Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
13/14.5T8PTL.G1
Relator: HELENA MELO
Descritores: CRÉDITO AO CONSUMO
JUROS REMUNERATÓRIOS
CLÁUSULA PENAL
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/19/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.º SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora):

I - O regime estabelecido no art. 781º do C.C. é supletivo, podendo as partes, no âmbito da sua liberdade contratual, estipular regime diverso.

II - O DL 133/2009 veio reforçar o direito dos consumidores, instituindo um regime mais favorável ao mutuário que o definido no art.º 781.º do Código Civil no caso de não cumprimento do contrato de crédito pelo consumidor, passando a exigir, para que o credor possa invocar a perda do benefício do prazo, a ocorrência cumulativa dos pressupostos referidos nas alíneas a) e b) do nº 1 do artº 20º do DL 133/2009.

III - O AUJ 7/2009 não veda a inclusão num contrato de mútuo oneroso da possibilidade de se vencerem juros remuneratórios. O afirmado no ponto 10 do referido AUJ só faz sentido, se for reportado à questão essencial nele discutida, que é precisamente a da aplicabilidade aos juros remuneratórios futuros da possibilidade de vencimento antecipado prevista no art.º 781.º do Código Civil, permitindo assim que se estabeleça regime diferente.

IV - O DL 133/2009 igualmente não veda a possibilidade de serem devidos juros remuneratórios, continuando o legislador a deixar sem solução a questão.

V - Os limites ao exercício da “liberdade contratual” no quadro dos contratos de adesão, com recurso a cláusulas contratuais gerais, são os que resultam da aplicação do Dec.Lei n.º 446/85 de 25/10.

VI - No caso dos autos, as partes expressamente estabeleceram, além do acordado na cláusula 8º b), que seria devida em caso de mora, sobre o montante em débito, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual acrescida de 4 pontos percentuais (cláusula 8ª alínea c).

VII - A possibilidade de cumulação destes juros com os juros remuneratórios, leva-nos a concluir que a 1ª parte da cláusula 8º b) impõe uma antecipação de cumprimento exagerada, permitindo ao apelado exigir a antecipação de uma contraprestação de uma prestação que ele não vai realizar, num quadro em que já estão também previstos juros de mora, mais cláusula penal e mais os juros de mora sobre os juros remuneratórios vincendos (para além do imposto de selo), pelo que a cláusula 8º b) é nula.
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães:

I - RELATÓRIO

Banco X, S.A., antes denominado Banco Y SA, intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra Miguel, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 15.170,39€, acrescida, de juros de mora vencidos até à data em que foi proposta a acção, às taxas de juro convencionadas entre as partes (incluindo a cláusula penal), bem com o imposto de selo sobre este montante de juros, e o pagamento dos juros de mora vincendos, calculados às mesmas taxas, até integral pagamento, e do imposto de selo sobre o montante dos juros.

Para tanto, alegou, em síntese, o seguinte:

No exercício da sua actividade, celebrou com o R. um contrato de mútuo, em virtude do qual lhe disponibilizou a quantia de 21.450,00€ ( para aquisição de um veículo automóvel), sendo que aquele se obrigou a pagar mensalmente a prestação convencionada, até integral pagamento da quantia mutuada e demais acréscimos convencionados.

Mais alegou que o R. deixou de pagar as prestações a que se obrigou, e que se venceram, todas as restantes, tendo as partes acordado expressamente que nas prestações consideradas vencidas incluir-se-iam os juros remuneratórios, e demais encargos incorporados em cada prestação.
Conclui, afirmando que lhe assiste, face ao incumprimento do R, e nos termos do acordado, o direito de receber as quantias peticionadas.

O R. aceitou a celebração do acordo, confessando que deixou de pagar as prestações em virtude de ter deixado de trabalhar, por problemas de saúde, tendo requerido a reforma por invalidez, mais sustentando que, face ao seguro celebrado aquando do contrato de mútuo, os pagamentos ora peticionados devem ser exigidos à K Companhia de Seguros, S.A. requerendo a sua intervenção.

Respondeu o A. pugnando pela condenação imediato no pedido face à confissão de dívida, pelo R., das quantias em causa, avançando, ainda, que a seguradora declinou a responsabilidade nesta situação anulando, na sequência, da participação efectuada, o competente contrato.

Admitida a intervenção, veio a K contestar, alegando que o contrato de seguro em causa não cobre esta situação, uma vez que a incapacidade que afecta o R. é anterior à celebração do contrato.

Invocou ainda que declinou qualquer responsabilidade e procedeu, dadas as declarações inexactas dos R. aquando da celebração do contrato, à anulação do certificado individual, o que comunicou ao R. em 21.4.2014, tendo emitido o competente estorno a seu favor.

Foi proferido despacho saneador/sentença com o seguinte teor decisório:

“- Julgar totalmente procedente a presente acção, condenando o R. Miguel a pagar à A as quantias peticionadas, incluindo juros vencidos e impostos de selo até à data de entrada da acção, num total de 16.219,32€, quantia acrescida dos juros de mora vencidos desde a data de entrada da acção e vincendos sob o capital reclamado, até integral pagamento, e respectivos impostos de selo que sobre esses juros recaírem, tudo nos termos peticionados.”

