Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
344/09.6TCGMR.G1
Relator: EVA ALMEIDA
Descritores: PERMUTA
DEMARCAÇÃO
PRÉDIO CONFINANTE
NULIDADE POR FALTA DE FORMA LEGAL
ABUSO DE DIREITO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/05/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I - A “permuta” ou cedência de pequenas áreas de terreno entre prédios confinantes para o acerto de estremas (demarcação extrajudicial), não está sujeita às exigências de forma previstas para a alienação de imóveis.
II - A invocação da nulidade de negócio, com fundamento na inobservância da forma legal, efectuada por quem propôs o negócio e criou na contraparte uma situação de confiança, com base na qual esta tomou disposições ou organizou planos de vida, que lhe acarretarão danos se a confiança legítima vier a ser frustrada, constitui abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.
III- Embora a doutrina e a jurisprudência entendam, maioritariamente, que o abuso de direito não poderá obstar à declaração da nulidade, sendo apenas fundamento da obrigação de indemnizar, é defensável que, quando as circunstâncias do caso concreto apontem para “uma clamorosa ofensa do princípio da boa-fé e do sentimento geralmente perfilhado pela comunidade, o abuso de direito sirva de válvula de escape, tornando válido o acto formalmente nulo, como sanção do acto abusivo”.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I – RELATÓRIO
A.. e mulher M.., intentaram a presente acção declarativa com processo comum, sob a forma ordinária, contra A.. e mulher A.., pedindo que estes sejam condenados:
A) A reconhecerem que os autores são donos e legítimos possuidores do prédio urbano descrito no artigo 1 ° da petição, com as delimitações resultantes do descrito nos artigos 2° a 16° e 43° a 52°, da petição;
B) A reconhecerem que o muro a que se alude nos artigos 43° a 52°, da petição, é propriedade dos autores;
C) A reconhecerem que o caminho de servidão melhor descrito nos artigos 28° a 36°, da petição, e que liga a rua do.. à sua propriedade identificada no artigo 25°, da petição, fazia e faz, corno sempre fez, parte da Quinta do.., a que se faz referência no artigo 26°, da petição;
D) A reconhecerem que os Autores sempre puderam passar livremente, a pé, com animais, veículos automóveis, ligeiros ou pesados, e com tratores agrícolas, pelo caminho referido na alínea anterior a fim de acederem ao seu identificado prédio pela entrada a que se alude nos artigos 11°,54°,55°,56°, 57° e 59°, da petição;
E) A reporem à sua cota original todo o traçado do caminho de servidão descrito nos artigos 28° a 36°, da petição, e que liga a rua do.. à sua propriedade identificada no artigo 25°, da petição, deste articulado, rebaixando-o por forma a que o prédio dos Autores não fique sujeito a receber mais águas, terras e entulhos arrastadas pelas chuvas, do que aqueles que recebia antes das obras levadas a cabo pelos Réus e a que se faz referência nos anteriores artigos 53° a 57°, da petição;
F) A absterem-se de, por qualquer forma, impedirem, limitarem ou dificultarem o livre exercício de todos os direitos contidos no direito de propriedade dos Autores sobre o prédio e muro referidos nas anteriores alíneas a) e b), bem como o direito de livre passagem no caminho referido nas anteriores alíneas d) e e);
G) A pagarem aos Autores a indemnização que se vier a liquidar em sede de execução de sentença, por todos os prejuízos patrimoniais e não patrimoniais causados em virtude das alegadas violações do direito de propriedade daqueles;
H) Em sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso no cumprimento das obrigações determinadas através de sentença que venha a ser proferida nos presentes autos, devendo o respectivo montante ser fixado de acordo com o estabelecido no artigo 829.o-A do Código Civil (CCiv), mas em quantia nunca inferior a € 50,00 (cinquenta euros).
Alegaram, em síntese, que, são legítimos proprietários do prédio descrito sob o n.º .. da Conservatória do Registo Predial, correspondendo este à parcela que adquiriram a J.., através da escritura pública celebrada a 14.05.1993, e às parcelas adquiridas, por compras verbais celebradas em 1992 e 1993 a J.., reduzidas a escrito através de documentos particulares; as aquisições destas parcelas de terreno a J.. foram-no com vista à entrada de veículos no prédio dos autores; posteriormente, houve um acordo entre os autores, o vizinho e os réus, proprietários do prédio confinante com o dos autores e ainda com o vizinho A.., para o alargamento do caminho; combinaram ainda o alinhamento de estremas e reconstrução do muro; em sede de execução do acordo, as partes desentenderam-se quanto à propriedade do muro, tendo os réus abandonado a sua execução, a qual foi concluída pelos autores; os réus fizeram obras no caminho, pelo qual os autores sempre passavam para aceder ao respectivo prédio, alterando-o e colocando uma cancela, que impedia o acesso aos autores, situação contra a qual estes reagiram através da propositura da providência cautelar apensa, que viram deferida (sem que os réus tenham apresentado contestação).
