Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1296/12.0TBVCT.G1
Relator: MARIA LUÍSA RAMOS
Descritores: NOVAÇÃO
ABUSO DE DIREITO
GRAVAÇÃO DA PROVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/06/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I. Ao não exercerem o ónus previsto no n.º1, parte final, do art.º 512º do Código de Processo Civil, de requererem a gravação da audiência final, as partes, entre elas os ora recorrentes, prescindiram da legal possibilidade de, em via de recurso, virem a impugnar a matéria de facto.
II. II. Ocorrendo a assunção de dívida nos termos do artº 595º -nº1-alínea.b) do Código Civil, obrigando-se um terceiro perante o credor a efectuar a prestação devida por outrem, não exonerando o credor, expressamente, o antigo devedor, pode exigir o cumprimento da obrigação de qualquer deles (como decorre do n.º2, do citado artigo).
III. III. A inexistência da prova do “ animus novandi “, desde logo, afasta a integração da figura jurídica da Novação prevista nos art.º 857º e 858º do Código Civil.
Decisão Texto Integral: Processo nº1296/12.0TBVCT.G1
Apelação em Processo Ordinário e Especial
1ª Secção Cível

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

F… intentou acção declarativa, com Processo Ordinário, nº1296/12.0TBVCT, do 4º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Viana do Castelo, contra a Herança Ilíquida e indivisa aberta por óbito de L…, sendo únicos e universais herdeiros a viúva A… e os filhos, A… e H…, pedindo se declare nulo o contrato de mútuo celebrado entre o Autor e o falecido L…, condenando-se a herança a restituir-lhe a quantia de €107.771,50 e juros vincendos até integral pagamento.
Alega que desde há mais de 20 anos que vinha emprestando dinheiro ao falecido L… para as suas actividades empresariais.
Em 31 de Dezembro de 2010, mais uma vez, a solicitação do falecido, emprestou-lhe €107.711,50, pelo prazo de um ano, prorrogável por mútuo acordo, empréstimo esse que foi reduzido a escrito e assinado pelo falecido e pelo Autor.
Nesse mesmo acto o falecido L… entregou ao A. o cheque referido nos autos para ser descontado em 31.12.2011.
Acontece que L… faleceu no dia 10 de Junho de 2011.
O Autor reuniu com a viúva e os filhos, informando o montante do débito, e o Autor e a viúva do falecido reduziram a escrito um acordo no qual aquela reconhecia o empréstimo, tendo, por conveniência daquela, alterado o prazo de restituição do dinheiro para Dezembro de 2013.
Tendo o Autor tomado conhecimento de que a viúva se estava a desfazer de bens para pagar dívidas e, sendo o contrato de mútuo nulo por falta de forma, recusando-se esta a dar ao Autor as garantias por este exigidas, o Autor viu-se na necessidade de instaurar a acção.
Devidamente citados vieram os Réus contestar na qualidade de únicos herdeiros da Herança aberta por óbito de L…, invocando a ilegitimidade da herança dizendo que, na sequência do acordo estabelecido entre o Autor e a viúva de L…, foram desonerados os co-herdeiros, filhos, bem como a própria herança, ficando a questão em causa a ser resolvida unicamente entre o Autor e A…, assumindo esta, em seu nome próprio, nova dívida perante o Autor no pressuposto de que com a contracção desta nova divida se extinguisse a dívida anterior, pelo que tal divida não veio a ser considerada na relação de bens e partilha da herança, tendo-se extinto a dívida que exonerava a herança por novação.
Mais invocando o abuso de direito, dizendo que sempre foi o Autor quem formalizou os empréstimos com o falecido L… mediante simples documentos particulares e foi o Autor quem negociou com A… a resolução do compromisso anterior e quem elaborou o documento em termos semelhantes ao anterior.
A celebração do contrato de mútuo com inobservância do formalismo legal deveu-se apenas à conduta do Autor que, agora, vem a juízo, aproveitar tal facto que foi determinado pela sua vontade.
O Autor apresentou réplica.