O R. não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, onde formulou as seguintes conclusões:

O Réu, nunca negou a celebração do contrato de mútuo e que deixou de pagar as prestações, não concorda porém com a condenação no pagamento de todas as quantias peticionadas pela Autora, em particular com os juros remuneratórios.
2.º A questão em torno dos juros remuneratórios foi amplamente discutida na Doutrina e vertida em Jurisprudência abundante, que culminou com o acórdão de uniformização, do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 25.03.2009 que expressamente declarou a não obrigação de liquidação de juros remuneratórios incorporados nas prestações de um contrato de mútuo, no qual se verifica a perda do benefício do prazo.
3.º Através do Decreto-lei 133/2009 de 02 Junho, novas discussões surgiram em torno desta questão, porém, atendendo ao dispositivo do referido D.L., parece-nos que as alterações introduzidas visam trazer maior protecção dos consumidores e maior responsabilização dos credores em matéria de concessão de crédito ao consumo.
4.º Pelo que, não nos parece fazer qualquer sentido o entendimento de que estando previsto no contrato de mútuo a imputação de juros remuneratórios em caso de perda de benefício do prazo contratual, estes possam ser cobrados, sob pena de se desvirtuar o objectivo crescente de protecção do consumidor, face a este tipo de contratos.
5.º Nessa medida parece-nos que, o entendimento do tribunal deste Tribunal da Relação de Guimarães, como exposto no acórdão de 13.01.2011, em dgsi.pt a que faz referência o acórdão do Tribunal Relação de Lisboa de 07.02.2013, em dgsi.pt, vai de encontro ao que se pretendeu com as alterações legislativas:

A cláusula de contratos de empréstimo em que se prevê que o mutuante, perante a falta de pagamento de três ou mais prestações sucessivas, possa considerar vencidas todas as restantes prestações incluindo nelas juros remuneratórios, nada mais diz, devidamente interpretada, do que outras cláusulas antigas já diziam, ou seja, de que “no valor das prestações estão incluídos o capital [e] os juros de financiamento […]” E, quanto a estas, o AUJ do STJ, nº. 7/2009, já tinha esclarecido que não tinham o poder de incluir, no vencimento antecipado, também os juros remuneratórios.
Isto se não se entender, mais simplesmente, que essas cláusulas nem sequer devem ser consideradas admissíveis nos contratos de crédito ao consumo.
(…)

Pelo que são nulas as cláusulas que contrariem a interpretação dessa norma, o que se declara quanto à Cláusula 7ª, alínea b), na parte em que faculta ao credor exigir juros remuneratórios sobre as prestações que se venceram imediatamente por via da invocação da perda do benefício do prazo.”
6.º E assim, também, se entendeu no acórdão de 12.02.2015 do tribunal da relação de Évora:
Em suma, se o credor quiser receber os juros remuneratórios até ao termo do contrato pode optar por não desencadear a perda do benefício do prazo; fazendo o, não pode exigir a remuneração associada à disponibilização do crédito durante o período de tempo contratualmente previsto, independentemente de cláusula estipulada nesse sentido pelas partes.
7.º Cremos que, não obstante não ter sido invocado, deveria ter sido apreciada a validade do contrato e das cláusulas nele vertidas, em especial a referida cláusula 7.b, que previa a contabilização de juros remuneratórios, concluindo-se pela sua nulidade, nessa parte, pois a causa, tem de ser julgada conforme for de direito.
8.º Como refere o tribunal a quo na fundamentação de direito, “incumbia-lhe durante aquele prazo e daquela forma, proceder à restituição de igual montante acrescido de juros remuneratórios, calculados à taxa acordada, tal como estipulado entre as partes, cf, art. 1145 do código civil) ”
9.º A contabilização dos juros remuneratórios faz sentido se o contrato vencesse na data que estaria prevista,
10.º Se a tendência é a protecção cada vez maior dos consumidores, o que se tem revelado e que será mais latente nas alterações que se prevêem levar a cabo no crédito à habitação, em consonância com diretivas europeias, incluindo um período de reflecção alargado, durante o qual as condições propostas pela entidade bancária se têm de manter e ainda a possibilidade de o consumidor se poder arrepender, mais nos faz pensar que as alterações levadas a cabo naquele DL 133/2009 de 02 Junho nunca poderiam interpretar-se em sentido prejudicial ao consumidor.
11.º Pelo que deverá este Tribunal julgar nula tal cláusula na parte indicada, nulidade que expressamente se invoca, e o recorrente absolvido do pagamento dos juros remuneratórios, alterando-se, ainda, a decisão no sentido de ser liquidado em execução de sentença o valor efectivamente em dívida pelo Recorrente, pois a Recorrida na petição inicial não diferencia os valores incluídos no somatório.

Termos em que declarando-se a nulidade parcial do artigo 7.º b) das condições gerais do contrato de mútuo, e o Recorrente absolvido do pagamento dos juros remuneratórios, sendo o Recorrente condenado no valor que vier a liquidar-se em execução de sentença, farão V. Exc.as inteira e costumada justiça.

O Banco C., S.A. contra-alegou, invocando que o apelante apenas suscitou a questão que pretende ver apreciada em sede de recurso e nunca antes, pelo que constituindo questão nova o tribunal da Relação não deverá apreciá-la. No entanto, se assim não se entender, não assiste razão ao apelante, devendo ser confirmada a decisão recorrida.

II – Objeto do recurso

Considerando que:

. o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e,
. os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido,

as questões a decidir são as seguintes:

. se o tribunal da Relação pode conhecer da questão nova suscitada apenas nas alegações de recurso relativa à nulidade da cláusula 8ª, b) do contrato celebrado entre as partes e, em caso afirmativo, se a referida cláusula é nula.

