Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1709/11.9TBVCT-B.G1
Relator: FERNANDO FREITAS
Descritores: ACTA DE JULGAMENTO
ABUSO DO DIREITO
CLÁUSULA ON FIRST DEMAND
JUIZ NATURAL
RECURSO
PROCEDIMENTOS CAUTELARES
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/24/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I.- O que está em causa no nº. 3 do artº.85º., do CIRE não é a legitimidade (passiva ou activa) para acção mas sim a legitimação do administrador para nela intervir em substituição do devedor, praticando os actos de disposição que a este cabiam.
II.- Tem efeito meramente devolutivo, por não caber na alínea d) do nº. 3 do artº. 692º., do C.P.Civil, e antes no nº. 1 do mesmo artigo, o recurso interposto, num procedimento cautelar comum, da decisão que revoga a providência anteriormente decretada, na sequência da oposição deduzida pelo requerido,
III.- Requerida pelo administrador da insolvência a apensação de uma acção e/ou procedimento cautelar a um processo de insolvência, o juiz daquela acção e procedimento cautelar mantém a competência própria para prosseguir com os seus termos já que é apenas ao juiz da insolvência que cabe decidir sobre o pedido de apensação e do momento em que ela é oportuna.
IV.- Assim, se o juiz do procedimento cautelar iniciou o julgamento, assistindo à produção de prova, deve prosseguir com a audiência até final e, pelo menos, fixar a matéria de facto, em obediência ao princípio da imediação e da plena assistência dos juízes, consagrado no artº. 654º., nº. 1, do C.P.Civil.
V.- Porque o procedimento cautelar não tem autonomia, deve ser imediatamente apensado à acção de que é dependente logo que ela seja intentada, passando a caber ao tribunal onde corre a acção a competência exclusiva para prosseguir com os termos do procedimento cautelar, no que se inclui o julgamento da oposição.
VI.- Quando a gravação da audiência tenha sido requerida pelas partes ou quando deva ser ordenada pelo tribunal, se a ela se não procede o acto é nulo, nos termos do artº. 201º., do C.P.Civil.
VII.- Esta nulidade não é do conhecimento oficioso e, sob pena de se dever considerar sanada, a sua arguição há-de obedecer às regras estabelecidas no artº. 205º., daquele Cód..
VIIII.- Sendo a acta da audiência de julgamento um documento autêntico se não for arguida a sua falsidade ela faz prova plena dos actos e requerimentos que regista e, a contrario, que para além deles não foi praticado outro acto ou formulado qualquer outro requerimento.
IX.- O juiz que julga a oposição à providência cautelar deve ponderar em conjunto as provas produzidas pelo requerente e as provas produzidas pelo requerido, relativamente aos factos que se contradizem, devendo reflectir na sua fundamentação o resultado dessa ponderação.
X.- Não tendo sido gravados os depoimentos, por se tratar de prova sujeita à livre apreciação do julgador, não pode o tribunal da Relação reapreciá-los.
XI.- A cláusula resolutiva de um contrato pode abranger tanto a situação de incumprimento definitivo como a de simples mora, o que torna desnecessária a interpelação admonitória prevista no artº. 808º., nº. 1, do Cód. Civil.
XII.- Só a prova inequívoca de comportamento fraudulento ou abusivo do beneficiário é que pode fundamentar a providência cautelar que visa impedir o pagamento da quantia assegurada por uma garantia on first demand.
XIII.- Não se pode dizer, sem mais, que actua com abuso do direito o promitente-comprador que considera verificada a condição resolutiva do contrato e o resolve, manifestando, porém, disponibilidade para negociar outro contrato, noutros moldes, ainda que com o mesmo objectivo do primeiro contrato.
Decisão Texto Integral:
- ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES -
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A) RELATÓRIO
“N…, Ldª.”, sociedade comercial com sede em Viana do Castelo, intentou procedimento cautelar comum contra “I…, Ldª.”, sociedade comercial com sede em Amadora, e o “Banco…, S. A.”, com sede em Lisboa, pedindo que:
1 – se declare inexistente o direito da 1ª. Requerida a executar a garantia bancária referida no artigo 16.º do requerimento inicial;
2 - se assim não se entender, que se intime a 1ª. Requerida a abster-se de provisoriamente accionar a garantia bancária identificada nos autos ou de qualquer forma interpelar a segunda requerida no sentido do seu pagamento, até decisão do processo principal;
3 - se, na pendência deste procedimento cautelar, tiver sido ordenado o pagamento da garantia bancária a favor da 1ª. Requerida, seja esta condenada a proceder à devolução à Requerente do montante de € 540.000,00; ou
4 - se assim não se entender, subsidiariamente, no caso de na pendência deste procedimento cautelar tiver sido ordenado o pagamento da garantia bancária a favor da 1ª. Requerida, seja esta condenada a depositar à ordem dos presentes autos o referido montante de € 540.000,00 até ao trânsito em julgado da sentença a proferir no âmbito da acção principal de execução específica do contrato-promessa de que o presente procedimento cautelar é dependente;
5 - ainda no caso de se ter verificado o pagamento da garantia bancária a favor a 1ª. Requerida, que seja esta condenada, a título acessório, numa sanção pecuniária compulsória, nos termos do disposto nos artigos 384º., nº. 2, do Código de Processo Civil e 829º.-A, do Código Civil, que se mostre adequada a assegurar a efectividade da providência decretada, em valor diário, atentos os montantes em causa, nunca inferior a € 5.000,00.
Tendo sido decidido não ouvir as Requeridas, com fundamento no disposto na 2ª. parte do artº. 385º., do C.P.Civ., foram produzidas as provas oferecidas pela Requerente, após o que foi julgado parcialmente procedente o procedimento cautelar, havendo-se condenado a 2ª. Requerida “Banco S.A.” a abster-se de entregar à 1ª. Requerida “I…, S. A.” qualquer importância que esta lhe peça ao abrigo da Garantia Bancária nº. N00352041, e sendo esta condenada a abster-se de pedir àquele Banco o pagamento de quaisquer quantias ao abrigo da mencionada garantia.
Citadas as Requeridas, apenas a “I…” deduziu oposição pedindo o levantamento imediato da providência decretada.
E, apreciadas as provas oferecidas por esta, a sua pretensão mereceu provimento, tendo sido decidido revogar a providência referida, ordenando-se o seu levantamento.
É desta decisão que vem o presente recurso, agora interposto pela “MASSA INSOLVENTE da N…, Ldª.” que pretende seja reposta a providência cautelar, nos termos inicialmente decididos, e seja julgada nula a decisão que julgou procedente a oposição, por “subsidiariamente, incompetência do juiz a quo, e/ou violação do princípio do juiz natural e na plena assistência dos juízes e/ou nulidade da gravação da prova, e/ou falta de fundamentação”.
A Requerida “I…” apresentou contra-alegações, propugnando para que se mantenha a decisão recorrida.
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
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B .- QUESTÕES PRÉVIAS
I.- Defende a Requerida/Apelada que o presente recurso não deve ser recebido por ilegitimidade da recorrente já que, nos termos do artº. 85º., nº. 3, do CIRE é o administrador da insolvência quem substitui o insolvente em todas as acções ali referidas.
Estabelece-se naquele dispositivo legal que o administrador da insolvência substitui o insolvente em todas as acções em que se apreciem questões relativas a bens compreendidos na massa insolvente e em todas as acções de natureza exclusivamente patrimonial intentadas pelo devedor e, bem assim, em todos os processos nos quais se tenha efectuado qualquer acto de apreensão ou detenção de bens compreendidos na massa insolvente.
Declarada a insolvência do devedor deve o juiz decretar a apreensão, para entrega imediata ao administrador da insolvência de todos os bens do devedor – cfr. alínea g) do artº. 36º., do CIRE.
Ao conjunto daqueles bens chama o artº. 46º. do mesmo Cód. “massa insolvente”.
Como património autónomo que é, a “massa insolvente” tem personalidade e capacidade judiciárias – cfr. artº.s 6º., alínea a) e 9º., ambos do C.P.Civil.
A “massa insolvente” é representada em Juízo pelo administrador da insolvência.
O que está em causa no nº. 3 do artº.85º., do CIRE não é a legitimidade (passiva ou activa) para acção mas sim a legitimação do administrador para nela intervir em substituição do devedor, praticando os actos de disposição que a este cabiam.
Com efeito, o conceito de legitimidade em direito adjectivo assenta na utilidade/prejuízo que deriva da procedência da acção.
Ora, in casu, a utilidade que deriva da procedência do recurso (e mesmo da acção de que o presente procedimento cautelar é dependente) não se reflecte, pelo menos directamente, na esfera patrimonial do administrador da insolvência.
Ainda na situação sub judicio o Administrador da Insolvência interveio, está no processo, e conferiu os poderes forenses ao Mandatário Judicial.
Termos em que se julga improcedente a excepção de ilegitimidade arguida pela Apelada.
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II.- Defende ainda a Apelada que ao recurso devem ser fixados efeitos meramente devolutivos.
O Meritíssimo Juiz que recebeu o recurso fixou-lhe efeitos suspensivos, acolhendo o propugnado pela Apelante.
Nos termos do artº. 692º., nº. 3, alínea d), do C.P.Civil, só têm efeito suspensivo os recursos interpostos do despacho que indefira liminarmente ou que não ordene a providência cautelar.
Sendo de presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (nº. 3 do artº. 9º., do Cód. Civil), se na alínea l) do nº. 2 do artº. 691º., do C.P.Civil expressamente refere ser admissível recurso do despacho que “determine o levantamento da providência”, é de crer que, se o quisesse, incluiria também esta situação na supra referida alínea d) do nº. 3 do artº. 692º..
Assim, muito embora acompanhemos a estupefacção da maioria dos Autores que se questionam sobre a utilidade da mencionada alínea d), o certo é que ela não abrange na sua previsão o recurso do despacho que ordena o levantamento da providência.
Por outro lado, aceitamos como boa a explicação dada por Abrantes Geraldes para justificar o efeito meramente devolutivo: “Tendo sido decretada e executada uma providência sem exercício do contraditório, o facto de o tribunal, perante a oposição deduzida, inverter o sentido da decisão é significativo quanto à perda do grau de verosimilhança que sustentava a decisão primitiva. Daí ser inteiramente adequado que a segunda decisão produza, em regra, efeitos imediatos …” (in “Recursos em Processo Civil” “Novo Regime”, 3ª. edição, 2010, pág. 279, nota 371).
Assim, se a Apelante pretendia obter o efeito suspensivo, para além de justificar o prejuízo considerável para si decorrente da execução da decisão, tinha igualmente de prestar caução, nos termos do nº. 3 do artº. 692º., do C.P.Civil, o que não fez.
Termos em que se fixa ao presente recurso o efeito meramente devolutivo.
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C) - CONCLUSÕES
I.- A Recorrente formulou as seguintes conclusões:
1.- A sentença a quo foi proferida, sem que o juiz a quo tivesse legitimidade para proferir tal decisão, importa a nulidade e consequente revogação da mesma.
1.1 - Na pendência do processo da oposição ao procedimento cautelar, o administrador de insolvência requereu a apensação ao processo de insolvência em 21 de Junho de 2011 em obediência ao artigo 85º., nº. 1 do CIRE fundamentando-o na importância que assume a garantia à primeira solicitação no valor de € 540.000,00 para a massa insolvente.
1.2 - Fazendo tábua rasa ao requerido o douto tribunal a quo proferiu despacho dizendo que nada há a ordenar a este aspecto devendo os autos prosseguir os seus tramites nomeadamente a realização da diligência de audiência de julgamento.
1.3 - Não suspendeu, nem adiou a diligência apesar de por força da apensação o juiz competente seria do 2º juízo e não aquele.
1.4 - Em 27-06-2011 foi proferido despacho pelo 2º juízo cível ordenando a apensação dos autos ao processo de insolvência
1.5 - O tribunal a quo em 30-06-2011 substituindo-se ao juiz titular do processo de insolvência, deu despacho no sentido que a apensação só se realizaria após prolação da decisão, o que fez em 04-07-2011, sendo notificada a sentença à recorrente em 06-07-2011.
1.6 - O intuito da apensação relaciona-se com a influência da decisão no valor da massa, sendo preponderante no decurso de um plano de insolvência.
1.7 - Violou e interpretou mal o artigo 85º do CIRE, violou o princípio par creditio creditorum, dando despacho em matéria para o qual não era competente.
1.8 - A sentença foi proferida em momento em que aquele juízo já não tinha competência, devendo ser revogada.
2. - A sentença é nula por violação do principio do juiz natural, do principio da plenitude de assistência de juízes e da imediação porquanto:
2.1 - Foi proferida decisão do procedimento cautelar pelo 2º Juízo Cível do Tribunal judicial de Viana do Castelo, e a decisão da oposição ao procedimento cautelar foi proferida pelo 1º juízo cível do mesmo tribunal.
2.2 - Foi requerida a apensação do processo ao processo de insolvência que corre termos no 2º juízo cível.
2.3 - A “assistência” é independente da gravação da prova produzida em sede de audiência e discussão de julgamento.
2.4 - A convicção do tribunal no julgamento da matéria de facto é formada pelos documentos juntos e provas produzidas mas também pela prova produzida em sede de audiência.
2.5 - Atendendo ao principio da livre apreciação do juiz quanto à prova testemunhal, só pode intervir na decisão da matéria de facto o juiz que tenha assistido a todos os actos de instrução e discussão praticados, ou seja o juiz que julgou a providencia cautelar será o único que poderá julgar a sua oposição, pois apenas este tem presente toda a prova produzida, e poderá com elevado grau de certeza fundamentar a sua decisão face aos elementos de prova contraditórios, nomeadamente na apreciação da prova testemunhal.
2.6 - O principio da plenitude de assistência do juiz está fundado no dever de fundamentação e motivação, pelo que na sentença devem ser considerados os factos provados na audiência de julgamento que decretou a providencia contrapondo com os factos provados na oposição, pelo que só a globalidade da apreciação da prova conduzirá a uma motivação e fundamentação justificada, coerente e imparcial.
2.7 - Viola pois, o principio da plenitude de assistência dos juízes, ínsito no artigo 654º do CPC e princípio do juiz natural que a decisão de oposição seja proferida por juiz diferente do que julgou a providencia cautelar, devendo ser revogada a decisão que julgou a oposição à providencia cautelar, anulando-a.
3. - É ainda nula a sentença por falta de gravação da prova, na medida em que foi requerida a gravação da prova, no decurso do recurso foram solicitadas as gravações da audiência de julgamento da oposição para reapreciação da matéria de facto.
3.1 - Foi o mandatário informado telefonicamente em 14 de Julho de 2011, que a audiência de julgamento da oposição, no dia 21 de Junho de 2011 não foi gravada e que apenas dispunha da gravação da audiência de julgamento da providência cautelar em Fevereiro.
3.2 - Violou pois o artigo 522-B e C do CPC, a não gravação da prova quando requerida, constituindo uma nulidade nos termos do artigo 201º do CPC, do acto, ou seja da audiência e dos actos subsequentes ou seja a sentença proferida, o que ora se requer e argui.
4.- Importa ainda a nulidade da sentença a falta de fundamentação nos termos do artigo 653º n.º 2 do CPC.
4.1 A sentença sub judice formula a sua fundamentação e motivação em factos que não foram dados como provados nem em sede da decisão da providencia cautelar, nem na oposição.
4.2 - O tribunal a quo refuta os factos dados como provados na sentença da providencia cautelar quanto aos elementos que decretaram a providencia cautelar, refutando a existência dos inúmeros erros da equipa de projectistas escolhidos pela requerente de que por falta da digitalização das assinaturas desses mesmos projectistas a CMVC se viu impedida de emitir a licença de construção e que a requerente obteve, regularizou e providenciou pelas circunstâncias e factos previstos na clausula 3.2 do contrato promessa – cfr. alíneas n) a p) dos factos provados na providencia - no entanto refuta sem que para o efeito dê como provado factos que os contradigam e sem que fundamente como chegou a tal conclusão, pelo que não é possível compreender a formação da convicção do tribunal nem como estabeleceu o chamado “salto lógico” da motivação e fundamentação.
4.3 - Refutou os factos sem fundamentar e fazendo tábua rasa aos elementos probatórios juntos com a petição da providencia cautelar, a saber os documentos 14 e 16 juntos pela requerente referentes à informação técnica dos erros de projectos onde claramente se verifica a falta de assinaturas, os ficheiros não estão gravados correctamente, não haver originais, etc.