Procedeu-se à elaboração de despacho saneador, tendo sido julgada improcedente a excepção de ilegitimidade passiva suscitada, declarando-se ainda todos os Réus, herdeiros, partes legitimas e intervenientes na acção, tendo exercido direito de defesa, tendo a decisão transitado em julgado, mais se organizando os factos assentes e a base instrutória.
Procedeu-se a Audiência de Discussão e Julgamento, tendo vindo a ser proferida sentença, que julgou a acção totalmente procedente, decidindo :
- Declarar nulo o contrato celebrado entre A. e L….
- Condenar os RR. A…, H… e M…, enquanto herdeiros de L… e na proporção da quota que coube a cada um na referida herança, a pagarem ao A. a quantia de €107.771,50 com juros desde a citação até integral pagamento à taxa de 4% - portaria 291/03 de 08.04.

Inconformados vieram A… , A… e H…, na qualidade de únicos herdeiros da Herança aberta por óbito de L…, recorrer, interpondo recurso de apelação.

O recurso foi recebido como recurso de Apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresentam, os recorrentes formulam as seguintes conclusões:
(…)

O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, tal como decorre das disposições legais dos artº 684º-nº3 do CPC, atentas as conclusões da apelação deduzida, e supra descritas, são as seguintes as questões a apreciar:
- reapreciação da matéria de facto
- alegada nulidade de sentença
- do mérito da causa



FUNDAMENTAÇÃO
I) OS FACTOS ( factos declarados provados na sentença recorrida ).
1. A solicitação do falecido L…, o Autor emprestou-lhe e entregou-lhe a quantia de € 107.711,50, pelo prazo de 1 ano, prorrogável por mútuo
acordo, montante destinado às suas actividades empresariais – cfr. al. A
dos Factos assentes.
2. O falecido L… entregou ao Autor o cheque nº 233 778 4028, emitido a favor deste, sacado sobre o B…, titulando a quantia de € 107.711,50, com vencimento em 31/12/2011 – cfr. al. B dos Factos Assentes.
3. Tal cheque era para ser descontado no fim do prazo do empréstimo – cfr.
al. C dos Factos Assentes.
4. L… faleceu no dia 10 de Junho de 2011 (assento de nascimento junto como doc. nº 3 com a petição inicial) – cfr. al. D dos Factos Assentes.
5. No dia do funeral a Ré viúva dirigiu-se ao Autor e declarou-lhe que sabia
que tinha contas para pagar e que depois lhe telefonaria para combinarem
uma reunião – cfr. al. E dos Factos Assentes.
6. Nos princípios de Setembro de 2011, o Autor reuniu com a viúva e os filhos, na Café Castelo, sito no Campo da Agonia, em Viana do Castelo, a quem informou do montante em dívida e de todos os detalhes do acordado
com o falecido – cfr. al. F dos Factos Assentes.
7. Após mais duas reuniões, em Dezembro de 2011, no escritório do falecido, na casa da quinta onde a viúva vivia, e vive, com os filhos, a Ré A… reconheceu o empréstimo de € 107.711,50 – cfr. al. G dos Factos Assentes.
8. Por documento escrito intitulado de “contrato de mútuo”, datado de 31 de Dezembro de 2011, F…, aqui Autor declarou que “neste acto, a título de empréstimo, entrega ao segundo outorgante (A…), a quantia de € 107.711,50 (cento e sete mil setecentos e onze euros e cinquenta cêntimos), pelo prazo de dois anos, não prorrogável”, e a segunda outorgante, a identificada A…, declarou que “pagará 8% de juros ao ano, durante o tempo em que vigorar o empréstimo,...comprometendo-se a liquidar os juros mensalmente, e a amortizar o empréstimo, logo que comece a receber os fundos provenientes da A… comprometendo-se a entregar bens, no valor em falta, se à data do vencimento do empréstimo, trinta e um Dezembro de dois mil e treze, o referido empréstimo ainda não estiver liquidado.” – cfr. al. H dos Factos Assentes.