III – Fundamentação

Na 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos:

1. O A., no exercício da sua actividade comercial, por contrato, celebrado nos termos e ao abrigo do Decreto – Lei 133/2009 de 2 de Junho e com destino, segundo informação então prestada pelo R., à aquisição de um veículo automóvel de marca AUDI, modelo A4 CABRIOLET 1.T S-LINE, com a matrícula ZT, por contrato constante de título particular datado de 27 de Abril de 2011, ao diante junto em fotocópia e que aqui se dá por integralmente reproduzido, tendo previamente prestado a informação pré-contratual que a LF, concedeu ao dito R. crédito directo, sob a forma de um contrato de mútuo, tendo assim emprestado ao dito R. a importância de Euros 21.450,00 (doc. n.º 2 e 3 juntos com a p.i).
2.º Nos termos do contrato assim celebrado entre o A. e o R., aquele emprestou a este a dita importância de Euros 21.450,00, com juros à taxa nominal inicial de 10,600% ao ano, indexada à Euribor a 90 dias, devendo a importância do empréstimo e os juros referidos, bem como a comissão de gestão, o imposto de selo de abertura de crédito e o prémio do seguro de vida, serem pagos, nos termos acordados, em 72 prestações, mensais e sucessivas, com vencimento, a primeira, em 10 de Maio de 2011 e as seguintes nos dias 10 dos meses subsequentes, sem prejuízo de o número de prestações poder ser superior ou inferior em função do acréscimo ou decréscimo da taxa de juro inicialmente acordada em função da variação da taxa Euribor, conforme expressamente consta da parte final da alínea b) da claúsula 4.ª das condições gerais do contrato (doc. n.º 2 e 3 juntos com a p.i).
3.º De harmonia com o acordado entre as partes - vidé citado doc. n.º 3 - a importância de cada uma das referidas prestações deveria ser paga - conforme ordem irrevogável logo dada pelo referido R. para o seu Banco - mediante transferências bancárias a efectuar, aquando do vencimento de cada uma das referidas prestações, para a conta bancária, logo indicada pelo ora A. (doc. n.º 3 junto com a p.i).
4.º Conforme também expressamente acordado - doc. n.º 3 - a falta de pagamento de três ou mais prestações sucessivas na data do respectivo vencimento implicava o vencimento imediato de todas as demais prestações, tendo estas o valor constante do contrato, ou seja o valor de Euros 417,99 cada. ( conforme doc. n.º 3).
5.º A. e R expressamente acordaram, conforme consta da Cláusula 7.ª , alínea b) das Condições Gerais do referido contrato e de harmonia com o expressamente disposto no artigo 20.º do referido Decreto-Lei 133/2009, de 2 de Junho, que “Em caso de não pagamento de três ou mais prestações sucessivas o Banco Y poderá considerar vencidas todas as restantes prestações incluindo nelas juros remuneratórios e demais encargos incorporados no montante de cada prestação mencionada nas Condições Especificas.”
6.º Atenta as actualizações da Euribor, a taxa de juro foi alterada para 10,91% no período de 01/04/2011 a 30/06/2011, para 10,96% no período de 01/07/2011 a 30/09/2011, para 10,89% no período de 01/10/2011 a 31/12/2011, para 10,33% no período de 01/01/2012 a 31/03/2012, para 10,13% no período de 01/04/2012 a 30/06/2012, para 9,71% no período de 01/07/2012 a 30/09/2012, para 9,65% no período de 01/10/2012 a 31/12/2012, para 9,67% no período de 01/01/2013 a 31/03/2013, para 9,68% no período de 01/04/2013 a 30/06/2013, para 9,69% no período de 01/07/2013 a 30/09/2013, para 9,74% no período de 01/10/2013 a 31/12/2013, para 9,774% no período de 01/01/2014 a 31/03/2014 e para 9,710% no período de 01/04/2014 a 30/06/2014 (conforme docs. 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16 e 17 da p.i.).
7.º Mais foi acordado entre o A. e o R. - doc. n.º 3 - que, em caso de mora sobre o montante em débito, a título de cláusula penal, acrescia uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual ajustada – 9,710% - acrescida de 4 pontos percentuais, ou seja, um juro à taxa anual de 13,710%.
8.º O referido contrato, celebrado por documento particular, é válido, "ex-vi" o disposto no Decreto-Lei N.º 133/2009, de 2 de Junho, "maximé" o disposto no artigo 12.º deste Decreto- -Lei.
9.º O A. é uma instituição de crédito, nos termos e de harmonia com o disposto na alínea a) do artigo 3.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei N.º 298/92, de 31 de Dezembro.
10.º Atenta as actualizações da taxa Euribor o prazo do contrato foi reduzido de 72 para 71 prestações, sendo o valor da 71.ª e última de Euros 299,63.
11.º O referido R., das prestações referidas, não pagou a 35.ª prestação e seguintes - num total de 37 – vencida a primeira em 10 de Março de 2014, vencendo-se então todas, conforme antes referido e conforme carta que o A. dirigiu ao R., comunicando-lhe a perda do benefício do prazo contratual, tendo-se assim operado a resolução do contrato referido com efeitos reportados a 10.03.2014 (doc. nº 17 da p.i.).
12.º O referido R. não providenciou às transferências bancárias referidas - que não foram feitas - para pagamento das ditas prestações, nem o R., ou quem quer que fosse por ele as pagou ao A..
13.º O contrato de seguro de vida a que é feita referência nas condições específicas do contrato, foi anulado em 10.06.2014, data de vencimento da 38.ª das ditas prestações.
14.º O valor da prestação, atenta a celebração do contrato de seguro de vida referido era de Euros 417,99 e, dada a anulação, a partir da 38.ª prestação, com vencimento em 10.06.2014, passou ser de Euros 412,63, atento precisamente o facto do seguro de vida ter sido anulado.
15.º O total das prestações em débito pelo R. ao A., em relação ao contrato agora referido ascende a Euros 15.170,39 [(3 x € 417,99) + (33 x 412,63 + €299,63)], quantitativo este a que acrescem juros - incluindo já a cláusula penal referida - que sobre ele se vencerem à referida taxa de 13,710% ao ano, desde a data do vencimento referida, desde 10 de Março de 2014, até integral e efectivo pagamento.
16.º Estes juros vencidos até a3 de Setembro de 2014 - ascendiam já a mais Euros1.008,59€.
