Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
187/08.4TBPTL.G1
Relator: MANUEL BARGADO
Descritores: CASO JULGADO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/06/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: Não obsta à verificação da exceção do caso julgado, o facto de nas duas ações, com os mesmos sujeitos e o mesmo pedido, existir mais do que uma causa de pedir, sendo suficiente para que ocorra o caso julgado, a identidade entre uma dessas causas de pedir, in casu a usucapião.
Decisão Texto Integral: Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães


I - RELATÓRIO
R… e marido, A…, instauraram a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra M… e mulher, M…, pedindo que estes sejam condenados a proceder à desocupação e entrega do imóvel identificado no art. 1º da p.i., livre de pessoas e bens e no pagamento aos autores da quantia de € 500,00 por cada mês que mediar entre a citação e a data da entrega efectiva do imóvel.
Para o efeito e em síntese, alegaram ter corrido termos no 2º Juízo do Tribunal de Ponte de Lima uma acção em que foram partes os aqui autores e réus, na qual foi proferida sentença que declarou os autores como donos e legítimos possuidores do prédio identificado no art. 1º da p.i. e que o prédio identificado no art. 21º daquela peça processual corresponde à parcela de terreno e construção que os autores pretendiam doar ao réu e faz parte integrante do aludido prédio identificado no art. 1º da p.i.; nessa mesma sentença foram os réus condenados a reconhecerem o direito de propriedade dos autores sobre aquele prédio, nele se incluindo aquela parcela de terreno e construção identificada no art. 21º e foi ainda declarada a nulidade da escritura de justificação realizada no dia 30.11.1998 e ordenada a eliminação da descrição na CRP.
Tendo tal sentença transitado em julgado, os réus recusam-se a desocupar e a entregar aos autores, livre de pessoas e bens, o referido imóvel, alegando ter direito a uma indemnização pelas benfeitorias realizadas.
Essa recusa dos réus impede os autores de colocar o imóvel no mercado de arrendamento, o que lhes proporcionaria um rendimento de € 500,00 por mês.
Os réus contestaram, afirmando que a mencionada acção foi intentada com o objectivo de que a ré não pudesse ter direito ao prédio descrito na aliena t) do art. 1º da p.i., tendo sido combinado com o réu marido que o mesmo não contestaria a acção e que após o decretamento do divórcio entre os réus os autores outorgariam uma escritura de doação a favor do réu. Sucede, porém, que os réus acabaram por se reconciliar, o que não é do agrado dos autores, mas estes nunca pediram aos réus que abandonassem a casa.
Em reconvenção, alegando a respectiva aquisição por usucapião, pedem os réus que seja declarada a propriedade plena dos mesmos sobre a parcela de terreno e habitação descrita no art. 97º da contestação.
Para o caso de assim não se entender, pedem seja reconhecido o seu direito de propriedade por o terem adquirido por acessão industrial imobiliária, pagando aos autores a quantia de € 3.500,00.
Ainda para o caso de assim não se entender, pedem uma indemnização pelas benfeitorias necessárias e úteis realizadas no prédio no valor de € 103.740,00.
Na réplica vieram os autores invocar a excepção do caso julgado quanto ao pedido (principal) reconvencional.
Gorada uma tentativa de conciliação entre as partes, foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a excepção do caso julgado e procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e à organização da base instrutória.
Instruído o processo, seguiram os autos para julgamento, sendo a matéria de facto decidida nos termos do despacho de fls. 443 a 450, sem reclamações.
Autores e réus apresentaram alegações sobre o aspecto jurídico da causa, concluindo os primeiros como na petição inicial e na réplica, e os segundos como na contestação /reconvenção.
De seguida foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto, decide-se:
1. Julgar a acção improcedente e em consequência absolver os RR. dos pedidos formulados.
2. Julgar a reconvenção, no que respeita ao primeiro pedido subsidiário, procedente e em consequência, condenam-se os RR. /reconvintes a entregarem aos AA/reconvindos a quantia de €23.660,00, quantia essa correspondente ao valor da parcela de terreno em causa antes da incorporação, já acrescida da respectiva actualização de acordo com os índices de preço no consumidor.
b-) A aquisição da propriedade plena e exclusiva do prédio identificado no ponto T da al. A dos Factos Assentes a favor dos RR. dar-se-á aquando da entrega aos AA. da quantia mencionada na alínea anterior, fixando-se desde já efeitos retroactivos desde 1991;
c-) Fixo em 60 dias o prazo concedido aos RR. para entregarem a quantia aludida na alínea b) aos AA., ficando a transmissão da propriedade desse terreno dependente desse pagamento.
Custas da acção e reconvenção pelos AA.».
Inconformados, os réus apelaram do assim decidido, rematando as sua alegações com as seguintes conclusões (transcrição):
«1. O tribunal a quo entende, na douta sentença proferida, que estão preenchidos os demais requisitos necessários à aquisição da propriedade, por usucapião, pelos RR./reconvintes, com excepção do requisito do decurso do prazo necessário.
2. De facto, o tribunal a quo diz na douta sentença que “podemos concluir que os RR. têm actos de posse relativamente ao prédio em questão”.
3. Que “Por outro lado, actuaram aqueles na convicção de que eram titulares do direito de propriedade sobre o prédio indicado em t) – cfr. resposta ao quesito 35 – pelo que sem mais, daqui se retira o “animus””.
4. Que a posse dos RR., sendo de boa fé, necessitaria do decurso do prazo de 15 anos para adquirir a propriedade por usucapião.
5. Conclui o tribunal a quo que os RR. não têm a posse do prédio por 15 anos face ao que está escrito nos pontos r) e p) da alínea A) dos Factos Assentes.
6. Ora, a matéria do decurso do prazo necessário à peticionada usucapião foi alegada pelos RR. nos seus articulados mas não incluída na base instrutória.
7. O tribunal a quo não atendeu à reclamação dos RR. quanto reclamaram sobre a não inclusão do decurso do prazo e da boa fé na base instrutória;
8. Ora, sem prejuízo da violação do disposto no indicado artigo 511.º n.ºs 1 e 2 do CPC, a não inclusão do decurso de tempo entre a selecção da matéria de facto controvertida acabou também por influenciar a prova produzida pelos RR. quanto a esta matéria, que se viram limitados na produção de prova ao longo das várias sessões de julgamento e quanto às perguntas a fazer às testemunhas arroladas.