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Os réus contestaram e deduziram reconvenção, pedindo a condenação dos autores/reconvindos a reconhecerem que os réus/reconvintes são donos e possuidores do prédio identificado nos artigos 31°, 32° e 33°, e que deste faz parte a faixa de terreno descrita nos artigos 27° a 29°, da contestação; a reconhecerem que, através das construções do muro e anexo, referidas nos artigos 14°,25° e 26°, da contestação, ocuparam a aludida faixa de terreno dos réus; a reconhecerem que essa ocupação é ilegítima e ilícita; a demolirem as construções e a retirarem dessa faixa de terreno os respectivos materiais.
Impugnaram os alegados acordos verbais de transmissão do direito de propriedade de parcelas de terreno por parte dos autores com J..; negaram que tenha havido qualquer acordo quanto à cedência de terreno para alinhamento de estremas, sustentando que, ainda que tivesse existido, a nulidade do mesmo, por inobservância da forma legal. Relativamente ao espaço de terreno, por onde o caminho se prolonga, invocaram a sua titularidade exclusiva como fazendo parte do seu prédio.
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O autor A.. faleceu na pendência da acção, tendo sido habilitados como seus sucessores a autora, J.. e J...
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Por despacho de fls. 104, o valor da acção foi fixado em € 106.800,00 e o da reconvenção em € 172.000,00. Tendo sido interposto recurso dessa decisão, e após a pronúncia pela Instância recursiva, foi, a fls. 136, proferido despacho a fixar o valor da reconvenção em € 4.800,00. A fls. 214, foi fixado o valor da acção em € 14.600,00 e o valor total da causa em € 19.400,00.
Nessa sequência, por despacho de fls. 296, as Varas de Competência Mista do Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães declararam-se incompetentes para a tramitação subsequente da acção, tendo sido ordenada a remessa do processo aos Juízos Cíveis, passando a seguir a forma sumária.
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Foi proferido despacho saneador onde se decidiu da validade e regularidade da instância e do processado, admitindo-se a reconvenção.
Seleccionou-se a matéria assente e controvertida, fixando-se a base instrutória.
Realizou-se a audiência de julgamento, com observância do formalismo legal.
Foi proferida sentença em que se decidiu, como questão prévia, que (…) «por força da decisão de admissão do incidente de intervenção, mas, ponderada a desistência dessa intervenção, a sentença a proferir neste processo não se encontrará dotada da eficácia que lhe seria conferida pelo artigo 332° do CPCiv, quanto aos chamados (que perdem essa qualidade).»
E no final:
«A. - Julgo a acção parcialmente procedente, e, em consequência:
1. Condeno os Réus a reconhecer que a Autora mulher e a herança aberta por óbito do Autor marido são proprietários do prédio descrito sob o n.o.., da freguesia de Ronfe, com inclusão das parcelas aludidas em r. e configuração constante do documento de fls. 462, com consideração do reconhecido nas ais. gg. e hh. da fundamentação de facto;
2. Condeno os Réus a reconhecer que o muro aludido em ii. e kk. é meeiro, sendo compropriedade dos Autores;
3. Condeno os Réus a reconhecer que os Autores, pelo caminho descrito nos nas ais. f. e z, e que liga a rua do.. à sua propriedade identificada em 1., deste dispositivo, sempre puderam passar livremente, a pé, com animais, veículos automóveis, ligeiros ou pesados, e com tratores agrícolas, a fim de acederem ao seu identificado prédio;
4. Condeno os Réus a absterem-se de, por qualquer forma, impedirem, limitarem ou dificultarem o livre exercício de todos os direitos contidos no direito de propriedade dos Autores sobre o prédio e de compropriedade sobre o muro referidos nas anteriores alíneas 3. e 4., bem como o direito de livre passagem no caminho referido nas anteriores alíneas;
5. Absolvo os Réus do restante peticionado;
B. Julgo a reconvenção improcedente e, em consequência:
6. Absolvo os Autores Reconvindos do pedido reconvencíonal,
As custas da presente acção e da reconvenção são da responsabilidade de ambas as partes, fixando-se o decaimento dos Autores em 25% e o dos Réus em 75% (cfr, artigo 527°11,2, do CPCiv). »
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Inconformados os réus interpuseram recurso, que instruíram com as pertinentes alegações em que formulam as seguintes conclusões:
1ª) As declarações que constam dos documentos referidos em J. dos factos provados são nulas por inobservância de forma legal, ou seja, escritura pública (artigos 875º e 220º do Código Civil).
2ª) Um eventual abuso do direito não justifica que se considere válido e eficaz um contrato de compra e venda de um bem imobiliário não formalizado por escritura pública (acórdão do STJ de 17/01/2002, in Col. Jur. STJ, Ano X, Tomo I, pg. 48).