4.4 - Não foi analisada e valorada prova, indicados quais os depoimentos das testemunhas e se os houve a este respeito, quais os estabelecidos critérios lógicos ou de experiencia que conduziram a tal conclusão.
4.5 - É ainda elencado um leque de conclusões que o tribunal a quo teceu constante da oposição e mais uma vez, não se refere, nem se infere como, pela análise de que prova se pode concluir que: “Como bem refere a requerida, tendo esta logrado provar os factos constantes da sua oposição pode-se dos mesmos concluir que:
- os projectos contidos e gravados nos CD’s entregues em 7 de Julho de 2010 à Requerente não sofreram qualquer alteração, uma vez que a razão de ser desta desconformidade assentou no facto de a regulamentação desta formalidade ter sido alterada entre o momento da entrega dos projectos pela Requerida à Requerente e o momento da entrega dos mesmos por parte desta à Câmara Municipal de Viana do Castelo;
- A Requerida jamais deixou de atender, pontualmente e ao abrigo do princípio de cooperação mútua contratualmente estabelecido, às solicitações da Requerente, nem os projectos e demais trabalhos apresentados pela Requerida apresentavam qualquer defeito;
- Pelo contrário, foi a Requerente que, com a sua conduta, propiciou os atrasos que ela própria denuncia, não obstante as sucessivas e reiteradas advertências da Requerida para o cumprimento das condições contratuais até ao dia 15 de Janeiro de 2011;
-A terem ocorrido quaisquer circunstâncias impeditivas do normal desenvolvimento do processo de licenciamento, as mesmas não se devem à Requerida, mas à Requerente, como esta expressamente reconhece em missiva dirigida à Requerida;
-A Requerente negligenciou os prazos e o tempo que demorou a entregar (i) o levantamento topográfico, (ii) a fazer o estudo urbanístico e (iii) a entregar as correcções ao estudo urbanístico na CMVC e suas posteriores alterações.”
4.6 - Não fundamenta o tribunal a quo como formulou e como apreciou a prova que originou os factos provados e não provados, quais as circunstancias em concreto, quais os depoimentos e em que medida, quais os documentos que motivem os factos dados como provados e consequentemente a sua fundamentação.
4.7 - A sentença violou pois o artigo 653º, nº 2 e 668º, nº 1 al. b) do CPC, sendo portanto consequentemente nula por falta de fundamentação.
5. - Enferma ainda a sentença de erro na apreciação da prova, porquanto em momento algum da referida motivação ou fundamentação o tribunal a quo atendeu à prova produzida e aos factos dados como provados na providencia cautelar fazendo o confronto dos documentos apresentados pela requerente na petição da providencia e os documentos apresentados pela requerida na sua oposição.
5.1- Nos termos do artigo 388º, nº 1 al. b), uma vez que estamos perante uma oposição, cabia ao tribunal a quo apreciar os factos da oposição, mas não poderia olvidar os factos provados e a prova junta aos autos no procedimento cautelar.
5.2 - Deveria ser atendida a prova no seu todo para a motivação e fundamentação da sentença, e não como se pode ler na motivação da sentença recorrida “ o tribunal fundou a sua convicção na extensa prova documental junta aos autos pela requerida – oponente, que conjugou com os depoimentos das testemunhas por si indicadas e inquiridas.”
6. - Ao contrario da sentença proferida, os factos provados constantes das alíneas xxx), yyy), pppp), qqqq), rrrr) ssss), tttt) têm de ser dado como não provados, nos termos da motivação apresentada porque:
6.1 - Não pode dar como provado que entre 1 e 14 a requerida entregou à requerente todos os projectos de arquitectura e especialidade, se dá simultaneamente como provado que em 12 de Julho os projectos de especialidade ainda estavam incompletos, e que entre 23 e 30 de Julho entregou os restantes projectos.
6.2 - Dá como provado em pppp) que a requerente é informada da alegada falta de assinatura e existência de um ficheiro que não abria em 12 de Janeiro, sendo certo que ficou documentalmente provado pelos documentos 6, 16, 17 da petição inicial que os projectos de especialidades foram entregues a 10 e 14 de Janeiro, o que significa que em 10 de Janeiro os mesmos não estavam concluídos.
6.3 - Alem disso, os projectos entregues estavam repletos de defeitos e desconformidades, o que o tribunal a quo veio a refutar fundamentando nos factos provados que eram “alegados defeitos e desconformidades”, negligenciando analisar a prova produzida no documento 6 da requerente podendo-se aferir que em 14 de Janeiro a equipa de projectistas ainda estava a apresentar alterações, sendo que em 24 de Janeiro existe ainda um oficio a solicitar apresentação de elementos em falta nos projectos de especialidade.
6.4 - Assim, os factos provados em n) a p) da sentença que decretou a providencia cautelar devem ser mantidos como provados.
6.5 - Fez errada apreciação da prova, numa contradição gritante entre a prova produzida documentalmente e os factos dados como provados em xxx) yyy), qqqq) rrrr) ssss) e tttt).
6.6 - Devem ser desconsiderados e dados como não provados os factos pppp) e qqqq) pois formulam um juízo de valor “alegadamente” e não um facto em si, sendo tal formulação abusiva, não mostrando isenção e imparcialidade na formulação dada aos quesitos.
6.7 - Os factos rrrr) e ssss) não podem ser dados como provados porquanto deu como provadas a alteração das regras referentes à gravação e assinatura dos projectos entre Julho de 2010 e Janeiro de 2011, sem que para o efeito tenha fundamentado em qualquer documento ou dl, na verdade, o regime jurídico da urbanização e da edificação data de 4 de Setembro de 2007 DL 60/2007, sendo que a ultima alteração ocorreu em 30 de Março de 2010 pelo DL 26/2010, e que já desde o DL nº 555/99 de 16 de Dezembro que no artigo 8º-A nº 3 se prevê a assinatura digital qualificada dos projectos.
6.8 - Ou seja entre Julho e Janeiro de 2011 não ocorreram mais alterações ao regime que justificassem os erros e as desconformidades alegadas.
6.9 - Julgou mal o tribunal a quo ao considerar provados tais factos e ao refutar os factos provados pela sentença da providencia cautelar.
6.10 - Deveria o tribunal a quo considerar provado que os atrasos na entrega, os erros e desconformidades nos projectos de especialidades são da responsabilidade exclusiva da requerida.
6.11 - No que respeita ao projecto de arquitectura fez o tribunal a quo errada apreciação da prova ao dar como provado as alíneas ddd) e jjj) pois deu o projecto de arquitectura como terminado em 26 de Fevereiro de 2010, deu também como provado que em 23 de Março a requerida enviou correio electrónico que faltavam elementos para “fechar” os projectos de arquitectura, em 13 de Abril não estava ainda finalizado o projecto de arquitectura, conforme documento 11 junto pela requerida.
6.12 - Adiante em zzz) ficou provado que “entre 1 e 14 de Julho a requerida procedeu à entrega à requerente dos documentos (PROJECTO DE ARQUITECTURA) o que significa que apenas em Julho a requerente obteve o projecto para que fosse possível submeter, o que fez em 7 de Julho de 2011, não havendo qualquer atraso na entrega do projecto.
6.13 - Foi dado como provado em mmm) que o motivo do atraso no desenvolvimento do projecto ficou dependente da operação da validação pelo BES, ou seja por facto imputável a 3º e não à requerente, pelo que não pode o tribunal a quo (dizer) que os atrasos se ficaram a dever à requerente e que tal contribuiu para a não verificação da clausula 3.2 do contrato promessa.
6.14 - Pelo documento 17 podemos aferir o lapso temporal decorrido entre a comunicação da requerente da proposta de alteração de projectos apresentada em 25 de Novembro e a resposta fornecida pela requerida em 14 de Janeiro propondo mais alterações.
6.15 - Daí não pode ser dado como provado ou concluir-se em sede de fundamentação que a requerida sempre respondeu “pontualmente e ao abrigo do principio de cooperação mutua contratualmente estabelecidas às solicitações da requerente”.
6.16 - Deverá ser dado como provado que a não obtenção da licença se deve a erros, discrepâncias, atrasos na entrega dos projectos da requerida e não da requerente.
6.17 - Sendo certo que a requerente realizou, providenciou e regularizou as circunstâncias e factos previstos na cláusula 3.2 do contrato.
7. - Não pode ser dado como provado o facto vertido em T) porquanto consubstancia uma oposição com os factos provados em n), p) r) e s). quanto à essencialidade e peremptoriedade do prazo do contrato.
7.1 - Em n) dá como provado que o prazo estabelecido para a realização do contrato seria de 24 meses “prazo genericamente estabelecido pela ora requerida nos contratos celebrados, atendendo o tempo que, normalmente, demoravam a ser obtidas as licenças necessárias”, nas alíneas p), r), e s) fica acordada a redução do prazo para 18 meses, com a possibilidade de duas prorrogações de 12 meses cada, pelo que não fez correcta apreciação da prova não podendo dar como provado em t) que resulta “vincada importância da celebração do contrato no prazo estabelecido”.
7.2 - Não estamos perante um prazo fatal, e peremptório, pois ao admitir a prorrogação estamos claramente a incutir celeridade e não a vincular um prazo essencial.
7.3 - Pelo que não há incumprimento, muito menos definitivo do contrato nos termos do artigo 804 e ss do CC, apenas mera mora na sua execução.
7.4 - Fez errada apreciação da prova e da lei, do artigo 804º e ss ao considerar prazo essencial e peremptório.
7.5 - Fez incorrecta apreciação dos factos, dando erradamente como provados as alíneas gg) e hh) pelo que a resolução só operaria pela impossibilidade definitiva da execução e não da mora nos termos da alínea 3.3 do contrato-promessa.
7.6 - Deveria ser dado como provado que nunca houve interpelação admonitória que convertesse a mora em incumprimento definitivo.
7.7 - Devia ser dado como provado que não existe perda de interesse no contrato por parte da requerida, o que existe é uma forma de pressionar a requerente a alterar os termos dos contratos, agindo em manifesto abuso de direito, atendendo para o efeito o penúltimo parágrafo da carta de 27 de Janeiro que a requerida enviou a comunicar a resolução do contrato mas que prevê a possibilidade de viabilização de um novo projecto, as reuniões com a CMVC e o facto de não ter até à data alterado o projecto inicial.
8. - Competia à requerida alegar e provar “a perda de interesse factos”, cabendo-lhe portanto o ónus da prova, o que não fez.
9. Agiu a requerida com manifesta má fé e abuso de direito violando os artigos 275 nº (2, crê-se) e abuso de direito nos termos do artigo 334º do cc
10. - A sentença deverá ser considerada nula por existência de contradições insanáveis entre os fundamentos considerados e relatados e a decisão adoptada, conforme motivação exposta.
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II.- A Recorrida contra-alegou, e concluiu dizendo:
a) - O Tribunal a quo actuou correctamente, e no âmbito da sua competência como titular do processo cautelar, ao não suspender ou adiar a audiência de julgamento de oposição, face ao requerimento do administrador da insolvência a requerer a apensação dos autos ao processo de insolvência.
b) - Assim como actuou correctamente ao cumprir a ordem de apensação que lhe foi dirigida pelo juiz da insolvência apenas após proferir decisão sobre a oposição deduzida nos autos de procedimento cautelar;
c) - A invocada nulidade da sentença não se verifica;
d) - A invocada nulidade foi arguida extemporaneamente, porquanto deveria ter sido arguida no prazo de 10 dias contados a partir do dia em que a Apelada foi notificada do despacho proferido a 30 de Junho de 2006, o que não se verificou;
e) - Não houve qualquer violação dos princípios do juiz natural, da imediação ou da plenitude da assistência dos juízes, pois, tratando-se de duas diligências judiciais distintas (julgamento da providência e julgamento da oposição), em momentos distintos e com enquadramentos e fins distintos, não encontra aqui aplicação o artigo 654.º do CPC;
f) - Mesmo que se entendesse ter havido violação destes princípios, nunca poderia a sentença vir a ser declarada nula, pois a Apelante não invocou a referida nulidade tempestivamente, ou seja, até ao termo da audiência de julgamento da oposição;
g) - Do mesmo modo, não enferma a sentença de nulidade por falta de gravação da prova;
h) - Com efeito, para além da falsidade do fundamento invocado com a arguida nulidade decorrente da falta de gravação da prova produzida na audiência de discussão e julgamento da oposição, a mesma arguição revela-se não só extemporânea, como arguida perante o tribunal indevido;
i) - A referida arguição de nulidade é extemporânea na medida em que deveria ter sido arguida até ao termo da audiência de discussão e julgamento em que a Apelante se encontrava representada por mandatário;
j) - Com efeito, impõe-se às partes, e seus mandatários, verificar, no início da audiência, se o funcionário judicial cuidou de, pelo menos, pôr em funcionamento os meios de captação de som ou se os mesmos estão colocados em posição adequada.
k) - Sem prejuízo do que antecede, releve-se ainda que a referida nulidade deveria ter sido arguida perante o tribunal em que foi alegadamente cometida.
l) - Acontece que a Apelante vem arguir a citada nulidade na sua alegação perante o tribunal de recurso.
m) - Ora, nos termos do artigo 205.º, n.º 3, do CPC se o processo for expedido em recurso antes de findar o prazo marcado neste artigo, pode a arguição ser feita perante o tribunal superior, contando-se, então, o prazo desde a distribuição.
n) - O momento da expedição do recurso a que se refere a citada norma do artigo 205.º, n.º 3, do CPC é o momento de subida ou expedição para o tribunal superior, o que ainda não se verificou, na medida em que apenas ocorre após a apresentação das alegações das partes.
o) - A sentença em crise também não enferma de nulidade por falta de fundamentação, pois, no âmbito dos procedimentos cautelares e atenta a particularidade do regime aos mesmos aplicável, apenas se exige uma avaliação sumária dos meios de prova carreados pelas partes para o processo de modo a confirmar ou rejeitar os fundamentos de decretamento da providência invocados pelo requerente (vide, a este propósito, a jurisprudência dominante e acima referida);
p) - Nessa medida, a fundamentação da qualificação dos factos como provados ou não provados é a que resulta expressa do capítulo intitulado de “Motivação”, não se exigindo maior especificação.
q) - Para alcançar a verdade material, o juiz a quo, em conformidade com os princípios regentes nesta matéria, valorou devidamente os factos instrumentais e outros que as partes oportunamente alegaram como resultado da instrução e discussão da causa, tendo sido facultado à parte contrária o exercício do contraditório.
r) - Por seu turno, a valoração do depoimento das testemunhas, é um princípio basilar da apreciação da prova e, nem mesmo em sede de recurso sobre a matéria de facto, poderá ser posto em causa.
s) - Com efeito, apenas o Tribunal a quo pode valorar o depoimento de cada uma das testemunhas, atendendo quer ao conhecimento que as mesmas têm dos factos, quer à postura, hesitações, esclarecimentos e dúvidas que demonstraram durante a respectiva inquirição.
t) - É nestas percepções que reside a convicção do Julgador ao decidir sobre a factualidade provada e não provada (veja-se quanto a esta questão a jurisprudência dos Tribunais superiores acima mencionados).
u) - Assim, não podendo as percepções da prova testemunhal serem apreendidas por falta de gravação da realizada em sede de julgamento da oposição, a reapreciação da prova pelo Tribunal ad quem encontra-se prejudicada.
v) - Caso assim não se entenda, sempre se dirá que os factos considerados como provados ou não provados nos presentes autos reflectem com exactidão a prova testemunhal e documental produzida.
w) - Não se entende, pois, como pretende a Apelada que os factos dados como provados nas alíneas xxx) e yyy) sejam dados como não provados, tanto mais que não indica qualquer meio de prova carreado para o processo e susceptível de provar o oposto, devendo a impugnação dos mesmos ser rejeitada nos termos do artigo 685.º - B, n.º 1 b) do CPC;
x) - No que se refere à impugnação das alíneas ppp), qqqq), rrrr), ssss) e tttt) dos factos dados como provados, a mesma não procede, porquanto, a Apelante não logrou provar o seu contrário, quer por falta de indicação de prova testemunhal, quer por a prova documental indicada não ser susceptível de contrariar esses mesmos factos;
y) - A impugnação das alíneas ddd) e jjj) dos factos dados como provados não procede em razão de não existir contradição entre o teor das mesmas, mas de, pelo contrário, serem as mesmas complementares, atendendo a que o projecto de arquitectura, finalizado pela Apelada em Fevereiro de 2010, apenas poderia dar-se por completo quando a Apelante facultasse à Apelada todos os elementos necessários para o efeito;
z) - Relativamente ao facto dado como provado em t), a Apelante não logra demonstrar, conforme lhe competia, quais os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, pelo que deverá ser rejeitada a sua impugnação (685.º-B, n.º 1, alínea a) do CPC).
aa) - Relativamente às alíneas gg) e hh) dos factos dados como provados, a Apelante não invoca, nos termos do artigo 685.º - B, n.º 1 b) do CPC, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa, pelo que a presente impugnação deverá ser rejeitada.
bb) - Significa, pois, que, em face do exposto, não há lugar a alteração da decisão proferida pelo Ilustre Tribunal a quo.
cc) - A decisão judicial de suspensão de execução de uma garantia bancária à primeira solicitação, no âmbito de um procedimento cautelar, apenas deverá ser proferida quando se demonstre, por um lado, que a execução dessa garantia pelo seu beneficiário se revela manifestamente abusiva, violadora do princípio da boa-fé, ou quando a sua execução constitui, por outro, uma verdadeira fraude ao direito que assiste ao beneficiário da garantia em executá-la.
dd) - Ou seja, a circunstância de a resolução de qualquer contrato poder se revelar ilícita, por violação de qualquer norma legal ou disposição contratual, não significa, por si só, que a execução da garantia bancária emitida no âmbito e ao abrigo desse contrato se revele abusiva.
ee) - O Tribunal a quo declarou na sentença em crise que “Resulta, assim, claro inexistir, por parte da ora Requerida, qualquer actuação desconforme com os princípios da boa-fé contratual ou manifestamente exercida em abuso de direito”.
ff) – Ao concluir como concluiu, o Tribunal a quo não poderia ordenar a suspensão da execução da garantia bancária por parte da ora Apelada, mesmo que se venha a julgar ilícita, o que não se perspectiva, a resolução do contrato-promessa dos autos por parte da Apelada.