17.º Sobre os juros referidos incide imposto de selo, à taxa de 4% ao ano, imposto de selo este da responsabilidade do R. e a pagar por ele ao A., "ex vi" o disposto na Tabela Geral do Imposto de Selo - artigo 120.º-A, alínea a), e seus nºs 1 e 4, ao presente artigo 17.2.1 da actual Tabela Geral do Imposto de Selo
18.º Este imposto de selo, sobre os juros referidos no anterior artigo 16.º, ascende já a mais Euros 40,34 sendo, atento o referido, da responsabilidade do dito R.
19.º O R., na qualidade de pessoa segura, aderiu à apólice de grupo do ramo vida nº 00060810, em que a K figura como seguradora, para garantir um empréstimo bancário com o nº 963601 celebrado com o A., que era o tomador e o beneficiário do contrato de seguro.
20º A inclusão do R. no seguro de grupo foi solicitada pelo A. em Maio de 2011, pelo A., conforme doc. nº 1 junto com a contestação da K e cujo conteúdo aqui se tem como integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
21.º Consequentemente, foi emitido o certificado nº 71725533, com início em 27/04/2011 e capital seguro inicial de € 21.450,00, com as coberturas de morte e invalidez total permanente.
22.º A emissão deste certificado teve por base os elementos e informações fornecidos pelo R., designadamente, a declaração de boa saúde, que permitiu a aceitação automática do contrato.
23.º Caso o R. não assinasse a declaração de boa saúde, o contrato de seguro não aceite pela seguradora.
24º As condições gerais, especiais e particulares ( juntas como doc. nº 2 da contestação da K e cujo conteúdo aqui se tem como integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais) foram comunicados e explicados ao R. e entregue uma cópia, bem como explicado o seu conteúdo e prestados todos os esclarecimentos sobre coberturas, garantias e exclusões, conforme o mesmo declarou no contrato de mútuo.
25º O seguro contratado é um seguro de vida anual renovável, sujeito a atualizações anuais automáticas do capital seguro de acordo com o montante em dívida ao Banco.
26º A Interveniente aceitou a contratação da cobertura dos riscos com base na documentação subscrita pelo interessado, não tendo sido necessário solicitar quaisquer outras informações relativas ao estado de saúde, nem a realização de exames médicos, de acordo com os critérios internos de conjugação de idade e capital em risco.
27º Através das propostas de seguro, questionários médicos e declarações de saúde, a Interveniente avalia e aceita os riscos garantidos ao abrigo dos contratos de seguro de vida.
28º O seguro foi aceite no pressuposto de que as declarações efetuadas pelas pessoas segura não padeciam de incorreções ou omissões que, no futuro, se fosse esse o caso, poderiam originar a resolução dos contratos ou a cessação das garantias conferidas, inclusive, numa eventual participação de sinistro.
29º No contrato de mútuo, o R. subscreveu a declaração de saúde: “o mutuário ao assinar este contrato declara estar de boa saúde, não sujeito a controlo médico regular por doença o acidente, ocorrido nos últimos 12 meses”.
30º A aceitação da adesão foi condicionada pela análise e aprovação da proposta de adesão subscrita, originando que a Interveniente fizesse fé nas declarações prestadas para a avaliação do risco.
31º Nos termos do disposto no clausulado das condições gerais e especiais deste seguro, a Interveniente deve estar na posse de todos os elementos que permitam analisar o risco a segurar.
32º Em 31/03/2014, a Interveniente recebeu do R., por intermédio do A., uma participação de alegado sinistro e diversa documentação, para ser acionada a cobertura de invalidez total e permanente, conforme docs. nº 3 a nº 5 juntos com a constestação da K e cujo conteúdo aqui se tem como integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
33º Da referida documentação consta, além do mais, que:
- O R. é detentor de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 85%;
- As sequelas físico-psíquicas complexas decorrem de acidente de viação ocorrido em 07/05/2005;
- O R. era seguido quer em Portugal, quer em Andorra, desde a data do acidente de viação;
- As patologias que contribuem par ao grau de invalidez são decorrentes das sequelas do acidente de viação.
34º A existência destas patologias não foi comunicada à Interveniente no momento da subscrição do contrato de seguro.
35º Este quadro clínico se tivesse sido declarado, teria condicionado a aceitação do risco pela K.
36º Só no momento da participação do sinistro é que a Interveniente tomou real conhecimento do estado de saúde do R., que já era do conhecimento do R. quando subscreveu o contrato de seguro.
37º Era conhecido pelo R. que as declarações inexatas ou reticentes ou a omissão dos factos tornam os pedidos de adesão nulos e sem qualquer efeito e que as pré-existências se encontram excluídas.
38º As declarações prestadas na proposta de adesão de um seguro de vida são essenciais para determinar a aceitação ou não e as condições do contrato.
39º Caso a R. tivesse conhecimento da situação clínica pré-existente, nunca teria aceite segurar, como aceitou, sem restrições, os riscos em causa.
40º Nos termos do art. 6º, nº 1, al. a) das Condições Gerais do contrato em causa, está excluída a cobertura do seguro em caso de doença pré-existente.
41. Como já supra referido e alegado pelo A. a K declinou qualquer responsabilidade pelo pagamento do capital seguro e procedeu à anulação do certificado individual, tendo tal decisão sido comunicada ao R. através de carta de 21/04/2014, conforme doc. nº 6 da contestação da K, que se junta e cujo conteúdo aqui se tem como integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
42. Apesar da insistência do R., a Interveniente declinou o sinistro e comunicou ao A. a anulação, conforme docs. nº 7 a nº 9 juntos com a contestação da K, e cujo conteúdo aqui se tem como integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
43º A Interveniente procedeu ainda ao estorno dos prémios que haviam sido cobrados ao R. correspondentes ao período de 10/04/2014 a 01/08/2014, no valor de € 20,01.