9. O documento supra referido foi elaborado pelo Autor – cfr. al. I dos Factos Assentes.
10.Por escritura pública denominada “partilha” outorgada no dia 10 de Abril de 2012, exarada a fls. 26 a 27 verso do livro de notas para escrituras diversas nº 130-G, do Cartório Notarial de Aveiro de Deolinda Rolo, sito na Avenida dos Congressos da Oposição Democrática, nº 65, J, em Aveiro os Réus A… e H…, declararam, para além do mais, que são bens próprios de L…: Número um: Prédio urbano de rés do chão e primeiro andar, com capela, tanque e logradouro, sito na Pontelha, freguesia de Neiva, concelho de Viana do Castelo, inscrito na matriz sob o artigo 210, com o valor patrimonial tributário de € 381,73 e o atribuído para este acto de € 60.000,00, descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo sob o nº 480, onde se acha registada a favor do autor da herança pela Ap. 20 de 24 de Setembro de 1998, com uma hipoteca registada a favor do Banco…, S.A., pela Ap. 6 de 20 de Dezembro de 2006; Número dois: O quinhão hereditário que cabe ao falecido L… por óbito de seu pai M…, correspondente a 1/6 da mesma herança Mais, declararam que são bens adquiridos pelo autor da herança, a título oneroso na constância do seu casamento: Número três: Quota do valor nominal de € 3750,00, no capital social da sociedade comercial por quotas com a firma “Q…”; Somando os valores atribuídos aos bens o total de € 93.750,00, constituindo o valor da herança do falecido o montante de € 91.875,00. – cfr. al. J dos Factos Assentes.
11. Declararam, ainda, na referida escritura que os referidos bens são adjudicados, em comum e partes iguais, aos outorgantes A… e H…, no valor de € 46.875,00, para cada um, levando cada um deles a mais que o seu quinhão o valor de € 16.250,00, valor que cada um deles se obriga a pagar, a título de tornas, à primeira outorgante A…, até ao dia 31/12/2012 – cfr. al. K dos Factos Assentes.
12. A dívida referida na alínea A) não foi participada na relação de bens da herança elaborada em 23 de Setembro de 2011 e entregue nas Finanças nem foi objecto de partilha realizada em 10 de Abril de 2012 – cfr. al. L dos Factos Assentes.
13. Desde há mais de 20 anos que o Autor emprestava dinheiro ao falecido L… – cfr. resposta ao quesito 1º.
14.O A. e o falecido L… subscreveram o documento junto aos autos a fls. 8 e 9 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido – cfr. resposta aos quesitos 2 a 5.
15.O documento referido em H) destinou-se a alterar os termos do empréstimo concedido ao falecido referido em B) quanto ao prazo de restituição do dinheiro – cfr. resposta ao quesito 6.
16.O que ocorreu por conveniência da Ré A… – cfr. resposta ao quesito 7.
17.A A… está a desfazer-se de bens para pagar dívidas – cfr. resposta ao quesito 8.
18.O Autor exigiu garantias de bom pagamento do empréstimo – cfr. resposta ao quesito 9.
19.As quais lhe foram recusadas – cfr. resposta ao quesito 10.-
20.Por forma a obter mais rendimento a R. A… decidiu efectuar trabalho nocturno e por turnos – cfr. resposta ao quesito 23.


II) O DIREITO APLICÁVEL
1. Pretendem os recorrentes se proceda à reapreciação e alteração da matéria de facto fixada na sentença recorrida, nos termos do artº 712º-nº1, al. a) e b) do Código de Processo Civil , alegando ter ocorrido erro de julgamento relativamente à matéria do art.º 6º da Base Instrutória, invocando que os depoimentos testemunhais em que se baseou a Mº Juiz “ a quo “ para fundar a matéria dada como provada a este quesito 6, são parciais, inconsistentes e insuficientes pelo que deveria este quesito sido dado como não provado.
Nos termos do disposto no artº 712º-nº1-al. a), do Código de Processo Civil, a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto só pode ser reapreciada pela Relação se do processo constarem todos os meios de prova que serviram de base á decisão, designadamente, tratando-se de prova testemunhal, a gravação da prova produzida em Audiência.
Nos termos do art.º 522-B do Código de Processo Civil, “ As audiências finais e os depoimentos, informações e esclarecimentos nelas prestadas são gravados sempre que alguma das partes o requeira, por não prescindir da documentação da prova nelas produzida, quando o tribunal oficiosamente determinar a gravação e nos casos especialmente previstos na lei.”
