elas celebrada nos autos de providência cautelar.
Refira-se que a apelante seguradora pretende que entre a matéria de facto dada como provada entre, por um lado, nos enunciados pontos 51º e 53º e a dada como provada, por outro, no ponto 86º da sentença recorrida, ocorre contradição, mas, a nosso ver, essa contradição não se afirma.
Na verdade, do mero confronto entre a matéria que se deu como provada nos ditos pontos 51º e 53º, em que se deu como assente que: “A Autora terá, ainda, que ser submetida a nova cirurgia para a remoção do “expansor” e aplicação de duas próteses. Pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razões de simetria”, com a enunciada no ponto 86º, onde se deu como provado que: “No processo apenso, foi homologado o acordo através da qual a Ré pagou a quantia de 10.000,00 euros para custear as despesas com intervenção cirúrgica (para remoção do expansor e colocação de duas próteses) – cfr. sentença homologatória de 17/03/2014, proferida no apenso A”, não existe contradição alguma, posto que não é por as partes terem celebrado aquela transação em 17/03/2014, ainda que essa transacção tenha por fim a realização da intervenção cirúrgica a que se alude naqueles pontos 51º e 53º dos factos provados, que se pode concluir que a Autora já realizou essa concreta intervenção cirúrgica.

As questões que se colocam e que se impõem analisar são a, nosso ver, as seguintes:

a) percorrida a matéria de facto dada como provada pelo tribunal a quo este não levou aos factos provados, conforme se impunha que acontecesse, a matéria fixada por acordo de Autora e Réus na ata de 29/02/2016. Essa matéria, no entanto, perante os fundamentos legais já acima enunciados, tem, por imposição legal, de ser levada aos factos provados;
b) impõe-se verificar se a matéria dada como provada pelo tribunal a quo nos pontos 51º e 53º, mas também, no ponto 52º (já que a materialidade dada como provada sob os pontos 51º, 52º e 53º na sentença recorrida se referem à mesma realidade), se reporta à mesma realidade fáctica a que se reportam as partes no acordo alcançado naquela ata de 29/02/2016. É que se a materialidade fáctica fixada por acordo de 29/02/2016, se reportar à mesma realidade factual a que se alude nos identificados pontos 51º, 52º e 53º dos factos dados como provados, automaticamente, por via daquele acordo, esta factualidade vertida nos referidos pontos 51º a 53º se tem como assente, impondo-se, tão-somente, acrescentar que a intervenção cirúrgica a que se alude nesses pontos 51º, 52º e 53º já foi realizada pela Autora em 12/11/2014; finalmente,
c) quanto à matéria vertida no ponto 86º dos factos provados na sentença recorrida, impõe-se verificar se a matéria dada como provada sob esse ponto 86º espelha os termos da transação celebrada entre as partes nos autos de providência cautelar.
Note-se que estamos exclusivamente a movimentar-nos, isto é, a decidir de facto. Logo, impõe-se, nesta sede, apenas verificar se a matéria vertida no ponto 86º dos factos provados na sentença recorrida espelha ou não os termos daquela transação, devendo, no caso negativo, alterar-se a resposta dada a este ponto 86º, por forma a torná-la conforme ao teor da transação celebrada, independentemente de qualquer interpretação que do teor dessa transação se possa fazer.
A interpretação do teor dessa transação, designadamente, saber se a quantia de dez mil euros paga pela seguradora à Autora se destinou a que a última realizasse a intervenção cirúrgica ou, também, para satisfazer outras finalidades e, bem assim se, consequentemente, essa quantia deve ou não ser de abatida à indemnização a arbitrar à Autora no âmbito da sentença a proferir nos presentes autos principais, já não consubstancia questão de facto, mas sim de direito, uma vez que está dependente da interpretação que se faça do teor daquela transação, interpretação essa que terá de ser feita em sede de subsunção da matéria fática apurada ao direito, no momento processual próprio, que manifestamente não é o presente, onde, reafirma-se, estamos em sede exclusiva de apreciação da matéria de facto.
No que respeita aos pontos 51º, 52º e 53º dos factos dados como provados na sentença recorrida, a Autora alegou, no ponto 35º da petição inicial, que “terá, ainda que ser submetida a nova cirurgia para remoção do “expansor” e aplicação de duas próteses visto que a pele não obteve a elasticidade suficiente (devido ao tecido necrosado e à infecção), pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razões de simetria”.
A matéria em apreço foi levada aos pontos 45º, 46º e 47º da base instrutória.
Em 26/02/2014, data em que a Autora instaurou a providência cautelar apensa (cfr. fls. 25 dos autos de providência cautelar), aquela ainda não tinha feito a referida intervenção cirúrgica, já que no art. 35º dessa providência cautelar, invoca a necessidade de efetuar a mesma, a ausência de meios económicos para suportar o custos inerentes à realização dessa intervenção cirúrgica e, bem assim para satisfazer outras necessidades suas e do seu agregado familiar como fundamento para lhe ser arbitrada a quantia de mil euros mensais, a título de reparação provisória dos danos que reclama nos autos principais.
Significa isto, que a intervenção cirúrgica a que se alude no ponto 1º, al. a) da transação celebrada naqueles autos de providência cautelar, homologada por sentença de 17/03/2014 nela proferida, sem dúvida alguma se refere à intervenção cirúrgica cuja necessidade de realização a Autora acusa no ponto 35º da petição inicial dos autos principais.
Por outro lado, na ata de audiência final realizada em 29/02/2016 nestes autos principais (fls. 426 a 428), as partes acordaram que “Autora e Réus admitem por acordo, que no dia 12/11/2014, a Autora foi submetida a uma substituição de um expansor mamário por prótese da mama direita e substituição de prótese PIP da mama esquerda, para se igualar a simetria”.
Perante tudo o que se vem explanando, dúvidas não podem subsistir que a descrita intervenção cirúrgica que a Autora realizou em 12/11/2014, se refere precisamente à intervenção cirúrgica cuja necessidade de realização aquela acusou no referido ponto 35º da petição inicial dos autos principais.

Resulta do exposto assistir inteira razão à seguradora apelante quando afirma que a intervenção cirúrgica a que aludem os factos provados nos pontos 51º, 52º e 53º da sentença recorrida, já foi realizada pela Autora, conforme acordo entre esta e os Réus alcançado na referida ata de audiência final de 29/06/2016 e que essa realidade fáctica não foi considerada nos factos provados na sentença recorrida.
Contudo, a conformação da factualidade dada como provada naquela sentença com o acordado entre as partes na dita audiência final de 29/06/2016, não passa, conforme pretende a apelante, pela eliminação da factualidade vertida nesses pontos 51º e 53º e por se dar como provado, em sua substituição, que “No dia 12/11/2014, a Autora foi submetida a uma substituição de um expansor mamário por prótese da mama direita e substituição da prótese PIP da mama esquerda para igualar a simetria”.
Se assim fosse, manifesto seria que a matéria dada como provada nessa sentença não espelharia os factos que vêm alegados pela Autora no ponto 35º da petição inicial.
Do confronto dessa factualidade alegada pela Autora no ponto 35º da petição inicial, com aquilo que ficou acordado entre essa Autora e os Réus na ata de 29/02/2016, o que se impõe é alterar os pontos 51º a 53º dos factos dados como provados na sentença recorrida, no sentido de se concretizar que a Autora tinha necessidade, à data da propositura da presente ação, em 15/06/2012, de realizar essa cirurgia (tal como aquela alegou em sede de petição inicial e as Rés reconheceram ao celebrarem com ela o acordo exarado na ata de fls. 426 a 428) e acrescentar-se à matéria dada como provada o ponto 53º-A, dando-se como assente que “A Autora realizou a cirurgia referida em 51º, 52º e 53º em 12/11/2014.
Significa isto que os pontos 51º, 52º e 53º (estes pontos 52º e 53º, mantém a respetiva redação), passam a constar da seguinte redação:

51- Em 15/06/2012, a Autora tinha que ser submetida a nova cirurgia para a remoção do “expansor” e aplicação de duas próteses.
52- Uma vez que a pele não obteve a elasticidade suficiente, devido ao tecido necrosado e à infecção.
53- Pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razões se simetria.

Acrescentando-se à matéria de facto dada como provada, o seguinte ponto:

53A – A Autora realizou a cirurgia referida em 51º, 52º e 53º em 12/11/2014.
No que respeita à matéria de facto dada como provada sob o ponto 86º da sentença recorrida, sem maiores delongas, é por demais evidente que a matéria aí dada como provada não reproduz o teor da transação que foi celebrada entre Autora e Réus nos autos de providência cautelar apensos, pelo que se impõe a alteração daquele ponto, de modo a torná-lo conforme ao teor da transação de fls. 31 a 37 desses autos, homologada por sentença neles proferida, entretanto transitada em julgado.