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As conclusões definem e delimitam o objecto do recurso, como se extrai do disposto nos artº.s 684º., nº. 3; 685º.-A, nº.s 1 e 3 e 685º.-C, nº. 2, alínea b), todos do C.P.Civil, e vem sendo invariavelmente reafirmado pela jurisprudência.
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D) FUNDAMENTAÇÃO
I.- A decisão que decretou a providência cautelar deu como provados os seguintes factos (cfr. fls. 224 a 228 – 2º. volume)
a) A requerente é uma sociedade comercial, com sede em Viana do Castelo, que se dedica, a título principal, à promoção de empreendimentos imobiliários;
b) A 1ª. requerida é uma sociedade comercial de direito português, com sede na Amadora, pertencente ao grupo multinacional, de capitais maioritariamente franceses e com presença em mais de quinze países, que gira sob a marca “Decathlom” e dedica-se especificamente à administração dos bens imóveis que, em Portugal, o Grupo “Decathlon” utiliza na sua actividade de comércio de artigos de desporto;
c) A Requerente e a 1ª. Requerida acordaram, entre si, os termos de uma transacção imobiliária, pela qual a 1ª. Requerida “Decathlon” se obrigou a comprar à Requerente um conjunto de prédios urbanos sitos em Darque, Viana de Castelo, desde que, em termos sucintos, neles pudesse construir uma loja Decathlon nos termos por esta pretendidos;
d) Para tal efeito, as referidas Partes, no dia 16 de Julho de 2009, formalizaram por escrito os seguintes contratos: 1) Contrato-promessa de compra e venda de bens imóveis, sitos em Darque, Viana do Castelo, cuja cópia consta de fls. 52 a 70 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; 2) Contrato de prestação de serviços de gestão de obra “Loja Decathlon em Viana do Castelo”, cuja cópia consta de fls. 76 a 92 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
e) Após a concretização do estudo urbanístico para a zona de Darque, Viana do Castelo, as Partes tiveram a necessidade de actualizar os termos do contrato-promessa de compra e venda identificado na alínea anterior, nomeadamente envolvendo na referida transacção imobiliária, outros proprietários de imóveis adjacentes ao da Requerente;
f) Pelo que a 19 de Outubro de 2010, as referidas Partes celebraram um aditamento ao referido contrato promessa de compra e venda, cuja cópia se encontra junta aos autos de fls. 94 a 107 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
g) Na data de assinatura do primeiro contrato entre Requerente e 1ª. Requerida, esta pagou à Requerente a título de sinal o valor de quinhentos e quarenta mil euros (€ 540.000,00);
h) No dia de assinatura do contrato-promessa de compra e venda, a Requerente entregou à 1ª. Requerida a garantia bancária n.º 00352041 emitida pelo 2º. Requerido “BES” no montante de € 540.000,00 (quinhentos e quarenta mil euros) conforme cópia que se encontra junta aos autos de fls. 108 a 109 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
i) Tal garantia bancária está em vigor e encontra-se na posse da 1ª. Requerida;
j) De acordo com o teor da referida garantia, em caso de interpelação para pagamento por parte da 1ª. Requerida junto do Banco, este dispõe do prazo máximo de 24 horas a contar do momento dessa interpelação para proceder ao respectivo pagamento;
k) Para garantir o Banco 2º. Requerido para o caso deste vir a ser chamado pela 1ª. Requerida a pagar a garantia bancária, a “N…” aceitou caucionar um depósito a prazo efectuado em seu nome junto do 2º. Requerido pelo mencionado valor de quinhentos e quarenta mil euros;
I) Quantia essa que o Banco automaticamente fará como sua, em caso de vir a ser chamado a pagar a garantia bancária à 1ª. Requerida;
m) Em cumprimento do contrato celebrado, designadamente, das cláusulas 1.5 e 5.2, a 1ª. Requerida escolheu uma equipa de projectistas para a realização dos projectos de arquitectura e especialidades;
n) Em face dos inúmeros erros da equipa de projectistas, escolhida pela 1ª. Requerida para a realização dos projectos, e que impedia a digitalização dos mesmos, a Requerente envidou todos os esforços no sentido de auxiliar tal equipa;
o) Aos poucos, tais erros foram sendo superados, com excepção da necessária digitalização da assinatura dos autores dos projectos, tarefa simples e rotineira, que ainda não foi feita e que, por causa dela, a Câmara de Viana do Castelo se vê impedida legalmente de emitir a licença de construção;
p) A Requerente realizou, obteve, regularizou e providenciou pelas circunstâncias e factos previstos na cláusula 3.2 do acordo referido na alínea a) de que dependia de si;
q) Em 27 de Janeiro de 2011 a 1ª. Requerida enviou para a Requerente a missiva cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 213 e 214 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, sublinhando-se que a primeira Requerida solicita nesta missiva a devolução do sinal entregue;
r) Em reforço desta posição, a 1ª. Requerida voltou a notificar a Requerente por e-mail, nos passados dias 07 e dia 11 de Fevereiro, dando conta que iria solicitar ao 2º. Requerido o pagamento da garantia bancária a partir de segunda-feira, dia 14 de Fevereiro;
s) Apesar disso, os responsáveis da 1ª. Requerida compareceram no dia 31 de Janeiro na Câmara Municipal de Viana do Castelo (CMVC) para uma reunião com o Presidente da Câmara e o Vereador do Urbanismo Luís Nobre, no sentido de solicitar urgência na emissão de todos os documentos por parte da CMVC com o objectivo de avançar com o projecto de Viana de Castelo o mais rapidamente possível;
t) Face a tal solicitação da “Decathlon”, a CMVC atento o interesse do projecto para o Município e o envolvimento de várias empresas de construção e imobiliárias locais envolvidas no negócio, nomeadamente na empreitada e sub-empreitadas subsequentes, emitiu uma declaração de conforto acerca de todos os pontos necessários ao licenciamento da Loja no dia seguinte, ou seja, 01 de Fevereiro de 2001, tendo essa declaração sido entregue à 1ª. Requerida em 2 de Fevereiro;
u) Em carta enviada a 4 de Fevereiro, cuja cópia se encontra junta aos autos de fls. 200 a 201 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, a Requerente pediu à 1ª. Requerida que reconsiderasse na posição adoptada, salientando e recordando a gravidade da situação para a Requerente, tendo nomeadamente em conta que, com total conhecimento e conivência da 1ª. Requerida: (i) A Requerente já executou grande parte das obras de urbanização dos terrenos; (ii) Adjudicou toda a empreitada de estrutura metálica (a qual já está executada em estaleiro e pronta a colocar); (iii) Adjudicou a obra de revestimentos do Edifício; (iv) Adjudicou toda a construção civil do Edifício (estacaria, betão, etc); (v) Integrou os terrenos no domínio público; e (vi) Assinou com a CMVC contrato de obras de urbanização que a obriga a executar todas as infra-estruturas previstas para o terreno;
v) Por causa dos contratos celebrados com a 1ª. Requerida a Requerente já assumiu compromissos no valor de € 1.727.248,63, sendo que cerca de € 300.000,00 já foram efectivamente liquidados;
w) A 1ª. Requerida tem insistido junto da Requerente para que esta aceite alterar os termos do negócio, no sentido desta aceitar retirar cerca de 1200m2 à área coberta da Loja e 4.000m2 às áreas verdes e de estacionamento, sob pena de accionarem a garantia bancária;
x) E tem continuado a trabalhar no projecto;
y) A primeira requerida tem 18 lojas abertas no país;
z) A requerente passa por grandes dificuldades financeiras;
aa) O accionamento da garantia bancária levará a requerente à insolvência.
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II.- A decisão impugnada considerou provados os seguintes factos (cfr. fls. 440 a 467):
a) No ano de 2008, o Grupo Decathlon, de que a Requerida faz parte, definiu como estratégia comercial e de expansão abrir uma nova loja sob a sua insígnia no concelho de Viana do Castelo.
b) Para o efeito, foi a ora Requerida encarregue, enquanto sociedade administradora dos imóveis do Grupo Decathlon em Portugal, de procurar, negociar e transaccionar o terreno onde a visada loja pudesse vir a ser instalada.
c) Após um estudo do mercado imobiliário de Viana do Castelo, a ora Requerida, em meados de 2008, identificou um local que respondia favoravelmente às suas exigências de procura.
d) A Requerida identificou, assim, um terreno onde pretendia construir e explorar a visada loja sob a insígnia "Decathlon", em virtude de a mesma se afigurar como ideal, em termos de localização e visibilidade.
e) O referido terreno era constituído por cinco prédios rústicos, da propriedade da Requerente, e situava-se na continuidade de uma zona comercial em que o Plano Director Municipal de Viana do Castelo determinava a necessidade de uma solução de conjunto para a área.
f) A Requerente, não obstante, enquanto promotor/proprietário dos prédios rústicos, propôs-se desenvolver um estudo urbanístico para a zona.
g) Foi assim que, em 2008, a Requerente e a Requerida encetaram negociações com vista à celebração do contrato-promessa de compra e venda dos autos.
h) Do referido estudo urbanístico resultaria uma reorganização fundiária da zona, devendo os cinco prédios ser objecto de divisão para cedências e permutas para e com o domínio público com vista à criação de infra-estruturas viárias.
i) Como resultado, os cinco prédios configurariam um único polígono para a implementação da loja, sendo a unificação dos prédios produto da aprovação do projecto de licenciamento da construção da loja "Decathlon".
j) Complementarmente ao negócio de compra e venda, as partes negociaram ainda os termos em que a Requerente poderia vir a assumir a responsabilidade de promover a construção da loja o que assentaria em duas ideias principais a saber:
1- a Requerente seria interlocutora junto dos serviços competentes da Câmara Municipal de Viana do Castelo ("CMVC") em todos os assuntos tendentes à obtenção do licenciamento de construção da loja e assumiria a gestão da sua construção, por um lado; e
2- a Requerida promoveria o desenvolvimento dos projectos necessários, assumindo os custos de contratação de projectistas.
k) Na exposição de motivos que levaram a Requerida a formalizar o seu interesse em concluir o referido negócio de promessa de compra e venda, foi por esta expressamente referido à Requerente, no âmbito das negociações havidas, que era intenção inequívoca do Grupo Decathlon abrir naquele local uma loja sob a sua insígnia com a maior brevidade possível.
l) Aliás, o propósito inicial do Grupo Decathlon era proceder à abertura da loja ainda durante o ano de 2009.
m) Durante este período negocial, foram trocadas diversas minutas de contrato entre as partes, tendo tido especial enfoque a questão do prazo de duração do contrato-promessa de compra venda.
n) Na verdade, a Requerida, numa primeira minuta enviada à Requerente, estabeleceu como prazo para celebração do contrato definitivo o período de 24 meses, sendo este prazo genericamente estabelecido pela ora Requerida nos contratos celebrados, atento o tempo que, normalmente, demoravam a ser obtidas as licenças necessárias.
o) O que, inicialmente, não foi objecto de alteração por parte da Requerente, (conforme decorre do correio electrónico enviado pela Requerente à responsável de expansão da região Norte do Grupo Decathlon em Portugal, Eng.ª Susana Silva, em 29 de Abril de 2009, com os seus comentários à minuta de contrato-promessa, constante de fls. 310 e ss dos autos).
p) Porém, uma vez que a denominada licença comercial já se encontrava a pagamento, a referida responsável de expansão do Grupo Decathlon propôs à Requerente a redução do prazo para celebração do contrato definitivo para 12 meses, enviando, para o efeito, por correio electrónico de 4 de Maio de 2009, a minuta do contrato-promessa de compra e venda em que se sugeria, entre outras, a alteração da Cláusula Terceira (3.1), conforme documento de fls. 322 e ss dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
q) Nos termos do referido correio electrónico, e sem prejuízo da inserção de comentários a outras questões previstas na minuta do contrato, a Eng.ª Susana Silva realçou a importância do tema, ao referir: “Agradeço a sua atenção para uma alteração que fizemos ao prazo do contrato como pode ver na cl 3.1”.
r) Sem prejuízo de concordar com uma redução do prazo de 24 meses inicialmente previsto, a Requerente sugeriu, em 5 de Maio de 2009, que, em vez de 12 meses, fosse o contrato promessa celebrado por um prazo de 18 meses.
s) Foi esta, a final, a versão do contrato promessa de compra e venda que vingou.
t) Ficou, assim e desde logo, vincada a importância de o contrato definitivo se realizar dentro de um prazo previamente estabelecido e acordado, nessa medida, tendo sido expressa e voluntariamente aceite pelas partes um prazo para concretização do negócio prometido.
u) Neste quadro de negociações, vieram a ser celebrados, no dia 16 de Julho e 2009, dois contratos entre a Requerente e a ora Requerida:
1 - o contrato-promessa de compra e venda dos cinco prédios rústicos da propriedade da Requerente;
2- e o contrato de prestação de serviços de gestão da obra, conforme documentos oferecidos pela Requerente com seu requerimento inicial, em cujos textos Requerente e Requerida formalizaram as respectivas exigências contratuais.
v) Não obstante as negociações terem tido início em 2008, o contrato promessa só foi celebrado em 2009 porque, na maior parte deste tempo, a Requerida esteve a aguardar informação da Requerente quanto as questões essenciais relativas ao projecto a instituir, assim como elementos essenciais à avaliação do projecto, tais como registos topográficos.
x) Em face da preocupação da Requerida quanto ao prazo de implementação e abertura ao público da sua loja, e no seguimento das negociações havidas, as partes convencionaram expressamente, na cláusula terceira (3.1) do contrato promessa de compra e venda dos autos, que “O presente contrato é celebrado pelo prazo de 18 (dezoito) meses, com início na data da sua assinatura. (...)”
y) A premência da celebração do contrato definitivo foi motivada por imperativos comerciais estabelecidos pelo Grupo Decatlhon, tendo sido ainda convencionado em função disso, nos termos desta cláusula, que, a ser prorrogado o prazo de vigência do contrato-promessa, apenas a ora Requerida teria legitimidade para o fazer: neste sentido, consta ainda da Cláusula Terceira (ponto 3.1): "Poderá a SEGUNDA CONTRAENTE, por sua própria e exclusiva iniciativa, e de acordo com os seus critérios, prorrogar o presente contrato por dois períodos sucessivos, de 12 (doze) meses cada um, bastando para o efeito comunicar essa intenção, nos termos da Cláusula Décima do presente contrato, à PRIMEIRA CONTRAENTE, com uma antecedência mínima de 15 (quinze) dias antes do termo do prazo enunciado no número anterior”.