Do Direito

Nas suas alegações, veio o apelante, pela primeira vez, suscitar a questão da nulidade da cláusula 8º, alínea b) do contrato celebrado entre as partes. O apelante, ao longo do ser recurso, referiu reiteradamente, certamente por lapso, a cláusula 7ª, b), mas resulta das suas alegações e do texto do contrato que a cláusula a que quis referir-se é a cláusula 8ª b) do mesmo contrato, no segmento em que faculta ao credor a possibilidade de exigir juros remuneratórios sobre as prestações que se venceram imediatamente por via da invocação pela mutuante da perda do benefício do prazo.

Não resulta claramente das conclusões das suas alegações por que razão o apelante entende que a cláusula é nula, para além de o ser por contrariar o regime mais protector do consumidor que o DL 133/209 veio estabelecer.

Contudo, recorrendo às alegações para interpretar as suas conclusões, afigura-se-nos que o apelante também entende que a cláusula é nula por violação da alínea d) do nº 1º do artº 22º do regime das cláusulas contratuais gerais – DL 446/85.
Não suscita dúvidas que aos Tribunais de recurso incumbe a reapreciação das decisões anteriores, estando-lhes vedado conhecer de questões novas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (1).

Nos termos do artº 286º do CC a nulidade é invocável a todo o tempo e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal. As nulidades previstas no DL 446/85, de 25 de Outubro são invocáveis nos termos gerais (artº 24º).

E sendo a nulidade do conhecimento oficioso, o tribunal de recurso deve pronunciar-se, apreciando se a mesma se verifica (no sentido defendido no Ac. do STJ de 10.07.2008, relator João Camilo).

O contrato de crédito em causa nos autos foi celebrado em 28.04.2011, regendo-se pela lei reguladora dos contratos de crédito ao consumo, o DL 133/2009, de 2/06 .

A única questão a decidir é se são devidos os juros remuneratórios que estavam incluídos nas prestações, no caso em que todas as prestações se vencem, por falta do pagamento de algumas delas e por accionamento pelo mutuante da cláusula de antecipação do pagamento.

Esta questão suscitou diversas decisões com sentidos divergentes que conduziram à prolação do acórdão uniformizador de jurisprudência nº 7/2009, de 25.03.2009, publicado no DR I Série, nº 86, de 05.05.2009 que fixou jurisprudência no sentido de que “no contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao artº 781º do CC, não implica a obrigação de pagamento de juros remuneratórios nelas incorporados”.

O apelado defende que acordou um regime diferente do que resulta da aplicação do artº 781º CC, o qual cede perante convenção diversa das partes, tendo no caso sido feita esse acordo na cláusula 8º, b), pelo que a cláusula não é nula.

Não obstante o acórdão uniformizador de jurisprudência, porque na respectiva fundamentação se fez constar como premissa do entendimento ali defendido, nomeadamente no ponto n.º 10, que “as partes no âmbito da sua liberdade contratual podem convencionar, contudo, regime diferente do que resulta da mera aplicação do princípio definido no art.º 781º do C. Civil”, a jurisprudência fixada acabou por não pôr fim à polémica.

O entendimento fixado no AUJ 7/2009 só se aplica quando o contrato em causa tem uma cláusula conforme ao artº 781º do CC, ou seja, cláusula que consagre o princípio definido neste artigo (conforme se defendeu no Ac. deste Tribunal da Relação, de 15.10.2013, proferido no proc. nº 3258/11 e no Ac. do TRL de 4.07.2013, proferido no proc. 1916/12).

No seguimento do AUJ 7/2009 e do DL 133/2009, de 02/06, a redacção das cláusulas dos contratos de crédito ao consumo foram alteradas, deixando de reproduzir “tout court” o artº 781º do CC, conformando-se com as exigências do artº 20º do DL 133/2009 e passando a prever expressamente o pagamento de juros remuneratórios, em caso da perda de benefício do prazo pelo devedor .

Diferentemente do que sucedia com os anteriores assentos, através dos quais os tribunais fixavam doutrina com força obrigatória geral (de acordo com o art. 2º do CC que veio a ser revogado pelo art. 4º do DL nº 329-A/95, de 12.12), os acórdãos de Uniformização de Jurisprudência não são vinculativos para quaisquer tribunais, mas não deixam de criar “uma jurisprudência qualificada, mais persuasiva e, portanto, a merecer uma maior ponderação” particularmente para as instâncias que não o próprio STJ, como se intui do disposto no art. 678º, nº 2, al. c), do CPC (cfr.se refere no Ac. do STJ de 14.05.2009, Proc. nº 218/09.OYFLSB).

Face a cláusulas de idêntico teor à que está em análise, têm sido proferidas diversas decisões divergentes e ainda que no mesmo sentido, com fundamentos diversos.

A redacção da cláusula 8ª b) do contrato dos autos é a seguinte: Em caso de não pagamento de três ou mais prestações sucessivas, o Banco Y poderá considerar vencidas todas as restantes prestações, incluindo nelas os juros remuneratórios e demais encargos incorporados no montante de cada prestação mencionada nas condições específicas, como expressamente fica acordado, desde que por escrito em simples carta dirigida ao(s) Mutuários(s) para a(s) morada(s) constante(s) do contrato lhes conceda um prazo suplementar de quinze dias de calendário para proceder(em) ao pagamento das prestações em atraso acrescidas da indemnização devida pela mora, com expressa advertência de que tal falta de pagamento neste novo prazo suplementar implica o dito vencimento por perda do benefício de prazo.