3ª) Os pretensos vendedores dos tractos de terreno referidos nos documentos mencionados em J. dos factos provados, Dr. J.. e mulher E.., são casados no regime da comunhão geral (cfr. doc. nº 8 referido na inicial), pelo que as alegadas alienações sempre careceriam do consentimento do cônjuge mulher (artigo 1682º-A nº 1 alínea a) do Código Civil), o que, num caso (doc. nº 5 referido na inicial), de todo não foi dado, e no outro (doc. nº 6 referido na inicial) foi dado com inobservância da forma legal (artigo 1684º do Código Civil), pelo que sempre seria nulo (artigo 220º do Código Civil).
4ª) As alienações de bens imóveis efectuadas por um cônjuge, sem o consentimento do outro, quando casados em regime que não seja a separação de bens, são anuláveis (artigo 1687º nº 1 do Código Civil).
5ª) Os RR. não deviam ter sido condenados no referido em A.1. da sentença, a partir de “(…) com inclusão (…)” até “(…) de facto”, A.2. e A.4..
6ª) O pedido reconvencional de reconhecimento de que os RR. São donos e possuidores do prédio identificado em C. dos factos provados resulta, não apenas do facto referido em C., mas também, como se viu, dos factos referidos em VV., WW., XX., YY. e ZZ. dos factos provados, pelo que esse pedido, no segmento ora considerado, deveria ser julgado procedente.
7ª) Da alínea C. dos factos provados resulta que tal prédio confronta do poente com estrada municipal, o que significa que não está encravado por nele se integrar o caminho mencionado em F., Z. e AA. dos factos provados, o que também deveria ter sido reconhecido e resultará da procedência do mesmo pedido.
8ª) Também o segmento final daquele pedido, na parte respeitante ao reconhecimento de que desse prédio faz parte a faixa de terreno mencionada em J. dos factos provados, deveria ser julgada procedente, isto em virtude da acima alegada nulidade dos negócios translativos da propriedade da mesma faixa de terreno.
9ª) Esta conclusão determina a procedência dos demais pedidos formulados sob as alíneas b) (reconhecimento pelos AA. de que, através das construções do muro e anexo, referidas em AAA. dos factos provados, ocuparam a aludida faixa de terreno dos RR., isto nos termos referidos na alínea J. dos factos provados), c) (reconhecimento pelos AA. de que tal ocupação não é titulada por qualquer modo legítimo, é ilícita, não consentida e gratuita), d) (condenação dos AA. a demolirem as referidas construções, retirando da aludida faixa de terreno todos os materiais de que aquelas são feitas, após a demolição) e e) (condenados os AA. a restituírem aos RR. a mencionada faixa de terreno livre e devoluta).
10ª) A decisão recorrida violou as normas dos artigos 220º, 875º, 1682º-A nº 1, 1684º e 1687º do Código Civil.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida nos termos supra invocados e substituindo-se a mesma por outra que julgue a acção improcedente, também quanto ao referido em A.1. da sentença, a partir de “(…) com inclusão (…)” até “(…) de facto”, A.2. e A.4. e condene os AA. no pedido reconvencional,
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Foram apresentadas contra-alegações.
Admitido o recurso, os autos foram remetidos a este Tribunal da Relação, onde foi recebido sob a forma, modo de subida e efeito atribuídos pela 1ª instância.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A DECIDIR.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, tal como decorre das disposições legais dos artºs 635º nº4 e 639º do NCPC, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões “salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras” (artº 608º nº2 do NCPC).
As questões a apreciar são as constantes das conclusões que acima reproduzimos.
III – FUNDAMENTOS DE FACTO
Está assente, porque inimpugnada, a seguinte factualidade:
«- Oriundos da matéria assente:
a. A aquisição do prédio descrito sob o n.º .., da freguesia de Ronfe, está inscrita a favor de A.., confrontando aquele do sul com J.., do nascente com os Réus e do poente com J.. - cfr. al. a. da matéria assente.
b. Por escritura celebrada a 14,05.1993, no Segundo Cartório Notarial de Guimarães, J.. declarou vender a A.. o prédio urbano composto de casa de rés-do-chão, com uma dependência e terreno de logradouro, situado no lugar do.. da freguesia de Ronfe, descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o n.º .. - cfr. al. b. da matéria assente.
c. Por escritura pública celebrada no dia 15.04.2002, no Primeiro Cartório Notarial de Guimarães, os Réus adquiriram a J.. e mulher E.. parte do prédio rústico, denominado Bouça e Campo do Soutinho, sito no lugar do Barreiro, da freguesia de Ronfe, com a área de 1.700 m2, a confrontar do sul com os Autores, do nascente com D.., e do poente com estrada municipal e A.. descrito na na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o n. o .., e inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo .. - cfr. al. c. da matéria assente.
d. O prédio que os Autores adquiriram a J.., em tempos idos, conjuntamente com diversos outros prédios e, nomeadamente, aquele que se situa a norte e que pertenceu a A.., faziam parte da denominada Quinta do..- cfr. al. d. da matéria assente.