Inexistindo especial regulamentação que determine a oficiosa gravação dos actos de Audiência, no caso em apreço, nem tendo sido proferido qualquer despacho nos autos a determinar tal registo, rege o disposto no art.º 512º do Código de Processo Civil, nos termos do qual, se o processo houver de prosseguir para julgamento são as partes notificadas para, nomeadamente, requererem a gravação da audiência final.
Nos autos, e na sequência da notificação legal para efeitos do artº 512º do Código de Processo Civil, ordenada no despacho saneador e base instrutória, as partes apresentaram os requerimentos probatórios de fls. 104 e 109, não tendo requerido a gravação da audiência final, assim, a tal efeito nada requerendo no prazo legal ( - sendo incorrecta a declaração em sentido contrário expressa na acta de julgamento a fls. 125 dos autos ) – sendo, aliás, o artº 791-nº2 referido na acta norma inaplicável no caso em apreço, sendo norma de regulamentação do processo sumário ).
Assim, conclui-se, nos autos nenhuma das partes requereu a gravação dos actos da audiência final, nem tal gravação foi ordenada pelo tribunal, nem norma existe que determine a sua realização oficiosa.
Assim, ao não exerceram tal ónus previsto no n.º1, parte final, do art.º 512º do Código de Processo Civil, as partes, entre elas os ora recorrentes, prescindiram da legal possibilidade de, em via de recurso, virem a impugnar a matéria de facto.
Nestes termos, no caso sub judice, e não obstante, por manifesto lapso da Sr.ª funcionária que esteve presente em julgamento, se haja procedido a tal gravação, não requerida pelas partes, nem judicialmente ordenada, não é legalmente admissível a impugnação da matéria de facto pois que a gravação realizada é absolutamente inexistente juridicamente, pelos motivos acima expostos.
Pelo exposto, não sendo legalmente admissível a reapreciação da matéria de facto, não se conhecerá da mesma, mantendo-se inalterada a factualidade fixada em 1ª instância.
2. Alegando os apelantes que a sentença é nula nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 668° do Código de Processo Civil, por omissão de pronúncia em virtude de a Meritíssima Juiz “a quo” não se ter pronunciado sobre as circunstâncias constitutivas de abuso de direito alegado pelos Réus, nulidade esta que, efectivamente, resultava dos termos da sentença recorrida, nos termos do indicado preceito legal o qual dispõe que é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, não tendo a Mª Juiz “ a quo “ abordado a questão em referência na sentença, tal nulidade veio a ser suprida nos termos do despacho de fls. 175/6 proferido nos termos do nº1 do artº 670º do Código de Processo Civil, mostrando-se, consequentemente, corrigido o vício, de cariz exclusivamente adjectivo ou processual, não subsistindo a arguida nulidade de sentença.
3. Abandonando os Réus a tese, assumida na contestação, da extinção da divída que exonerava a herança por Novação, alegadamente na sequência do acordo estabelecido entre o Autor e a viúva de L…, defendendo os Réus ter assumindo esta, em seu nome próprio, nova dívida perante o Autor no pressuposto de que com a contracção desta nova divida se extinguisse a dívida anterior, ficando desonerados os co-herdeiros, filhos, bem como a própria herança;
vêm, ora, sem sede de alegações de recurso defender, igualmente, ter ocorrido extinção da indicada dívida, mas decorrente da assunção da dívida anterior, referente ao falecido L…, por parte da Ré A…, acordada com o credor, Autor na acção, assunção esta, referem, efectuada nos termos do artigo 595.º do Código Civil, baseando-se, ainda, os recorrentes na pretendida eliminação da matéria de facto do ponto nº 15 do elenco dos factos provados, correspondente à matéria declarada provada do artº 6º da Base Instrutória.
A decisão desta questão, de qualquer modo, é independente de tal formulação do quesito e respectiva prova, sendo a alteração pretendida, e indeferida, indiferente à decisão.