9. Nessa medida, os RR. impugnam os despachos proferidos quanto à reclamação apresentada e também a multa a que os RR. foram condenados, ao abrigo do disposto no artigo 511.º n.º 3 do CPC, por violação do disposto no mesmo artigo 511º n.º 1 e 2 do CPC, que obrigava a seleccionar a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, sendo que uma das questões plausíveis do direito controvertidas nestes autos é precisamente a usucapião, com inclusão na matéria de facto seleccionada, do decurso do tempo.
10. Nessa medida, deverá ser atendido o pedido dos RR. e o tribunal ad quem, incluir na base instrutória a matéria alegada pelos RR. do decurso do prazo e da boa fé, por ter sido violado o disposto no artigo 511.º n.ºs 1 e 2 do CPC.
11. Houve igualmente violação, por parte do tribunal a quo, do princípio do dispositivo, previsto nos artigos 264.º n.º 3 e 650.º n.º 2 al. f) do CPC, ao não ampliar a base instrutória de forma a incluir os factos aludidos pelas testemunhas M…, E…, J… e M…, quanto à questão do decurso do prazo da posse dos RR., ou seja, que a sua posse remonta pelo menos ao ano de 1990.
12. De facto, a prova produzida nas sessões de julgamento quanto à matéria do decurso do prazo para efeitos de usucapião vai no sentido de que a posse dos RR. remota pelo menos ao ano de 1990.
13. Pelo que o tribunal a quo deveria ter incluído esta matéria na base instrutória e ser a mesma dada por provada.
14. E nessa medida deveria ter havido decisão diversa no que respeita a estes pontos concretos da matéria de facto.
15. Entendem os RR., ora Recorrentes, que face a todos estes elementos, o lapso de tempo alegado pelos RR. no seu articulado (15 anos), a sua não inclusão na base instrutória apesar da reclamação dos RR., o que resultou da instrução da causa, que o tribunal a quo o deveria, ao abrigo dos preceitos acima citados, trazê-lo para os autos, ampliando a base instrutória da causa, aditando um novo quesito através do qual se perguntaria: Se a posse dos RR. remonta pelo menos ao ano de 1990.
16. E, consequentemente dar tal facto por provado, face à prova produzida, e considerar que os RR. adquiriram o imóvel por usucapião.
17. Não o tendo feito e sendo este facto essencial, tendo em conta a verdade material que o nosso ordenamento visa, o Recorrente solicita ao Tribunal ad quem que, ao abrigo dos poderes que lhe são atribuídos, nomeadamente pelo artigo 712º CPC, reaprecie a prova gravada e amplie a matéria de facto, tendo em conta aquele novo facto, e o considere provado.
18. E, desta feita, também por este novo facto trazido ao processo, declarar que os RR. adquiriram o prédio identificado no ponto t) da al. A) dos Factos Assentes por usucapião.»
Os autores apresentaram contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido, levantando como questões prévias a intempestividade do recurso e o não conhecimento da impugnação das decisões interlocutórias.
Recorreram ainda subordinadamente os autores do despacho saneador na parte em que julgou improcedente a excepção do caso julgado, tendo concluído as alegações da seguinte forma:
«1. Na acção sumária n.º 624/06.2TBPTL, que correu termos no 2.º Juízo do Tribunal da Comarca de Ponte de Lima, os aqui e lá Autores, invocaram, entre o mais, como causa de pedir, a usucapião como forma de aquisição originária do direito de propriedade sobre o prédio identificado nos autos.
2. Ao contrário do que se sustenta no despacho recorrido, não é de todo correcto afirmar (antes pelo contrário…) que, “na acção nº 624/06.2TBPTL, a causa de pedir assentava na nulidade de uma escritura pública de justificação em que tinham sido outorgantes os RR e no âmbito da qual tinham sido proferidas falsas declarações”.
3. A causa de pedir era complexa e compreendia também a aquisição do direito de propriedade do referido prédio, por usucapião – nomeadamente, nos arts. 2.º, 3.º e 4.º da p.i. (juntos aos autos por requerimento de 03/06/2008).
4. Na presente acção – que é igual àquela outra quanto às partes – foram os aqui RR. a invocar a usucapião sobre esse mesmo prédio; e foram os aqui Réus e Reconvintes e ali Réus a pedir ao Tribunal que declarasse que adquiriram o direito de propriedade sobre aquele prédio, por usucapião – pedido que também foi formulado pelos ora AA. e julgado procedente, no primitivo processo acima referido.
5. Aqui chegados, é manifesto que estes autos, ao menos no que respeita ao pedido reconvencional formulado sob a al. b) – que pressupõe a aquisição da propriedade, por usucapião -, são materialmente similares àquela primitiva acção – só se distinguindo dela no que respeita à posição assumida pelas partes (os ali RR. são aqui reconvintes e os ali AA. são aqui reconvindos).
6. Dispõe os arts. 497.º e 498.º do Cód. Proc. Civil que repete-se a causa quando existe identidade ao nível das partes, do pedido e da causa de pedir.
7. Esta causa é uma repetição da acção sumária n.º 624/06.2TBPTL, no que respeita às partes, ao pedido de aquisição do direito de propriedade, por usucapião, e à causa de pedir alegada para a procedência desse pedido (a posse por mais de 20 anos).
8. É hoje inequívoco que a identidade de partes se verifica independentemente da posição ocupada por elas na lide – veja-se o Ac. Relação do Porto de 07/06/1994 (in dgsi.pt, proc. 9410160).
9. O despacho recorrido, ao adoptar entendimento contrário, violou as disposições dos arts. 497.º, n.º 1 e 498.º, n.º 1 e 2 do Cód. Proc. Civil.
10. Deve, pois, ser revogado e substituído por Douto Acórdão que, julgando procedente a presente apelação, confira provimento à excepção de caso julgado e, em consequência, absolva os RR. da instância reconvencional, relativamente ao pedido formulado sob a al. b) da reconvenção.
Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II - ÂMBITO DO RECURSO
O objecto dos recursos, delimitado pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (arts. 660º, nº 2, 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1, do CPC, redacção pré-vigente, aqui aplicável), pressupõe a análise das seguintes questões:
No recurso principal:
- não inclusão na base instrutória de factos essenciais para a decisão da causa;
- violação do princípio do dispositivo por não ter sido acolhida a pretensão dos recorrentes de ver ampliada a base instrutória, de forma a nela serem incluídos factos relatados pelas testemunhas.
- alteração da matéria de facto.
No recurso subordinado:
- excepção do caso julgado quanto ao pedido reconvencional.

III – FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos[1]:
1. No âmbito da acção declarativa sob a forma sumária, proposta no dia 15 de Maio de 2006, que correu termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Ponte de Lima sob o nº 624/06.2TBPTL, em que foram partes, como AA. R… e marido A… e como RR M… e mulher M…, foram dados como provados os seguintes factos:
«a) - Por escritura pública celebrada em 29 de Setembro de 1987 e exarada a fls. 84vº do Livro 24- S do Cartório Notarial de Ponte de Lima, os AA. adquiriram a R…, mãe da A. esposa, o seguinte prédio: Casa de habitação de rés-do-chão e primeiro andar, sita no lugar de Gramela, freguesia de Estorãos, concelho de Ponte de Lima, com a superfície coberta de 52 m2 e logradouro com 2 350 m2, a confrontar de Norte com B… e dos restantes lados com caminho, omissa na Conservatória de Registo Predial de Ponte de Lima, inscrita na matriz predial urbana respectiva sob o artigo 222º.
b) - Desde há mais de 1, 10, 20, 30 e mais anos que os AA., por si e seus antepossuidores, designadamente a vendedora, sua antecessora, se encontram na posse do referido imóvel, habitando-o, cuidando da sua conservação e limpeza, fazendo obras de conservação, reparação e beneficiação, cultivando e semeando no respectivo logradouro produtos vários de agricultura e afins, colhendo os frutos ou produtos dessas sementeiras, pagando a respectiva contribuição autárquica, fazendo seus todos os frutos, produtos e utilidades que o imóvel é susceptível de produzir ou proporcionar.
c) - Mantendo essa sem interrupção temporal, à vista, com conhecimento e aceitação de toda a gente, sem oposição de quem quer que seja, na convicção de quem exerce todos os poderes correspondentes ao direito de propriedade e que, assim actuando, não prejudica os direitos de outrem.
d) - Após a celebração da escritura, os AA. entraram na posse do prédio e levaram a cabo, no respectivo logradouro, à construção de um prédio urbano que destinaram à sua habitação e do seu agregado familiar.
e) - Entretanto, uma outra construção antiga, já existente no prédio, que se encontrava em avançado estado de degradação, continuou a deteriorar-se, pois os AA. não estavam a precisar dela, devido à construção da sua própria casa.
f) - Aquando da celebração da escritura de venda referida no artigo primeiro desta petição, a mãe da A. esposa manifestou a vontade de que, caso fosse necessário, os AA. teriam de doar aos irmãos aquela construção bem como um pedaço de terreno para logradouro, ao que estes anuíram.
g) - Isto na medida em que quer os AA., quer a mãe da A. esposa, sabiam que aqueles não iriam aproveitar aquela construção existente, pois pretendiam construir de raiz o prédio urbano destinado à sua habitação.
h) - Em finais de 1990, princípios de 1991, a mãe da A. esposa começou a insistir com esta no sentido de os AA. cederem ao Réu marido aquele prédio urbano já degradado, por forma a que este ali instalasse também a sua casa de habitação.
i) – Na verdade, o Réu marido, que havia casado em 1985 com a Ré esposa e de cujo casamento já existiam dois filhos, era o único dos irmãos que ainda não tinha casa e vivia, numa situação de favor, em casa de terceiros.
j) - Os AA., inicialmente e apesar daquele acordo com a mãe da A. esposa, levantaram algumas reticências em aceder àquela pretensão, pois já tinham destinado que o edificado, atento o facto de serem poucos os terrenos para construção, seria um dia para um dos seus filhos levar a cabo, se assim o entendessem, a construção da sua habitação.
k) - Mas as insistências por parte da R… foram tantas que, em meados de 1991, os AA. acederam àquela pretensão formulada pela mãe da A. esposa, respeitando, assim, aquela manifestação de vontade expressa aquando da celebração da escritura.
l) - Assim, os AA. combinaram com a mãe da A. esposa e o Réu marido, que aqueles lhe dariam a construção bem como uma parcela de terreno, com a área de 705 m2, que se destinaria a logradouro do prédio destinado a habitação.
m) A título gratuito e sem qualquer contrapartida.
n) - Para formalizar aquela "doação", os AA., representados pela mãe da A. esposa, e o Réu marido reduziram a escrito um contrato promessa de compra e venda, pelo qual os AA. "prometeram" vender ao Réu marido a construção existente no artigo 222º urbano, bem como uma parcela de terreno com a área de 705 m2.
o) - Apesar de nesse contrato se ter mencionado que o preço da venda seria de 500.000$00 e que o mesmo já teria sido pago, na verdade o Réu marido não procedeu ao pagamento de qualquer quantia a título de preço e, muito menos, aquela que consta do contrato.
p) - O Réu marido entrou na posse daquela parcela, incluindo a construção, imediatamente a seguir à celebração do referido contrato.
q) - Os RR. efectuaram algumas obras de beneficiação da construção, por forma a possibilitar que o seu agregado familiar ali se instalasse.
r) - Desde finais de Maio princípios de Junho de 1991 até ao presente que os RR. têm ocupado o prédio urbano e o logradouro identificados na cláusula segunda do contrato promessa acima referido.
s) - No entanto, a escritura de doação a favor do Réu marido nunca se formalizou porque, apesar das diligências efectuadas, não foi possível proceder à desanexação (da parcela de terreno doada e da construção) do "prédio mãe" identificado no artigo 1º desta petição.