e. Também em tempos idos, o prédio mencionado em c. e as duas parcelas de terreno a que se faz referência no artigo 3. fizeram parte da Quinta do.. - cfr. al. e, da matéria assente.
f. Desde tempos imemoriais que o acesso da denominada Bouça do Soutinho, identificada em c., e das duas parcelas de terreno a que se reporta o artigo 3. era feito através de um caminho, com o piso em terra batida, com cerca de 1 ,80 m de largura - cfr. al. f. da matéria assente.
g. Os Réus altearam o leito do caminho referido na alínea anterior por forma a impedirem que as águas provenientes do caminho público escorressem para a respectiva casa de habitação - cfr. al. g. da matéria assente.
h. Os Réus fecharam a entrada da sua casa com uma cancela em metal e rede malha-sol - cfr. al. h. da matéria assente.
- Oriundos da base instrutória:
i. O prédio aludido em a. confronta, em parte, do norte com caminho público resposta (explicativa) ao artigo 1 ° da base instrutória.
j. J.. e E.. declararam vender ao Autor uma faixa de terreno de 50 m2 e outra faixa de terreno, no total de 162 m2, melhor identificadas nos documentos de fls. 29 a 31, dos autos de procedimento cautelar - resposta ao artigo 3 ° da base instrutória.
k. Os Autores entraram na posse do prédio mencionado em a., pelo menos, no ano de 1992 - resposta (restritiva) ao artigo 4° da base instrutória.
l. A aquisição da faixa de terreno de 50 m2 teve lugar em 29.03.1992 - resposta ao artigo 5° da base instrutória.
m. E a aquisição da outra faixa de terreno teve lugar no inicio do ano de 1993, para alinhamento da estrema comum e facilitar a entrada na propriedade de um automóvel ligeiro - resposta ao artigo 6° da base instrutória.
n. Nessa altura, procederam à delimitação do prédio através da construção dum muro - resposta ao artigo 7° da base instrutória.
o. Bem como da construção dum anexo e da plantação de árvores de fruto e outras plantas - resposta ao artigo 8° da base instrutória.
p. Por onde passaram a aceder - resposta ao artigo 10° da base instrutória.
q. A pé, com animais, com veículo automóvel ligeiro e com tractor que usavam para trabalhar na horta que têm no seu logradouro - resposta ao artigo 11 o da base instrutória.
r. Em 27.01.2002, perante a necessidade de os Autores procederem à regularização da situação de registo, J.., no local e em conjunto com o Autor marido, fixou a área das duas parcelas em 162 m2 - resposta ao artigo 12° da base instrutória.
s. Os Autores, por si e antepossuidores, sempre estiveram na posse do prédio identificado em a. e das parcelas mencionadas em por mais de 10, 15, 16, 17, 19,20,50 e 70 anos - resposta ao artigo 13° da base instrutória.
t. Contínua e de forma ininterrupta - resposta ao artigo 14° da base instrutória.
u. Usando-o, habitando-o e efectuando nele obras de conservação e de transformação - resposta ao artigo 15° da base instrutória.
v. Cultivando-o, limpando-o e colhendo todos os seus frutos e utilidades e suportando os respectivos encargos, nomeadamente os de natureza fiscal - resposta ao artigo 16° da base instrutória.
W. Praticando todos estes actos com ânimo de verdadeiros proprietários - resposta ao artigo 17" da base instrutória.
x. Com o conhecimento de todas a pessoas do lugar e freguesia de sua situação resposta ao artigo 18° da base instrutória.
y. E tudo sem a oposição de ninguém - resposta ao artigo 19° da base instrutória.
z. O caminho a que se alude em f. prolongava-se ao longo de, pelo menos, 20,50 mts, no sentido nascente-poente, entre o prédio identificado em a. e o prédio de A.. - resposta (parcial) ao artigo 20° da base instrutória.
aa. Fazendo a ligação à rua do.. - resposta ao artigo 21° da base instrutória.
bb. Factos estes que, quer J.. e mulher E.., quer os Réus, bem conheciam - resposta ao artigo 22° da base instrutória.
cc. E que os Réus nunca puseram em causa e respeitaram até há uns anos a esta parte - resposta ao artigo 24° da base instrutória.
dd. Os Réus solicitaram a A.. e aos Autores a cedência de alguns metros quadrados de terreno dos prédios de cada um deles, nas partes que confrontavam com o caminho atrás descrito - resposta ao artigo 25° (parte) da base instrutória.
ee. Possibilitando o seu alargamento para a largura que actualmente apresenta resposta ao artigo 26° (parte) da base instrutória.
ff. O que tanto o referido A.., como os Autores acederam e autorizaram - resposta ao artigo 27° da base instrutória.
gg. Na mesma ocasião, tendo em vista o acerto de estremas, os Réus solicitaram aos Autores a cedência da parcela de terreno assinalada a verde forte na planta junta sob o doe. n.º 12 aos autos de procedimento cautelar (cujo original está a fls. 462) - resposta ao artigo 28° da base instrutória.
hh. Por troca de uma outra, pertença daqueles, assinalada a azul, na mesma planta (cujo original está a fls. 462) - resposta ao artigo 29° da base instrutória.
