Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2723/12.2TBBRG.G1
Relator: HELENA MELO
Descritores: CONTRATO DE EMPREITADA
MULTA CONTRATUAL
EMPREITEIRO
DONO DA OBRA
AUTO DE FISCALIZAÇÃO
INCUMPRIMENTO DO CONTRATO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/20/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: HELENA MELO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I. A aplicação da cláusula contratual que reproduz quase na íntegra o artº 201º, nº 5 do DL 59/99 que prevê a aplicação de multas contratuais ao empreiteiro, na redacção vigente à data dos factos, tem como pressuposto o prévio levantamento de auto pela fiscalização e o seu conhecimento pelo empreiteiro, permitindo-lhe a sua defesa, ainda que as razões do incumprimento não sejam relativas ao cumprimento defeituoso do contrato.
II.A aplicação de multas pelo dono da obra tem como fim pressionar o empreiteiro a cumprir o prazo, pelo que têm de ser aplicadas em momento anterior à entrega da obra.
Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães:

I – Relatório

AA, S.A. intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, contra BB, S.A., pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 450.000,00, acrescida de juros à taxa supletiva, contados desde 15-06-2009 (data da notificação para a constituição do tribunal arbitral) até efectivo e integral pagamento.
Alegou para tal que celebrou com a R., em 28.11.2015, um contrato de empreitada para a execução da obra de construção do Hotel Central de Viana do Castelo, em terreno sito no gaveto da Rua da Bandeira com a Av. Gaspar Castro, freguesia de Santa Maria Maior, Viana do Castelo, por preço global fixo (quanto aos trabalhos constantes da proposta de empreitada, no valor global de € 1.560.000,00), tendo sido ainda acordada a realização de outros trabalhos.
O prazo para a realização dos trabalhos da empreitada era de 180 dias, com início em 1 de Janeiro de 2006, não tendo porém sido facultado pela Ré à Autora as peças escritas ou desenhadas complementares ao projecto, necessárias para que esta pudesse proceder à execução da obra, bem como a licença da obra emitida pela Câmara Municipal de Viana do Castelo, nem o livro de obras.
Acrescentou que a obra apenas foi concluída e entregue em 30 de Maio de 2007 (334 dias após o prazo acordado), imputando o atraso à execução dos trabalhos a mais e a indefinições e omissões por parte da Ré, nomeadamente na elaboração e aprovação dos projectos necessários ao licenciamento e desenvolvimento da obra, na apresentação à autora das demais peças escritas e desenhadas complementares ao projecto e necessárias à execução da obra, na definição atempada de opções diversas do previsto executar, na falta de esclarecimento oportuno dos pormenores construtivos que em projecto lhe competiam evidenciar e na resolução de ocorrências contratualmente não previstas, como sucedeu por exemplo com a falta de soluções para debelar o nível freático e para as contenções periféricas, com a estacaria de fundações, com as infraestruturas eléctricas e com a indefinição quanto à implantação da obra.
Invocou, ainda, que estes atrasos da responsabilidade da Ré lhe causaram prejuízos com a afectação de recursos humanos e equipamentos, por um período de, pelo menos, 6 meses, cujo montante computa em € 450.000,00
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A R contestou, refutando a responsabilidade que lhe é imputada pela Autora pelo atraso na conclusão e entrega da obra, com excepção apenas do período de um mês, no tocante aos trabalhos de estacaria e contenção periférica, para cuja compensação considera suficiente a quantia de € 5.000,00. Pelo contrário, no que respeita aos trabalhos a mais (que foram pagos como tais), ao nível freático e à falta de licença de obra e de livro de obra, nenhuma destas situações inviabilizava a prossecução dos trabalhos decorrentes da empreitada inicial.
Alega, em oposição com o vertido na petição inicial, que tais atrasos na conclusão da obra (que deveria ter ficado pronta em 30-07-2006, contando com a prorrogação do prazo inicial por 30 dias, o que significa que o atraso se cifrou em 306 dias) se devem a culpa exclusiva da própria Autora, reclamando assim a aplicação da multa diária estabelecida contratualmente no valor de € 500,00, o que conduz a uma indemnização a este título que ascende a € 153.000,00.
Formulou, assim, um pedido reconvencional no montante de € 148.000,00 (operando a compensação com a quantia de € 5.000,00 que reconheceu dever à Autora), acrescido das custas de parte referentes ao processo que correu termos no Tribunal Arbitral de € 41.210,01 e dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos, contabilizando aqueles no valor de € 2.017,43 até à data da apresentação da reconvenção.