z) Atenta a exigência legal de obtenção prévia de um conjunto de elementos para celebração do contrato definitivo, entenderam as partes sujeitar a celebração do contrato definitivo a um conjunto de condições cuja responsabilidade foi repartida entre Requerente e Requerida.
aa) Assim, a celebração do contrato prometido ficou “… sujeita, desde logo, à obtenção de todas e de cada uma das licenças, autorizações e aprovações necessárias, de forma incondicionada, à instalação e construção de um complexo comercial e de serviços ...”, tal como descrito no contrato dos autos (cfr. Cláusula Terceira do contrato-promessa de compra e venda), nomeadamente, a celebração do contrato definitivo ficou condicionado à:
a) Obtenção de autorização de localização e de instalação para o estabelecimento comercial a retalho, de forma incondicionada (cláusula 3.2.1);
b) Regularização registral e matricial da parcela de terreno pretendida adquirir (cláusula 3.2.2);
c) Notificação à Requerida do deferimento da licença de construção emitida pela Câmara Municipal de Viana do Castelo (cláusula 3.2.3);
d) Obtenção de aprovação do projecto de construção dos acessos necessários ao terreno (cláusula 3.2.4);
e) Garantia de tratamento das condicionantes do terreno (cláusula 3.2.5);
f) Entrega da garantia bancária nos termos e para os efeitos do contrato de prestação de serviços (cláusula 3.2.6).
bb) Nos termos do contrato dos autos celebrado entre as partes, a Requerente obrigou-se “… a apresentar em seu nome todos os pedidos de licenciamento, autorizações ou outros que entenda por úteis e necessários para a implantação da loja DECATHLON ...”, assim como comprometeu-se a “... assinar quaisquer requerimentos que sejam necessários à obtenção das licenças ...” (cfr. Cláusula 1.3 do contrato promessa).
cc) A Requerida, por sua vez, vinculou-se a contratar, e a pagar, a equipa de projectistas (cfr. Cláusula 1.3 do contrato promessa).
dd) Ambas as partes comprometeram-se a envidar todos os seus melhores esforços para que a realização das condições e dos licenciamentos necessários fossem analisados no menor tempo possível (cfr. Cláusula Quinta do contrato promessa).
ee) Ainda nos termos do contrato de prestação de serviços de gestão de obra celebrado entre a Requerente e a Requerida, a Requerente obrigou-se perante a Requerida a acompanhar a execução dos projectos necessários à aprovação pela Câmara Municipal de Viana do Castelo e seus eventuais aditamentos, assim como diligenciar pela sua aprovação (cfr. Cláusula 1.1 do contrato de prestação de serviços dos autos),
ff) Nos termos do referido contrato, competia à Requerente “... coordenar os procedimentos necessários à obtenção de todas as licenças e autorizações administrativas necessárias à construção da loja “DECATHLON VIANA DO CASTELO” nos prédios acima identificados, bem como de todas as licenças e autorizações administrativas ao pleno funcionamento e exploração da loja, designadamente a licença de construção...” (cfr. Cláusula 1.1 do contrato de prestação de serviços dos autos).
gg) As partes estabeleceram, na Cláusula Terceira (3.3) do contrato promessa de compra e venda dos autos, que o contrato-promessa considerar-se-ia resolvido caso as condições previstas não se encontrassem verificadas até ao termo do prazo para a celebração do contrato definitivo.
hh) A resolução do contrato, que operaria por mero efeito previsto e querido pelas partes, deveria apenas ser objecto de comunicação pela ora Requerida à Requerente.
ii) No âmbito de toda a operação de promoção imobiliária dos autos esteve igualmente envolvida uma outra sociedade comercial denominada "Viana Plaza, S.A.", locatária financeira de dois prédios, propriedade do Banco Espírito Santo ("BES"), contíguos àqueles que eram propriedade da Requerente e prometidos vender à Requerida.
jj) O envolvimento da referida sociedade resultou de uma parceria estabelecida com a Requerente para a promoção de vários empreendimentos para venda e arrendamento nos prédios sitos em Viana do Castelo, propriedade de ambas as empresas.
kk) Nos termos do estudo urbanístico promovido pela Requerente para a área envolvente dos indicados prédios, onde se incluíam os prédios prometidos vender à Requerida, foi configurada uma única parcela de terreno para construção com uma área aproximada da pretendida pela Requerida para a implantação da sua loja no concelho de Viana do Castelo.
ll) A referida parcela era composta pela junção de dois dos cinco prédios prometidos vender pela Requerente à Requerida com dois outros prédios de que a referida sociedade comercial, “Viana Plaza, S. A.” era locatária financeira e o Banco Espírito Santo proprietário.
mm) As partes estiveram então de acordo em alterar o objecto da promessa de compra e venda celebrada entre a Requerente e a Requerida, passando o mesmo a ser constituído pela referida parcela de terreno que à data tinha dois proprietários, a Requerente e o Banco Espírito Santo.
nn) Pelo que foi celebrado, em 19 de Outubro de 2010, entre a ora Requerida, como promitente-compradora, o Banco Espírito Santo, enquanto promitente vendedor, e a Viana Plaza, S. A., como locatária financeira, o contrato-promessa de compra e venda que constitui o Doc. n.º 4 junto pela Requerente com o seu requerimento inicial.
oo) O referido contrato promessa de compra e venda contemplou um conjunto de condições para celebração da escritura pública de compra e venda prometida, previstas na cláusula Terceira, tendo sido estabelecido, no ponto 3.4, que a escritura pública prometida ficaria dependente da outorga da escritura pública de compra e venda dos prédios da propriedade da Requerente, nas condições estabelecidas no contrato promessa celebrado com a Requerida em 16 de Julho de 2009.
pp) Uma vez que os objectos de cada um dos contratos promessa acima referidos concorriam para o mesmo fim visado pela Requerida, foi necessário proceder à revisão dos termos do contrato promessa celebrado entre a Requerente e a Requerida, sobretudo com o propósito de alterar os prédios objecto da promessa, que deixaram de ser os cinco inicialmente acordados nos termos do referido contrato, para passarem a ser apenas dois.
qq) Assim, na mesma data de 19 de Outubro de 2010, foi celebrado entre a Requerente e a Requerida um aditamento ao contrato promessa de compra e venda, o qual veio, no essencial, alterar o texto original quanto aos seguintes aspectos:
- identificação dos prédios rústicos da propriedade da Requerente e por esta prometidos vender à ora Requerida (Cláusula Primeira);
- alteração do preço (Cláusula Segunda);
- incremento/alteração das condições para a celebração do contrato prometido (Cláusula Terceira);
- alteração dos Anexos; (cfr. cópia do referido aditamento que constitui o Doc. n.º 4 junto pela Requerente com o seu requerimento inicial).
rr) No âmbito do cumprimento das suas obrigações decorrentes do contrato promessa dos autos a Requerida, com vista à elaboração dos projectos de arquitectura e das especialidades, contratou uma equipa de projectistas por si designada, a qual foi constituída pelas pessoas identificadas pela Requerente no artigo 42.º do seu requerimento inicial, e também pelo Arquitecto Eduardo Araújo, do gabinete de Arquitectos Eduardo Araújo & Nuno Lascasas Arquitectos (“EANL”), responsável pela área de arquitectura e coordenação do projecto.
ss) Sem prejuízo da constituição atempada da equipa de projectistas pela Requerida, o desenvolvimento do projecto de construção da loja esteve praticamente parado nos meses seguintes à data de celebração do contrato promessa dos autos, em 16 de Julho de 2009.
tt) A elaboração e aprovação do estudo urbanístico, da responsabilidade da Requerente, revelava-se de fundamental importância para o início do projecto, porquanto todos os estudos e projectos, designada mente de arquitectura da loja Decathlon, estavam naturalmente dependentes da aprovação das regras urbanísticas aplicáveis à zona em causa.
uu) Tal condição resultou expressa, desde logo, do parecer proferido em 2 de Fevereiro de 2009 pela Câmara Municipal de Viana do Castelo no âmbito da emissão da denominada Licença Comercial, onde se lê: “2 - De acordo com o disposto no n.º 1 do art. 45.º do regulamento do PUC, a edificabilidade nestas Zonas fica condicionada à execução de plano pormenor, operação de loteamento ou estudo urbanístico que englobe toda a área.", conforme cópia do referido parecer junta como documento 4, a fls. 347, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
vv) Em 8 de Fevereiro de 20l0, a apresentação das cotas dos arruamentos e limites do terreno, assim como os projectos das infra-estruturas respectivas ainda não tinham sido apresentados junto da Câmara Municipal de Viana do Castelo.
ww) Em 4 de Fevereiro de 2010, realizou-se uma reunião, na qual estiveram presentes, por parte da Requerente, o Sr. Manuel Basto, por parte da Requerida a Eng.ª Susana Silva e o Dr. Telmo Santos e, por parte da Viana Plaza, o Dr, Armando Lacerda, Eng.ª Bento Aires e Rui Madureira.
xx) Nessa reunião, ficou acordado, entre outros aspectos, (i) que o estudo urbanístico deveria ser apresentado pela Requerente junto da Câmara Municipal de Viana do Castelo até ao dia 12 de Fevereiro de 2010 e (ii) que a loja abriria em Novembro de 2010, para aproveitar a campanha de Natal, tudo conforme relatório da reunião enviado por correio electrónico, em 8 de Fevereiro de 2010, pela “Imorendimento” (do Grupo Viana Plaza) às partes intervenientes, junto como documento nº. 5, a fls. 349 e 350.
yy) Na sequência dos compromissos assumidos pela Requerente nas citadas reuniões, a Requerida confrontou a Requerente, por correio electrónico de 23 de Fevereiro de 2010, com diversos pontos essenciais para a execução do contrato, a saber:
“( ... ) tinha ficado previsto que o estudo urbanístico fosse oficialmente entregue na CMVC no passado dia 19Fev, como tal venho solicitar que me seja enviado o comprovativo da entrega assim como a memória descritiva, para que possa ser também referido no nosso projecto de arquitectura”.
“Agradeço também que me seja enviado os seguintes elementos:
- levantamento topográfico georeferenciado
- cotas dos arruamentos"
"Uma vez que vocês não têm os projectos de execução das vias pronto, nós nos nossos projectos de especialidades vamos definir as ligações às infra-estruturas dos arruamentos e depois vocês terão de se adaptar.
"Chamo a atenção para o facto de que não dispomos de muito tempo para a concretização deste projecto e que o empenho de todos é a chave para que esta loja abra ainda este ano, como tal agradeço que disponibilizem todos meios para que possamos levar este projecto ''bom porto".
zz) Em 24 de Fevereiro de 2010, a Requerente enviou, finalmente, à ora Requerida o levantamento topográfico, mas sem menção das cotas dos arruamentos, nem qualquer dado referente às infra-estruturas.
aaa) Em 26 de Fevereiro de 2010, a Requerente procedeu ao envio à ora Requerida da planta geral de implantação com perfis, mas com falhas graves de informação e em versão desactualizada, designadamente com cotas incompatíveis, resultantes de dois levantamentos sobrepostos e versão do projecto de arquitectura já ultrapassada (cf. doc. 6 de fls. 351 dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
bbb) Nessa mesma data, a Requerida enviou à Requerente um correio electrónico, nos termos do qual alertou a Requerente (i) para o facto de ter passado o prazo para data de entrega prevista do estudo urbanístico na Câmara Municipal de Viana do Castelo, sem que aquela tivesse promovido qualquer diligência, (ii) de que continuava a aguardar resposta quanto a proposta de cedência para equipamento e (iii) de que necessitava de saber quando o estudo urbanístico daria entrada na CMVC, conforme cópia do referido correio electrónico junto como documento nº 7, a fls. 352.
ccc) No referido correio electrónico a Requerida revela à Requerente que “É com bastante desagrado que verifico que já passou 1 semana para a data de entrega prevista do EU (estudo urbanístico) na câmara municipal de Viana do Castelo e que ainda nada foi feito ou dito.
Alerto para o seguinte:
- A Decathlon muito brevemente vai abrir a maior loja do país (8000 m2 - área de venda) no mesmo eixo que a de Viana;
-mais a norte existe já uma outra loja (4000 m2) que todos os dias recebe clientes oriundos de Viana do castelo, isto para não falar da loja de Braga (4000m2).
Todos estes pontos parecem muito favoráveis, mas são fortes argumentos para que se coloque em causa este projecto (2888 m2) caso não abra ainda este ano”.
ddd) No referido correio electrónico a Requerida deixou ainda expressas as seguintes constatações:
O tempo passa e há uma loja da decathlon para abrir até Outubro!
- estudo geotécnico - feito - responsabilidade Decathlon
- projecto de arquitectura da Decathlon - feito - responsabilidade Decathlon
- estudo urbanístico nada feito responsabilidade Normaster/ lmorendimentd”.
eee) Em 23 de Março de 2010, o gabinete de arquitectos EANL solicitou novamente à Requerente a entrega do levantamento topográfico, por forma a corrigir as incorrecções supra referidas.
fff) Nessa mesma data, a Requerida, através de correio electrónico, confirmou o agendamento telefónico de uma reunião com a Requerente, a qual teria a seguinte ordem de trabalhos:
- apresentação dos elementos necessários para "fechar" definitivamente o nosso projecto de arquitectura: - memória descritiva do estudo urbanístico
- planta do estudo urbanístico
- localização do terreno a ceder - preferência em planta - dados necessários para serem referidos na nossa memória descritiva - requerimento para entrega do projecto na câmara
- certidões do registo predial actualizadas
- confirmar cotas do projecto - atenção o nosso arquitecto ainda não recebeu o levantamento topográfico conforme combinado na visita a Viana na semana passada”; conforme cópia do correio electrónico junta como doc. 8, a fls.353.
ggg) Em resposta, a Requerente solicitou o adiamento da reunião, alegando que “o topógrafo ainda não entregou a última versão do levantamento topográfico ao Arquitecto Eduardo”, conforme cópia do correio electrónico datado de 24 de Março de 2010, junta como doc. 9 a fls. 354.
hhh) Por sua vez, a Requerida respondeu por correio electrónico, nesse mesmo dia, nos seguintes termos:
Agradeço que prepare toda a documentação necessária, senão terei de no próprio dia cancelar a reunião, pois como sabe em todas as reuniões feitas até hoje existe sempre um documento em falta, que é proposto para ser entregue no dia a seguir até hoje que aguardamos...
Agradeço que imponha um outro ritmo de trabalho e ordem em todo este processo, pois é algo que não se tem verificado até aos dias de hoje”, conforme cópia do referido correio electrónico junta como doc. 10, a fls. 355.
iii) Em 24 de Março de 2010, o gabinete de arquitectos EANL enviou à Requerida os projectos das especialidades.
jjj) Em 13 de Abril de 2010, a Requerida enviou à Requerente um correio electrónico no qual afirma que:
Após 2 reuniões desmarcadas pela Normaster devido à falta de elementos para nos serem entregues, venho mais uma vez informar que a reunião está marcada para esta 5ªf pelas 11 h30 nas nossas instalações da Maia.
Continuo a insistir na entrega dos seguintes elementos:
- apresentação dos elementos necessários para ''fechar'' definitivamente o nosso projecto de arquitectura:
- memória descritiva do estudo urbanístico
- planta do estudo urbanístico
- localização do terreno a ceder - preferência em planta - dados necessários para serem referidos na nossa memória descritiva - requerimento para entrega do projecto na câmara
- certidões do registo predial actualizadas
- confirmar cotas do projecto”, conforme correio electrónico junto como doc. 11, a fls. 356.
kkk) A Requerente respondeu, por meio de correio electrónico, no dia 14 de Abril de 2010, alegando que: “1º Já se encontram garantidas as infraestruturas de acesso ao IC1 (por se encontrarem já concluídas na sua totalidade), pelo que, neste momento, poderia ser apresentado junto da Câmara Municipal de Viana do castelo o projecto da loja DECATHLON a construir na freguesia de Darque, concelho de Viana do Castelo, conforme está descrito no ponto 1.3 da CLÁUSULA PRIMEIRA do contrato oportunamente celebrado.