t) - Em 30 de Novembro de 1998, os RR., por intermédio de procurador, outorgaram numa escritura pública de justificação através da qual declararam ser donos e legítimos possuidores com exclusão de outrem do seguinte imóvel: Prédio urbano, destinado a habitação unifamiliar, de rés-do-chão e andar, com a área coberta de cinquenta e dois metros quadrados e logradouro com a área de seiscentos e quarenta e oito metros quadrados, situado no lugar de Gramela, freguesia de Estorãos, concelho de Ponte de Lima, a confrontar de Norte com R… e dos restantes lados com caminho, omisso na Conservatória de Registo Predial, inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o artigo 419º.
u) - Mais declararam que a aquisição do terreno onde teria sido implantada o referido prédio, se operou por doação meramente verbal que lhes foi feita por M…, viúva, residente que foi no lugar do Cruzeiro, freguesia de Estorãos, concelho de Ponte de Lima.
v) - Doação esta que teria sido efectuada por volta de mil novecentos e setenta, não se chegando, no entanto, a efectuar a projectada escritura de doação.
x) - Mais declararam que estavam na posse do prédio há mais de vinte anos.
y) – As declarações constantes desta escritura de justificação são manifestamente falsas.
w) – Na verdade, o prédio que os RR. justificaram por aquela escritura corresponde exactamente à parcela de terreno e construção que os AA. quiseram doar ao primeiro Réu e que fazia, como faz, parte integrante do prédio identificado no artigo primeiro.
z) - À data em que referem ter sido efectuada a referida doação verbal o Réu marido tinha SETE anos de idade e a Ré esposa apenas CINCO anos de idade.
aa) - Aquela M… nunca foi dona, proprietária ou possuidora de qualquer prédio no lugar de Gramela, freguesia de Estorãos, concelho de Ponte de Lima.
ab) - E muito menos do prédio justificado.
ac) - Por outro lado, os RR. não estavam na posse do referido prédio há mais de vinte anos, como falsamente afirmaram naquela escritura.
ad) - O prédio justificado faz parte integrante do prédio identificado no artigo primeiro da petição inicial.
ae) - A celebração daquela escritura de justificação foi um estratagema engendrado pelos RR., com a ajuda de terceiros, por forma a evitar a necessidade da escritura de doação dos AA. a favor do Réu marido.
af) - Para o efeito, os RR., por si ou terceira pessoa, participaram à matriz predial a inscrição de um prédio urbano, dizendo que o mesmo se encontrava omisso na respectiva matriz predial.
ag) - Conseguindo assim que à construção que integrava o prédio identificado no artigo primeiro fosse atribuído um artigo matricial diferente do original.
ah) - Posteriormente, aproveitando-se do facto de aquele novo artigo estar omisso na Conservatória de Registo Predial de Ponte de Lima, obtiveram certidão a confirmar essa omissão.
ai) - Mas ao prestarem aquelas declarações na escritura de justificação, as testemunhas e o representante dos RR. sabiam que as mesmas não correspondiam à realidade e que eram falsas.
aj) - Quando se constou que os RR. teriam efectuado aquela escritura de justificação, os AA. contactaram um advogado no sentido de instaurar acção para obter a nulidade da mesma.
ak) - Porque entendiam que não deveria ser por esse meio que o 1º Réu deveria formalizar e obter a titularidade do imóvel.
al) - Consultados os registos do Cartório Notarial de Ponte de Lima, os AA. constataram que a escritura de justificação não havia sido celebrada naquele cartório, desconhecendo onde é que a mesma teria sido celebrada.
am) - O advogado que então contactaram informou-os que seria conveniente tornarem-se assinantes do jornal "Cardeal Saraiva", pois se efectivamente existisse a justificação, seria obrigatória a sua publicação e o mais certo é que fosse naquele jornal.
an) - Os AA., residentes na Alemanha, tornaram-se assinantes daquele jornal.
ao) – Mas nunca constataram que tivesse sido efectuada aquela publicação.
ap) - Há cerca de três quatro anos, os AA. falaram no assunto com o 1º Réu, também emigrado na Alemanha, tendo este referido que a regularização da casa estava a ser tratada por um cunhado, mas que não sabia muito bem como é que o estava a fazer.
aq) - Posteriormente, os AA. souberam que a referida escritura havia sido já celebrada em 1998 e que dela não tomaram conhecimento porque a publicação havia sido efectuada no jornal "Alto Minho", também deste concelho de Ponte de Lima, mas com muito menor implantação junto da comunidade emigrante» [al. A) dos Factos Assentes].
2. A acção identificada em A foi julgada procedente, por provada, por sentença aí proferida, transitada em julgado, a qual:
«a) - declarou que os AA. são donos e legítimos possuidores do prédio identificado no artigo primeiro desta petição; b) - declarou que o “prédio” identificado no artigo 21º corresponde à parcela de terreno e construção que os AA. pretendiam doar ao 1º Réu e faz parte integrante do prédio identificado no artigo primeiro;
c) - condenou os RR. a reconhecer o direito de propriedade dos AA. sobre o prédio identificado no artigo primeiro, nele se incluindo aquela parcela e construção identificada no artigo 21º deste articulado;
d) - declarou a nulidade da escritura de justificação realizada em 30 de Novembro de 1998 e exarada a fls.34 do Livro 438-D do Cartório Notarial de Barcelos;
e) - ordenou a eliminação da descrição na Conservatória de Registo Predial de Ponte de Lima, referente ao prédio identificado no precedente artigo 21º, bem como o cancelamento de todas e quaisquer inscrições que derivem daquela escritura ou de actos subsequentes” [al. B) dos Factos Assentes].
3. Os RR. casaram em 31 de Agosto de 1985, com convenção antenupcial, sob o regime de comunhão geral de bens [al. C dos Factos Assentes].
4. No dia 1 de Março de 2005 o R. marido propôs no Tribunal Judicial de Ponte de Lima a acção de divórcio litigioso, que correu termos no 1.º juízo daquele tribunal com o n.º de processo 371/05.2TBPTL [al. D) dos Factos Assentes].
5. O R. marido, por requerimento de 06.09.2006 deu entrada junto do processo de divórcio litigioso nº 371/05.2TBPTL, do 1º Juízo do Tribunal de Ponte de Lima, ao pedido de desistência do divórcio [al. D1) dos Factos Assentes].
6. Os AA. intentaram a acção indicada em A) com a concordância do R. marido [resposta ao quesito 4].
7. Na pendência da acção de divórcio indicada em C) [resposta ao quesito 5].
8. Com o objectivo de obstar que a R. mulher pudesse ter direito em partilhas ao prédio descrito em t) da alínea A) [resposta ao quesito 6].