Desta feita, aquele ponto 86º dos factos assentes, passa a constar do seguinte teor:
86- No processo apenso, por sentença transitada em julgado, foi homologada a transação, entrada em juízo em 14/03/2014, celebrada entre Autora e Rés, na qual estas acordaram, além do mais, no seguinte:


a) A requerente reduz o pedido à quantia de 10.000,00 (dez mil) euros, a qual se destina em primeira linha a custear as despesas com a intervenção cirúrgica que se refere na presente providência (intervenção cirúrgica a que se reportam os pontos 51º, 52º e 53º dos factos provados).
b) A requerente compromete-se a realizar a referida cirurgia e a dar do facto imediato conhecimento nos autos principais, juntando comprovativo – cfr. doc. de fls. 31 a 38 dos autos de providência cautelar, cujo restante teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

Adita-se à matéria de facto provada o seguinte ponto:
86A- Na sequência da transação referida em 86º, a Ré seguradora pagou à Autora os dez mil euros a que se alude nessa transação.
Decorre do exposto, proceder, ainda que parcialmente, a impugnação da matéria de facto aduzida pela apelante seguradora.
**
Na sequência das alterações acabadas de enunciar, introduzidas à matéria de facto acima referidas, a matéria de facto dada como provada e não provada, passa a ser a seguinte:

1. No dia 5-8-2010, a Autora foi submetida a uma mamoplastia na clínica “Y – Prestação de Serviços Médico-Cirúrgicos, Lda.” – al. A).
2. Tal intervenção foi levada a cabo pelo cirurgião plástico Dr. E. M., que exerce a sua atividade profissional na aludida clínica – al. B).
3. Por tal intervenção, a Autora pagou 2.750 € - al. C).
4. Entre “W Portugal, S.A.” e o aludido Dr. E. M. foi celebrado o contrato de seguro titulado pela apólice nº ..., junto a fls. 122 e segs., através do qual este transferiu para aquela a responsabilidade civil pelos seus atos médicos – al. D).
5. Resulta do art. 5º, al. i), das Condições Gerais do aludido contrato de seguro que o mesmo não garante a responsabilidade civil emergente de “perdas indirectas de qualquer natureza, lucros cessantes e paralisações” – al. E).
6. Por via daquele contrato de seguro, a W Portugal, na sequência da intervenção aludida em A), entregou à Autora a quantia de 15.000 € – al. F).
7. Nas horas seguintes ao “despertar da anestesia” aplicada no âmbito da intervenção aludida em 1., a Autora começou a sentir dores no seio direito, justamente um dos locais corporais onde foi intervencionada – artigo 1º.
8. No dia 7-8-2010, a Autora deslocou-se à aludida Clinica “Y” para lhe retirarem os drenos, então relatando ao Dr. E. M. que sentia muitas dores, desmaiava com frequência e não conseguia levantar o meu braço direito – artigo 2º.
9. Ao que o médico respondeu que tais seriam reações normais à intervenção cirúrgica – artigo 3º.
10. Passados alguns dias, e como a Autora não sentia melhoras e estava em estado febril, ligou diretamente para o Dr. E. M. – artigo 4º.
11. Porém, o Dr. E. M. não atendeu nem retribuiu a chamada por se encontrar de férias – artigo 5º.
12. Tendo a Autora ligado para uma assistente dele, que a aconselhou a tomar medicação para a febre e as dores – artigo 6º.
13. No dia 21-8-2010, a Autora deslocou-se à Clínica “Y” para retirar os pontos, então voltando a reiterar ao Dr. E. M. que continuava com dores e que não conseguia levantar o braço – artigo 7º.
14. Mais o informando que sentia dois “caroços” por debaixo do braço direito entre o peito e a axila – artigo 8º.
15. Ao que o médico respondeu que tal seria normal, mais lhe recomendando que “massajasse que os caroços, que acabavam por desaparecer” – artigo 9º.
16. Tendo a Autora informado que não conseguia massajar os “caroços” porquanto tal ato lhe causava dores insuportáveis – artigo 10º.
17. No dia 27-8-2010, a Autora detetou uma bolha junto à cicatriz – artigo 11º.
18. Tendo telefonando, de imediato, ao Dr. E. M., o qual não se encontrava disponível – artigo 12º.
19. Pelo que a Autora se deslocou a um Posto de Enfermagem, em Lisboa, onde foi vista por um Enfermeiro – artigo 13º.
20. O qual, face à quantidade de “pus” saído dessa bolha, pediu à Autora que entrasse em contacto com o Dr. E. M. com urgência – artigo 14º.
21. De imediato, a Autora contactou o Dr. E. M., que lhe receitou então antibióticos injetáveis, por ser o mais forte para combater a infeção – artigo 15º.
22. Nesse mesmo dia, a Autora foi vista em Famalicão pelo Dr. E. M., que a examinou e decidiu, face a gravidade da situação, que lhe faria uma série de tratamentos para excluir a hipótese de nova cirurgia – artigo 16º.
23. Tais tratamentos consistiam em espremer o seio e seringas para injetar desinfetante para drenar o “pus” que nunca acabava – artigo 17º.
24. A Autora deslocou-se de Mirandela, onde reside, a Famalicão, durante três meses, para se submeter a tais tratamentos – artigo 18º. 25. Tais tratamentos provocavam-lhe dores – artigo 19º.
26. Apesar destes tratamentos, mantinham-se os caroços por baixo da axila, bem como falta de mobilidade no braço direito – artigo 20º.
27. O que provocava dores constantes e permanentes à Autora – artigo 21º.
28. Face a manutenção daquela situação, em novembro de 2010, o Dr. E. M. efetuou nova cirurgia para remover a prótese, pois suspeitava de qualquer infeção provocada pela mesma – artigo 22º.
29. Entre a primeira e esta segunda intervenções cirúrgicas, a Autora esteve sempre a tomar antibióticos e anti-inflamatórios – artigo 23º.
30. Após esta intervenção cirúrgica, a Autora ficou sem a prótese durante um mês – artigo 24º.
31. E continuou com dores e a tomar antibióticos – artigo 25º.
32. Em dezembro de 2010 a Autora foi, novamente, submetida a uma nova cirurgia realizada nesta clínica e pelo Dr. E. M. para recolocar a prótese – artigo 26º.
33. Apesar das aludidas intervenções e tratamentos, as dores continuaram e eram cada vez mais fortes – artigo 27º.
34. E a mobilidade do seu braço direito piorou – artigo 28º.
35. E continuou a deslocar-se, durante um mês, de Mirandela a Famalicão, todas as semanas, sendo, em algumas dela, duas vezes, para se submeter aos mesmos tratamentos – artigo 29º.
36. O Dr. E. M. dizia e afiançava sempre que o peito estava a melhorar – artigo 30º.
37. No entanto, os “caroços” continuavam iguais – artigo 31º.
38. Entretanto, a Autora contactou a sua médica de família, Dra. T. M., que, no imediato, detetou uma infeção – artigo 32º.
39. Tendo o Dr. E. M., informado deste facto pela aludida médica, lhe voltado a prescrever a toma de antibióticos e de anti-inflamatórios – artigo 33º.
40. No dia 1-2-2011, a Autora deslocou-se a Coimbra para ser vista de urgência por uma médica sua conhecida, a Drª P. M. – artigo 34º.
41. Esta médica, após examinar a Autora, também confirmou a existência de uma infeção – artigo 35º.
42. Em virtude desta infeção, a Autora ficou com o tecido do seio necrosado – artigo 36º.
43. No dia 2-2-2011, a Autora realizou nova cirurgia para a remoção da prótese e limpeza da ferida na “Clínica MC”, em Coimbra – artigo 37º.
44. Então se tendo detetado a existência de duas compressas compactadas e infetadas entre o seio e a axila – artigo 38º.
45. As quais constituíam os tais “caroços” de que a Autora se queixava – artigo 39º.
46. Por causa disso, a Autora voltou a ficar sem um peito durante quase 9 meses – artigo 40º.
47. Bem como com uma cicatriz de grandes dimensões – artigo 41º.
48. No dia 26-10-2011, a Autora volta a ser submetida a nova cirurgia pela Drª P. M. para a colocação de um “expansor mamário”, com o objetivo de fazer a expansão da pele entretanto retirada – artigo 42º.
49. Este tratamento teve que ser feito todas as semanas em Coimbra – artigo 43º.
50. O que implicou que a Autora se deslocasse de Mirandela a Coimbra todas as semanas até fevereiro de 2012 – artigo 44º.
51. Em 15/06/2012, a Autora tinha que ser submetida a nova cirurgia para a remoção do “expansor” e aplicação de duas próteses.
52. Uma vez que a pele não obteve a elasticidade suficiente, devido ao tecido necrosado e à infeção.
53. Pelo que vai ser obrigada a retirar a outra colocada no peito esquerdo por razões de simetria.
53A- A Autora realizou a cirurgia referida em 51º, 52º e 53º em 12/11/2014.
54. Durante todo o período de tempo acima mencionado, a Autora sentiu dores e mau estar – artigo 48º.
55. E sentiu-se afetada na sua estética e na sua autoestima – artigo 49º.
56. Não conseguindo ir à praia ou vestir um “biquíni” – artigo 50º.
57. Nem praticar desporto – artigo 52º.
58. Vive atormentada com a perceção de que o seu corpo se encontra distorcido e deformado – artigo 52º.
59. Sente vergonha de ver e exibir o seu corpo – artigo 53º.
60. Os danos físicos sofridos pela Autora são irreparáveis e irreversíveis em 11,80 pontos – artigo 54º.
61. E vão acompanhá-la, nesse grau, até aos últimos dias de vida – artigo 55º.
62. Nas deslocações efetuadas entre a residência da Autora, em Mirandela, Vila Nova de Famalicão e Coimbra, acima referidas, bem como com as cirurgias e os tratamentos a que foi sujeita, a despendeu:
- em agosto 2010: 2.886,13;
- em setembro 2010: 132,60 €;
- em outubro 2010: 166,38€;
- em novembro 2010: 133,09€;
- em dezembro 2010: 300,87€;
- em janeiro 2011: 132,92€;
- em fevereiro 2011: 1.334,60€;
- em março 2011: 1.408,86€; e
- entre abril 2011 e dezembro 2011: 2.859,00€ – artigo 56º/parte.
63. A Autora efetuou deslocações para receber tratamentos e fazer cirurgias, a Vila Nova de Famalicão e Coimbra, gastando em combustível montante não concretamente apurado – artigo 56º/parte. 64. A Autora exercia funções como vendedora/comercial na empresa “E. – Comércio P/grosso de Produtos Alimentares, Lda.”, com sede em Mirandela – artigo 57º.
65. Em consequência da total incapacidade que lhe adveio das lesões acima descritas, a Autora deixou de trabalhar desde a realização da intervenção aludida em 1. (até à instauração da presente ação) – artigo 58º.
66. A Autora auferia, a título de vencimento, a quantia mensal de 571 € – artigo 59º.
67. Por força dos factos acima descritos, a Autora sentiu tristeza – artigo 63º.
68. Sente-se revoltada e amargurada – artigo 64º.
69. O que gerou o afastamento dos seus filhos e marido – artigo 65º. 70. A Autora ficou com prejuízo da sua atividade sexual em grau 2 numa escala de 7 pontos – artigo 66º/parte.
71. O que lhe gera sofrimento e dor – artigo 67º.
72. A mamoplastia aludida em 1. não era uma cirurgia normal de mamoplastia de aumento, antes compreendendo uma troca de próteses introduzidas muitos anos antes – artigo 69º.
73. Pretendendo a Autora, ao mesmo tempo, um aumento do seu tamanho – artigo 70º.
74. As primeiras próteses tinham sido introduzidas por via axilar – artigo 71º.
75. Quando se pretendeu fazer a remoção pela mesma via da prótese da mama direita, essa prótese estava já completamente desfeita, saindo aos pedaços – artigo 72º.
76. Para melhor visualização e para a sua completa extração, houve que fazer uma nova abordagem via inframamária – artigo 73º.
77. Tendo sido, nessa altura, que, para estancar eventual hemorragia, foram colocadas compressas na zona axilar do lado direito – artigo 74º.
78. Após a realização de uma cirurgia do tipo a que a Autora foi sujeita, o paciente pode ser afetado por dor – artigo 75º/parte.
79. As dificuldades em elevar os braços podem ocorrer após uma cirurgia do tipo a que a Autora foi submetida – artigo 76º/parte.
80. Em grande parte das doentes que fazem este tipo de cirurgia por via axilar, podem surgir fibroses, ou seja, os acima aludidos “caroços” – artigo 77º.
81. Essas fibroses são tratadas através de massagem – artigo 78º.
82. A infeção que afetou a Autora, só por si, não significava que tivesse ficado alojada na axila qualquer corpo estranho – artigo 79º.
83. Na ecografia surge referido que “No QSE (quadrante superior externo) da mama direta observa-se imagem compatível com processo fibrótico sequelar, com 38 mm de diâmetro” – artigo 82º/parte.
84. Após a remoção da prótese, entre 05.11.2010 e 17.12.2010, houve melhoria da sintomatologia – artigo 81º/parte.
85. O que levou o Réu E. M. a pensar, nesse período de tempo, que o problema podia residir na prótese – artigo 82º.
86. No processo apenso, por sentença transitada em julgado foi homologada a transação, entrada em juízo em 14/03/2014, celebrada entre Autora e Rés, na qual estas acordaram, além do mais, no seguinte:


a) A requerente reduz o pedido à quantia de 10.000,00 (dez mil) euros, a qual se destina em primeira linha a custear as despesas com a intervenção cirúrgica que se refere na presente providência (intervenção cirúrgica a que se reportam os pontos 51º, 52º e 53º dos factos provados).
b) A requerente compromete-se a realizar a referida cirurgia e a dar do facto imediato conhecimento nos autos principais, juntando comprovativo – cfr. doc. de fls. 31 a 38 dos autos de providência cautelar, cujo restante teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
86A. Na sequência da transação referida em 86º, a Ré seguradora pagou à Autora os dez mil euros a que se alude nessa transação.
87. A dor a que se alude na resposta ao artigo é normalmente ligeira, e deve melhorar com o uso de analgésicos comuns – facto instrumental decorrente da instrução da causa.
88. No dia 12.11.2014, a Autora foi submetida a uma substituição de um expansor mamário por prótese da mama direita e substituição da prótese PIP da mama esquerda, para se igualar a simetria – facto admitido por acordo pelas partes na diligência documentada a fls. 426 e ss. (vd. maxime fls. 427).
89. Nos relatórios periciais consta, na parte relativa aos elementos de identificação, que a Autora nasceu a 01.08.1968 e que tinha 42 anos à data da primeira cirurgia – facto instrumental decorrente da instrução da causa (cfr. maxime fls. 375 a 376).
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b. Factos não provados:

90. A irreversibilidade das lesões (para toda a vida) é em grau superior ao que se fez constar na resposta ao artigo 54º - artigo 54º/parte.
91. A intervenção aludida em 1. e as lesões daí provenientes causaram à Autora risco de vida – artigo 68º.
92. A Autora recebia subsídio de Natal e de férias – artigo 60º.
93. Bem como outras quantias referentes a remuneração de trabalho extraordinário – artigo 62º.
94. Se não fosse a aludida incapacidade, a Autora iria subir de categoria dentro daquela empresa, designadamente, alcançando o cargo de encarregada geral – artigo 62º.
95. A Autora perdeu o apetite sexual para o resto da sua vida – artigo 66º/parte.
96. Após a realização de uma cirurgia do tipo a que a Autora foi sujeita, a dor a que se alude na resposta ao artigo 75º ocorre sempre – artigo 75º/parte.
97. As dificuldades a que se alude na resposta ao artigo 76º são correntes e normais – artigo 76º/parte.
98. A melhoria a que se refere na resposta ao artigo 81º foi significativa – artigo 81º/parte.
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B.1.5- Do dano biológico.