Concluiu, pedindo a improcedência da acção (com excepção da mencionada importância de € 5.000,00) e a procedência da reconvenção, com a condenação da Autora no pagamento da quantia de € 191.227,44, acrescida de juros de mora.
A Autora replicou, nos termos constantes de fls. 110 a 116 do processo físico, impugnando os novos factos alegados pela Ré na sua contestação-reconvenção e reiterando o que havia já alegado na petição inicial, no sentido da culpa exclusiva da Ré pelo atraso na conclusão e entrega da obra.
Quanto às custas reclamadas, defende que as mesmas deverão ser fixadas no próprio processo a que respeitam, não sendo esta a sede para apreciar o respectivo pedido. Mais alegou que a R. nunca deu cumprimento ao disposto na cláusula 21º, nº 3 do contrato de empreitada, não tendo nunca lhe remetido qualquer auto por aplicação de multas contratuais.
Terminou, pedindo a improcedência da reconvenção.
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A Ré treplicou, mantendo tudo o que havia alegado na contestação/reconvenção e impugnando a nova factualidade alegada pela Autora na réplica.
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Procedeu-se a uma audiência prévia.
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Antes da prolação do despacho saneador foi decidido não admitir a reconvenção deduzida pela Ré na sua contestação, na parte referente ao pagamento da quantia de € 43.227,44 (custas de parte relativas ao processo que correu termos no tribunal arbitral e de cuja decisão foi interposto recurso para este Tribunal da Relação), acrescida dos respectivos juros peticionados, tendo a mesma sido admitida quanto ao demais peticionado.
Após, foi elaborado despacho saneador, na sequência do qual se procedeu à selecção da matéria de facto assente e da base instrutória.
Procedeu-se seguidamente a julgamento e a final foi proferida sentença com o seguinte teor decisório, no que ao caso interessa:
“– Por tudo o exposto, decide-se:
a) julgar parcialmente procedente a acção e, em consequência
1. reconhecer que a Autora é titular de um crédito sobre a Ré, no valor de € 15.000,00;
2. absolver a R. do restante pedido;
b) julgar parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência:
1. reconhecer que a Ré é titular de um crédito sobre a Autora, no valor de € 152.000,00;
2. considerar extinto o crédito supra indicado em a) 1., por compensação;
3. operando a compensação entre os créditos referidos em a) 1. e b) 1., condenar a Autora a pagar à Ré a quantia de € 137.000,00, correspondente à diferença entre o crédito da Autora e o crédito da Ré, acrescida de juros de mora desde a data da notificação do pedido reconvencional até integral pagamento, às taxas legais em cada momento em vigor para as operações comerciais, nos termos da Portaria nº 597/2005, de 19/07. “

A A. não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, no qual concluiu do seguinte modo:
1- O Tribunal a quo apoia-se unicamente no facto dado como provadon.º 20 para aplicar à recorrente multas contratualmente previstas poratraso na execução dos trabalhos contratuais.
2- Não existe facto provado que demonstre o cumprimento do dispostona cláusula 21ª, n.º 3 (“A aplicação de multas contratuais, seráprecedida de auto lavrado pela fiscalização, do qual o dono da obraenviará uma cópia ao empreiteiro, notificando-o para, no prazo deuma semana, deduzir a sua defesa.”) do contrato de empreitada - até
porque tal jamais foi alegado nos art.s 152º a art. 167º dacontestação.
3- As multas contratuais por atraso na conclusão na empreitadadesignam-se na doutrina por cláusulas penais moratórias, que cessama sua razão de ser uma vez terminada e entregue a obra, o que sucedeu– vd. facto dado como provado n.º 13.
4- Devem ser aplicadas no decurso da empreitada da formacontratualmente prevista para o fazer – ou de acordo com a tramitaçãolegal para o efeito, por remissão contratualmente determinada para oDecreto-Lei n.º 59/99.
5- As penalidades contratuais não podem ser aplicadas após a conclusãoda empreitada, não podem ser aplicadas judicialmente em momentoposterior nem podem ser aplicadas prescindindo da sua tramitaçãoformal e sem conceder ao empreiteiro defesa quanto à aplicação dasmesmas.
6- A recorrente nunca foi notificada, nem no decorrer da obra nemdepois, da aplicação de multas contratuais, o que aliás foi alegado noart. 24º da réplica e que, portanto, integra a base factual a julgar peloTribunal a quo, não tendo sido, aliás, produzida sequer prova docontrário (vd. art. 324º, n.º 1 CCiv..)