9. E acordaram com o R marido que este não contestaria a acção indicada em A) [resposta ao quesito 7].
10. E que uma vez decretado o divórcio dos RR, os AA, já declarados proprietários do prédio indicado em t), outorgariam uma escritura de doação apenas a favor do R. marido [resposta ao quesito 8].
11. Os RR. reconciliaram-se em Agosto de 2006, [resposta ao quesito 9].
12. À data da celebração do contrato aludido em n), a parcela de terreno objecto daquele estava coberta de mato e silvas [resposta ao quesito 12].
13. E a construção objecto daquele contrato encontrava-se desabitada [resposta ao quesito 13].
14. Com partes do seu telhado caídas [resposta ao quesito 14].
15. E o rés-do-chão apresentava o piso em terra [resposta ao quesito 15].
16. Os RR. procederam à limpeza do terreno e da construção, retirando o mato e silvas que os invadiam [resposta ao quesito 17].
17. E mandaram tirar as medidas da construção existente e traçaram um projecto de construção [resposta ao quesito 18].
18. E demoliram a construção indicada em 13, removeram o entulho e iniciaram a construção no mesmo local de um prédio de dois pisos, procedendo à colocação da 1.ª placa que separa os andares, em betão armado [resposta ao quesito 19].
19. No mesmo ano, os RR. procederam à escavação manual em rocha dura do rés-do-chão para a criação de um futuro espaço de cozinha, à construção de escada interior em betão armado e à edificação das divisões interiores do rés-do-chão e do 1.º andar [resposta ao quesito 20].
20. Em finais do mês de Maio de 1991, logo após assinar o contrato promessa, o Réu marido emigrou para a Alemanha [resposta ao quesito 21].
21. E as obras ficaram paradas até 1995 dado os RR. disporem de pouco dinheiro [resposta ao quesito 22].
22. No Verão de 1995, os RR. executaram a 2.ª placa e o telhado do prédio indicado em t) [al. E) dos Factos Assentes].
23. Durante os anos de 1995 e 2000, os RR construíram um anexo para garagem e arrumos, com a área coberta de 44,70 m2 [al. F) dos Factos Assentes].
24. E pavimentaram uma área de 240 m2 do logradouro em lajeado de pedra do tipo “xisto” com acabamento em rústico [al. G) dos Factos Assentes].
25. E colocaram no logradouro um chafariz em pedra do tipo “xisto” [al. H) dos Factos Assentes].
26. E na entrada principal de acesso ao logradouro do prédio, os RR. colocaram um portão em ferro tratado, com cerca de 3 metros de largura, ladeado por dois tranqueiros e com uma arcada em pedra do tipo “xisto” [al. I) dos Factos Assentes].
27. Os RR. procederam à execução de toda a instalação de abastecimento de água e da rede de saneamento [al. J) dos Factos Assentes].
28. E construíram uma fossa séptica e um poço sumidouro [al. L) dos Factos Assentes].
29. E construíram um depósito para armazenar a água potável que adquiriram à Junta de freguesia [al. M) dos Factos Assentes].
30. E instalaram uma electrobomba no referido depósito de água para abastecimento de água à habitação e para rega dos jardins e horta [al. N) dos Factos Assentes].
31. No ano de 1996 os AA construíram um muro divisório entre o seu prédio e o prédio indicado em t) [al. O= dos Factos Assentes].
32. O prédio ficou concluído no Verão de 1996 [resposta ao quesito 23].
33. Nesse Verão, os RR. mandaram fazer os móveis para a casa, nomeadamente para a cozinha e casas de banho que tiveram de ser executados à medida dada as reduzidas dimensões das divisões da casa [resposta ao quesito 24].
34. O prédio construído pelos RR é composto por: - Rés-do-chão: uma cozinha, uma sala e uma instalação sanitária; - 1.º andar: um corredor, uma sala, dois quartos e uma instalação sanitária; - Ligação entre os dois pisos é realizada por uma escada interior e outra exterior; - Área coberta do 1.º andar: 52,50 m2; - Área coberta do r/c: 44,00 m2; - Cobertura: telhado do tipo quatro águas revestido com telha de barro; - Acabamentos exteriores: Paredes exteriores em pedra do tipo “xisto”, com acabamento rústico; Portas e janelas em madeira maciça exótica devidamente tratadas; Portadas exteriores em madeira maciça exótica devidamente tratada. - Acabamentos interiores: Paredes interiores e tectos com acabamento do tipo “areado” e pintadas; Revestimento das paredes da cozinha e das instalações sanitárias até ao tecto com material cerâmico; Revestimento de todos os pavimentos interiores com material cerâmico; Loiças sanitárias brancas e torneiras; Revestimento de toda a escada interior com madeira maciça envernizada; Rodapé em madeira maciça; Portas interiores do tipo pré-fabricadas folhadas a madeira de mogno; Móveis de cozinha em madeira maciça de castanho incluindo todos os electrodomésticos encastráveis [resposta ao quesito 25].
35. Os RR. começaram a habitar a casa no Verão de 1997 [resposta ao quesito 26].
36. O anexo indicado em F) tem uma cobertura em laje aligeirada impermeabilizada através de telas asfálticas protegida com betonilha de pavimento [resposta ao quesito 27].
37. E apresenta os seguintes acabamentos: Paredes exteriores em pedra do tipo “xisto” com acabamento rústico; Porta e portão de garagem de abrir em ferro devidamente tratado; Paredes interiores e tectos com acabamento do tipo “areado” [resposta ao quesito 28].
38. A parte restante do logradouro indicado em G foi ajardinada [resposta ao quesito 29].
39. E aí foi colocada relva, uma latada e várias árvores de fruto [resposta ao quesito 30].
40. Os RR. construíram, pelo menos, dois muros exteriores, sendo que um com cerca de 31,50m de comprimento, espessura média de 40 cm, altura variável, em média 1,50m, em alvenaria de pedra, do tipo xisto e acabamento rústico; outro com 42 metros de comprimento, altura variável, em média com 3,50 m, em alvenaria de pedra, do tipo granito, com acabamento rústico [resposta aos quesitos 31, 32 e 33].