Sustenta a apelante que o tribunal a quo incorreu em erro de direito ao enquadrar o dano biológico com que a Autora ficou a padecer na categoria de dano patrimonial, argumentando que atendendo à matéria de facto provada, é indiscutível que aquela não ficou afetada na sua capacidade de trabalho, dado que apenas se provou que, em consequência do acidente, a Autora ficou com um défice funcional permanente na integridade físico-psíquica em 11,80 pontos, mas sempre compatível com o exercício da sua atividade habitual, ainda que implicando esforços complementares.
Antes de entrarmos na apreciação da concreta questão submetida pela apelante a este tribunal, incumbe referir, que estando os Réus obrigados a indemnizar a Autora, em consequência do comportamento ilícito e culposo, porque contrário à legis artis que se impunha ao Réu E. M. observar, enquanto médico, para com a última, que na intervenção cirúrgica que realizou àquela deixou duas compressas compactadas no interior do corpo desta (cfr. ponto 44º da matéria apurada) e perante o agravar do estado infecioso da última no pós-operatório e o intensificar das suas queixas, não cuidou manifestamente em adotar as cautelas de diagnóstico que a situação exigia, atento o padrão de diligência de um médico medianamente cauteloso e prudente (bónus pater familia), perante as situações concretas do caso (cfr. pontos 7 a 39 dos factos apurados), em sede de indemnização dos danos patrimoniais, nos termos do disposto no art. 562º do Cód. Civil, os Réus encontram-se obrigados a reconstituir a situação da Autora que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, o que significa que no ordenamento jurídico nacional a lei privilegia a reconstituição natural.
Essa indemnização, em função do disposto no art. 564º, n.º 1 do Cód. Civil, abrange, não só os prejuízos causados à Autora (danos emergentes ou diretos, ou seja, a diminuição do património já existente na esfera jurídico-patrimonial desta), como os benefícios que a mesma deixou de obter em consequência da lesão, ou seja, os ganhos que se frustraram, ou dito por outras palavras, os prejuízos que lhe advieram por não ter visto aumentado o seu património em consequência da lesão (lucros cessantes).
Precise-se que quando a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor, manda o art. 566º, n.º 1 do Cód. Civil que a indemnização seja fixada em dinheiro.
O art. 566º, n.º 2 do Cód. Civil consagra, em sede de indemnização em dinheiro, a denominada “Teoria da Diferença”, estabelecendo que aquela indemnização em dinheiro terá como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado (situação patrimonial real em que se encontra a Autora na sequência daquela intervenção cirúrgica, constitutiva da responsabilidade indemnizatória) e a que teria se não existissem danos (situação hipotética em que se encontraria se não fossem os danos sofridos). “Quer dizer que a diferença se estabelece entre a situação real atual e a situação hipotética correspondente ao mesmo momento” (16).
Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior (n.º 2 do art. 564º do CC).
Nos casos em que não possa ser averiguado o valor exato dos danos (em função do critério da teoria da diferença), o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (nº 3 do art. 566º do CC), funcionando a equidade, em sede de danos patrimoniais, como critério residual, apenas para o caso de não ter sido possível averiguar o valor exato dos danos (17).
Enunciados que estão os critérios a que há-de presidir a indemnização a fixar à Autora pelos danos patrimoniais que sofreu em consequência do referido comportamento ilícito, culposo e danoso do Réu E. M., cumpre entrar na apreciação da concreta questão suscitada pela apelante seguradora.
O conceito de dano biológico surgiu em Itália, sendo proclamado pela primeira vez em sentença proferida pelo Tribunal de Génova de 25/05/1974, num contexto de uma situação específica do ordenamento jurídico italiano em que o sistema ressarcitório dos danos não patrimoniais era muito fechado (18).
No ordenamento jurídico nacional não existe consenso sobre a categoria em que deve ser inserido o dano biológico e, consequentemente, quanto à forma daquele ser ressarcido.
Com efeito, a maioria da jurisprudência e alguma doutrina têm considerado o dano biológico como tendo cariz patrimonial, argumentado que mesmo quando não exista uma repercussão negativa a nível salarial ou na atividade profissional do lesado, por não se estar perante uma incapacidade para a sua atividade profissional concreta, o dano biológico, na medida em que constitui uma lesão de bens eminentemente pessoais do lesado (uma lesão da sua saúde), implica para o lesado uma deficiente ou imperfeita capacidade de utilizar o seu corpo, no desenvolvimento das atividades pessoais em geral, com uma consequente e igualmente previsível maior penosidade, dispêndio e desgaste físico na execução das tarefas que, no antecedente, vinha desempenhando com regularidade.
Sustenta-se que a referida incapacidade funcional do lesado reflete-se nos mais variados aspetos da sua vida, desde logo, na sua capacidade laboral, que lhe permite auferir rendimentos, mas também na sua vida pessoal, familiar, social, de lazer, etc..
A pessoa assim afetada está em inferioridade perante as outras pessoas, mesmo que não desempenhe qualquer atividade laboral: ou não consegue desempenhar as mesmas atividades, fazer o que elas fazem, ou fazem-no, mas com maior dificuldade, sendo obrigada a despender maior esforço.
Segundo esta jurisprudência e doutrina, o dano biológico constitui uma verdadeira “capitis deminutio”, num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando, de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha e evolução profissional expectável e, nessa medida, restringe o leque de oportunidades profissionais à disposição do lesado, erigindo-se, deste modo, em fonte atual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais.
De acordo com esta corrente jurisprudencial, o dano biológico deve ser sempre valorado em sede patrimonial, independentemente da pessoa lesada com esse tipo de incapacidade, na altura do acidente, desempenhar ou não atividade remunerada, designadamente, por estar reformada (19).
Outra corrente sufraga que o dano biológico pode ser indemnizado como dano patrimonial ou compensado como dano não patrimonial, segundo uma análise casuística. Em função das consequências da lesão, entre patrimoniais e não patrimoniais, varia também a indemnização do dano biológico (20).
Finalmente, existe quem sustente que o dano biológico como dano base ou dano evento, deve ser ressarcido autonomamente, constituindo como que um tertium genus, não subsumível à categoria dos danos patrimoniais ou não patrimoniais, devendo ser indemnizado de per se (21).
Precise-se que somos sensíveis aos argumentos aduzidos pela primeira corrente jurisprudencial acima enunciada e que, aliás, é a corrente maioritária, uma vez que perscrutadas as realidades da vida não descortinamos nenhuma situação em que o ser humano não careça de trabalhar para prover ao seu sustento e necessidades e, bem assim do seu agregado familiar.
Na tenra idade e na juventude, o ser humano prepara-se para a sua vida profissional futura.
Na idade adulta, trabalha, ou estando desempregado, tem forçosamente de procurar trabalho.
Caso não exerça atividade profissional remunerada, como é o caso das domésticas, tem de prover à educação dos filhos e à satisfação das necessidades do lar, fazendo a lide doméstica, indo às compras, etc.
No outono da vida, após uma vida de trabalho, estando reformado, o ser humano tem de continuar a trabalhar, agora dedicando-se às suas lides domésticas e familiares.
Pretender-se que as crianças ou os jovens, no momento do evento constitutivo da obrigação indemnizatória, não trabalham e que, consequentemente, não têm direito a uma indemnização pela frustração da capacidade de ganho futura é esquecer-se, desde logo, que se limita as próprias capacidades de uma criança ou jovem de aprender e se habilitar convenientemente ao desempenho futuro de uma atividade profissional (um jovem doente ou afetado na sua capacidade funcional, em regra, não tem a mesma disponibilidade física e mental para aprender que aqueles que não padeçam de semelhantes handicaps) e, bem assim que essas crianças ou adolescentes, no futuro, irão ter de, necessariamente, trabalhar para prover às suas necessidades e do seu agregado familiar e que ao afetar-se a sua capacidade funcional, se limita irremediavelmente as suas hipóteses futuras de granjearem trabalho e, sobretudo, de granjearem trabalho futuro condigno e adequadamente remunerado. Aliás, sendo a seguradora apelante entidade empregadora, já que como seguradora que é, certamente que terá centenas ou milhares de trabalhadores ao seu serviço, numa seleção de trabalhadores, certamente que seleciona os candidatos saudáveis, com 100% da sua capacidade funcional intacta, em detrimento daqueles outros que, por doença ou acidente, têm essa sua capacidade funcional reduzida – estes últimos apenas serão contratados caso o Estado dê vantagens económicas à entidade empregadora ou caso esses trabalhadores se disponham a receber uma contrapartida económica mais reduzida em relação àquela remuneração que é paga aos trabalhadores com 100% de capacidade funcional intacta e, ainda assim, caso se disponham a fazer um maior esforço para atingirem níveis de produtividade próximos daqueles outros, saudáveis, sob pena de serem a breve trecho dispensados pela sua entidade empregadora.
Pretender-se que as domésticas ou os reformados não trabalham, é reduzir o valor do trabalho doméstico que os mesmos têm, necessariamente, de desempenhar para prover às suas necessidades diárias e as do seu agregado familiar.
No entanto, esse trabalho doméstico – educação dos filhos, limpeza da casa, confecionar as refeições, cuidar dos filhos ou dos netos, etc. -, tem indiscutivelmente um valor pecuniário, tanto assim que quando ambos os membros do casal trabalham ou em caso de impossibilidade, designadamente, por via das incapacidades funcionais que os afetam, não conseguem satisfazer esse trabalho doméstico e têm de se socorrer de terceiros para o executar, os mesmos têm de pagar a esses terceiros remuneração correspondente a essa atividade que lhes prestam.
Argumentar-se que o tribunal a quo aceitou a conceção do corpo como “instrumento de trabalho” é argumento manifestamente falacioso uma vez que, na sociedade hodierna, o corpo dos trabalhadores, tal como uma máquina, é efetivamente encarado pelas empresas e pela sociedade em geral, única e exclusivamente, como “instrumento de trabalho” – os trabalhadores valem pela sua capacidade produtiva e o trabalho por eles proporcionado têm uma valor económico e vale por esse valor económico.
Argumentar-se que em caso de acidente e de redução da capacidade funcional, o trabalhador que não sofra ablação na sua remuneração não deve ser indemnizado pela perda da capacidade futura de ganho é, na nossa perspetiva, um falso argumento.
Com efeito, conforme resulta das leis laborais, em caso de acidente de trabalho que afete o trabalhador na sua capacidade de ganho, a LAT assegura aos trabalhadores uma indemnização por essa perda (art. 17º da Lei n.º 100/97, de 13/09).
No entanto, segundo essas mesmas leis laborais, a entidade empregadora está proibida de reduzir a remuneração do trabalhador assim afetado (art. 36º daquela Lei n.º 100/97).
O argumento de que em caso de incapacidade funcional emergente de facto danoso que não determine a redução do nível salarial do trabalhador, não confere ao lesado direito a receber indemnização pela perda da capacidade de ganho futura deste, esquece, assim, que no âmbito da própria legislação do trabalho, apesar de, por lei imperativa, ser assegurado ao trabalhador que, em consequência de acidente de trabalho, sofra IPP, ITA ou ITP, seja indemnizado por via dessa incapacidade (direito este que tem, inclusivamente, feição indisponível para o trabalhador, que a ele não pode renunciar), está vedado à entidade empregadora reduzir a remuneração desse trabalhador, apenas assistindo à entidade empregadora o direito de pôr termo ao contrato de trabalho que tem com esse trabalhador quando este fique incapacitado definitiva e permanentemente para todo e qualquer trabalho (em que o contrato de trabalho caduca automaticamente), ou quando fique incapacitado definitiva e permanentemente para o seu trabalho habitual, em que o contrato de trabalho apenas caduca caso não seja possível proceder à sua reconversão profissional para posto de trabalho compatível com a incapacidade funcional que o afeta.
Essa visão das coisas olvida que esta salvaguarda legal dos trabalhadores é meramente aparente, como certamente não o desconhece o legislador, uma vez que os trabalhadores assim afetados, ou se esforçam para produzir, mantendo níveis de produção semelhantes aos demais trabalhadores sem qualquer afetação funcional ou, a breve trecho, serão dispensados pelas respetivas entidades patronais (é isto que demonstram as regras da experiência comum acontecer), enfrentando graves e acrescidas dificuldades para granjearem novo trabalho dada a incapacidade funcional que os afeta.
Mais olvida que esses trabalhadores terão de fazer esforços acrescidos para manter os níveis de produção próximos, se não iguais/semelhantes, que os trabalhadores, seus colegas, com a respetiva capacidade funcional intacta e que, na sua vida familiar e quotidiana e, inclusivamente, de lazer, ainda que já aposentados, terão de fazer esforços acrescidos para fazer a sua lide doméstica, designadamente, as refeições, limpeza da casa, educar os filhos, os netos, criar os seus animais domésticos, praticar o seu desporto, darem o seu passeio, etc.
Acresce que no caso, conforme se retira da factualidade provada, a Autora trabalhava à data do facto constitutivo da obrigação indemnizatória, só deixando de o fazer em consequência da total incapacidade que lhe adveio das lesões e desde a realização da intervenção cirúrgica realizada em 05/08/2010 (cfr. pontos 1, 64 e 65 da matéria apurada), pelo que encontrando-se a mesma afetada, em consequência das lesões emergentes do comportamento inadimplente do Réu E. M., de uma IPG de 11,80 pontos, a qual a irá acompanhar até aos últimos dias da sua vida (cfr. pontos 60 e 61), é indiscutível que aquela, até ao últimos dias da sua vida, não só irá ter de desenvolver esforços acrescidos para realizar as tarefas próprias que um ser humano realiza nos seus momentos de lazer, na sua vida doméstica e familiar, como irá enfrentar dificuldades acrescidas para arranjar trabalho e, caso o consiga, para manter os níveis de produtividade semelhantes aos dos restantes trabalhadores que não padeçam de qualquer afetação nessa sua capacidade profissional, caso pretenda assegurar o seu posto de trabalho.