11. Obrigando-se a procederem à construção do novo muro delimitador dos prédios de ambos - resposta ao artigo 30° (parte) da base instrutória.
JJ. Alcançado este acordo, de imediato, foram iniciados trabalhos de demolição do muro existente e construção do novo muro na nova localização definida resposta ao artigo 32° (parte) da base instrutória.
kk. Quando os Réus já haviam procedido à colocação de duas ou três faixas de blocos do dito muro, em virtude de uma divergência quanto à propriedade do muro, abandonaram a construção do mesmo, tendo os Autores terminado a sua construção, com a configuração se mantém até à presente data - resposta ao artigo 33° da base instrutória.
ll. Os Réus nunca puseram em causa até à dedução de reconvenção - resposta (explicativa) ao artigo 34° da base instrutória.
mm. Em data que os Autores não conseguem precisar, mas que situam no início do segundo semestre de 2007, os Réus fizeram diversas obras no caminho, tendo feito o alteamento do caminho a que se alude em g. ao longo de toda a sua extensão - resposta ao artigo 35° da base instrutória.
nn. Colocando uma fileira de cerca de 8 (oito) blocos de cimento em frente da entrada, por forma a segurar as terras - resposta ao artigo 36° da base instrutória.
oo. Acabando, assim, por dificultar o acesso dos veículos automóveis por parte dos Autores - resposta ao artigo 37° da base instrutória.
pp. E obrigando-os a retirarem aqueles blocos de cimento sempre que o pretendiam fazer - resposta ao artigo 38° da base instrutória.
qq. Os quais, de seguida, também se viam obrigados a repor - resposta ao artigo 39° da base instrutória.
rr. A cancela de metal e rede malha sol a que se alude em h. foi fixada contra a vontade expressa dos Autores- resposta ao artigo 40° (parte) da base instrutória.
ss. Logrando, dessa forma, impedir o acesso por parte destes ao seu prédio - resposta ao artigo 41 o da base instrutória.
tt. O caminho foi alargado pelos Réus entre 3,00 a, pelo menos, 3,80 - resposta (restritiva) ao artigo 45° da base instrutória.
uu. Utilizando em parte, para o efeito, terreno que lhes foi cedido por A.. - resposta (explicativa) ao artigo 46° da base instrutória.
vv. Há mais de 20, 30 e 40 anos que os Réus vêm possuindo o prédio mencionado em c. - resposta ao artigo 47° da base instrutória.
ww. Pagando as contribuições e impostos, fazendo as necessárias obras de conservação e melhoramento, usufruindo das utilidades e lá roçando matos resposta ao artigo 48° da base instrutória.
xx. À vista de toda a gente, incluindo dos Autores - resposta ao artigo 49° da base instrutória.
yy. Sem oposição de ninguém - resposta ao artigo 50° da base instrutória.
zz. Na convicção de quem exerce um direito próprio - resposta ao artigo 51° da base instrutória.
aaa. Em data não apurada, os Autores demoliram o muro e construíram um outro em blocos de cimento junto ao anexo - resposta (parcial) ao artigo 52° da base instrutória.»
IV – FUNDAMENTOS DE DIREITO
As conclusões dos apelantes, tal como as interpretamos, cindem-se em três questões principais:
– A primeira refere-se à aquisição do direito de propriedade pelos autores de um prédio urbano, que identificam em 1º da P.I, que lhes foi vendido por J.., mediante escritura celebrada a 14,05.1993, que já estava na respectiva posse pelo menos desde 1992 e onde integraram duas parcelas de terreno, que totalizam 162 m2, adquiridas por documentos particulares, entre 92 e 93, ao proprietário de um prédio com ele confinante.
– A segunda questão reporta-se, sinteticamente, ao direito de propriedade dos réus sobre o prédio descrito em c) dos factos assentes e à permuta, entre as partes, de parcelas de terreno, em resultado dos acordos mencionados em dd) a hh) dos factos provados, celebrados em data não apurada, mas que se presume posterior à aquisição pelos réus do respectivo prédio, que confina com o dos autores e que ocorreu em 2002.
– E na terceira, nebulosamente colocada, os recorrentes pretendem que se conclua dos factos provados que o caminho em discussão integra os respectivo prédio, pugnando pela procedência do pedido reconvencional.