7- A aplicação de multas contratuais pelo Tribunal a quo é ilícitaporquanto nula e deve, nessa mesma medida, ser revogada, conformejurisprudência abundante e citada.
8- Por outro lado, a sentença a quo considera não serem devidos €450.000,00 a título de custos de estaleiro conforme peticionados pelaautora (vd. art. 144º PI) pelo atraso da obra e pela permanência dosseus meios na mesma entre 31/06/2006 e 30/05/2007.
9- A sentença a quo considera que apenas deve ser consideradoimputado à ré um atraso de 30 dias e que este atraso deve serindemnizado à razão da multa contratual fixada para o atraso naconclusão da obra por parte do empreiteiro.
10- A sentença a quo faz errada apreciação de prova e consequentementeerrada aplicação do direito aos autos. Vejamos.
11- Conforme facto dado como provado n.º 29, a licença de obra apenasfoi entregue à autora em 26 de Maio de 2006.
12- A recorrente não poderia iniciar a construção da obra sem dispor dalicença por imperativo legal, razão pela qual e desde logo, apenas apartir da data da obtenção da licença deveria iniciar-se a contagem doprazo de execução da empreitada contratualmente previsto, implicadoper se a falta de licença de obra um atraso de 118 dias - veja-se, aliás,o depoimento da testemunha CC,gravado em audiência de julgamento de 4 de Abril de 2016, entre as15:09 e as 17:02, com continuação na audiência de julgamento de 09de Maio de 2016 entre as 15h24m e as 17h38m, minuto 5:11.
13- As sobrelarguras foram tardiamente executadas, sendo que nos termosda cláusula 2ª, n.º 3, estão excluídas do contrato de empreitada – vd. Odepoimento do mesmo CC – apenas tendo sido apresentadauma solução para o problema depois de 17 de Março, 76 dias após oinício da empreitada.
14- Nos termos da cláusula 28ª, n.º 2, competia à recorrente obter alicença de obra e de uso de explosivos (que apenas foi obtida a27/7/2006 – cfr. facto dado como provado n.º 35.)
15- Foi a recorrida quem decidiu a aplicação de explosivos na rocha peloque apenas a si lhe pode ser imputado o atraso no desmonte da mesma– cfr. depoimento de CC, minuto 50:02 e ss.. O atraso que aobtenção da licença gera para a continuação da obra é perceptível dodepoimento de DD, gravado emaudiência de julgamento de 24 de fevereiro de 2016, entre as 10h28me as 12h49m, minuto 40:00 e seguintes.
16- A licença para explosivos para desmonte de pedra já vinha sendosolicitada desde 20/02/2006, sendo que a 06/04/2006 insiste-se namesma (cfr. p. 71 do relatório de peritagem), sendo que a licença deobra apenas é entregue à recorrente a 26/05/2006 e 51 dias após aúltima solicitação o que deve determinar no entender dos peritos 51dias de prorrogação de prazo – cfr. p. 72 do relatório da primeiraperitagem, o que implica que não seja dado como provado o facto n.º33, n.º 34 e que seja considerado como provado o facto o) do elencodos factos dados como não provados.
17- Deve ser considerada provada a matéria de facto constante da al. b)dos factos não provados como elencada pela matéria a quo.
18- O preço dos trabalhos a mais implica que estes corresponderam aaproximadamente um terço da obra a executar – cfr. facto dado comoprovado n.º 12.
19- Considerar que a execução de trabalhos a mais que orçam em umterço do total de trabalhos a executar em seis meses não tem influênciana tramitação da obra ou que apenas implicará um atraso de 30 diasnesta é uma asserção que não tem correspondência nas regras deexperiência ou de apreciação prudente.
20- As questões relativas às sobrelarguras, à drenagem, à alteração dafilosofia do projecto de fundações, os trabalhos de alterações diversas,o tempo de execução de todas estas tarefas directamente e o tempo derepercussão destas na execução da empreitada estão documentadasnos autos e no relatório de peritagem, tanto de 2014 como de 2015,cujas passagens mais relevantes estão elencadas em corpo de texto dapresente alegação, sendo de destacar que o dono de obra em06/06/2006 não tinha ainda uma solução de projecto fechada sobre omodo como tal tarefa devia ser executada – cfr. p. 50 do relatório deperitagem – tal como não a tinha no início do projecto - cfr. p. 52 domesmo.