Resulta do que se vem dizendo que nenhuma censura nos merece a sentença recorrida quando nela se atribui uma indemnização pelo dano patrimonial futuro (perda da capacidade de ganho futura) sofrida pela Autora por via da IPG com que se encontra afetada em consequência do comportamento ilício e culposo do Réu E. M., improcedendo os argumentos aduzidos pela apelante a este respeito.

B.1.6- Do cálculo da indemnização pela perda da capacidade de ganho futura da Autora.

Sustenta a apelante que a indemnização arbitrada à Autora a título de perda da capacidade de ganho futura desta, por via do dano biológico com que se encontra afetada se mostra excessiva, uma vez que no cálculo dessa indemnização se considerou que a esperança média de vida daquela ascendia aos 84 anos, quando, pretensamente, atendendo ao seu ano de nascimento (1968), essa esperança de vida ascende a apenas a 70,3 anos de idade, e em virtude de não se ter considerado que aquela irá receber a indemnização de uma só vez e, consequentemente, poderá colocar o dinheiro a render, percebendo o respetivo juro.
O dano futuro decorrente da perda da capacidade de ganho da Autora por via da incapacidade com que se encontra afetada terá de ser quantificado com recurso à equidade (arts. 564º, n.º 2 e 566º, n.º 3 do CC.).
A propósito da determinação desta indemnização a jurisprudência é uniforme que uma justa indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a lesada não irá auferir e que se extinguirá no final do período provável da sua vida (não da vida ativa da lesada, já que não é razoável ficcionar-se que a vida física desaparece no mesmo momento e com ela todas as suas necessidades), posto que só assim se logrará, na verdade, reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (22).
Mais se tem considerado que a “equidade intervém, necessariamente, na medida em que há que assentar no tempo provável de vida da vítima, na diferença que, em cada época futura, existirá entre o rendimento auferido e o que auferiria se não tivesse sido a lesão e, por fim, na evolução da unidade monetária em que a indemnização se irá exprimir” (23).
Na concretização desta indemnização, porém, uns têm recorrido a fórmulas matemáticas e financeiras (o que possibilita a uniformidade de julgados e uma maior facilidade de cálculo), outros à equidade, e outros, ainda, a ambas as possibilidades, conjugando-as (24).
Contudo a posição jurisprudencial maioritária é aquela que considera que o recurso a fórmulas matemáticas não constitui um critério absoluto, devendo as mesmas ser aplicadas como meros índices ou parâmetros, que carecem de ser temperados mediante o recurso a um juízo de equidade, uma vez que na avaliação dos prejuízos o juiz deve atender sempre à multiplicidade e à especificidade das circunstâncias que concorrem no caso concreto e que o tornam único e diferente, além de que não se pode desvincular do critério da equidade que é erigido pelo legislador no art. 566º, n.º 3 do CC. como critério a seguir na fixação deste tipo de indemnização (25), posição que sufragamos.
Aduz a apelante que atenta a data de nascimento da Autora - 01/08/1968 -, a esperança média de vida daquela ascende a 70,3 anos, uma vez que a esperança média de vida de 83,2 anos considerada pelo tribunal a quo respeita aos membros do sexo feminino nascidos apenas em 2014, e neste aspeto assiste-lhe razão, conforme se pode ver das estatísticas públicas pela PORDATA, acessíveis na Internet.
Deste modo e na senda do que se vem dizendo, no cálculo da indemnização, com recurso à equidade, nos termos do disposto no art. 566º, n.º 3, do CC, iremos socorrer-nos, como critério objetivador, aferidor e orientador, com vista a evitar subjetivismos, de várias fórmulas matemáticas, a saber: a enunciada no Ac. STJ. de 04/12/2007, Proc. 07A3836, in base de dados da DGSI, a prevista nos estudos efetuados pelo Dr. Sousa Dinis, in CJ/STJ, 1997, t. II, págs. 11 e ss e as enunciadas na Lei dos Acidentes de Trabalho.
Precise-se que o recurso a essas fórmulas é meramente indicador e instrumental, já que o critério que vai presidir, até por imposição legal, à fixação desta concreta indemnização é a equidade.
No cálculo da indemnização impõe-se considerar, a idade da Autora à data do evento: 42 anos;
A esperança média de vida daquela: 29 anos;
O rendimento anual por ela auferido à data do evento: 6.852,00 euros;
A incapacidade permanente com que se encontra afetada: 11,8 pontos;
A circunstância que irá receber de uma só vez a totalidade da indemnização, a qual se reporta, em grande medida, a um dano futuro, o que lhe permitirá rentabilizar a quantia recebida em termos financeiros; e
O facto da remuneração mensal auferida pela Autora à data do evento não se iria manter estática no tempo, mas sofreria inevitáveis atualizações, até porque essa remuneração era modesta, em pouco excedendo o salário mínimo nacional vigente à data do evento.
Tudo ponderado e sopesado, apelando ao critério da equidade que deverá presidir à fixação da indemnização pela perda da capacidade aquisitiva futura, temos como justo, adequado e proporcional fixar a indemnização devida à Autora em 21.000,00 euros.

B.1.7- Da compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pela Autora.

Sustenta a apelante que a compensação arbitrada pelo tribunal a quo à Autora, no montante de 60.000,00 euros, peca por excesso, tendo em consideração a dimensão dos danos não patrimoniais por esta sofridos e os critérios jurisprudenciais seguidos nesta matéria, concluindo que essa compensação deverá ser reduzida a valor que não exceda os 30.000,00 euros.

Por sua vez, a Autora sufraga que aquele montante compensatório é insuficiente para a compensar por todos os danos não patrimoniais sofridos e que continuará a sofrer e reclama que essa compensação seja aumentada para 175.000,00 euros.
Antes de avançarmos na fixação desta compensação, impõe-se ter presente que os danos não patrimoniais não atingem o património do lesado e são insuscetíveis de avaliação pecuniária e correspondem à angústia, à dor física, à doença, ao vexame, à perda de prestígio ou de reputação, ao abalo psíquico-emocional, ao luto, à dor da perda de um ente amado.
A indemnização por danos não patrimoniais reveste uma natureza acentuadamente mista: por um lado visa reparar, de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada, e por outro não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, o agente (26).
Nos termos do disposto no art. 496º, n.º 1 do Cód. Civil, nem todos os danos não patrimoniais são compensáveis, mas apenas aqueles que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito.
Essa gravidade deve aferir-se por um grau objetivo e não por um padrão subjetivo, derivado de uma sensibilidade requintada ou embotada, mas a compensação a arbitrar deverá ser significativa, até para se atingir aquela finalidade sancionatória.