Já anteriormente a aqui relatora, se pronunciou sobre esta questão, no Ac. do TRG de 14.11.2013, proferido no proc. 46/12, onde foi considerado que assistia às partes, ao abrigo do princípio da liberdade contratual, o direito de estabelecer outro regime, diferente do resultante do artº 781º do CC, tendo considerado não conforme ao artº 781º, a cláusula onde se estabeleceu que “em caso de não pagamento de três ou mais prestações sucessivas, o Banco Y poderá considerar vencidas todas as prestações, incluindo nelas os juros remuneratórios e demais encargos incorporados (sublinhado nosso) no montante de cada prestação mencionada nas Condições Específicas…”, sendo devidos os juros remuneratórios.
Não suscita dúvidas que o regime estabelecido no art. 781º do C.C. é supletivo, podendo as partes, no âmbito da sua liberdade contratual, estipular regime diverso.
O DL 133/2009 veio reforçar o direito dos consumidores, instituindo, no que importa agora considerar, um regime mais favorável que o definido no art.º 781.º do Código Civil no caso de não cumprimento do contrato de crédito pelo consumidor, passando a exigir, para que o credor possa invocar a perda do benefício do prazo, a ocorrência cumulativa das seguintes circunstâncias (artº 20º, nº 1 do DL 133/2009):

a) A falta de pagamento de duas prestações sucessivas que exceda 10/prct. do montante total do crédito;
b) Ter o credor, sem sucesso, concedido ao consumidor um prazo suplementar mínimo de 15 dias para proceder ao pagamento das prestações em atraso, acrescidas da eventual indemnização devida, com a expressa advertência dos efeitos da perda do benefício do prazo ou da resolução do contrato.

No AUJ 7/2009 entendeu-se que, com a perda de benefício do prazo, por força da exigibilidade imediata do capital pelo credor, facultado pelo artigo 781.º do CC, passando a faltar o diferimento no tempo entre a privação do capital e a sua recuperação pelo credor, deixam de ser devidos juros remuneratórios relativamente ao espaço temporal não decorrido como consequência da antecipação de vencimento. Os juros destinavam-se a renumerar o diferimento no tempo, deixando-o de o haver e passando o capital a ser exigido de imediato, não são devidos.

Ora ressalta desde logo da mera leitura da cláusula 8º b) que esta não é tão só a reprodução do regime constante no artº 781º do CC, pois que as partes acordaram expressamente que continuavam a ser devidos juros remuneratórios, mesmo no caso do vencimento antecipado das prestações.

Ora, não sendo o regime do artº 781º imperativo as partes podem acordar em termos diferentes.

Questão diversa e que não foi abordada no acórdão por nós relatado de 14.11.2013, já referido, é se as partes ao convencionarem nos termos constantes da cláusula 8º, b), 1ª parte, inseriram uma cláusula proibida.

O apelante defende que esta cláusula é nula por contrariar o regime do DL 133/2009 e por ofender o disposto no artº 22º, nº 1, alínea l) do DL 446/85 que aprovou a lei das cláusulas contratuais gerais.

O artº 20º do DL 133/2009 impõe limites à resolução do contrato de crédito ao consumo e a exigibilidade do capital decorrente da perda de benefício do prazo. Mas esta norma nada estabelece relativamente a juros remuneratórios. O legislador do DL 133/2009, sabedor da controvérsia que deu azo ao AUJ, nada veio esclarecer a propósito dos juros remuneratórios. Com efeito, apesar de o artigo 20.º do Dec.-Lei n.º 133/2009 ter vindo a definir os pressupostos de exercício do direito do credor a invocar a perda do benefício do prazo ou a operar a resolução do contrato, nada prescreve quanto à determinação do montante das prestações vincendas a ter em conta, pelo que continua a colocar-se a questão de saber se nelas se devem incluir, além da parcela do capital em dívida, também os juros remuneratórios ali previamente incorporados.

Nessa medida, o citado Acórdão Uniformizador mantém plena actualidade, mormente em sede de interpretação do artigo 781.º do CC, para o qual implicitamente remete o artigo 20.º do Dec.-Lei n.º 133/2009, tal como foi doutrinado pelo referido aresto em conformidade com a respectiva fundamentação, não obstante a revogação do diploma vigente à data em que foi exarado, o DL n.º 359/91, pelo DL n.º 133/09. Este diploma procedeu à transposição para a ordem jurídica interna da Directiva n.º 2008/48/CE, de 23/4, na sequência da alteração das Directivas anteriormente transpostas pelo revogado DL n.º 359/91, mantendo a mesma definição de “contrato de crédito” (cfr. art.º 2.º, n.º 1, al. a) e art.º 4.º, n.º 1, al. c), da lei revogada e da actual, respectivamente).

Não entendemos assim que o DL 133/2009 tenha vindo proibir a possibilidade das partes convencionarem o pagamento de juros remuneratórios.

Os limites ao exercício da “liberdade contratual” no quadro dos contratos de adesão, com recurso a cláusulas contratuais gerais, como se afigura ser o contrato em causa nos autos, são os que resultam da aplicação do Dec.Lei n.º 446/85 de 25/10 (daqui em diante LCCG). E nos termos do artº 12º, as cláusulas proibidas por disposições desta lei são nulas. Entre as cláusulas relativamente proibidas, consta da al. l) do nº 1 do art. 22º da LCCG, as que “ imponham antecipações de cumprimento exageradas”.

O controlo da validade do conteúdo das cláusulas contratuais gerais é feito em termos objetivos, mas abstratos, tendo em atenção a procura dum adequado equilíbrio de interesses, na consideração da razoabilidade do modelo global encontrado, sendo de afastar as situações que potenciam prejuízos inadequados ou propiciam desequilíbrios significativos das prestações, apelando, nalguns preceitos legais ao quadro negocial padronizado.

No acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22/6/2017 (Relator: Jorge Leal, Proc. n.º 71/15.5T8MFR.L1-2), entendeu-se que uma cláusula como a dos autos era nula, mas não por violação da alínea l) do nº 1 artº 22º da LCCG. Como se pode ler no sumário: «É nula, por violação do disposto nos artigos 15.º e 19.º alínea c) da LCCG, a cláusula contratual geral, inserida num contrato de crédito ao consumo, que reconheça ao mutuante o direito, no caso de mora do devedor no pagamento das prestações acordadas, de exigir do mutuário o pagamento antecipado (a par do capital mutuado) dos juros remuneratórios futuros».