41. Ao longo dos anos, os RR. cultivaram batatas, couves, feijão, milho e vinha, e plantaram árvores de fruto como seja figueira, tangerineiras, nespereira, limoeiro, na parcela de terreno aludida em 12 [resposta ao quesito 34].
42. A limpeza do terreno, a demolição da construção indicada em 13, a construção do prédio dos RR e posterior utilização, foram executadas à vista de toda a gente, sem qualquer oposição, na convicção de que eram os titulares do direito de propriedade sobre o prédio indicado em t) [resposta ao quesito 35].
43. Os RR. pagaram o Imposto Autárquico referente ao prédio que construíram.. [resposta ao quesito 36].
44. E pagaram as facturas da luz, cujo contador se encontra em nome do R. marido [resposta ao quesito 37].
45. Os AA. tiveram conhecimento dos factos indicados em 35 e autorizaram as obras de construção realizadas pelos RR. ao longo dos anos [resposta ao quesito 38].
46. Os AA. tiveram conhecimento e autorizaram que os RR. instalassem a sua casa de morada de família no prédio que construíram [resposta ao quesito 39].
47. A casa construída pelos RR. tem o valor de €44.200,00 [resposta ao quesito 41].
48. O anexo tem o valor de €12.000,00 [resposta ao quesito 42].
49. Os arranjos exteriores, excluindo os muros, têm o valor de €9.650,00 [resposta ao quesito 43].
50. Todos os muros exteriores existentes no prédio, incluindo o muro construído pelos AA.. têm o valor total de €15.000,00 [resposta aos quesitos 44 e 72]
51. Em 1990 o terreno e a construção existente valiam €11.304,00, sendo €10.145,00 para o terreno e o restante para a construção [resposta ao quesito 45].
52. Actualmente o prédio identificado em t) tem o valor de €101.850,00 [resposta ao quesito 46]
53. O custo com as demolições da construção aludida em 13, incluindo o telhado em ruínas, divisórias, remoção de entulhos e respectiva descarga e vazamento ascende e 3.200,00 [resposta ao quesito 47].
54. O custo com a escavação manual da rocha dura, no r/c da moradia para criação do espaço da cozinha, ascende a € 2 100,00 [resposta ao quesito 48].
55. O custo com a construção e arranjo das paredes exteriores em pedra da região, incluindo a execução do enchimento de todas as juntas com argamassa própria para o efeito, ascende a € 4.500,00 [resposta ao quesito 49].
56. O custo com E na execução das lajes de piso do 1º andar e do tecto do 1.º andar, em betão armado, ascende a € 4.750,00 [resposta ao quesito 50].
57. O custo com execução de paredes divisórias do rés-do-chão e do 1º andar, ascende a € 2.500,00 [resposta ao quesito 51].
58. O custo com execução da estrutura do telhado e colocação de telha nova, ascende a € 2.800,00 [resposta ao quesito 52].
59. O custo com a execução do pavimento térreo no rés-do-chão ascende a € 600,00 [resposta ao quesito 53].
60. O custo com a colocação de betonilhas de pavimento no r/c e 1º andar, ascende a € 1.000,00 [resposta ao quesito 54].
61. O custo com a construção das escadas exteriores, em betão armado, ascende a € 700,00. [resposta ao quesito 55].
62. O custo com o revestimento de todas as paredes e tectos interiores com acabamento do tipo areado fino e respectiva pintura ascende a € 3.200,00 [resposta ao quesito 56].
63. O custo com a execução de toda a instalação eléctrica ascende a € 2.000,00 [resposta ao quesito 57].
64. O custo com a execução de toda a instalação de abastecimento de água e da rede de saneamento, incluindo a construção de fossa céptica e poço sumidouro, ascende a € 2.100,00 [resposta ao quesito 58].
65. O custo com o revestimento da parede até ao tecto com azulejo nas duas instalações sanitárias e na cozinha ascende a € 900,00 [resposta ao quesito 59].
66. O custo com o revestimento dos pavimentos de toda a moradia com mosaico cerâmico ascende a € 1.600,00 [resposta ao quesito 60].
67. O custo com a aquisição e colocação de rodapé em madeira maciça, em toda a moradia, ascende a € 750,00 [resposta ao quesito 61].
68. O custo com a aquisição e colocação de todas as portas, janelas e respectivos vidros, contras em madeira maciça, revestimento de escadas interiores e portas interiores, ascende a € 3.300,00 [resposta ao quesito 62].
69. O custo com a aquisição e colocação de peitoris e soleiras ascende a € 400,00 [resposta ao quesito 63].
70. O custo com a aquisição e colocação de todas as loiças sanitárias e torneiras para as duas instalações sanitárias ascende a € 600.00 [reposta ao quesito 64].
71. O custo com a execução de um depósito para armazenar água potável e instalação de uma electrobomba no referido depósito, ascende a € 1 200,00 [resposta ao quesito 65].
72. O custo com a aquisição e colocação de móveis de cozinha ascende a € 1.900,00 [resposta ao quesito 66].
73. O custo com a aquisição e colocação de caleiras em alumínio e respectivos tubos de escoamento de águas em PVC, em volta de toda a habitação, ascende a € 600,00 [resposta ao quesito 67].
74. O custo com a execução das escadas exteriores ascende a € 500,00 [resposta ao quesito 68].
75. O custo com a aquisição e colocação de uma grade de apoio nas escadas exteriores ascende a € 300,00 [resposta ao quesito 69].
76. O custo com a colocação de candeeiros e iluminação exterior da habitação ascende a € 350,00 [resposta ao quesito 70].
77. O custo com a construção do anexo para garagem e arrumos ascende a € 12.000,00 [resposta ao quesito 71].
78. O custo com o arranjo do logradouro, nomeadamente, com a pavimentação de uma área de 240 m2, para circulação automóvel e passeios, em lajedo de pedra do tipo “xisto”, ascende a € 6.6000,00 [resposta ao quesito 73].
79. O custo com a execução da entrada principal de acesso à propriedade, composta por dois tranqueiros e uma arcada e respectivo portão em ferro, ascende a € 1.250,00 [resposta ao quesito 74].