21- A estes factos acresce a entrada em obra da sub-empreiteira SCOUT,por ordem da recorrida, responsável por actividades de estruturametálica antecedentes e precedentes de trabalhos a executar pelarecorrente, o que mais determinou o atraso da obra porquanto estasintervinham a partir da laje no piso 0 (vd. facto dado como provado n.º
31 que mostra a interferência destes empreiteiros no trabalho darecorrente desde 6/7/2015) e implica uma prorrogação de prazo deempreitada de mais de 60 dias – cfr. p. 73 do relatório de peritagem de2014.
22- O relatório de peritagem de 2014 e documentos para os quais omesmo remete e expressamente elencados em corpo de texto dapresente alegação determina que, descontadas responsabilidades darecorrente, deverão ser imputadas responsabilidades à recorrida poratrasos na conclusão da empreitada em 124 dias + 81 dias + 1 dia, ouseja, 206 dias – cfr. p. 76 do relatório pericial de primeira perícia, quelevou a cabo extensiva análise documental e do projecto dos autos.
23- Dos elementos de prova indicados resulta que a al. b) dos factos dadoscomo não provados deveria ter sido considerada provada, maisresultando provado que o estaleiro da recorrente permaneceu em obramais 206 dias do que o previsto por responsabilidade da recorrida.
Mais deverá ser consideradas provada as als. d), e) dadas como nãoprovadas.
24- De igual forma, e para lá do atraso que os trabalhos a maisprovocariam, consta do doc. n.º 77 junto aos autos com a PI (vd. art.104º PI) a alteração da generalidade de fundações de indirectas paradirectas o que, considerada a extensão dos trabalhos em questão, nãopode deixar de ser julgado como de extrema morosidade e implicarprolongamento de trabalhos.
25- A recorrente tem direito a ser indemnizada no valor peticionado comreferência a 206 dias contabilizados com base nos custos de estaleirocontratualmente aceites como anexo ao contrato de empreitada porambas as partes e constantes do doc. n.º 5 junto com a PI e calculadosnos termos do doc. n.º 98 junto com a PI.
26- A presença dos meios da recorrente em obra resulta com abundânciado doc. n.º 81, 82, 83, 84, 88, 92, 93, 94, 98 juntos com a PI pelo quedevem ser pagos nos termos contratualmente acordados na medida emque permaneceram em obra para lá do tempo acordado porresponsabilidade da recorrida.
27- Assim deveria a sentença a quo ter procedido à aplicação do direitoaos factos provados, condenando a recorrida no pagamento de €450.000,00 pelos custos de estaleiro e manutenção da mão-de-obra eequipamentos em obra, com os custos inerentes e associados.
A parte contrária contra-alegou e formulou as seguintes concussões:

1.º - A fundamentação das respostas à matéria de facto é de talmodo elucidativa, esclarecedora e assertiva na apreciação dosdepoimentos prestados pelas testemunhas que, conjugados comos demais meios de prova existentes no processo,designadamente as Actas referentes à execução do contrato deempreitada, nada há a apontar-se à forma como foramelaboradas, uma vez que traduzem fielmente a realidade factualapurada pelo M.mo Juiz recorrido.

2.º - Pelo que a douta sentença em impugnação, mormentequanto às respostas dadas aos factos provados e não provados,tal como à matéria da reconvenção, deve ser mantida in totumpor não ser susceptível de qualquer reparo ou censura.

II – Objecto do recurso
Considerando que:
. o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e,
. os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido,
as questões a decidir são as seguintes:
. se os factos constantes dos pontos 33 e 34 da matéria de facto provada devem ser dados como não provados;
. se os factos constantes das alíneas b), d) e) e o) da matéria de facto dada como não provada devem ser dados como provados;
. se, em consequência da alteração de facto, o montante dos prejuízos sofridos pela A. é superior ao considerado na sentença recorrida, por o atraso na conclusão da obra ser de imputar à R. em mais 176 dias do que os 30 dias considerados na sentença recorrida, no total de 206 dias; e,
. se a A. não pode ser condenada no pagamento da multa estabelecida no contrato de empreitada, para o caso da ultrapassagem do prazo acordado para a execução da empreitada, por a R. não ter dado cumprimento à cláusula 21º, nº 3 do mesmo contrato e por a obra já ter sido concluída.