Nos termos do artigo 595º -nº 1 do Código Civil, a transmissão a título singular de uma dívida pode verificar-se : b) por contrato entre o novo devedor e o credor, com ou sem o consentimento do antigo devedor ;
mais dispondo o n.º 2, do citado preceito legal, que, em qualquer dos casos a transmissão só exonera o antigo devedor havendo declaração expressa do credor; de contrário o antigo devedor responde solidariamente com o novo obrigado.
Ora, no caso em apreço, tal declaração de exoneração do antigo devedor, o falecido Luís Manuel Gomes Freixo, não existe, tal como claramente decorre do texto do acordo escrito intitulado de “contrato de mútuo”, datado de 31 de Dezembro de 2011, celebrado entre F…, aqui Autor e M…, e a que alude o ponto nº8 dos factos provados.
E, assim, tendo assumindo a ora recorrente A…, perante o Autor a indicada divida do seu falecido marido, mantém-se a responsabilidade solidária da herança, e, consequentemente, concluída esta dos herdeiros, na medida em que não foi o anterior devedor expressamente desonerado pelo credor, podendo o Autor exigir a qualquer dos Réus o cumprimento da dívida, tratando-se de dívida solidária nos termos dos artº 595º-nº1-alínea.b) e nº2 e artº 518º e 519º, todos do Código Civil.
“ Como o próprio nome indica, a assunção de dívida é a operação pela qual um terceiro ( assuntor ) se obriga perante o credor a efectuar a prestação devida por outrem (… )o n.º2 estabelece ainda, como medida de protecção do credor, que este, não exonerando expressamente o antigo devedor, pode exigir o cumprimento da obrigação de qualquer deles. Os devedores são solidários (cfr. art.º 512º e 518º e sgs. ).
Neste caso fica existindo aquilo que os autores designam por co-assunção de dívida, assunção cumulativa, acessão ou adjunção à dívida “ – P.Lima e A.Varela, in Código Civil anotado, vol I, anotações ao art.º 595º.
A verdadeira assunção (liberatória) de dívida apenas existe no caso de o antigo devedor ser exonerado e ficar apenas vinculado o novo devedor ( v. autores e obra citada, pg. 580 ), o que no caso não se verifica, mantendo-se a responsabilidade dos Réus, a título de solidariedade;
não ocorrendo, assim, igualmente, pelas mesmas razões, e como decorre dos factos provados, Novação subjectiva por substituição do devedor nos termos do art.º 858º, 2ª parte, do Código Civil, não se provando a substituição do antigo devedor exonerado pelo credor;
nem a Novação objectiva, nos termos dos art.º 857º, não se provando a contracção de uma nova divida em substituição da anterior ,
desde logo por inexistência da prova do “ animus novandi “, elemento essencial caracterizador da referida figura (( Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 16/6/2009, 3/3/2009, 17/3/2009, disponíveis in www.dgsi.pt, e , Ac. do STJ publicados nos BMJ 401/599 e 455/524; Ac. TRP de 14/2/2008, 10/11/2000, 26/4/2001, e, Ac. Tribunal da Relação de Coimbra de 23/6/2009 e 28/6/2005, in www.dgsi,pt, e, na Doutrina, Almeida Costa, Obrigações, 9ª edição Almedina, 2003, págs. 1038; A.Varela, in Obrigações em geral, págs. 235, II e na R.L.J. Ano 118º, págs.30 ) antes se provando a sua inexistência, tal como resulta dos factos provados.
Com efeito, nos termos do art.º 857º do Código Civil, quando o devedor contrai perante o credor uma nova obrigação em substituição da antiga dá-se a novação, porém, para que esta efectivamente ocorra exige-se, ainda, nos termos do art.º 859º do mesmo diploma legal, que a vontade de contrair a nova obrigação em substituição da antiga seja expressamente manifestada.
E, assim, não havendo declaração expressa de que se pretende novar (animus novandi ), a obrigação primitiva não se extingue, sendo que a declaração é expressa quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação de vontade nos termos do n.º1 do art.º 217º do Código Civil – cfr. P.Lima e A.Varela, in Código Civil, anotado, II vol, pg.131;
sendo que, o caso sub judice, inexiste manifestação expressa nesse sentido, tal como é exigido pelo art.º 859º do Código Civil.