80. O custo com o arranjo das áreas ajardinadas e colocação da latada ascende a €500,00 [resposta ao quesito 75].
81. O prédio identificado em t) da alínea A, atentas as suas características, vale no mercado de arrendamento, no máximo, € 250,00 por mês [resposta ao quesito 3].

B) O DIREITO
Da excepção do caso julgado (recurso subordinado):
Começaremos a nossa análise pelo recurso subordinado, pois fundando-se este recurso numa excepção dilatória determinativa da absolvição da instância quanto ao pedido formulado sob a alínea b) da reconvenção, tem, obviamente, prioridade sobre o recurso principal, na medida em que a sua procedência torna inútil o conhecimento do recurso principal, no qual os réus pretendem justamente a procedência daquele pedido[2].
Através do instituto do caso julgado pretende-se evitar que, em novo processo, o juiz possa validamente estatuir, de modo diverso, sobre o direito, situação ou posição jurídica concreta definida por uma anterior decisão, com desconhecimento dos bens jurídicos por ela reconhecidos e tutelados. Pouco importa que possam ser resolvidas diversamente pelos tribunais questões cujos elementos de direito sejam idênticos. São outros os institutos processuais que, até certo ponto, hão-de prevenir ou remediar esse inconveniente – coligação de partes, recurso de revista, recurso para o tribunal pleno, etc. O caso julgado não pretende evitar uma colisão teórica de decisões, visa apenas a contradição de julgados, isto é, a existência de decisões concretamente incompatíveis.
Por isso a lei exige que se verifique a identidade de pedidos, a similitude de pretensões do autor, de efeitos jurídicos por ele pretendidos.
A lei adjectiva (arts. 193º, n.º 2, al. c) e 498º, n.º 4 do CPC) consagra a teoria da substanciação, segundo a qual se tem de declarar o título donde provenha o direito deduzido em juízo, isto é, a causa de pedir, que o mesmo é dizer, o acto ou facto jurídico concreto donde emerge a pretensão do autor.
Em suma: além do direito cujo reconhecimento se pretende e do efeito jurídico que se pretende obter, exige-se a menção do facto concreto que serve de fundamento ao pedido.
E é a resposta dada na sentença à pretensão do autor, delimitada em função do facto jurídico concreto que lhe serve de fundamento, que a lei pretende que seja respeitada através da força e autoridade do caso julgado[3].
O que releva para se verificar a identidade objectiva entre duas acções é que a segunda acção seja proposta para exercer o mesmo direito que se exerceu mediante a primeira.
E, como nota Manuel de Andrade[4], a sentença há-de valer como caso julgado, pelo menos até onde contenha a resposta do Tribunal ao pedido: o caso julgado destina-se a tornar certa e intocável a posição das partes quanto aos bens litigados, tal como na sentença foi reconhecida e declarada; neste aspecto cobre tanto o deduzido como o dedutível.
Enunciado o direito resta subsumi-lo aos factos.
Desde logo há que reconhecer que existe identidade subjectiva nesta acção e na acção que, com o nº 624/06.2TBPTL, correu termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Ponte de Lima, pois os autores e réus numa e noutra acção são exactamente os memos, com a particularidade de os réus assumirem na presente acção a posição de reconvintes e os autores a posição de reconvindos.
Na verdade, ao conceito de repetição da causa que nos é dado pelo nº 1 do art. 498º do CPC, «é indiferente que seja ou não a mesma a posição das partes no segundo processo, podendo ser autor na segunda acção o réu da primeira e vice-versa »[5].
Como é idêntico o efeito jurídico pretendido pelos autores em ambos os pleitos: a declaração de que são os donos/proprietários da parcela de terreno e construção/habitação correspondente ao prédio urbano, destinado a habitação unifamiliar, de rés-do-chão e andar, com a área coberta de cinquenta e dois metros quadrados e logradouro com a área de seiscentos e quarenta e oito metros quadrados, omisso na Conservatória de Registo Predial e inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o artigo 419º.
Na verdade, a circunstância de os réus/reconvintes terem utilizado expressões não totalmente coincidentes na formulação do pedido, peticionando que se declare a “propriedade plena aos réus” em vez de se declarar que são “donos e legítimos possuidores”, em nada altera o sentido do pedido, sabendo-se que num e noutro caso o que está em causa é a propriedade, o domínio do imóvel em questão.
E será que é idêntica a causa de pedir numa e noutra acção?
Conforme se decidiu no Acórdão do STJ de 20.01.94[6], «[a] causa de pedir, como decorre da definição legal constante do artigo 498.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, é o facto jurídico concreto em que se baseia a pretensão deduzida em juízo; isto é, o facto ou conjunto de factos concretos articulados pelo autor e dos quais dimanarão o efeito ou efeitos jurídicos que, através do pedido formulado, pretende ver juridicamente reconhecidos.»
Alberto dos Reis, citando Baudry e Barde, ensina-nos que a causa de pedir «é o facto jurídico que constitui o fundamento legal do benefício ou do direito, objecto do pedido; é o princípio gerador do direito, a sua causa eficiente, a origo petionis
E, desde logo adverte, apoiando-se em Chiovenda, que «há que repelir, antes de mais nada, a ideia de a que a causa petendi seja a norma de lei invocada pela parte. A acção identifica-se e individualiza-se, não pela norma abstracta da lei, mas pelos elementos de facto que converteram em concreto a vontade legal»[7].
Atenta a teoria da substanciação acolhida pelo legislador nacional, o autor não se pode ficar pela alegação seca e conceitual da relação jurídica abstracta, da mera categoria jurídica donde pretende extrair determinados efeitos jurídicos, devendo, antes, preocupar-se em articular os factos concretos constitutivos do direito a que se arroga.
Daí que se entenda que os argumentos e razões jurídicas invocadas pelo autor na petição inicial, em cumprimento do disposto na alínea c) do nº1 do artigo 467º do CPC, não são elemento integrante da causa de pedir. Tanto mais que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 664º do mesmo Código).
Ainda a este respeito, é importante realçar a posição de Mariana França Gouveia[8]:
«A causa de pedir, para efeito de excepção de caso julgado é, (...), definida através dos factos constitutivos de todas as normas em concurso aparente que possam ser aplicadas ao conjunto de factos reconhecidos como provados na sentença transitada.»