2º No entanto, desde já alertamos V.Exª para o facto de ainda não se encontrarem, neste momento, efectivadas a regularização registal e matricial da parcela de terreno em questão, prevista no ponto 3.2.2 da CLÁUSULA TERCEIRA do aludido contrato, situação esta em que a NORMASTER tem vindo a trabalhar ao longo do tempo mas que ainda não está concluída, sendo necessário encetar e concluir alguns procedimentos como aliás estava já previsto. (...)”, conforme cópia de correio electrónico junta como doc. 12, a fls. 357.
lll) A Requerida respondeu por correio electrónico no mesmo dia 14 de Abril de 2010, nos termos do qual afirma:
1º - Conforme é do seu conhecimento, o PDM de Viana do Castelo determina que as intervenções na área onde pretendemos instalar a loja Decathlon Viana do Castelo, tem de ser enquadradas em PP ou estudo urbanístico. De resto, isso mesmo consta do parecer técnico de 9/2/2009, da CM Viana do Castelo, sobre o licenciamento comercial da loja. Daí, a necessidade do estudo urbanístico que tem vindo a ser sempre adiado. Para além disso, como é também do seu conhecimento, as áreas de cedência que são necessárias no âmbito do processo de licenciamento da construção da Decathlon, têm de ser identificadas no processo a entregar na CM Viana do Castelo. Estas áreas, conforme acabou por ser afirmado pela Normaster, já não podem ser dentro dos limites do estudo urbanístico, continuando a Decathlon a aguardar a identificação exacta dos terrenos que servirão para este fim. Por este motivo, parece que qualquer projecto que hoje entre na CM Viana do Castelo, não poderia ser aprovado.
Contudo, ainda assim, conforme o determinado na cláusula 1.3. do contrato assinado, é da responsabilidade da Normaster a entrega e a aprovação do projecto. Assim, se no vosso entender o projecto já pode dar entrada; não nos operemos, ficando a aguardar a respectiva comunicação conforme está disposto na mesma cláusula.
2º Na verdade, não sabemos, porque essa matéria não nos tem sido comunicada, quais as diligências que foram feitas para a regularização cadastral da parcela de terreno. Contudo, parece-nos que um projecto que não seja instruído com estes elementos regularizados, não poderá ser aprovado. Assim, não deixo de manifestar o nosso interesse na rápida conclusão desse processo, para que o projecto de edificação da Decathlon possa ser instruído com sucesso.
( ... )
Assim, insisto na urgência de marcação de reunião para que a possamos tomar conhecimento cabal de todos os aspectos relevantes do processo. De facto, não podemos aceitar ou deixar de aceitar as actuais circunstâncias se das mesmas não tivermos conhecimento. Reitero assim, a necessidade de manter a data e hora da reunião agendada”, conforme cópia de e-mail datado (de 14/04/2010) junto como doc. 13 a fls. 358 dos autos.
mmm) Por correio electrónico de 7 de Maio de 2010, a Requerente justificou à Requerida a razão do atraso no desenvolvimento do projecto, alegando, para tanto, que “O que realmente se passou e que neste momento está resolvido (em 05/05/2010 numa reunião entre a Normaster e a VPSA) foi a questão relacionada com validação de toda a operação por parte do Banco BES, que é a entidade que financiou os terrenos da Viana Plaza, SA e que protelou todo o processo de decisão da Imorendimento.
A Normaster e a VPSA já chegaram a um entendimento definitivo, o que vai permitir dar andamento definitivo ao processo.", conforme cópia do correio electrónico junto como doc. 14, a fls. 360.
nnn) Na mesma data de 7 de Maio de 2010, a Requerida solicitou à requerente a realização de uma reunião para o dia 10 de Maio de 2010 com vista à entrega do estudo urbanístico, conforme cópia de correio electrónico junta a fls. 361, como doc. 15.
ooo) Porém, a referida reunião foi adiada para o dia 13 de Maio de 2010, data em que efectivamente se realizou.
ppp) Em 14 de Maio de 2010, a Requerente entregou à Requerida o estudo urbanístico, tendo a ora Requerida procedido, de imediato, à verificação/análise dos erros e incorrecções, detectando, designadamente, incorrecções no traçado de vias/estacionamento, na delimitação de espaços verdes, na cércea do edifício, bem como da falta de apresentação da planta do terreno a ceder para equipamentos.
qqq) A Requerida solicitou, então, à Requerente os esclarecimentos necessários para rectificação das indicadas incorrecções.
rrr) Em 28 de Maio de 2010 a Requerida recordou a Requerente que havia sido agendada, para o dia 1 de Junho de 2010, uma nova reunião, tendo a Requerente manifestado, uma vez mais a sua impossibilidade de comparência.
sss) O que, porém, não constituiu para a Requerida motivo de adiamento da reunião, pois, conforme teve oportunidade de referir:
Como sabe, em resultado dos sucessivos atrasos verificados até ao presente, encontra-se em risco a abertura do Decathlon Viana do Castelo antes do período comercial pretendido no final do corrente ano. Não posso deixar de fazer notar que esta empresa, além de ter sempre cumprido com os seus compromissos, tem feito tudo o que se encontra ao seu alcance e no âmbito das suas responsabilidades no sentido de não se perder qualquer instante no andamento do processo”, conforme cópia de troca de correios electrónicos junta como doc. 16, a fls. 362 dos autos.
ttt) No dia 1 de Junho de 2010, realizou-se uma reunião de coordenação de projecto à qual compareceram, nomeadamente, o Senhor Manuel Basto, por parte da Requerente, a Eng.ª Sónia Setoca, Arq.º Hugo Ribeiro e Eng.ª Susana Silva, por parte da Requerida, e ainda o Arq.º Eduardo Araújo, por parte do gabinete de Arquitectos EANL.
uuu) No âmbito desta reunião foi uma vez mais feita referência aos atrasos da Requerente no desenvolvimento do projecto, conforme se refere no memorando da reunião constante do correio electrónico datado de 7 de Junho de 2010:
12. Mais uma vez foi mencionado que o facto de a Normaster não ter até ao momento desenvolvido os projectos de infra-estruturas do Loteamento é visto como um atraso no desenvolvimento de todo o processo, obrigando a Decathlon a tomar decisões relativamente a ligações de infra-estruturas que podem não se vir a concretizar.”, conforme cópia do indicado correio electrónico junto como doc. 17 a fls. 364.
vvv) Em face das diversas incorrecções detectadas pela Requerida e da necessidade de apresentação de uma nova versão do estudo urbanístico, só em 7 de Junho de 2010 é que a Requerente enviou à Requerida as peças devidamente alteradas em conformidade com as indicações da Requerida, sendo que, apenas nessa data, pôde a Requerida validar o estudo urbanístico efectuado pela Requerente, conforme correios electrónicos trocados entre as partes junta como doc. 18, a fls. 366 e 367 dos autos.
xxx) Em 12 de Julho de 2010, realizou-se nova reunião entre a Requerente e a Requerida, para coordenação do projecto.
yyy) No decorrer da reunião, entre outros pontos, “2) Sónia Setoca questionou a Normaster se já dispõe dos projectos de especialidades do Estudo Urbanístico para que a Decathlon possa compatibilizar os mesmos com os seus projectos de especialidades, uma vez que, até ao momento, os nossos projectos de especialidades se consideram incompletos devido à falta de informação que existe relativamente à localização das redes de abastecimento (águas, esgotos domésticos, esgotos pluviais, energia eléctrica, telecomunicações…)”, conforme cópia de correio electrónico junto como doc. 19 a fls. 368, datado de 14 de Julho de 2010, com o memorando da referida reunião.
zzz) Entre 1 e 14 de Julho de 2010, a Requerida procedeu à entrega à Requerente, para que esta desse entrada junto da Câmara Municipal de Viana do Castelo, da totalidade dos projectos de arquitectura e das especialidades da loja Decathlon.
aaaa) Entre 23 e 30 de Julho de 2010, a Requerida entregou à Requerente todos os demais projectos de execução da sua responsabilidade.
bbbb) Desde 5 de Agosto até ao final da vigência do contrato promessa de e compra e venda dos autos, e para além dos anteriores e já acima destacados, foram sucessivas as comunicações da Requerida solicitando a entrega de elementos que permitissem o acompanhamento por esta dos procedimentos de licenciamento.
cccc) Adicionalmente, a partir desta data, a Requerida solicitou à Requerente o planeamento da fase de negociação e selecção de empreiteiro, atenta a necessidade premente de início da obra de forma a ser possível a abertura do estabelecimento até ao final desse ano.
dddd) Foram ainda vários os erros detectados nos documentos que foram sendo entregues pela Requerente, como se verificou, a título de exemplo, pelo facto de a 24 de Agosto de 2010 ter sido recebida informação da Direcção Geral de Energia a denunciar incorrecções na instrução/entrega do projecto eléctrico, que era da responsabilidade da Requerente, designadamente no que respeita ao número de colecções entregues.
eeee) Passou, então, a Requerida, através do seu projectista contratado, a providenciar, de forma directa, a imediata resolução, sem o que a mesma não poderia ter sido obtida em tempo útil.
ffff) Em 23 de Novembro de 2010, a Eng.ª Susana Silva foi informada pelo Vereador do Urbanismo da Câmara Municipal de Viana do Castelo que continuavam a existir problemas com o estudo urbanístico, conforme correio electrónico datado de 24 de Novembro de 2011, junto como doc. 20 a fls. 372 e ss.
gggg) No referido correio electrónico a Eng.ª Susana Silva deu aos seus colegas, funcionários da Requerida, a informação de que “A única coisa que continua em falta é a aprovação do EU e obras de urbanização para se ter a licença de construção. Após uma pequena conversa ontem com o vereador, continua a existir pbs com o EU, pelo que hoje estava agendada uma reunião da CMVC com o arqº autor do EU."
hhhh) Em 25 de Novembro de 2010, a Requerente solicitou à Requerida a aprovação de alternativas aos projectos apresentados para efeitos de negociação da empreitada (cfr. Doc. n.º 17 junto pela Requerente com o seu requerimento inicial).
iiii) Em resposta, a Requerida enviou o parecer da sua equipa técnica, nos termos do qual entendeu, fundadamente, aprovar algumas e não aprovar outras das alterações propostas.
jjjj) Mais solicitou a Requerida, relativamente à proposta da Requerente de substituir os equipamentos previstos no Projecto Eléctrico por outros de outras marcas, mas com as mesmas características e semelhança estética, o envio de todos os elementos necessários a demonstrar essa mesma equivalência (cfr. Doc. n.º 17 junto pela Requerente com o seu requerimento inicial).
kkkk) Na sequência da resposta apresentada pela Requerida ao pedido de alteração dos projectos apresentados, a Requerente solicitou a realização de uma reunião com os técnicos da Requerida, sem, contudo, proceder ao envio da documentação solicitada.
1111) A Requerida, no seu correio electrónico datado de 16 de Janeiro de 2011, reiterou a necessidade de envio da documentação solicitada, manifestando, ademais, que, sem a mesma, a reunião não teria qualquer efeito útil, visto tratar-se de questões técnicas que apenas poderiam ser abordadas e decididas com base em elementos concretos (cfr. Doc. n.º 17 junto com o requerimento inicial).
mmmm) Em 7 de Janeiro de 2011, a Requerida enviou novo correio electrónico à Requerente com vista a dar resposta às últimas informações/propostas transmitidas pela Requerente, nos termos do qual releva:
Assim, no que respeita ao contrato de urbanização assinado entre a CMVC e a Normaster e após a análise do mesmo, verificamos que este documento não vai ao encontro da condição suspensiva assumida no aditamento assinado entre a Normaster e esta empresa em 19 de Outubro de 2010.”
“Com efeito, previa-se no referido aditamento como condição para a escritura, a emissão do alvará de obras de urbanização ou em alternativa, algum titulo que permitisse a construção imediata das infraestruturas adjacentes ao lote a comprar pela Decathlon.”
“Como se pode concluir da leitura do contrato de urbanização enviado, é necessário ainda a reformulação e entrega para licenciamento do projecto de arquitectura de obras de urbanização e ainda dos respectivos projectos de especialidades.”
"Só após a respectiva aprovação é que a CMVC poderá emitir a autorização para a construção das obras de urbanização e aí nesse momento é que se encontrará cumprida a condição para compra do terreno pela Decathlon, referente às obras de urbanização.”
“Aproveito para relembrar de que ainda se encontram por verificar algumas condições para além das 2 já referidas, nomeadamente, a notificação de que a licença de construção se encontra a pagamento, a regularização no registo predial de todos os terrenos (a compra e venda dos terrenos à Viana Plaza são também uma condição para a compra dos terrenos da Normaster).”
"Cumpre-me ainda fazer uma última referência. No dia 15 de Janeiro termina o prazo contratual para cumprimento das condições para a outorga da escritura.”, conforme cópia do referido correio electrónico junta como doc. 21, a fls. 373 e 374 dos autos.
Nnnn) Como supra referido, em 7 de Julho de 2010, a Requerida entregou à Requerente o projecto de arquitectura da responsabilidade da sua equipa de projectistas.
0ooo) Na mesma data, a Requerente deu entrada do estudo urbanístico e do projecto de arquitectura junto da Câmara Municipal de Viana do Castelo (cfr. Doc. n.º 6 oferecido pela Requerente com o seu requerimento inicial).
Pppp) Em 12 de Janeiro de 2011, a Requerente, na pessoa do Sr. Peixoto, contactou o Arq.º Eduardo Araújo, da equipa de projectistas da Requerida, informando que os projectos das especialidades não tinham dado entrada na Câmara Municipal de Viana do Castelo porque, alegadamente, não estavam bem feitos.
Qqqq) A alegada desconformidade residia no facto de (i) faltar assinatura digital no CD entregue com a compilação dos projectos e (ii) haver um ficheiro que não abria.
Rrrr) A razão de ser deste alegados defeitos residiam no facto de os projectos das especialidades terem sido elaborados e entregues à Requerente em Julho de 2010, em observação das regras regulamentares então em vigor na Câmara Municipal de Viana do Castelo referentes à gravação e entrega de documentos em CD, regras estas que foram objecto de mais do que uma alteração em 2010.
Ssss) Porém, como a Requerente não procedeu à entrega atempada dos projectos de especialidades junto da Câmara Municipal de Viana do Castelo devido aos atrasos da sua própria responsabilidade, no momento em que deu entrada dos mesmos, cerca de meio ano depois, as regras em vigor eram outras, pelo que a gravação e apresentação dos projectos de especialidades em suporte digital entregues não se encontravam em conformidade com as regras regulamentares em vigor e exigidas pela Câmara Municipal de Viana do Castelo.
Tttt) A alteração das normas regulamentares implicava, assim, a re-gravação dos projectos de especialidades em CD, não estando, por isso, em causa, o respectivo conteúdo, mas tão só a forma de apresentação junto da entidade oficial.
Uuuu) O Arq.º Eduardo Araújo informou a Requerida desta situação, através do seu correio electrónico datado de 12 de Janeiro de 2011, junto como doc. 22 a fls. 374, tendo, ademais, referido que os CD's entregues já se encontravam a ser refeitos.
Vvvv) O novo CD, com o mesmo conteúdo do anterior, foi entregue à Requerente um dia após ter sido solicitado, ou seja, no dia 13 de Janeiro de 2011.
Wwww) A Requerida, na pessoa da Eng.ª …, foi contactada telefonicamente, em 28 de Janeiro de 2011, pelo Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo com o propósito de agendar uma reunião para o dia 31 de Janeiro de 2011.
xxxx) Na data acordada, estiveram presentes na reunião o Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo, o Vereador do Urbanismo, a Eng.ª Susana Silva (responsável de expansão do Grupo Decathlon) e o Sr. Peixoto (representante da Requerente).
Yyyy) O Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo manifestou, então, a manutenção do interesse do Município no projecto visado pela Decathlon, em razão da mais valia económica para a região dele decorrente, manifestando igualmente toda a sua disponibilidade para viabilizar a instalação da loja sob a insígnia Decathlon no seu concelho.
Zzzz) A Requerida informou então o Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo que o contrato celebrado com a Requerente havia cessado pelo decurso do prazo nele previsto e que, atentas as modificações entretanto operadas e não obstante manter o interesse de investir em Viana do Castelo, não podia obrigar-se nos moldes do contrato inicial. Assim, a celebrar-se um novo negócio, o projecto inicialmente previsto teria que ser ajustado às novas realidades.
Aaaaa) A Requerida informou ainda o Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo que, caso não fosse possível alcançar um novo acordo com a Requerente, estaria disponível para iniciar uma nova prospecção do mercado imobiliário em Viana do Castelo.
Bbbbb) Neste quadro, o Presidente da Câmara de Viana do Castelo disponibilizou-se para diligenciar a emissão de uma declaração por parte dos serviços da Câmara Municipal identificando os elementos que se encontravam em falta para a emissão da licença de construção da loja Decathlon, tendo sido a Requerente, e não a Requerida, a enunciar os aspectos que seria conveniente abordar numa tal declaração.
ccccc) A referida declaração foi emitida no dia seguinte ao da reunião, tendo sido enviada à Requerente que, de imediato, a reenviou à atenção da Requerida.