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No tocante à primeira questão, entendem os recorrentes que não deviam ter sido condenados no referido em A.1. da sentença, a partir de “(…) com inclusão (…)” até “(…) de facto”, A.2. e A.4.., concretamente: “com inclusão das parcelas aludidas em r. e configuração constante do documento de fls. 462, com consideração do reconhecido nas als. gg. e hh. da fundamentação de facto”. . A.2. Condeno os Réus a reconhecer que o muro aludido em ii. e kk. é meeiro, sendo compropriedade dos Autores. A4 Condeno os Réus a absterem-se de, por qualquer forma, impedirem, limitarem ou dificultarem o livre exercício de todos os direitos contidos no direito de propriedade dos Autores sobre o prédio e de compropriedade sobre o muro referidos nas anteriores alíneas 3. e 4., bem como o direito de livre passagem no caminho referido nas anteriores alíneas;
Os recorrentes sustentam que, ainda que genuínos fossem os documentos referidos em J. dos factos provados, sempre as declarações que dos mesmos constam seriam nulas por inobservância de forma legal, ou seja, escritura pública (artigos 875º e 220º do Código Civil).
Há aqui que cindir a declaração de vontade, o negócio pretendido e a forma que a declaração deveria assumir, nos termos da lei, para a efectivação desse negócio.
Está provado que J.. e E.., declararam vender ao Autor uma faixa de terreno de 50 m2 e outra uma outra faixa de terreno, totalizando 162 m2, para acerto de estremas e para facilitar o acesso ao prédio dos autores, isto é para integrar o prédio dos autores que confinava com outros prédios dos vendedores.
A questão do negócio visado necessitar de ser celebrado por escritura pública e por isso a venda ser nula por vício de forma é outra questão, que posteriormente analisaremos, dando já por assente, que as declarações não são nulas e os documentos são meio de prova de que as mesmas foram prestadas.
Alegam igualmente os recorrentes que as alienações de bens imóveis efectuadas por um cônjuge, sem o consentimento do outro, quando casados em regime que não seja a separação de bens, são anuláveis.
Efectivamente são, mas enquanto o não forem o negócio permanece válido. Ora a anulabilidade, diferentemente da nulidade, só pode ser arguida pelas pessoas em favor das quais é estabelecida, no caso a mulher, E..; e num certo prazo, sendo certo que não foi arguida.
Assim, não podem os réus reconvintes, aqui recorrentes, valer-se do disposto no artº 1687º do CC, por não terem legitimidade para requerer a anulação do negócio, que, aliás, como decorre dos documentos juntos aos autos e do depoimento da própria E.., foi consentido por esta, estando tacitamente confirmado. Acresce que a matéria de facto não foi impugnada e da al. j) dos factos provados consta “(…) declararam vender ao Autor uma faixa de terreno de 50 m2 e outra faixa de terreno, no total de 162 m2”, nem sequer se colocando a questão da falta de declaração da mulher.
Quanto à exigência de escritura pública para a “cedência” entre proprietários confinantes de duas pequenas áreas, totalizando 162 m2, face ao que emerge dos documentos particulares juntos aos autos e referidos na motivação sob as als. b), c), d) e e) e dos factos provados sob as als. j), k), l), m) e n), a questão, quando se reporta a acerto de estremas, é discutível.
Com efeito, a demarcação dos prédios pode ser efectuada extrajudicialmente e não carece de ser celebrada por escritura pública (vide Ac. do TRL de 13-07-2010, proc. 504/06.1TBMFR.L1-1 in dgsi.pt). Não é um meio de aquisição do direito de propriedade, que já se mostrava adquirido, mas tão só de rectificação de estremas, ainda que tal envolva a cedência de áreas entre os proprietários confinantes, situação que aliás é excepcionada da proibição geral de fraccionamento [al. c) do artº 1377º do CC]. E é excepcionada precisamente porque não importa a constituição de um novo prédio, nem a alteração substancial do qualquer um deles. Ora, a redacção do artº 875º do CC e do artº 89º do Cod. do Notariado, ao tempo vigentes, refere-se a bens imóveis, tal como definidos no artº 204º do CC. Não se tendo autonomizado aquela pequena parcela de terreno enquanto um novo prédio rústico, sendo tão só um acerto entre prédios confinantes, para permitir um melhor acesso e a respectiva demarcação, é defensável que tal operação se possa validamente efectuar por documento particular.
Mas, mesmo que assim não se entenda, certo é que as ditas parcelas de terreno, integradas no prédio dos autores, adquiridas por documento particular, estão na respectiva posse, integrando o prédio dos autores, pelo menos desde inícios de 1993 (factos l), m) e n), s), t) a y), de forma ininterrupta, à vista de todos e sem oposição de ninguém. Isto é, os autores adquiriram a sua posse, que lhes foi transmitida pelos antepossuidores, independentemente da validade dos títulos (cfr. artº 1263º al. b)).
E, ainda que se pudesse considerar que a falta de título válido importaria considerar a posse sobre esta pequena área como não titulada, certo é que os autores lograram ilidir a presunção de má-fé, pois que do conjunto da prova produzida notoriamente emerge, que, com tal aquisição, mais do que ignorar a possibilidade de estarem a lesar direito de outrem, efectivamente não lesaram direito de quem quer que seja (artº 1260º do CC), muito menos dos réus, que nessa altura ainda nem haviam adquirido o respectivo prédio, precisamente àqueles com quem os autores negociaram.