Como referimos, continua a não haver uniformidade de decisões. No sentido da admissibilidade da cláusula, reportando-nos a decisões posteriores ao AUJ 7/2009, o acórdão da Relação de Lisboa, de 04.7.2013, processo 1916/12.7TBPDL.L1-2 e acórdão da Relação do Porto, 09.6.2015, processo 2188/12.8TBPNF.P1.

Em sentido da nulidade de tal cláusula (embora com algumas divergências na fundamentação), o acórdão da Relação de Lisboa, de 11.9.2012, processo 3203/11.9TBFUN.L1-7; acórdão da Relação de Lisboa, de 06.11.2012, processo 1834/12.9TJLSB.L1-7; acórdão da Relação de Lisboa, de 07.02.2013, processo 10/11.2 TBAGH.L1-2; acórdão da Relação do Porto, de 10.11.2015, processo 1060/15.5T8PVZ.P1; acórdão da Relação do Porto, de 25.10.2016, processo 455/16.1T8VFR.P1; acórdão da Relação de Guimarães, de 14.4.2016, processo 20/14.8T8FAF.G1; acórdão da Relação de Coimbra, de 29.5.2012, processo 2715/11.9TBACB.CV1; acórdão da Relação de Coimbra, de 13.11.2012, processo 67/12.9T2VGS.C1; acórdão da Relação de Évora, de 13.02.2014, processo 1665/11.3TBCTX.E1; acórdão da Relação de Évora, de 12.02.2015, processo 341/13.7TBVV.E1; acórdão da Relação de Évora, 08.9.2016, processo 431/12.3TBBJA.E1; acórdão da Relação de Évora, de 09.3.2017, processo 6589/15.2T8STB.E1.

No ac. do TRL de 11.09.2012, proferido no proc. 3203/11 considerou-se não serem devidos juros remuneratórios, em resultado do AUJ nº 7/2009.

No ac. do TRL de 7/02/2013, proc. 1384/12, considerou-se a cláusula nula por violação do disposto no artº 22º, nº 1, l) da LCCG (como é defendido no caso pelo apelante);

No ac. do TRL de 17.10.2017, processo 201/15, considerou-se nula uma cláusula idêntica à dos autos, por violação do disposto no artº 15º e 19º alínea c) da LCCG ( e também no acórdão já citado 71/15, conforme já referido).

No ac.do TRP de 10.11.2015, proc. 1060/15, considerou-se que a ressalva que foi feita no AUJ foi só no sentido de que as partes poderiam adoptar regime diferente do previsto no artº 781º do CC e não no sentido de que as partes poderiam incluir no valor das prestações os juros remuneratórios quanto às prestações vencidas e não pagas.

No Ac. do TRP de 25.10.2016, proc.455/16 entendeu-se que, “mantendo-se actual e em vigor a solução decretada no AUJ nº 7/2009, terá de interpretar-se a cláusula em questão no sentido de que, quanto às prestações vincendas ao tempo da perda do benefício do prazo segundo a vontade do mutuante, se não terão como incluídos nelas juros remuneratórios ou encargos inerentes. Estes serão incluídos apenas em relação às prestações vencidas até ao momento da invocação, pelo mutuante, da perda do benefício do prazo. No caso contrário, tal cláusula seria nula, porquanto, devendo ser interpretados à luz daquele AUJ nº 7/2009, os arts. 19º e 20º do D.L. 133/2009 sempre proibiriam, de forma imperativa, a possibilidade de, perante o incumprimento do mutuário, o mutuante poder accionar os mecanismos a que alude esse art.º 20º , invocando a perda do benefício do prazo e exigindo os juros remuneratórios sobre as prestações ainda vincendas. “

No ac. do TRG de 14.04.2016, proc. 20/14, considerou-se que não são devidos “os pretendidos juros remuneratórios (e inerentes encargos) referentes às prestações cujo vencimento foi antecipado na sequência do incumprimento da ré consumidora.

Aliás, “numa interpretação sistemática e coerente do diploma (DL 133/2009), não se compreenderia que fossem usados critérios tão diversos e com consequências tão desequilibradas entre si, entre o regime do reembolso antecipado do capital mutuado por parte do mutuário, e o regime da perda do benefício do prazo ou da resolução do contrato, estes por incumprimento contratual do mutuário.


Na verdade, estabelecendo art.º 19º do diploma, uma compensação perfeitamente equilibrada para o caso do reembolso, por parte do mutuário, da totalidade ou de parte do capital mutuado (0,5% do capital reembolsado no caso de falta um ano ou menos para o termo do contrato, e de 0,25% desse capital, se o prazo superior, desde a taxa nominal aplicável seja fixa), não se compreenderia que no caso de incumprimento do mutuário, com a consequente perda do benefício do prazo de que resulta o vencimento imediato das prestações vincendas, as sanções fossem de tal forma violentas e desproporcionadas que obrigassem o mutuário a pagar juros remuneratórios sobre as prestações vincendas, remunerando assim um capital a que já não tem direito (vide neste sentido Acórdão do TRL de 07/02/2013, proferido no Proc. n.º 10/11.2TBAGH.L1-2, e jurisprudência e doutrina aí citadas)” - In acórdão da RE de 12/2/2015, disponível em
www.dgsi.pt.”

No Ac. do TRE de 1665/11, de 13/2/2014 defendeu-se que “Em síntese:nada obsta que não se acate um acórdão uniformizador de jurisprudência, quando o contrato ora submetido à apreciação do Tribunal contenha cláusulas divergentes do que esteve na base do dito acórdão; num contrato de crédito a consumidores, a cláusula a considerar vencidas todas as demais prestações, incluindo nelas os juros remuneratórios, em caso de perda do benefício do prazo, corresponde a uma camuflada e desproporcionada cláusula penal e, como tal, proibida e nula.