Igualmente não ocorre Dação “ pro solvendo “ ( datio pro solvendo ), prevista no artº 840º do Código Civil, na medida em que traduzindo-se esta na realização de uma prestação diferente da devida, para que o credor obtenha mais facilmente, pela realização do valor dela, a satisfação do seu crédito, dos factos provados não decorre constituir o novo contrato elaborado meio facilitador da satisfação futura do crédito tal como se prevê e estatui legalmente para a datio pro solvendo nos termos da disposição legal supra citada.
Constituiu-se, assim, A, a viúva do antigo devedor, o falecido L…, co-responsável pelo pagamento da indicada quantia em dívida, nos termos do artigo 595º -nº 1-alínea.b) do Código Civil, por assunção singular da dívida do seu falecido marido perante o Autor, mas, a par da responsabilidade pré-existente, e que subsiste, do de cujus, e, consequentemente, dos seus herdeiros.
Podendo o Autor, o credor, optar por demandar qualquer dos devedores, tendo, in casu, optado por demandar a Herança Ilíquida e indivisa aberta por óbito de L…, sendo únicos e universais herdeiros a viúva A… e os filhos, A… e H…, tendo nos autos sido sido julgada improcedente a excepção de ilegitimidade passiva suscitada, declarando-se ainda todos os Réus, herdeiros, partes legitimas e intervenientes na acção, tendo exercido direito de defesa, tendo tal decisão transitado em julgado.
Nestes termos se confirmando a sentença condenatória proferida, improcedendo os fundamentos da apelação.
4. E, pelas mesmas razões, de facto e de direito, improcede igualmente a apelação no tocante à alegada actuação do Autor em Abuso de Direito, nos termos do art.º 334º do Código Civil, o qual determina ser ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito, pois que os factos provados não abrangem a previsibilidade da norma, baseando-se os apelantes nesta invocação em factos que não se provaram, como salientou já a Mª Juiz “ a quo”, deste modo falecendo, desde logo por tais razões, os fundamentos da apelação.
Como refere P. Pais de Vasconcelos, in Teoria Geral do Direito Civil, 5ª edição, pg. 262 “ A jus-eticidade desempenha um papel importante na substância do direito subjectivo. Esta exige um direito de mérito, de conformidade com as coordenadas axiológicas, ético-jurídicas, do Direito (… ). De entre os princípios ético jurídicos avultam, entre outros, a boa fé e os costumes ( art.º 334º e 762º-n.º 2 do Código Civil )”, dispondo, ainda, este preceito legal, a par do já estatuído pelo art.º 334º, do citado diploma legal, que “ No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé”.
“ As normas jurídicas – Lex – influenciam a substância do direito subjectivo – Ius _ ao impor, proibir ou determinar o seu conteúdo e o modo do seu exercício. Trata-se de estatuir limites extrínsecos do direito subjectivo e ao seu exercício “- autor e obra citada.
“O abuso de direito é (…) contradição entre o respeito por uma estrutura formal ( através da qual se invoca um “direito” ) e a violação da intenção material em que normativamente se funda o mesmo direito que aquela estrutura pretende traduzir – Castanheira Neves - Questão de Facto - Questão de Direito ou o Problema Metodológico da Juridicidade, pg. 524”.
Analisados os autos, na sua globalidade, e o exercício do direito do Autor que no processo se realiza, afigura-se o mesmo, absolutamente, legítimo e correspondente a exigência do cumprimento de estipulação contratual, salientando-se que a dívida do falecido L…, no valor de € 107.711,50, decorrente de empréstimo que lhe foi concedido pelo Autor, a solicitação do falecido, pelo prazo de 1 ano, destinado às suas actividades empresariais, com vencimento em 31/12/2011, à data da propositura da acção – 25/4/2012, se mostrava vencida, há vários meses, sendo devida e exigível, nos termos acima assinalados.
Conclui-se, nestes termos, pela total improcedência da apelação.
DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença proferida.
Custas pelos apelantes.
Guimarães, 6 de março de 2014
Luísa Duarte
Raquel Rego
António Sobrinho