Assim e no que apenas respeita às duas pequenas áreas de terreno integradas no prédio, validamente adquirido pelos autores em 1993 e registado a seu favor, mesmo que se entenda autonomizá-las e juridicamente dar-lhes tratamento diverso, certo é, que, por força do estabelecido no artº 1296º do CC, teríamos que considerar o direito de propriedade adquirido por usucapião.
Acresce que os autores podem juntar a sua posse à dos seus antecessores, pelo que, tal como resulta dos factos provados, já possuem o prédio, com as ditas parcelas, há tempo suficiente para a aquisição originária do direito, por via da usucapião, ainda que a sua posse se presumisse de má-fé.
Pelo exposto a argumentação do recorrentes, com que pretendem inverter o decidido no tocante aos pedidos em que foram condenados, nomeadamente o A1, falece, sendo certo que os argumentos aduzidos e acima apreciados em nada contrariam o mais decidido, na parte em que a acção procedeu.
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Para a apreciação da 2ª questão importa a matéria de facto das als. dd) a aaa), nomeadamente:
Por escritura pública celebrada no dia 15.04.2002, no Primeiro Cartório Notarial de Guimarães, os Réus adquiriram a J.. e mulher E.. parte do prédio rústico, denominado Bouça e Campo do Soutinho, sito no lugar do Barreiro, da freguesia de Ronfe, com a área de 1.700 m2, a confrontar do sul com os Autores, do nascente com D.., e do poente com estrada municipal e A.. descrito na na Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o n. o.., e inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo..,
Os Réus solicitaram a A.. e aos Autores a cedência de alguns metros quadrados de terreno dos prédios de cada um deles, nas partes que confrontavam com o caminho atrás descrito, possibilitando o seu alargamento para a largura que actualmente apresenta.
O que tanto o referido A.., como os Autores acederam e autorizaram.
Na mesma ocasião, tendo em vista o acerto de estremas, os Réus solicitaram aos Autores a cedência da parcela de terreno assinalada a verde forte na planta junta sob o doc. n.º 12 aos autos de procedimento cautelar (cujo original está a fls. 462), por troca de uma outra, pertença daqueles, assinalada a azul, na mesma planta. Obrigando-se a procederem à construção do novo muro delimitador dos prédios de ambos.
Alcançado este acordo, de imediato, foram iniciados trabalhos de demolição do muro existente e construção do novo muro na nova localização definida.
Quando os Réus já haviam procedido à colocação de duas ou três faixas de blocos do dito muro, em virtude de uma divergência quanto à propriedade do muro, abandonaram a construção do mesmo, tendo os Autores terminado a sua construção, com a configuração se mantém até à presente data.
Os Réus nunca puseram em causa este acordo e a construção do muro até à dedução de reconvenção.
Em reconvenção os réus peticionaram a restituição da faixa de terreno com a largura de 1,70m na extremidade norte e 2,30 na sua extremidade sul, que alegam lhes pertence.
Como resulta da factualidade acabada de transcrever foram os réus, aqui recorrentes que propuseram aos autores a troca desta faixa de terreno do respectivo prédio, por uma outra do prédio dos autores, com vista ao acerto de estremas.
O acordo foi alcançado, obrigando-se os réus a construírem o muro divisório, que iniciaram, levantando três fiadas, no local acordado, muro que acabou por ser concluído pelos autores.
Não houve qualquer apropriação ilícita por parte dos autores reconvindos desta área de terreno.
Como atrás dissemos, a propósito da outra questão, também aqui é defensável que este acordo, por respeitar apenas à demarcação dos prédios, não esteja submetido à exigência de forma legal, in casu escritura pública.
Acresce que, como se decidiu na sentença recorrida, a subsidiária invocação da nulidade deste acordo constitui abuso de direito.
Dispõe o artigo 334º do CC que "é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito".
No caso, o abuso de direito, integra-se na modalidade de “venire contra factum proprium”, que consiste em o exercício contrariar uma conduta antes assumida pelo titular do direito (cf. os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Maio de 2007 – 07 A1180 e de 30 de Março de 2006 – P.º 3921/05, 4.ª).
Com efeito, a anterior conduta dos reconvintes/recorrentes, objectivamente considerada, era de molde a despertar nos recorridos a convicção de que eles também no futuro se comportariam, coerentemente, de determinada maneira.” (cf. Prof. Baptista Machado, “Obra Dispersa”,1, pags. 415 e segs.) e criou nos reconvindos/recorridos uma situação de confiança com base na qual tomaram disposições ou organizaram planos (nomeadamente a conclusão do muro), que, gorados, lhes causarão danos (cfr. Ac. do STJ de 11.1.2011- proc. 2226/07.7TJVNF.P1.S1 in dgsi.pt ).