Por outro lado, concluído que seja que um determinado dano não patrimonial é suscetível de ser compensado, nos termos do disposto no art. 496º, n.º 3, essa compensação será fixada pelo tribunal por recurso à equidade, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494º, designadamente o grau de culpabilidade do agente, a situação económica do lesante e a do lesado.
Resulta do que se vem dizendo, que a compensação a fixar por danos não patrimoniais sofridos pelo lesado, mais uma vez, não obedece a critérios matemáticos, mas à equidade, o que se revela tarefa árdua imposta ao julgador, até pela diversidade de situações com que se vê confrontado, onde, raras vezes, se depara com casos idênticos.
Não obstante essas dificuldades, impõe-se analisar o caso concreto e compará-lo por referências a casos idênticos/semelhantes tratados na jurisprudência, por forma a não cair em subjetivismos e em violações dos princípios da igualdade e da segurança jurídicas, sabendo-se que casos idênticos reclamam tratamento jurídico idêntico e, por conseguinte, compensações idênticas, devendo, nessa fixação, ter-se em conta, além dos padrões adotados pela jurisprudência, a flutuação do valor da moeda, a gravidade do dano tendo em conta as lesões sofridas, as suas sequelas e o sofrimento físico-psíquico experimentado pela vítima, bem como outras circunstâncias do caso que se mostrem pertinentes (27).
Na situação presente, em sede de danos não patrimoniais sofridos pela Autora, relevam os seguintes factos:
Foi submetida a uma mamoplastia em 05/08/2010 (ponto 1);
Desde 05/08/2010 até novembro de 2010 sofreu dores e esteve sempre a tomar antibióticos e anti-inflamatórios por via do comportamento inadimplente do Réu E. M., em virtude de embora a intervenção cirúrgica atrás referida dar dor, esta é normalmente ligeira e melhora com o uso de analgésicos comuns (pontos 2 a 27, 29 e 87);
Em novembro de 2010, a Autora efetuou nova cirurgia (a 2ª) para remoção da prótese (ponto 29);
Após esta intervenção cirúrgica a Autora ficou durante um mês sem prótese (ponto 30);
Continuou com dores e a tomar antibióticos (ponto 31);
Em dezembro de 2010 foi submetida a nova cirurgia (a terceira) para recolocar a prótese (ponto 32);
Continuou a ter dores, que cada vez eram mais fortes, e a mobilidade do braço piorou (pontos 33 e 34);
Durante um mês fez deslocações, todas as semanas, de Mirandela a Vila Nova de Famalicão e, algumas vezes, duas vezes por semana, para se submeter a tratamentos (ponto 35);
Em 02/02/2011, realizou nova intervenção cirúrgica (a quarta) para remoção da prótese e limpeza da ferida (ponto 43);
Ficou sem peito durante quase nove meses, bem com uma cicatriz de grandes dimensões (pontos 46 e 47);
Em 26/10/2011 foi submetida a nova cirurgia (a 5ª) para colocação de um expansor mamário, com o objetivo de fazer a expansão da pele entretanto retirada (ponto 48);
Teve de se deslocar de 26/10/2011 até fevereiro de 2012, todas as semanas, de Mirandela a Coimbra, para tratamentos (pontos 46 a 50);
Em 12/11/2014, teve de ser submetida a nova cirurgia (a 6ª) para remoção do expansor e aplicação de duas próteses, uma vez que a pele não obteve elasticidade suficiente, devido ao tecido necrosado e à infeção (pontos 51, 53 e 88);
Desde 05/08/2014 sentiu dores e mau estar e sentiu-se afetada na sua estética e na sua auto-estima, não conseguindo ir à praia ou vestir “biquíni”, sequer praticar desporto (pontos 54 a 57);
Vive atormentada com a perceção de que o seu corpo se encontra distorcido e deformado, sentindo vergonha de o ver e exibir (pontos 58 e 59);
Ficou afetada de danos físicos irreparáveis e irreversíveis, que a vão acompanhar durante toda a vida e que lhe determinam uma incapacidade permanente de 11,80 pontos (pontos 60 a 61).
Sentiu tristeza e sente-se revoltada e amargurada, o que gerou o afastamento dos seus filhos e marido (pontos 67 a 69); e
Ficou com prejuízo da sua atividade sexual em grau 2 numa escala de 7 pontos, o que lhe gera sofrimento e dor (pontos 70 e 71).