Ddddd) A Requerida não solicitou urgência na emissão de quaisquer documentos, nem tal tema foi abordado.
Eeeee) No dia 9 de Fevereiro de 2011, o Presidente da Câmara de Viana do Castelo enviou directamente ao Director Geral da Decathlon, Dr. …, um fax, nos termos do qual reiterou o interesse do Município na concretização do projecto Decathlon e revelou a importância do mesmo para a tecido empresarial e laboral do concelho, conforme cópia junta como doc. nº 24, junta a fls. 377 e ss dos autos.
Fffff) A Requerida, não obstante ter considerado cessado o contrato-promessa continuou a manter contactos com a Requerente pelos seguintes motivos: a Requerida não podia, assim, ignorar o forte apelo que lhe foi pessoalmente dirigido pelo Presidente da Câmara de Viana do Castelo no sentido de incentivar e proporcionar todas as condições necessárias e ao seu alcance para que viesse a ser efectivamente aberta ao público uma loja sob a insígnia Decathlon no seu concelho; por outro lado, ambas as partes pretendiam aproveitar os esforços humanos e financeiros promovidos, durante dois anos, na perspectiva da celebração do contrato definitivo, desde que salvaguardados os actuais termos e condições de investimento do Grupo Dechatlon.
Gggg) Em todo o caso, sempre as conversas mantidas entre Requerente e Requerida partiram do pressuposto por parte da requerida de que o contrato anterior havia cessado nos termos nele previstos.
Hhhhh) Foi isso mesmo que o responsável da Decathlon, Dr. …, comunicou à Requerente, por correio electrónico de 14 de Fevereiro de 2011, quando lhe manifestou que “O contrato assinado em 2009 terminou, sendo por isso devida a devolução do sinal; A Decathlon, ao contrário do que referiu, não está interessada na continuação do negócio que estava contratado;
(...) Qualquer entendimento entre as duas empresas que se consiga obter sobre a compra e venda de terreno em Viana do Castelo será objecto de novo contrato”, conforme cópia do referido correio electrónico junto como doc. 25, a fls.378.
iiiii) A Requerida recusou aceitar o negócio tal como estava contratado, não obstante o ter considerado cessado:
1- em primeiro lugar, a outorga da escritura pública prometida de compra e venda do terreno faria entrar em vigor o contrato de prestação de serviços de gestão de obra celebrado com a Requerente, tendo a Requerida perdido interesse, face à circunstância de a Requerente não ser uma entidade que lhe inspire a necessária confiança à execução rigorosa do referido contrato, decorrente de toda a sua actuação na execução do contrato-promessa dos autos;
2- por outro lado, a actual situação financeira da Requerente, por esta relevada e assumida, não inspirar a necessária confiança à celebração de um contrato de gestão de obra, em montante aproximado de Euros 2.400.000,00.
3- ser hoje política interna do Grupo Decathlon que a gestão das empreitadas de construção das respectivas lojas fica a seu cargo, não sendo já contratada a terceiros;
4- em face da retracção de mercado, existe diferença de enquadramento económico entre o momento em que o investimento foi original e internamente aprovado pelo Grupo Decathlon e o actual. Neste novo quadro, um investimento, à data de hoje, implica a reavaliação de todos os respectivos pressupostos, incluindo da área de venda de arranque da loja.
Jjjjj) Actualmente o Grupo Decathlon considera que a área de arranque de uma loja sob a sua insígnia a abrir em Viana do Castelo deva ser de 2.000m2, sem prejuízo de qualquer projecto ter que voltar a ser objecto de aprovação interna.
Kkkkk) Na presente data, não foi ainda emitido o alvará de construção.
Lllll) Por ofício datado de 7 de Março de 2011, emitido pelo Vereador Luís Nobre, foi a Requerente notificada de que o projecto de obras de urbanização apresenta condições para vir a ser aceite, mas continua por apresentar o documento que atesta a sua legitimidade para intervir numa parte do prédio.
mmmmm) Foram, por este meio, comunicados à Requerente os termos e condições da informação técnica que sustenta a notificação, donde se destaca:
"Verifica-se que as referidas parcelas correspondem ao contorno de parte das áreas de intervenção previstas para a realização da primeira fase das obras de urbanização propostas pela requerente. Contudo, continua por apresentar documento que legitime a requerente a intervir na parte do prédio confinante a norte com o prédio com a descrição n.º 2359 da CRPVC, necessária à execução da ligação ao acesso à A28”:
Concluiu, em conformidade, o referido ofício que: "Mais se informa que até à eventual emissão do alvará de construção, deverão ser regularizadas todas as condicionantes de natureza da legitimidade”, conforme cópia do ofício junto como doc. 26, a fls. 379 e 380 dos autos.
Nnnnn) No mesmo sentido conclui o ofício datado de 15 de Março de 2011, emitido pelo Vereador Luís Nobre, acerca do licenciamento de obras e onde se lê:
"Notifico-a, mais uma vez que, até à emissão do alvará de construção deverão ser garantidas todas as questões de legitimidade”.
0oooo) Ao aproximar-se o termo de vigência do contrato-promessa de compra e venda dos autos, a Requerida enviou à Requerente uma carta, datada de 15 de Dezembro de 2010, nos termos da qual alertou a Requerente para a iminência do termo do contrato-promessa, sem contudo estarem reunidas as condições, da responsabilidade da Requerente, para a celebração do contrato definitivo, conforme cópia da carta junta como doc. 23, a fls. 375 e 376 dos autos.
Ppppp) A Requerente não dirigiu à Requerida qualquer resposta.
***
IV.- Transcrita a facticidade que a 1ª. Instância deu como provada, cumpre passar à apreciação das questões a decidir, pela ordem por que foram suscitadas.
A) – Falta de legitimidade do juiz para proferir a decisão, por ter sido requerida a apensação destes autos aos de processo de insolvência;
B) Violação do principio do juiz natural e do princípio da plenitude da assistência dos juízes:
Nos termos do disposto no artº. 85º., nº. 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE) são apensadas ao processo de insolvência, além de outras, todas as acções de natureza exclusivamente patrimonial intentadas pelo devedor, desde que a apensação seja requerida pelo administrador de insolvência, com o fundamento na conveniência para os fins do processo.
Daqui se extrai que a apensação das referidas acções não ocorre sem que o administrador da insolvência o requeira e está sujeita a uma decisão judicial, que aprecia se estão verificados os pressupostos que permitem a apensação, que, como se refere no Ac. da Rel. do Porto de 10/09/2009, “está dependente de requisitos de oportunidade e de conveniência cuja verificação apenas ao juiz da insolvência cabe aferir” (in www.dgsi.pt, Procº. 133/09.8RPPRT (Deolinda Varão)).
E também se conclui que enquanto não for decidida e pedida a apensação, a competência para as referidas acções continua a caber ao juiz que as vinha tramitando.
Na situação sub judicio, como se vê de fls. 433 e 434, em 21/06/2011, o Administrador de Insolvência requereu a apensação destes autos aos de Insolvência alegando que “o seu resultado pode influenciar no valor da massa”.
De acordo com o que ficou a constar da acta da audiência de fls. 438, a Meritíssima Juiz a quo entendeu que os requerimentos acima mencionados não constituíam causa de suspensão do processo, visto que a apensação teria de ser solicitada pelo Juiz do processo de insolvência, e prosseguiu com a audiência de julgamento.
O acerto desta decisão resulta do que acima se deixou referido – posto que não havia ainda uma decisão judicial sobre o requerimento formulado pelo Administrador da Insolvência, não se sabendo, por isso, se a apensação ia ou não ser ordenada, e, a sê-lo, quando é que seria solicitada a remessa destes autos, o juiz do 1º. Juízo Cível continuava a ter competência para os termos deste processo, designadamente para julgar a oposição à providência cautelar.
Como se vê de fls. 608 e 609, a apensação veio a ser ordenada e a remessa destes autos foi solicitada ao 1º. Juízo Cível pelo ofício datado de 27/06/2011 e em 30/06/2011 a Meritíssima Juiz a quo despachou no sentido de se satisfazer a solicitada remessa após a prolacção da decisão.
E, de facto, por ter presidido ao julgamento é sua a competência para proferir a decisão, por aplicação do princípio da imediação e da plenitude da assistência dos juízes, consagrado no artº. 654º., nº. 1 do C.P.Civil – “só podem intervir na decisão da matéria de facto os juízes que tenham assistido a todos os actos de instrução e discussão praticados na audiência final”.
Como referem Antunes Varela et al. “Esse contacto directo, imediato, principalmente entre o juiz e a testemunha, permite ao responsável pelo julgamento captar uma série valiosa de elementos (através do que pode perguntar, observar e depreender do depoimento, da pessoa e das reacções do inquirido) sobre a realidade dos factos …” (in “Manual de Processo Civil”, pág. 639).
Também Anselmo de Castro escreve “O princípio da imediação é consequencial dos princípios da verdade material e da livre apreciação das provas, na medida em que uma e outra necessariamente requerem a imediação, ou seja, o contacto directo do tribunal com os intervenientes no processo, a fim de assegurar ao julgador de modo mais perfeito o juízo sobre a veracidade ou falsidade duma alegação” (ut “Direito Processual Civil Declaratório”, vol. III, pág. 175).
Ora, na situação sub judicio apesar da prova de boa parte dos factos tenr assentado em documentos juntos aos autos, não deixou de ser dado relevo aos depoimentos produzidos na audiência, cuja apreciação só podia ser feita pelo juiz que presidiu ao julgamento.
Assim, e de acordo com o disposto no artº. 654º., nº. 1 do C.P.Civil, a competência para a apreciação e decisão da oposição cabia à Meritíssima Juiz do 1º. Juízo Cível, ainda que tenha sido solicitado o procedimento cautelar para apensação ao processo de insolvência, já que esta solicitação ocorreu em data posterior à da audiência final.
Improcedem, pois, a conclusão 1ª. e as subconclusões em que se desdobra.
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O procedimento cautelar é sempre dependente de uma causa que tenha por fundamento o direito acautelado – cfr. nº. 2, in fine, do artº. 2º., e nº. 1 do artº. 383º., ambos do C.P.Civil.
Visando acautelar o efeito útil da acção, o mesmo é dizer, a eficácia da sentença, o procedimento cautelar pretende combater o periculum in mora, prevenindo os prejuízos que decorrem da natural demora do processo.
É porque não tem autonomia que o procedimento cautelar deve ser apensado à acção logo que ela seja instaurada.
E, se a acção for instaurada noutro tribunal, a segunda parte do nº. 2 do acima referido artº. 383º., atribui-lhe a exclusiva competência “para os termos subsequentes à remessa”.
É, assim, inequívoco que se a acção foi instaurada depois de ter sido decretada a providência mas antes de ter sido deduzida a oposição – cfr. a alínea b) do nº. 1 do artº. 388º., do C.P.Civil – a competência para conhecer e decidir foi atribuída ao juiz a quem foi distribuída a acção.
Sem embargo, como defende Abrantes Geraldes, “a interposição da acção não provoca ipso jure, a cessação da competência do juiz que tem a seu cargo o procedimento”, devendo ser respeitados os princípios “da continuidade da audiência ou da plenitude da assistência dos juízes” e, em nota de rodapé, prossegue, “Porém, já não se colhem os mesmos obstáculos quando a oportunidade da remessa surja depois de ter sido proferida a decisão, sem contraditório do requerido, e numa altura em que se esteja a processar o incidente de oposição … … já que o juiz que decidir o incidente pode aceder livremente ao teor da primeira decisão ou aos meios de prova oralmente produzidos e que necessariamente se encontrarão registados (gravados)” (cfr. “Temas da Reforma do Processo Civil”, III Volume, 4ª. Edição, págs. 158 e 159 e nota 238).
Decidiu no mesmo sentido, dentre outros, o Ac. do S.T.J. de 6/06/2000 fundamentando que por na fase da oposição se não pôr em causa a fixação da matéria de facto anteriormente consignada nos autos “nada impede que seja um outro juiz a decidir a nova matéria de facto, desde que fosse ele a assistir à produção da nova prova” (in C. J., Acs. do S.T.J., ano VIII, Tomo II-2000, pág. 101).
Ora, na situação sub judicio, os presentes autos de procedimento cautelar foram averbados ao 2º. Juízo Cível de Viana do Castelo, e a acção de que são dependentes foi distribuída ao 1º. Juízo Cível da mesma comarca – cfr. fls. 393 - pelo que, nos termos do disposto na 2ª. parte do nº. 2 do artº. 383º., do C.P.Civil, a competência para os termos subsequentes passou a caber, exclusivamente, a este 1º. Juízo.
Em face do exposto há-de concluir-se improceder a conclusão 2ª., com as subconclusões em que se desdobra.
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C) – Nulidade de falta de gravação da prova:
No que se refere à gravação da prova, estabelece o nº. 4 do artº. 386º., do C.P.Civil que os depoimentos devem ser gravados quando tenham sido prestados antes de o requerido ser ouvido.
Em todos os outros casos, designadamente no julgamento da oposição, o registo só é feito quando alguma das partes o requerer ou o tribunal o determinar – cfr. artº. 304º., nº.s 3 e 4, ex vi do nº. 3 do artº. 384º., ainda do mesmo Cód..
Enquanto na primeira situação há que proporcionar ao requerido o conhecimento dos depoimentos produzidos, na segunda situação ambas as partes estão presentes e, por isso, têm conhecimento das provas que se produzam em audiência.
No sentido de que a gravação deve ser determinada pelo tribunal sempre que os depoimentos tenham sido gravados, na decorrência do disposto no nº. 4 do artº. 386º., do C.P.civil, se pronunciou o Ac. desta Relação de 13/10/2011 (António Sobrinho), com fundamento em que aquele dispositivo legal não afasta este entendimento e ainda para preservar a igualdade das partes e possibilitar a reapreciação global da provas pelo tribunal de recurso (in www.dgsi.pt, Procº. 671/10.0TBCBT-A.G1).
Sem embargo de se reconhecerem os benefícios da gravação em sede de reapreciação da prova pelo tribunal de recurso, parece-nos que a igualdade das partes fica salvaguardada se se der a oportunidade ao requerente da providência de requerer a gravação até ao início da audiência, já que o requerido a deve solicitar logo no requerimento de oposição, como lho impõe o nº. 4 do artº. 304º., supra referido.
De qualquer modo, quer tendo a gravação sido requerida pelas partes, quer deva ser o tribunal a ordená-la, se a ela se não procede o acto é nulo, nos termos do disposto no artº. 201º., do C.P.Civil.
Esta nulidade não é do conhecimento oficioso e a sua arguição há-de obedecer às regras estatuídas no artº. 205º., do mesmo Cód. – se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, a nulidade deve ser arguida até ao termo do acto.
Não estando a parte presente nem representada por mandatário, dispõe do prazo de 10 dias para arguir a nulidade, que se contam a partir do dia em que, depois de cometida a nulidade, ela interveio em algum acto praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele – cfr., dentre outros o Ac. desta Relação de Guimarães acima citado e o Ac. do S.T.J. de 06/07/2000, in C. J., Acs. do S.T.J., ano VIII, Tomo II-2000, pág.154 e ainda Abrantes Geraldes, ob. cit. pág. 230.
Arguida a nulidade durante a prática de um acto presidido pelo juiz, deve este tomar as providências necessárias para que sejam cumpridas as determinações legais.
Se a nulidade não for arguida nos termos e prazo acima referido, tem-se por sanada.
Na conclusão 3ª. alega a Recorrente que “foi requerida a gravação da prova”, “no início da audiência de julgamento” (como explicita a fls. 494) e que o seu Mandatário só em 14/07/2011 teve conhecimento de que a prova não tinha sido gravada.
A Recorrida insurge-se contra aquela afirmação, rotulando-a de falsa e de uma gravidade ostensiva, assegurando que nem ela “Apelada, nem a Apelante requereram a gravação da audiência de julgamento da oposição nem no início da audiência nem em qualquer outro momento” e que “o tema da gravação da audiência de discussão e julgamento foi apenas objecto de referência no início da audiência em razão de o Senhor Juiz a quo ter feito saber que a audiência não seria gravada em razão de a mesma não ter sido requerida, tendo ambos os mandatários presentes, em representação da Apelante e da Apelada, se conformado com a referida situação” (cfr. fls. 562).