Refere o mesmo autor na obra citada, que o efeito jurídico próprio do instituto só se desencadeia quando se verificam os seguintes pressupostos:
1. Uma situação objectiva de confiança; uma conduta de alguém que de facto possa ser entendida como uma tomada de posição vinculante em relação a dada situação futura.
2. Investimento na confiança: o conflito de interesses e a necessidade de tutela jurídica surgem quando uma contraparte, com base na situação de confiança criada, toma disposições ou organiza planos de vida de que lhe surgirão danos, se a confiança legítima vier a ser frustrada.
3. Boa-fé da contra-parte que confiou: a confiança do terceiro ou da contraparte só merecerá protecção jurídica quando de boa fé tenha agido com cuidado e precauções usuais no tráfico jurídico" - obra citada, páginas 415 a 418.
O que no caso resulta evidente dos factos provados.
Contra-argumentam os recorrentes que “o eventual abuso do direito não justifica que se considere válido e eficaz um contrato de compra e venda de um bem imobiliário não formalizado por escritura pública (acórdão do STJ de 17/01/2002, in Col. Jur. STJ, Ano X, Tomo I, pg. 48)”.
Efectivamente, a entender-se que esta “permuta” para acertamento de estremas teria de ser formalizada por escritura pública, a doutrina e a jurisprudência têm entendido que o abuso de direito não poderá obstar à declaração da nulidade, que aliás é de conhecimento oficioso, sendo apenas fundamento da obrigação de indemnizar. Neste sentido os Acs. do STJ de 11 de Julho de 1999, BMJ n.º 409, págs. 735 a742 e de 17.01.2002, proc. 01B3778, in dgsi.pt (referido pelos recorrentes) bem como os autores neles citados.
Contudo, também se tem entendido que “Os efeitos da invalidade por vício de forma podem, apesar disso, ser excluídos pelo abuso de direito, mas sempre em casos excepcionais ou de limite, a ponderar casuisticamente, em que as circunstâncias apontem para uma clamorosa ofensa do princípio da boa-fé e do sentimento geralmente perfilhado pela comunidade, situação em que o abuso de direito servirá de válvula de escape, tornando válido o acto formalmente nulo, como sanção do acto abusivo.» - cfr. Ac. do STJ de 28.2.2012, proc. 349/06.8TBOAZ.P1.S1, relatado pelo Excelentíssimo Juiz Conselheiro Alves Velho (sublinhado nosso).
No mesmo sentido, escreve-se no Ac. do STJ de 24.10.2013, proc. 1673/07.9TJVNF.P1.S1, relatado pela Excelentíssima Juiz Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza:
«Por último, torna-se necessário determinar, no caso, se a declaração de nulidade por vício de forma pode ser paralisada por ser abusivo o exercício do direito de a invocar.
Ora, do ponto de vista de terceiros interessados, protegidos pela publicidade que implica a exigência de documento autêntico, crê-se que a mesma está garantida pela visibilidade da divisão material que existe, entre o prédio dos autores e o caminho alargado. E, agora do ponto de vista das partes, nenhum indício se encontra que revele qualquer prejuízo para a devida ponderação dos efeitos do negócio efectuado.
Finalmente, recorde-se que a cedência foi alegada pelos próprios autores na petição inicial, nenhuma dúvida se colocando quanto à prova do acordo subjacente.
Conclui-se assim que o acórdão recorrido não merece qualquer censura, e que a nulidade foi abusivamente invocada pelos autores.
A terminar, observa-se que se trata de um caso em que as circunstâncias concretas do exercício do direito de invocar a invalidade formal de um negócio jurídico podem excepcionalmente conduzir à paralisar desse exercício, por abuso de direito – de um dos “casos excepcionais ou de limite, a ponderar casuisticamente”, a que se referem o acórdão de 28 de Fevereiro de 2012, www.dgsi.pt, proc. nº 349/06.8TBOAZ.P1.S1.»
É exactamente este o nosso entendimento relativamente à situação aqui em apreço e que assim coincide com o decidido pela 1ª instância.
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Referem ainda os recorrentes, com vista à procedência do pedido reconvencional, que da alínea C. dos factos provados resulta que o respectivo prédio confronta do poente com estrada municipal, o que significa que não está encravado por nele se integrar o caminho mencionado em F., Z. e AA. dos factos provados, o que também deveria ter sido reconhecido e resultará da procedência do mesmo pedido.
Ora, nem a escritura a que se refere a al. c) dos factos provados, nem o registo predial fazem prova plena ou criam qualquer presunção no tocante às confrontações declaradas. Não é em face das confrontações declaradas que se pode concluir que o leito do caminho, que aqui se discute, integra o prédio dos réus, factualidade que alegaram, mas que não lograram provar.
Pelo exposto improcedem in totum as conclusões dos apelantes.
V - DELIBERAÇÃO
Nestes termos, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.
Custas pelos recorrentes.
Guimarães, 05-02-2015
Eva Almeida
Filipe Caroço
António Santos