No Ac. do TRE de 12.02.2015, proc. 341/13 considerou-se que “Resta optar pela solução que entendemos mais conforme com a legislação aplicável.

Como acima dissemos, é manifesto que o espírito que presidiu à elaboração do Decreto-Lei n.º 133/2009, foi no sentido expressamente consagrado no seu Preâmbulo, de aumentar a eficácia da defesa do consumidor na concessão de crédito ao consumo, na linha da legislação que tem sido publicada sobre o tema.

Assim, atendendo à interpretação teleológica do diploma, que tem por fito estabelecer os mecanismos que permitam assegurar, de forma imperativa, a protecção do consumidor, e à coerência sistemática e racional que deve ser tida em conta na interpretação harmoniosa dos art.ºs 19º e 20º do diploma, ao que já acima aludimos, somos levados a perfilhar a tese (vide tb Jorge Morais de Carvalho, Manual do Direito do Consumo, 2013, a págs. 285 a 290), de que o diploma em apreço, veda, imperativamente, que num Contrato de Crédito ao Consumo, mormente num Contrato de Mútuo, estabelecido entre uma entidade que tem como actividade profissional a concessão de crédito e um consumidor, se estabeleçam cláusulas que permitam ao credor, em caso de, por sua iniciativa, e em face do incumprimento do devedor, accionar os mecanismos a que alude o art.º 20º do diploma, invocando a perda do benefício do prazo, poder exigir à contraparte juros remuneratórios sobre as prestações que se venceram imediatamente por via dessa invocação.

Pelo que são nulas as cláusulas que contrariem a interpretação dessa norma, o que se declara quanto à Cláusula 7ª, alínea b), na parte em que faculta ao credor exigir juros remuneratórios sobre as prestações que se venceram imediatamente por via da invocação da perda do benefício do prazo.

Mas mesmo que assim não se entendesse, e se adoptasse a tese, em termos gerais, de que é admissível a estipulação de uma cláusula, por iniciativa de ambas as partes, de que são devidos juros remuneratórios sobre as prestações vencidas por via da invocação, pelo credor, da perda do benefício do prazo, sempre a 1ª parte da alínea b) da Cláusula 7ª, seria nula “ao menos nos contratos de adesão celebrados com consumidores finais, nula por permitir ao Banco exigir a antecipação de uma contraprestação de uma prestação que ele não vai realizar [aplicando as ideias dos tipos de cláusulas abusivas previstas nas als. f) e o) do anexo à Directiva 93/13/CEE do Conselho de 05/04/1993, com concretização na al. l) do nº. 1 do art. 22 da LCCG do Dec.-Lei 446/85]. “ (Acórdão do TRL de 07/02/2013, proferido no Proc. n.º 10/11.2TBAGH.L1-2).”

No mesmo sentido deste último acórdão se entendeu, no Ac. do TRE de 8.09.2016, proc.431/12.

Não se nos afigura, com o devido respeito por opinião contrária, que o AUJ 7/2009, vede a inclusão num contrato de mútuo oneroso da possibilidade de se vencerem juros remuneratórios, como tem sido entendido nalgumas decisões.
O afirmado no ponto 10 do referido AUJ só faz sentido, se for reportado à questão essencial nele discutida, que é precisamente a da aplicabilidade aos juros remuneratórios futuros da possibilidade de vencimento antecipado prevista no art.º 781.º do Código Civil, permitindo assim que se estabeleça regime diferente.

E também não se nos afigura que a possibilidade de serem devidos juros remuneratórios está imperativamente vedado pelo DL 133/2009. O legislador continuou a deixar sem solução a questão.

A nulidade da cláusula poderá resultar, por se tratar no caso de um contrato de adesão, de violação do estabelecido no DL 446/85. E neste quadro, a conclusão pela proibição da cláusula terá de ser analisado caso a caso, tendo em conta cada contrato concreto e a globalidade das cláusulas contratadas.

No caso dos autos, as partes expressamente estabeleceram, além do acordado na cláusula 8º b), que seria devida em caso de mora, sobre o montante em débito, a título de cláusula penal, uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual acrescida de 4 pontos percentuais (cláusula 8ª alínea c).

Ora, a possibilidade de cumulação destes juros com os juros remuneratórios, leva-nos a concluir que a 1ª parte da cláusula 8º b) impõe uma antecipação de cumprimento exagerada, permitindo ao apelado exigir a antecipação de uma contraprestação de uma prestação que ele não vai realizar, num quadro em que já estão também previstos juros de mora, mais cláusula penal e mais os juros de mora sobre os juros remuneratórios vincendos (para além do imposto de selo).

E assim sendo, não são devidos os juros remuneratórios, por a cláusula ser nula (artº 22º, nº 1, alínea l) e 24º do DL 446/85), assistindo razão ao apelante.

IV – Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em julgar procedente a apelação e consequentemente, revogam parcialmente a sentença recorrida na parte em que condena o apelante a pagar-lhe juros remuneratórios relativos a prestações de períodos que ainda não tinham decorrido, com a inerente repercussão sobre os juros vencidos e vincendos e imposto de selo.
Custas pela apelada.
Notifique.
Guimarães, 19 de abril de 2018.

Helena Melo
Pedro Damião e Cunha
Maria João Matos



1. Ver a propósito, entre outros, o Ac. do TRE de 31.05.2012, proferido no proc. 245/08 e os Acs. do STJ (só sumário) de 19.03.2000, proferido no proc. 98B111 e de 24.02.99, proferido no processo 087683, a propósito de questões que não foram suscitadas no Tribunal da Relação, mas apenas no Supremo, todos acessíveis em www. dgsi.pt.