Ora, da acta de fls. 438 não consta qualquer requerimento sobre a gravação da prova, e, face à oposição do alegado, solicitou-se a confirmação da presença do Mandatário da Apelante na audiência final, tendo o Tribunal de Viana do Castelo respondido remetendo para aquela acta (cfr. fls. 604 e 607).
O teor da acta da audiência não foi arguido de falso nem a Apelante vem arguir qualquer vício que ponha em causa a sua exactidão.
Sendo a acta um documento autêntico, faz prova plena do que nela ficou a constar, isto é, dos factos que nela se refere terem sido praticados – cfr. artº. 371º., do Cód. Civil.
Assim, devendo fazerem-se constar da acta, designadamente, as declarações e os requerimentos que tiverem sido formulados, como o impõe o artº. 159º., nº. 1, do C.P.Civil, e não constando da acta da audiência qualquer requerimento para gravação da prova, é de concluir que não foi formulado.
De resto, afigura-se incongruente o alegado pela Apelante porquanto se requereu a gravação ou entendia que a prova devia ser gravada, devia reagir em acta caso o requerimento lhe fosse indeferido e/ou logo que se apercebesse que o tribunal não estava a proceder à gravação.
E se é certo que as partes não podem, por não terem meios, controlar se a gravação foi ou não bem feita, não deixa de ser certo que os actos necessários à gravação, todo o “aparato” que a rodeia, não pode deixar de ser percepcionado por quem assista e intervenha na audiência – maxime os mandatários das partes.
Assim, porque não foi arguida a falsidade da acta – e a sê-lo era perante o tribunal da 1ª. Instância – temos de concluir que não foi formulado qualquer requerimento a solicitar a gravação da prova, já que daquele documento não consta que tal acto tenha sido praticado na audiência e nem qualquer despacho que, directa ou indirectamente, se lhe refira.
Por outro lado, uma vez que a nulidade, que decorreria da falta de gravação, não foi arguida na audiência, estando a Apelante nela representada por mandatário judicial, tem-se o vício por sanado.
De qualquer modo, e ainda que alegando que o Mandatário da Apelante só teve, na realidade, conhecimento da falta de gravação no dia 14/07/2011 (data em que apresentou o requerimento de fls. 480), teria o prazo de 10 dias para invocar a nulidade, no tribunal da 1ª. Instância, que é quem dela devia conhecer, cabendo recurso apenas da decisão que sobre ela se pronunciasse – dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se, postulados consagrados de há muito pela Jurisprudência, e de que nos dá conta o Prof. Alberto dos Reis (in “Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 2º., pág. 507), e mantêm toda a sua actualidade.
Refira-se, finalmente, que tendo os presentes autos sido remetidos a este tribunal da Relação em 09/09/2009, está afastada a hipótese prevista no nº. 3 do artº. 205º., do C.P.Civil.
Do exposto se conclui que não procede a invocada nulidade, destarte improcedendo a conclusão 3ª., com as subconclusões em que se desdobra.
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D) – Falta de fundamentação
Argui a Apelante a falta de fundamentação da decisão, por não observar o disposto no artº. 653º., nº. 2, do C.P.Civil, estando, por isso, ferida da nulidade prevista na alínea b) do nº. 1 do artº. 668º., do mesmo Cód..
É indubitável que o juiz deve fundamentar as suas decisões - cfr. artº. 158º., do C.P.Civil.
E como referem Antunes Varela et al. “A motivação … exige como suporte mínimo, a concretização do meio probatório gerador da convicção do julgador”, mas este deve ainda “para a plena consecução do fim almejado pela lei, referir, na medida do possível, as razões da credibilidade ou da força decisiva reconhecida a esses meios de prova” (in “Manual de Processo Civil”, Coimbra, 1984, pág. 635 a 637), isto é, deve explicitar porque acreditou na testemunha A e não na testemunha B, que a contraditou, porque valorou em maior grau determinado documento em detrimento de outro cujo conteúdo contraria aquele.
Como escreve Lebre de Freitas “A fundamentação exerce, pois, a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o auto-controlo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao acto jurisdicional” (in “A Acção Declarativa Comum à Luz do Código Revisto”), 2ª. ed., pág. 297).
Referindo-se à fundamentação das decisões nos procedimentos cautelares escreve Abrantes Geraldes “O que parece útil realçar é a necessidade de se compatibilizarem os diversos princípios que regem a matéria dos procedimentos, destacando, por um lado, a celeridade e a apreciação sumária do litígio, que não se compadecem com decisões excessivamente longas e prolixas e, por outro lado, a necessidade de concretizar uma fundamentação razoável, de acordo com as circunstâncias do caso” (in “Temas da Reforma do Processo Civil”, III volume, 4ª. ed., pág. 239).
A decisão impugnada transcreve os factos provados – alíneas a) a Ppppp, de fls. 440 a 467 – e os não provados – 3º. parágrafo de fls. 47.
E fundamenta este juízo sobre a facticidade dizendo que o “Tribunal fundou a sua convicção na extensa prova documental junta aos autos pela requerida-oponente, que conjugou com os depoimentos das testemunhas por si indicadas e inquiridas (… …) as quais de forma objectiva, isenta e revelando conhecimento directo, descreveram de forma convincente ao Tribunal todo o desenrolar do processo, após a celebração do contrato-promessa, tendente à realização de todas as condições necessárias à celebração do contrato definitivo, tendo em conta as obrigações reciprocamente assumidas …… Destes depoimentos resultou não corresponder à verdade que a equipa de projectistas da Requerida tenha cometido inúmeros erros nos projectos apresentados e entregues à Requerente; que tais erros foram sendo superados ……(transcreve os factos que a primeira decisão considerou provados, sob as alíneas n) e o)).
E depois, prossegue: “Na verdade, do conjunto dos supra descritos depoimentos resultou que o atraso na emissão da licença de construção resultou da circunstância de a Requerente não ter promovido diligente e atempadamente o cumprimento das suas obrigações. Desde logo: diligenciando atempadamente pela aprovação do estudo urbanístico e respectivas especialidades, aliás, base de trabalho essencial para que a requerida pudesse cumprir e concretizar os projectos a que se vinculou no referido contrato-promessa”.
É certo que, não tendo os mencionados depoimentos sido gravados não está este tribunal da Relação em condições de proceder à sua reapreciação.
Também é certo que não podemos deixar de crer no que afirmou a Meritíssima Juiz a quo quanto à objectividade, isenção e razão de ciência das testemunhas inquiridas.
Sem embargo, e por elas terem afirmado factos que contradizem o que se deixou provado na primeira decisão, o mesmo é dizer, a prova que ali se produziu, e por os depoimentos não terem sido gravados, impunha-se uma maior concretização dos testemunhos em que a Meritíssima Juiz a quo se fundamentou relativamente a cada um daqueles factos, até porque respeitam a realidades diferentes, v.g., com transcrição de afirmações que tenha produzido e foram determinantes para fundamentar a sua convicção.
Ora, esta ausência de concretização conjugada com a nenhuma informação sobre se tais testemunhas foram ou não confrontadas com as provas produzidas pela Requerente, e, tendo-o sido, quais as suas reacções, são susceptíveis de afectar a transparência da decisão.
Temos, porém, de reconhecer que a fundamentação existe.
Não podemos deixar de referir, porém, que, posto estejamos num procedimento cautelar, e, por isso, o rigor que se exige para a formação da convicção no que se refere à oposição não poder ser em grau superior ao exigido para a decisão que decretou a providência, a fundamentação podia ser mais explícita e concretizadora, o que a tornava mais convincente quanto à bondade da decisão.
Grau de convencimento que, de facto, sai ainda afectado por na fundamentação não haver uma só referência às provas em que se baseou a primeira decisão, o que justifica, pelo menos, a dúvida sobre se tais provas não foram contrapostas às que se produziram na audiência, e a Requerida ofereceu, sendo certo que o juiz que julga a oposição deve ponderar em conjunto as provas produzidas pelo requerente e as provas produzidas pelo requerido, devendo reflectir na sua decisão o resultado da ponderação.
De qualquer forma, e uma vez que a decisão impugnada contém a fundamentação, sendo indicadas as provas que alicerçaram a convicção da Meritíssima Juiz que a proferiu, improcede a conclusão 4ª. e as respectivas subconclusões.
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E) Impugnação da matéria de facto
A parte que impugnar a matéria de facto está obrigada a especificar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponha uma decisão diversa da recorrida, sob pena de rejeição do recurso – cfr. artº. 685º.-B, do C.P.Civil.
É certo que a Apelante é parca na indicação dos meios probatórios que impõem decisão diversa da recorrida, por vezes se limitando a dizer, com relação a alguns factos que eles estão em contradição com os que ficaram provados na decisão que decretou a providência.
Sem embargo, apreciaremos também esta parte do recurso.
Quer os documentos particulares que foram juntos aos autos (excluindo os que têm força probatória plena, conferida pelo artº. 376º., do Cód. Civil), quer os depoimentos das testemunhas, estão sujeitos ao princípio da livre apreciação pelo julgador que decide segundo a sua prudente convicção.
Como se referiu já, não tendo os depoimentos sido gravados não pode este tribunal da Relação reapreciar a prova, tanto mais que, como se extrai da fundamentação, as testemunhas ajudaram a interpretar o teor dos documentos que fora juntos aos autos e que contribuíram para a formação da convicção da Meritíssima Juiz a quo.
Cumprirá, pois, essencialmente, verificar se existem deficiências ou obscuridades ou ainda contradições, sem embargo de, aplicando as regras da experiência comum, diferir de alguns dos julgamentos efectuados.
Insurge-se a Apelante contra os factos transcritos sob as alíneas xxx) e yyy).
Tais factos referem-se a uma reunião havida no dia 12/07/2010 (alínea xxx), e transcreve o nº. 2 do memorando dessa reunião (alínea yyy), que consta de fls. 368 a 370 dos autos.
Como se vê desse documento, os assuntos tratados nessa reunião estão transcritos sob 35 números, e no que se refere aos projectos de especialidades, se é certo que “Sónia Stoca” (pela Apelada) questiona a “Normaster” (Apelante) sobre esses projectos, não é menos verdade que esta pede àquela o envio dos projectos de especialidade da “Loja Decathlon” para os compatibilizar com os projectos de especialidades do Estudo Urbanístico, havendo a primeira se comprometido a satisfazer a solicitação da segunda “até ao final da presente semana” – cfr. nº.s 3 a 9.
Sendo assim, e porque o email onde se transcreve aquele memorando é do dia 14 de Julho de 2010, não podia ter sido dado como provado o facto transcrito sob a alínea zzz) – que “Entre 1 e 14 de Julho de 2010 a Requerida procedeu à entrega à Requerente, para que esta desse entrada junto da Câmara Municipal de Viana do Castelo, da totalidade dos projectos de arquitectura e das especialidades da loja Decathlon” – porque se assim tivesse sucedido não fazia sentido a Requerente dizer à Requerida que, para os compatibilizar com os projectos de especialidades do Estudo Urbanístico “necessitaria de ter acesso” aos projectos de especialidades da “Loja Decathlon”.
Decide-se, pois, eliminar do acervo factual o facto transcrito sob a alínea zzz.
A alínea Pppp) transcreve ipsis verbis o item 118º. da oposição, e refere-se a um facto que não se encontra documentado nos autos.
Posto que o “contacto” terá ocorrido entre o “Sr. Peixoto” e a testemunha “Arq.º Eduardo Araújo” é de crer ter sido no depoimento desta testemunha que a Meritíssima Juiz a quo fundou a sua convicção.
Ora, não tendo o respectivo depoimento sido gravado, não pode este tribunal da Relação reapreciá-lo.
Na subconclusão 6.2 faz a Apelante referência aos documentos 6, 16 e 17, que juntou.
Registamos que salvo raríssimas excepções os documentos apresentados pela Requerente (vol. I) não estão numerados e por aqueles em que se divisa a numeração se constata não terem sido ordenados, o que dificultou a sua identificação.
Crê-se, porém, que a Apelante se reporta ao quadro-resumo de fls. 110, vendo-se que com o requerimento nº. 338/11, de 14/01/2011, se apresentaram “elementos em falta” – cfr. fls. 122 e 123 –, donde se deduz ter havido anteriormente uma entrega de documentos.
Ainda assim, pelo ofício de fls. 121, datado de 24/01/2011, são solicitados à Apelante os “ficheiros em formato digital em conformidade com os nomes” dos projectos de “Águas, esgotos, pluvial, RSU, Acústico e Incêndios” sendo ainda referido, em “Nota”, no documento de fls. 123 que “O ficheiro “AVAC_Declaração de Conformidade SCE_AVAC. signed” dá uma mensagem de erro”.
Daqui se extrai que o facto transcrito em Qqqq – “A alegada desconformidade residia no facto de (i) faltar assinatura digital no CD entregue com a compilação dos projectos; e (ii) haver um ficheiro que não abria – não está totalmente correcto já que se em 19 e 21 de Janeiro de 2011 (data de informação que consta dos documentos de fls. 122 e 123) faltavam aqueles elementos, é de pressupor que em 12 dos mesmos mês e ano (que é a data a que se reporta o “facto” acima referido) faltariam, se não outros, pelo menos os mesmos.
Da fundamentação não se consegue deduzir qual ou quais os elementos de prova que fundamentaram a convicção da Meritíssima Juiz a quo quanto aos factos transcritos em Rrrr e Ssss.
Sem embargo, e como já se deixou referido, este tribunal da Relação está limitado na reapreciação da matéria de facto por os depoimentos não terem sido gravados pelo que eles terão de ser mantidos.
Sob as alíneas ddd) e jjj), são transcritos, respectivamente, os emails de 26/Fevereiro/2010, último parágrafo, constante de fls. 352, e o de 13/Abril/2010, constante de fls. 356, pelo qual a Requerida insiste com a Requerente pelo envio “dos elementos necessários para ‘fechar’ o nosso projecto de arquitectura”.
Na subconclusão 6.14 a Apelante refere-se ao documento de fls. 218 – email datado de 25/11/2010 – em que propõe “para incorporar em compartimento próprio, exterior à loja, o Posto de Seccionamento, o P.T., e o Grupo Gerador, a executar “in situ”, em alternativa ao previsto em Projecto”, e propõe ainda “Substituição dos equipamentos previstos no Projecto Eléctrico por outros de outras marcas, mantendo as mesmas características técnicas e semelhança estética”.
É certo que em 14/01/2011, Sónia Stoca, pela Requerida, envia a resposta, também por email, e nela, para além de declarar não aceitar algumas das alterações, mas refere, quanto ao Posto de Seccionamento: “Aguardamos o envio, por parte da Normaster, de todos os elementos necessários que demonstrem a equivalência das Celas …”, outro tanto referindo quanto ao P.T. e ao Grupo Gerador”.
De facto, e como a Apelante quis demonstrar, demorou um pouco mais de um mês e meio a resposta da Requerida, mas pela resposta fica também demonstrado que durante todo esse período de tempo ela, Apelante, não enviou à Requerida “os elementos necessários”, ou seja, a descrição das características técnicas dos materiais que pretendia substituir, que permitiam à Requerida aceitar ou rejeitar as alterações propostas.
Somente dois dias depois – num Domingo (precisamente na data em que se completavam os 18 meses, prazo fixado no contrato-promessa de compra e venda) é que a Apelante reagiu ao email acima referido, propondo uma reunião entre os técnicos, como se pode ver de fls. 215, ao fundo, e 216, ao cimo.
Na 7ª. conclusão vem a Apelante defender que não pode ser dado como provado, “quanto à essencialidade e peremptoriedade do prazo do contrato” o facto vertido em “t” porque consubstancia uma oposição com os factos provados em n), p), r) e s).
A facticidade transcrita nestas alíneas respeita às sucessivas versões do prazo para a celebração do contrato definitivo – a primeira proposta foi de 24 meses, a segunda proposta foi de 12 meses e a terceira, aceite, fixou-se nos 18 meses.
O que consta na alínea t) representa o resultado a que o julgador chegou na interpretação da cláusula terceira do contrato-promessa (cfr. fls. 56) – saber se um prazo é absoluto ou relativo depende ou da natureza do negócio ou da vontade das partes, “devendo, em caso de dúvida, ter-se como estabelecido um prazo absoluto, por ser de presumir que os outorgantes quiseram efectivamente vincular-se de harmonia com os termos do contrato” – cfr. Ac. do STJ de 12/01/2010, in www.dgsi.pt, Procº. 628/09.3YFLSB (Paulo Sá)).