Temos, assim, como factos preponderantes emergentes da factualidade que se acaba de transcrever para efeitos de determinação do quantum compensatório, a circunstância de durante mais de quatro anos, mais concretamente, entre 05/08/2010 até 12/11/2014, a Autora se ter visto confrontada com um quadro de dor, tomada constante de analgésicos e anti-inflamatórios, deslocações frequentes a hospitais para tratamentos, insegurança por ver o seu quadro clínico não resolvido e a agravar-se, realização de seis intervenções cirúrgicas, ficou sem peito durante quase nove meses e com uma extensa cicatriz, além de ter ficado a padecer com uma incapacidade permanente de 11,8 pontos, com um prejuízo sexual de grau 2 numa escala de 7 pontos de gravidade crescente.
Acresce que a Autora sentiu-se, e sente-se, afetada na sua estética e na sua auto-estima, não conseguindo ir à praia ou vestir “biquíni”, sequer praticar desporto, vivendo atormentada com a perceção de que o seu corpo se encontra distorcido e deformado, sentindo vergonha de o ver e de o exibir, além de ter sentido tristeza e sente-se revoltada e amargurada, o que gerou o afastamento dos seus filhos e marido.
Note-se que tudo isto ocorre numa pessoa do sexo feminino, que à data daquela intervenção cirúrgica contava 42 anos de idade, sendo, por conseguinte, pessoa ainda na média idade e que manifestamente era (e é) pessoa que se preocupava (e preocupa) com o seu visual, tanto assim que se submeteu a uma intervenção cirúrgica do foro estético aos seios, manifestamente para melhorar o seu visual, eliminando ou atenuando as inevitáveis sequelas que o decorrer do tempo acarreta.
Destaque-se que aquela intervenção cirúrgica foi efetuada aos seios, símbolo da sexualidade feminina, pelo que é manifesto que as repercussões tidas na pessoa da Autora não deixaram de ser extremamente relevantes, sobretudo, a circunstância desta ter ficado sem peito durante quase nove meses, o que não deixa de ser traumático para qualquer mulher.
Tudo isto foi causado pelo Réu E. M., médico, que se dispôs a efetuar uma intervenção cirúrgica estética aos seios da Autora, com vista a melhorar o seu visual e que assim tanto o e a prejudicou.
Os danos morais sofridos pela Autora são inquestionavelmente intensos, como intensas são as respetivas consequências ao nível da sua saúde, integridade física e moral, bens esses tutelados pelo art. 70º, n.º1 do CC, tudo para quem prezava (e preza) o seu aspeto físico, sem dúvida erigido como elemento fundamental na sociedade contemporânea, sobretudo em relação ao sexo feminino, mas cuja mais valia era exacerbada pela Autora, ao ponto desta se ter disposto a se submeter, e se submeteu, a uma intervenção cirúrgica estética, com os inerentes riscos e sofrimentos que lhe estão associados, os quais a mesma certamente não ignorava, querendo-os, contudo correr, pela mais-valia que daí adviria para o seu aspeto físico, aspeto esse que aquela prezava (e preza), pelo que o Réu E. M., não podia desconhecer, sequer desconhecia, a importância que o aspeto físico tinha (e tem) para a Autora.
No entanto, o Réu E. M., em vez de melhorar o aspeto físico da Autora, prejudicou-o e acarretou-lhe os consideráveis prejuízos físicos e morais acima descritos.
Porém, como se referiu, na fixação da compensação, cientes de quão difícil é proceder a essa fixação e encontrar quadros semelhantes/idênticos tratados na jurisprudência, porque se impõe afastar subjetivismos e assegurar os princípios da igualdade e da segurança e certezas jurídicas, impõe-se ter presente os critérios jurisprudenciais seguidos nesta matéria.
Ora, no Ac. de 27.11.2011, Processo n.º 2572/07.OTBTVD.L1, o STJ. fixou uma compensação relativa a danos não patrimoniais em 30.000,00 euros, relativamente a um jovem que teve um período de tratamento particularmente penoso, com intervenções cirúrgicas, acamamento, imobilização, enjoos, dores em grau 3 numa escala até 7 e sequelas permanentes com gravidade relativa.
Já no Ac. de 7.10.2010, Processo n.º 370/04.1TBVGS.C1, aquela mesma instância superior fixou a compensação em 50.000,00 euros, relativamente a uma pessoa de 29 anos que sofreu várias fraturas e um traumatismo crâneo-encefálico, com inerentes dores (de grau 5 numa escala até 7); esteve hospitalizado duas vezes, foi sujeito a intervenções cirúrgicas e a tratamento em fisioterapia; teve de se deslocar, por longo tempo, com o auxílio de canadianas; ficou, como sequelas permanentes, com cicatrizes na perna, claudicação da marcha, dificuldade em permanecer de pé, em subir e descer escadas e, bem assim, impossibilitado de correr e praticar desporto que antes praticava e passou, de alegre e comunicativo, a pessoa triste, desconcertado e ansioso.
No Ac. de 27.5.2010, Processo n.º 8629/05.4TBBRG.G1.S1, essa Instância Superior, fixou em 60.000,00 euros, a compensação relativa a sinistrado com 16 anos de idade, que sofreu fratura basicervical do fémur esquerdo e traumatismo craniano com perda de consciência; teve de andar de canadianas três meses e fazer fisioterapia, ficou a apresentar marcha viciosa e marcadamente claudicante, dismetria dos membros inferiores, báscula da bacia com rotação e maior saliência da anca esquerda, desvio escoliótico com dor na palpação lombar, atrofia dos nadegueiros à esquerda, atrofia da coxa e da perna esquerdas e marcada rigidez da anca esquerda. Ficou ainda, com incapacidade para corrida, para se ajoelhar e adotar posição de cócoras, dificuldade marcada na permanência de pé, alterações sexuais devido às dificuldades de posicionamento, impossibilidade de poder praticar desportos que impliquem esforço físico, sensação de tristeza, vergonha e revolta bem como frustração e medo no contacto com o sexo oposto. Tem necessidade de nova intervenção cirúrgica, de continuar a fazer fisioterapia, de adaptação automóvel para poder conduzir; não frequenta praias pela dificuldade em caminhar na areia e pela vergonha de exibir o seu corpo; não frequenta piscinas, não participa em jogos de futebol e está impossibilitado de carregar pesos. Era alegre e extrovertido e passou a ser mal-humorado e agressivo, com pesadelos frequentes, insónias e tendências para o isolamento, lendo e escrevendo com dificuldade.
Por sua vez, no Ac. de 13/07/2017, Proc. 3214/11.4TBVIS.C1.S1, aquele Tribunal arbitrou uma compensação de 60.000,00 euros, a lesado em consequência de acidente de viação que, à data do evento, contava 36 anos de idade e que, em consequência desse acidente, sofreu lesões que lhe demandaram a realização de exames, tratamentos e cirurgias, que lhe determinaram, pelo menos, 152 dias de internamento, sofrendo um quantum doloris de grau 7 numa escala de 7 graus de gravidade crescente; um dano estético fixável no grau 4, numa escala de 7 graus de gravidade crescente; sofreu um prejuízo de afirmação pessoal fixável no grau 4, numa escala de 5 graus de gravidade crescente; andou 2/3 meses de cadeira de rodas e alguns meses de canadianas e que em consequência do acidente e lesões dele emergentes, ficou, como sequela, a ter erecções mais lentas e não tão rígidas que as que antes do acidente tinha, ficando portador de uma repercussão na atividade sexual fixável no grau 3, numa situação de gravidade crescente.
Refira-se que atentos os critérios jurisprudenciais acabados de enunciar, mal se compreende quais os concretos critérios a que a Autora se socorreu para pretender que a compensação a ser-lhe arbitrada seja aumentada para 175.000,000 euros, valor este que se mostra totalmente desconforme aos critérios jurisprudenciais seguidos nesta matéria.
Ao invés, não podemos deixar de concordar com a apelante seguradora que o montante compensatório fixado pelo tribunal a quo nos 60.000,00 euros, se mostra excessivo atenta a dimensão dos danos não patrimoniais sofridos pela Autora e os padrões jurisprudenciais seguidos nesta matéria.
Atentos esses padrões, considerando que os danos acima enunciados foram causados à Autora no âmbito de uma cirurgia estética efetuada aos seios, símbolo sexual da mulher, determinando-lhe que ficasse sem seios durante cerca de nove meses, afetando-a, de modo definitivo, na sua estética ao nível dos seios, quando a imagem, sobretudo, da mulher, é elemento erigido como “alfa e ómega” na sociedade hodierna, imagem essa exacerbada pela Autora ou ponto de se ter submetido a uma intervenção estética aos seios, do que lhe resultou prejuízo para a sua imagem, em vez de benefício, determinando-lhe um prejuízo sexual de grau 2, além do quadro doloroso acima referido, entendemos como justo, adequado, proporcional, mas suficiente, fixar a compensação devida à Autora por todos os danos não patrimoniais sofridos e que irá continuar a sofrer em 45.000,00 euros.
Resultado do que se vem dizendo, proceder parcialmente a apelação interposta pela Ré seguradora, e improceder, in totum, a apelação da Autora.

B.1.8- Da dedução da quantia de dez mil euros paga pela seguradora no âmbito dos autos de providência cautelar à indemnização ora fixada à Autora.

Sustenta a apelante seguradora que a quantia de dez mil euros que pagou à Autora no âmbito dos autos de procedimento cautelar apensos carece de ser descontada, na sua totalidade, ao montante indemnizatório que foi arbitrada à última nos presentes autos principais.
Como acima ficou dito, improcedem os argumentos aduzidos pela apelante quanto à invocada nulidade do segmento decisório da sentença proferida pelo tribunal a quo quando ordena a não dedução daquela quantia à indemnização fixada à Autora.
No entanto, sem grande esforço interpretativo, é manifesto improceder a tese da apelada quando pretende que aqueles dez mil euros lhe foram pagos exclusivamente para custear a intervenção cirúrgica para remoção do expansor e colocação das duas próteses, intervenção cirúrgica essa que realizou em 12/11/2004.
Que assim não é, decorre, desde logo, do teor da cláusula 1ª, al. a) da transação que aquela Autora celebrou com os Réus no âmbito dos autos de procedimento cautelar apensos, onde expressamente acordam que os mencionados dez mil euros se destinam, em primeira linha, a custear as despesas com aquela intervenção cirúrgica, mas também do pedido que aí vem formulado, onde as partes intervenientes nessa transação pedem que aquele valor de dez mil euros seja atendido “como liquidação provisória a imputar na indemnização a liquidar nos autos principais”.
Aliás, resulta da petição de procedimento cautelar, que a prestação provisória que a Autora reclamava naqueles autos se destinava a suprir as suas insuficiências económicas para realizar aquela intervenção cirúrgica de que se encontrava necessitada, mas, também, para prover às suas necessidades quotidianas e às do seu agregado familiar, conforme não se abstém de expressamente o afirmar no art. 61º da petição inicial apresentada nesse procedimento cautelar, onde alega que: “o objetivo da presente providência é de garantir a sobrevivência da requerente e realização da intervenção cirúrgica, até decisão final da ação principal…”, facto esse que reafirma no art. 66º do mesmo articulado, onde escreve: “Carece assim, a requerente de uma quantia mensal de cerca de 1.000,00 euros para fazer face às despesas com a intervenção cirúrgica a realizar, despesas médicas e medicamentosas, próteses, tratamentos e demais despesas do quotidiano, com o seu agregado familiar, em suma, sobreviver até à reparação final de todos os danos”, pelo que mal se compreende a postura da Autora, ao negar aquilo que é indiscutível e no que acordou.
Precise-se que na cláusula 1.b) da transação celebrada, Autora e Réus acordaram que a primeira se comprometia “a realizar a referida cirurgia e a dar do facto imediato conhecimento nos autos principais, juntando comprovativo”, o que bem se compreende, posto que, destinando-se aqueles dez mil euros pagos pela seguradora à Autora, em primeira linha, a que a mesma realizasse a intervenção cirúrgica e custeasse as inerentes despesas, havia que se determinar o custo dessas despesas, a fim desse custo ser deduzido aos apontados dez mil euros que a seguradora lhe entregou, sendo o diferencial assim calculado deduzido ao montante indemnizatório reclamado pela Autora nos presentes autos principais.
É isto e só isto que, reafirma-se, sem grande esforço interpretativo, se extrai da transação de fls. 31 a 37 dos autos de providência cautelar.
Deste modo, se não assiste razão à Autora quando pretende que aqueles dez mil euros que lhe foram entregues pela Ré seguradora se destinaram apenas e tão-só a custear a intervenção cirúrgica, não havendo nada a deduzir na indemnização arbitrada nos autos principais, também não assiste manifestamente razão àquela Ré seguradora quando pretende que aqueles dez mil euros terão de ser deduzidos, na íntegra, ao montante indemnizatório arbitrado à Autora na sentença recorrida, esquecendo que entregou à ultima os apontados dez mil euros para custear as despesas da intervenção cirúrgica a que a última tinha de se submeter e que apenas a parte que excedesse o custo dessa intervenção seria abatido ao montante indemnizatório a arbitrar à Autora no âmbito dos presentes autos principais.
Resulta do que se vem dizendo que, para além da quantia de 15.000,00 euros aludida na alínea b) da parte dispositiva da sentença proferida nos autos principais, impõe-se ainda deduzir aos montantes indemnizatórios identificados nessa sentença e a que se alude na alínea a) da parte dispositiva, o diferencial entre os dez mil euros que a Autora recebeu da Ré seguradora e a quantia que a mesma despendeu na realização da intervenção cirúrgica que realizou em 12/11/2014 e cuja fatura deverá juntar aos autos por forma a receber dos Réus o montante indemnizatório a que tem direito.
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Decisão:

Nestes termos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar a apelação interposta pela Ré “X – Companhia de Seguros, S.A.”, parcialmente procedente e, em consequência:

A- revogam a alínea a.1) da parte dispositiva da sentença recorrida, proferida a fls. 526 a 545, substituindo o que aí ficou decidido pela condenação solidária dos Réus Y – Prestação de Serviços Médico Cirúrgicos, Lda., E. M. e W Portugal – Companhia de Seguros, S.A. (com a atual designação de “X – Companhia de Seguros, S.A.”), no pagamento à Autora Maria da quantia compensatória de 45.000,00 (quarenta e cinco mil) euros, a título de danos não patrimoniais, sobre a qual acrescem juros moratórios, à taxa legal aplicável aos juros civis, desde a data da prolação daquela sentença até integral pagamento;
B- revogam a alínea a.4) da parte dispositiva da sentença recorrida, proferida a fls. 526 a 545, substituindo o que aí ficou decidido pela condenação solidária dos Réus Y – Prestação de Serviços Médico Cirúrgicos, Lda., E. M. e W Portugal – Companhia de Seguros, S.A. (com a atual designação de “X – Companhia de Seguros, S.A.”), no pagamento à Autora Maria da quantia compensatória de 21.000,00 (vinte e um mil) euros, a título de dano biológico, sobre a qual acrescem juros moratórios, à taxa legal aplicável aos juros civis, desde a data da prolação daquela sentença até integral pagamento;
C- para além da quantia de 15.000,00 (quinze mil) euros referida na al. b) da parte disjuntiva da sentença recorrida, determinam que às quantias fixadas em a) seja ainda deduzido o diferencial entre os dez mil euros que a Autora recebeu da Ré seguradora no âmbito dos autos de providência cautelar apensos e a quantia que a mesma Autora despendeu na realização da intervenção cirúrgica que efetuou em 12/11/2014;
D- confirmam o demais decidido na sentença recorrida.
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Custas da apelação por apelante seguradora e por apelada Autora na proporção do respetivo decaimento (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC), que se fixa em 50% para cada uma delas.
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Acordam em julgar a apelação interposta pela Autora, Maria, improcedente e, em consequência confirmam o que ficou decidido na sentença recorrida, com as alterações acima apontadas a propósito da apelação interposta pela apelante seguradora.
Custas desta apelação pela apelante Maria do Céu (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
Notifique.
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Guimarães, 18 de dezembro de 2017

(Dr. José Alberto Moreira Dias)
(Dr. António José Saúde Barroca Penha)
(Dra. Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha)


1. Neste sentido vide Ac. RL. de 29/10/2015, Proc. 161/09.3TCSNT.L1-2, in base de dados da DGSI.
2. Abílio Neto, in “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed., janeiro/2014, pág. 734.
3. Ac. STJ. 08/03/2001, Proc. 00A3277, in base de dados da DGSI.
4. Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, 5º vol., págs. 55 e 143.
5. Lebre de Freitas, “A Ação Declarativa Comum”, pág. 335.
6. Manuel Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, 1979, págs. 373 a 375
7. Teixeira de Sousa, in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, 1997, pág. 70. No mesmo sentido, vide Abílio Neto, in “Novo Código de Processo Civil Anotado”, 2ª ed., janeiro de 2014, págs. 24 e 25, onde se lê: “…seriam factos principais aqueles que integram o facto ou factos jurídicos que servem de base à ação ou exceção. Por seu turno, estes factos dividir-se-iam em essenciais e complementares, sendo os primeiros os que constituem os elementos típicos do direito que se pretende atuar em juízo e os segundos aqueles que, de harmonia com a lei, lhes conferem a eficácia jurídica necessária para fazer essa atuação. Ou seja, aquele denominador comum abrangeria não só a causa de pedir (os factos essenciais), mas também a procedibilidade da ação (os factos complementares). Tomemos como exemplo a separação de facto por um ano consecutivo como fundamento do divórcio sem consentimento de um dos cônjuges (…); será este o facto essencial. Mas, para a procedência da ação ter-se-á ainda de prova que durante esse ano não existiu comunhão de vida entre os cônjuges e que houve da parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer (…); estes serão os factos complementares”. Também Abrantes Geraldes in “Sentença Cível”, janeiro de 2014, acessível in Internet, e Ac. RC. de 23/02/2016, Proc. 2316/12.4TBPBL.C1, in base de dados da DGSI.
8. Ob. cit., pág. 70.
9. Abrantes Geraldes, in “Sentença Cível”, pág. 11.
10. Abrantes Geraldes, “Sentença Cível”, págs. 12 e 13.
11. António Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 4ª ed., 2017, pág. 153.
12. ob. cit., pág. 155.
13. Abrantes Geraldes, in ob. cit., pág. 159. No mesmo sentido vide Acs. S.T.J. de 18/11/2008, Proc. 08A3406; 15/09/2011, Proc. 1079/07.0TVPRT.P.S1; 04/03/2015, Proc. 2180/09.0TTLSB.L1.S2; 01/10/2015, Proc. 824/11.3TTLSB. L1. S1; 26/11/2015, Proc. 291/12.4TTLRA.C1; 03/03/2016, Proc. 861/13.3TTVIS.C1.S1; 11/02/2016; Proc. 157/12.8TUGMR.G1.S1, todos in base de dados da DGSI.
14. Ana Luísa Geraldes, “Impugnação e Reapreciação Sobre a Matéria de Facto”, in “Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, vol. IV, pág. 609.
15. Abrantes Geraldes, in “Sentença Cível”, janeiro de 2014, pág. 20.
16. Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 9ª ed., Almedina, págs. 936 e 937-
17. Ac. STJ. 19/02/2004, Proc. n.º 03B4271, in base de dados do ITIJ.
18. Ana Luísa Monteiro de Queirós, in “Do Dano Biológico”, 2013, págs. 6 a 34.
19. Acs. do STJ. de 10/10/2012, Proc. 632/10.G1.S1; 19/05/2009, Proc. 298/06.0TBSJM.S1; 10/07/2008, Proc. 08B2101; 04/10/2007, Proc. 07B2957; 09/11/2006, Proc. 08B3798; 06/05/1999, Proc 99B222; RP. de 07/07/2005, Proc. 0532146; 12/01/2006, Proc. 0536203; 04/10/2006, Proc. 0515426, RG. de 03/07/2014, Proc. 333/12.3TCGNR.G1, todos in base de dados da DGI. No mesmo sentido, Sinde Monteiro, “Estudos Sobre a Responsabilidade Civil”, onde escreve que “a indemnização por danos patrimoniais é devida mesmo que não se prove ter resultado da incapacidade física diminuição dos proventos da vítima”.
20. Neste sentido Ac. STJ. de 27/10/2009, Proc. 560/09.0YFLSB, da base de dados da DGSI.
21. Neste sentido Acs. STJ. de 13/07/2017, Proc. 3214/11.4TBVIS.C1.S1; de 20/05/2010, Proc. 103/2002. L1.S1, e de 23/11/2010, Proc. 456/06.8TBVGS.C1.S1, todos in base de dados, lendo-se no segundo que o dano biológico, perspetivado como diminuição somático-psíquica e funcional do lesado, com substancial e notória repercussão na via profissional de quem o sofre, é sempre ressarcível, como dano autónomo, independentemente do seu específico e concreto enquadramento nas categorias do dano patrimonial e não patrimonial.
22. Acs. STJ. de 10/11/2016, Proc. 175/05.2TBPSR.E2.S1; de 10/10/2012; de 03/12/200719/02/2004, RL. de 21/03/2012, Proc. 4129/06.3, todos in base de dados da DGSI; de 28/09/95, CJ/STJ, t. 3º, pág. 36, e de 25/09/2007, in base de dados do ITIJ.
23. Ac. STJ., de 25/06/2002, CJ/STJ, t. 2º, pág. 132.
24. Sousa Dinis, in “Dano Corporal em Acidentes de Viação, Cálculo de indemnizações, Situações de Agravamento”, in CJ/STJ, 1997, t. II, págs. 11 e ss.
25. Ac. STJ., 04/03/93, in AC/STJ, t. 1º, pág. 129.
26. Ac. STJ de 29/04/2004, in base de dados da DGSI.
27. Ac. STJ. de 13/07/2004, Salvador da Costa, in base de dados da DGSI.