E, mais à frente, precisa[9]:
«...para o caso julgado, na sua vertente de excepção, a causa de pedir é definida através do conjunto de todos os factos constitutivos de todas as normas em concurso aparente que possam ser aplicadas ao conjunto de factos reconhecidos como provados na sentença transitada. Uma acção posterior será barrada pela excepção do caso julgado quando os mesmos factos reconhecidos como provados são os únicos alegados, mesmo que a norma invocada seja diferente. Estes factos principais enquadram apenas os que servem de fundamentação ao pedido, o que tem como consequência que, propondo o réu acção de sentido contrário, basta a identidade de factos constitutivos do direito do autor que o réu alega (para logo de seguida invocar a excepção) para que haja identidade de causa de pedir.
Na sua vertente de autoridade, a causa de pedir define-se exactamente da mesma forma, ou seja, enquadra todos os factos constitutivos de todas as normas em concurso aparente, que possam ser aplicadas em conjunto de factos reconhecidos como provados na sentença transitada. O que significa que as decisões sobre estes factos constitutivos terão autoridade de caso julgado em acções posteriores com objectos diferentes.»
Na presente acção os réus invocaram como causa de pedir do pedido reconvencional a usucapião e a acessão industrial imobiliária.
Por sua vez, na acção nº 624/06.2TBPTL, invocaram os autores como causa de pedir a usucapião (arts. 2º, 3º e 4º da respectiva p.i.) – cfr. fls. 158 e ss..
É certo que também invocaram como causa de pedir naquela acção, a nulidade de uma escritura de justificação para pedirem a respectiva declaração de nulidade.
Só que daí não decorre, como se escreveu no saneador recorrido, que nessa acção “a causa de pedir assentava na nulidade de uma escritura pública”.
Disto se apercebeu, aliás, a Mm.ª Juíza do julgamento quando escreveu na sentença:
«Analisando a petição inicial do processo nº 624/06.2TBPTL – cfr. fls. 158 a 171 – verifica-se que os dois últimos pedidos são característicos de uma acção de simples apreciação negativa, o que não impede a cumulação de tal pedido com um pedido típico de uma acção declarativa de condenação (a declaração de que o terreno e construção lhes pertence – isto porque todos os pedidos são processual (a todos corresponde a forma de processo comum) e substancialmente (por coadunação prática) compatíveis, na definição do art. 470º nº 1 C.P.Civ. (neste sentido, Teixeira de Sousa, As Partes, o Objecto e a Prova na Acção Declarativa, pgs. 144 e 145).
Daí que, a nosso ver, naqueles autos a causa de pedir não tenha por base, apenas, a nulidade da escritura de justificação notarial, mas também os factos – no caso a usucapião – tendentes a afirmar a propriedade dos AA.
Deste modo e salvo melhor opinião, há claramente caso julgado relativamente ao primeiro pedido agora formulado na reconvenção»[10].
Não podíamos estar mais de acordo com esta análise.
Na verdade, sendo vários os pedidos formulados na acção nº 624/06.2TBPTL, os mesmos tinham como suporte várias causas de pedir, à semelhança, aliás, do que sucede na presente acção, na qual os réus fundamentam o pedido reconvencional de reconhecimento da propriedade sobre o prédio em causa na usucapião e na acessão industrial imobiliária.
Significa isto que em ambas as acções o facto jurídico de que emerge o pedido deduzido pelos autores relativamente ao direito de propriedade que invocam é a aquisição originária do prédio em causa (usucapião).
Não pode, por isso, haver dúvida de que há identidade de causa de pedir nas duas acções.
Deste modo, não pode mais qualquer Tribunal proferir uma decisão entre as mesmas partes que julgue procedente a acção com fundamento na aquisição do dito prédio pelos réus/reconvintes, sob pena de contradição directa de julgados.
O recurso merece, pois, provimento.

Julgado procedente o recurso subordinado fica prejudicado o conhecimento do recurso principal dos réus que colocava como questão essencial decidenda a aquisição pelos réus do aludido prédio por usucapião.

Sumário:
Não obsta à verificação da excepção do caso julgado, o facto de nas duas acções, com os mesmos sujeitos e o mesmo pedido, existir mais do que uma causa de pedir, sendo suficiente para que ocorra o caso julgado, a identidade entre uma dessas causas de pedir, in casu a usucapião.

IV – DECISÃO
Pelo exposto, decide-se:
a) julgar procedente o recurso subordinado interposto pelos autores e, em consequência, revogar o despacho saneador que julgou improcedente a excepção do caso julgado, absolvendo os autores da instância quanto ao pedido formulado sob a alínea b) da reconvenção;
b) julgar prejudicado o conhecimento do recurso principal dos réus, confirmando, embora com fundamentos não inteiramente coincidentes a decisão recorrida;
c) condenar os réus nas custas.
*
Guimarães, 6 de Fevereiro de 2014
Manuel Bargado
Helena Gomes de Melo
Heitor Gonçalves
____________________________________
[1] Mantém-se a sequência de factos constante da sentença.
[2] Cfr., a este propósito, Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil – Novo Regime, 3ª edição revista e actualizada, 2010, p. 90 e a doutrina e jurisprudência aí citada
[3] Cfr. Acs. do STJ de 17/02/1994, BMJ 434º-580 e de 20/04/1994, BMJ, 436º-300; Manuel Andrade, Noções Fundamentais de Processo Civil, 1963, págs. 297 e segs. e Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª ed., págs. 710 e ss..
[4] Ob. cit., pág. 304.
[5] Lebre de Freitas – Montalvão Machado – Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 2ª ed., 2008, pp. 347/348.
[6] BMJ, n.º 433, pág. 495.
[7] Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. III, pág. 121.
[8] A Causa de Pedir na Acção Declarativa, Almedina, Coimbra, pág. 493, citada no Ac. do STJ de 29.09.2009, proc. 2258/07.5TBSTS.S1, in www.dgsi.pt.
[9] Ibidem, pág. 509.
[10] Dada a existência de despacho saneador a afirmar o contrário e a circunstância do mesmo poder ser objecto de recurso, como foi, a Mm.ª Juíza considerou-se naquele momento vinculada por tal decisão.