Ora, é permitido recurso à prova testemunhal para a interpretação das cláusulas contratuais – cfr. artº. 393º., do Cód. Civil.
Vale, por isso, também quanto a este facto a limitação da reapreciação da prova face à ausência de gravação, tanto mais que se não verifica a contradição que é apontada pela Apelante.
Atento o que vem de decidir-se, conclui-se procederem apenas em alguns (pequenos) aspectos as conclusões 6ª. e 7ª..
Não cremos, assim, que haja necessidade de voltar a transcrever a matéria de facto.
***
F) Do mérito da decisão.
1.- Como resulta da facticidade provada, a Apelante e a Requerida “Immadora” celebraram o contrato-promessa de compra e venda que se encontra junto aos autos de fls. 52 a 63, pelo qual a primeira prometeu vender à segunda parte de um grupo de prédios rústicos para esta aí construir “um complexo comercial e de serviços da insígnia DECATHLON”.
Para a celebração do contrato definitivo foi fixado o prazo de “18 (dezoito) meses” a contar da data da assinatura do contrato, que ocorreu em 16/07/2009, terminando, por isso, esse prazo em 16/01/2011.
Ficou estipulado que somente a promitente-compradora/Requerida é que tinha a prerrogativa de “por sua própria e exclusiva iniciativa, de acordo com os seus critérios” prorrogar aquele prazo “por dois períodos sucessivos, de 12 (doze) meses cada um”.
Ainda no mesmo contrato, as partes sujeitaram a celebração da escritura de compra e venda (contrato definitivo) à verificação de sete condições, sendo uma delas a “obtenção de todas e de cada uma das licenças, autorizações e aprovações necessárias, de forma incondicionada, à instalação e construção de um complexo comercial e de serviços…”.
Também quanto a esta parte, ficou estabelecido que apenas a promitente-compradora/Requerida “poderá sempre optar, livremente e de acordo com o seu único critério, pela celebração da escritura pública” mesmo que não estejam verificadas as condições referidas (à excepção da regularização registal e matricial da parcela de terreno).
Como é claro, vale para o contrato-promessa o princípio da liberdade contratual, consagrado no artº. 405º. do Cód. Civil, nas suas duas vertentes: liberdade de contratar e liberdade de conformação do contrato.
Nenhuma das partes contratantes pôs em causa o estado de liberdade em que estavam quando negociaram o contrato em mérito.
Daqui se extrai ter sido do comum acordo que foi atribuído apenas a uma das partes o direito, quer de prorrogar o prazo do contrato, quer de celebrar o contrato prometido, mesmo que não verificadas as (algumas das) condições estabelecidas.
O artº. 270º. do Cód. Civil permite que as partes subordinem a um acontecimento futuro e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução.
A condição é, pois, uma cláusula contratual na qual os contratantes subordinam a eficácia de uma declaração de vontade a um evento futuro e incerto.
A condição é suspensiva quando o negócio só produza efeitos após a eventual verificação da ocorrência.
E é resolutiva sempre que o negócio deixe de produzir efeitos após a eventual verificação da ocorrência.
Como vem sendo entendido, a cláusula resolutiva pode abranger tanto a situação de incumprimento definitivo como a de simples mora, o que torna desnecessária a interpelação admonitória a intimar a outra parte a cumprir dentro de certo prazo peremptório – cfr. artº. 808º., nº. 1, do Cód. Civil.
Como escreveu Baptista Machado “A inadimplência da específica obrigação prevista (na cláusula resolutiva expressa) é fundamento e pressuposto indispensável da resolução. Dela emerge um direito potestativo que confere à parte adimplente (ou não inadimplente) o poder jurídico de, por um simples acto de livre vontade e só por si, produzir a resolução que, inelutavelmente, se impõe à contraparte inadimplente.
Só por si porque a parte adimplente (ou não inadimplente) pode resolver imediatamente o contrato mediante declaração, escrita ou oral, à outra parte (artº. 436º., nº. 1), sem necessidade de intervenção do juiz e sem ter de recorrer ao artº. 808º., nº. 1” (in “Obras Dispersas”, vol. I, págs. 137 a 146, e ainda os Acs. do S.T.J. de 12/01/2010, acima referido, e de 28/06/2011, no mesmo sítio da internet, proferido no Procº. 7580/05.2TBVNG.P1.S1 (Sebastião Povoas). Cfr. ainda Menezes Cordeiro, in “Tratado de Direito Civil Português” I Parte Geral, Tomo I, 3ª. edição, págs. 713 a 725, e ainda Pedro Pais de Vasconcelos, in “Teoria Geral do Direito Civil, 5ª. edição, 2008, págs. 606 a 615).
Nos termos do disposto no artº. 275º., nº. 2, do Cód. Civil, se a verificação da condição for impedida, contra as regras da boa fé, por aquele a quem prejudica, tem-se por verificada, e se for provocada por aquele a quem aproveita, considera-se como não verificada.
Trata-se, como refere Pedro Pais de Vasconcelos de remissão para os padrões de “seriedade e honradez, de ortonomia, de agir como deve ser, do honeste agere”.
E relativamente à dificuldade de saber, num contrato bilateral, a quem beneficia uma condição, remata certeiramente Menezes Cordeiro “nunca nenhuma das partes pode, contra a boa fé, impedir ou provocar condições”.
Como vimos, na cláusula terceira as partes estabeleceram condições sem a verificação das quais não se celebraria o contrato prometido, ou seja, não se cumpriria a promessa contratualmente assumida, sendo, assim, resolvido este contrato-promessa.
Trata-se, pois, de uma cláusula resolutiva e não suspensiva, como defende a Apelante dado que a produção dos efeitos próprios do contrato-promessa não ficaram dependentes daquelas condições – v.g. a promitente-compradora pagou o sinal.
Assim é que o ponto 3.3 da mencionada cláusula fixa o prazo em que deve ser comunicada a decisão de “resolução” do contrato, baseada na não verificação das condições previstas no número anterior.
O prazo referido foi fixado nos “quinze (15) dias seguintes ao conhecimento da impossibilidade da verificação da respectiva condição ou de excessiva oneração da mesma”.
A resolução do contrato, porque fundada na referida cláusula é admissível - cfr. artº. 432º., do Cód.Civil.
Ora, no dia 27/01/2011, a promitente-compradora/Requerida enviou à Apelante a comunicação que consta de fls. 213 e 214 (I volume), fazendo-lhe saber que, por se não verificar a totalidade das “condições acordadas”, perdeu o interesse no projecto “tal como se desenhou à partida”.
Ainda que deixando aberta a porta para negociar “um projecto noutros moldes”, aquela accionou a cláusula que lhe permitia resolver o contrato- promessa, tendo-o feito no prazo referido no supra aludido ponto 3.3 da dita cláusula terceira.
Deste modo, e de conformidade com o nº. 3.5 da mesma cláusula, a Apelante ficou obrigada a, “no prazo máximo de 8 (oito) dias após a comunicação recebida” restituir em singelo àquela “todas as quantias que tenha recebido”, sob pena de, não o fazendo, a referida promitente-compradora/Requerida “accionar o seu recebimento através da respectiva garantia bancária”.
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2.- E foi precisamente para evitar que a promitente-compradora/ Requerida accionasse a garantia bancária que a Apelante intentou a presente providência cautelar.
Como se vê de fls. 108 e 109, trata-se de uma garantia “on first demand”, que obriga o “Banco Espírito Santo, S.A.” a pagar àquela, à primeira solicitação, uma quantia cujo montante máximo é de € 540.000.
A garantia autónoma é definida por Galvão Teles como “a garantia pela qual o banco que a presta se obriga a pagar ao beneficiário certa quantia em dinheiro, no caso de alegada inexecução ou má execução de determinado contrato (o contrato base), sem poder invocar em seu benefício quaisquer meios de defesa relacionados com esse mesmo contrato” (in “O Direito”, ano 120º, 1988, III-IV, págs. 275-290).
Sem embargo, o Banco poderá recusar o pagamento quando o beneficiário ao reclamá-lo procede com manifesta má fé.
Para que a má fé possa ser considerada é necessário que ela seja “patente, não oferecendo a menor dúvida, por decorrer com absoluta segurança de prova documental em poder do banco” (Autor e loc. cit.).
Almeida Costa e Pinto Monteiro referem igualmente que o banco pode e “deve recusar-se a pagar a garantia em caso de fraude manifesta, de abuso evidente por parte do beneficiário”, excepção que “só pode ser invocada em caso-limite, quando o abuso ou a fraude do beneficiário forem, desde logo inequívocos” (cfr. Parecer publicado na C. J., ano XI – 1986, tomo 5, págs. 15-34).
Reconhecendo que o devedor pode tentar impedir o pagamento ou execução da garantia “através de medidas instauradas em sede judiciária ou arbitral de natureza cautelar”, defendem os mesmos Autores que o êxito de tais medidas dependerá “da prova inequívoca do comportamento manifestamente fraudulento ou abusivo do beneficiário” (loc. cit. pág. 21. Em sede de Jurisprudência, v.g., Ac. do S.T.J. de 14/10/2004 (Araújo de Barros), in C.J., Acs. do S.T.J., ano XII, tomo III/2004, pág. 58; Ac. da Rel. de Coimbra, de 27/01/2004 (Távora Vítor), in C.J., ano XXIX, tomo I/2004, págs. 18-21, e Ac. da Rel. de Lisboa, de 16/06/2011 (Ondina Carmo Alves) in C. J., ano XXXVI, tomo III/2011, págs. 117-122).
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3.- A Apelante acusa a promitente-compradora/Requerida de agir com má fé e com abuso do direito.
De acordo com o disposto no artº. 334º., do Cód. Civil, é ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.
O abuso pressupõe a existência do direito e, como refere o Ac. do S.T.J., de 22/11/1994, “no moderno pensamento jurídico os direitos subjectivos sofrem vários limites – de ordem moral, teológica e social, nomeadamente – e é a ofensa destes que constitui o abuso reprimido pela nossa lei” (in C. J. - Acs. do S.T.J. – ano II, tomo III-1994, pág. 158 (Carlos Caldas)).
Como referem P. Lima e A. Varela “a concepção adoptada do abuso do direito é a objectiva. Não é necessária a consciência de se excederem, com o seu exercício, os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes, ou pelo fim social ou económico do direito; basta que se excedam esses limites”, o que não significa que ao conceito “sejam alheios factores subjectivos, como, por exemplo, a intenção com que o titular tenha agido”( ut “Código Civil Anotado”, 3ª. Edição, volume I, pág. 296).
Exige-se, por outro lado, que o excesso cometido seja manifesto, que haja “uma clamorosa ofensa do sentimento jurídico socialmente dominante” (nos dizeres do Prof. Vaz Serra, in B.M.J., nº. 85º., pág. 253).
No abuso do direito não é um direito ou um interesse alheio que é ofendido mas sim um direito próprio que é abusivamente exercido e, por isso, o exercício deste direito é, então, tido como ilegítimo (cfr. Prof. A. Varela, in Revista Leg. e Jurisprudª., ano 114, pág. 75).
Em resumo, e como se escreveu no Ac. do S.T.J. de 21/09/1993, “existirá abuso do direito quando, admitido um certo direito como válido em tese geral, aparece, todavia, no caso concreto, exercitado em termos clamorosamente ofensivos da justiça, ainda que ajustados ao conteúdo formal do direito; dito de outro modo, o abuso do direito pressupõe a existência e a titularidade do poder formal que constitui a verdadeira substância do direito subjectivo mas este poder formal é exercido em aberta contradição, seja com o fim (económico ou social) a que esse poder se encontra adstrito, seja com o condicionalismo ético-jurídico (boa fé e bons costumes) que, em cada época histórica envolve o seu reconhecimento” (in C.J., Acs. do S.T.J., ano I, tomo III – 1993, pág.21, e referências doutrinais aí mencionadas).
Sem prejuízo de relembrarmos que estamos ainda no julgamento de uma providência cautelar, com o que isso significa em termos de consistência de prova, diremos que a Requerida conseguiu provar haver procurado incentivar a Apelante para o cumprimento de todas as condições de que dependiam a celebração do contrato prometido. Manifestou-lhe o interesse que tinha em abrir a projectada loja.
A Requerida e a Apelante acusam-se mutuamente de erros nos projectos que tiveram de corrigir e atrasaram o momento da apresentação do projecto de urbanização na Câmara Municipal de Viana do Castelo.
Porém, da matéria de facto provada não é possível extrair uma conclusão segura sobre o grau de culpa a assacar a cada uma delas, ou mesmo se a culpa de uma sobreleva a da outra.
A Apelante acusa ainda a Requerida de demorar muito tempo na resposta às propostas de alteração nos equipamentos e materiais previstos nos projectos. Contudo, nesse tempo todo também lhe não enviou os elementos necessários – características técnicas e semelhança estética – à tomada de decisão de aceitação das propostas alterações.
Reconhece-se que a Apelante teve de desenvolver negociações que, pelas regras da experiência, se sabe que são morosas, mas não há nos autos qualquer elemento probatório que, pelo menos, indicie ter a Apelante pedido o prolongamento do prazo estabelecido no contrato-promessa – bem pelo contrário, quando explica a razão dos atrasos na dificuldade de contratar com o “BES”, assume que vai cumprir por não haver mais obstáculos.
E assim é que, de atraso em atraso o tempo passou e quando chegou ao seu termo o prazo estabelecido não havia ainda o projecto de urbanização aprovado e nem a situação dos prédios estava regularizada na Conservatória do Registo Predial, como se deduz dos ofícios de 07/03/2011 e de 15 dos mesmos mês e ano, provindos do Vereador Luís Nobre, da Câmara Municipal de Viana do Castelo, nos quais este acusa a falta do documento que ateste a legitimidade para intervir numa parte do prédio (cfr. supra alíneas Lllll e Nnnnn).
Não estando, assim, preenchidas duas das condições expressamente estabelecidas para que o contrato prometido fosse celebrado, era legítimo à Requerente, de acordo com as suas conveniências, embora, resolver o contrato-promessa.
E o exercício do seu direito à resolução do contrato não é deslegitimado pela sua aceitação em negociar novo contrato, visando os mesmos fins que o contrato resolvido.
Certo que ela, Requerida, está numa posição de força e a Apelante numa situação frágil, o que torna mais fácil àquela impor a esta condições menos favoráveis, mas isso são as regras do “mundo” dos negócios a funcionar.
Também não configura um venire contra factum proprium, violador de tutela da confiança a aceitação da Requerida em participar numa reunião na Câmara Municipal de Viana do Castelo, a pedido do respectivo presidente, com vista à procura de uma solução que passasse pela construção da loja nos termos projectados.
É que as comunicações da Requerida à Apelante são inequívocas no sentido da perda de interesse no negócio que havia sido celebrado e na vontade de o resolver.
Do exposto se conclui que o exercício do direito da Requerida não ofende os princípios da boa fé e muito menos em termos clamorosos, como os exigidos pelo instituto do abuso do direito.
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4.- Ainda relativamente ao procedimento cautelar comum, como com acerto vem referido em ambas as decisões em apreciação, para ser decretada a providência, no essencial, têm de se verificar os seguintes pressupostos:
- probabilidade séria da existência do direito invocado (fumus boni iuris);
- fundado receio de que na pendência da acção esse direito sofra lesão grave e dificilmente reparável;
- que o prejuízo que se pretende evitar não seja inferior ao dano resultante da providência.
A decisão que decretou a providência situou o periculum in mora na probabilidade de a execução da garantia bancária levar a Apelante “inexoravelmente” a uma situação de insolvência.
Ora, como se vê da sentença certificada a fls. 428 a 431 já foi declarada a insolvência da Apelante pelo que perdeu actualidade o acautelamento deste perigo.
Por outro lado, e como ficou provado, a Requerida integra o Grupo Multinacional Decathlon, o que lhe confere um poderio económico elevado que garante que a Apelante, se obtiver ganho de causa na acção que intentou, não terá dificuldade em conseguir executar a condenação.
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De tudo quanto vem de expor-se, e ainda que com fundamento diverso do constante da sentença impugnada, resulta haver fundamento para ser revogada a providência cautelar decretada.
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E) - DECISÃO
Nos termos que acima se deixam expostos, decide-se negar provimento ao recurso interposto e confirmar-se a decisão recorrida, que revogou a providencia decretada.
Custas pela Apelante.
Notifique e cumpra as demais d.n.
Guimarães, 24/Janº./2012
Fernando F. Freitas – relator
Purificação Carvalho - Adjunta
Eduardo José Oliveira Azevedo - Adjunto