III – Fundamentação
Na 1ª instância foram dados como provados e não provados os seguintes factos:
Factos provados
1. A autora é uma sociedade comercial, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Braga que tem como objecto social “indústria de construção civil e obras públicas”.
2. A ré é, também, uma sociedade comercial, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Ponte de Lima que tem por objecto social “operações sobre imóveis, compra venda de imóveis e dos adquiridos para esse fim, compra, venda e construção de imóveis para fins turísticos, construção civil e obras públicas, empreitadas e loteamentos”.
3. Em 28 de Novembro de 2005, a autora celebrou com a ré, por escrito, um contrato de empreitada de obra de construção civil que tem por objecto “a execução da empreitada de demolições, movimentação de terras e projecto de especialidades de estrutura de betão armado referente à construção do Hotel Central de Viana do Castelo, em terreno sito no gaveto da Rua da Bandeira com a Av. Gaspar Castro, freguesia de Santa Maria Maior, Viana do Castelo”.
4. Do âmbito do supra referido contrato de empreitada e por expressão da Clª 2ª, n° 3, estão excluídos os seguintes trabalhos preparatórios e acessórios: vedação e protecção da obra, contenção periférica, escavação de sobre largura, aterros, controle do nível freático, desactivação e desvio das redes de infraestruturas existentes, públicas ou privadas, instaladas na área dos trabalhos.
5. Ficou ainda acordado entre as partes que a Autora seria remunerada mediante um preço global fixo, compreendendo a realização de todos os trabalhos constantes da proposta da empreitada e por série de preços, compreendendo todos os trabalhos que houvesse necessidade de executar da natureza estabelecida no capítulo II, artigo 2.03 (execução de estacas em betão armado) da proposta de empreitada, que ultrapassassem a quantidade prevista na referida proposta e cujo valor era determinado tendo por base a lista de preços unitários.
6. O custo dos trabalhos da empreitada a realizar por preço global fixo era de € 1.560.000,00, acrescido de IVA e o custo dos trabalhos a realizar por série de preços era o resultante da realização dos trabalhos previstos no Capítulo II, artigo 2.03 (execução de estacas em betão armado) da proposta de empreitada e da lista de preços unitários, na parte realizada, que excedia o previsto na referida proposta de empreitada.
7. Nos termos da Clª. 15ª, n° 1, do contrato de empreitada, a Autora obrigava-se, ainda, a executar os trabalhos não englobados na empreitada que lhe fossem solicitados.
8. O prazo para a realização dos trabalhos da empreitada era de 180 dias, incluindo sábados, domingos e feriados, com início em 1 de Janeiro de 2006.
9. Em 2 de Janeiro de 2006, a ré facultou à autora os locais onde haviam de ser executados os trabalhos.
10. A ré não entregou à autora, no acto de consignação da obra, a licença da obra emitida pela Câmara Municipal de Viana do Castelo, nem lhe apresentou o livro de obras.
11. Os trabalhos contratuais iniciais, cujo custo ascendeu à importância ilíquida de € 1.529.371,08, encontram-se identificados nas facturas n°s 2006/23, 2006/137, 2006/153, 2006/88, 2006/101, 2006/141, 2006/162, 2006/182, 2006/221, 2006/194, 2006/250, 2006/268, 2007/04, 2007/37, 2007/179 e 2007/105.
12. Os trabalhos a mais, determinados pela ré, cujo custo ascendeu ao valor ilíquido de € 446.782,39, encontram-se identificados nas facturas n°s 2006/41, 2006/54, 2006/89, 2006/102, 2006/142, 2006/163, 2006/183, 2006/195, 2006/220, 2006/251, 2006/269, 2007/05, 2007/38, 2007/80, 2007/106 e 2007/121.
13. A ré pagou os valores referidos em 11º e 12º.
14. A obra foi concluída e entregue em 30 de Maio de 2007.
15. O acordo celebrado entre as partes prescreve que o controle do nível freático está excluído do âmbito da empreitada.
16. Em 20 de Abril de 2006 a Ré informou a Autora da concessão de prorrogação contratual pelo período de 30 dias.
17. A autora, por solicitação da ré, em 23 de Maio de 2006 forneceu orçamento para a realização dos seguintes trabalhos: impermeabilização do pavimento térreo; drenagem do pavimento térreo; pilares / elementos verticais à vista no piso -2; junta “water stop 020”; poço de bombagem; e caixas de visita em betão.
18. No final do mês de Julho, a autora tinha realizado 60,30% da obra, € 99.158,64 de trabalhos a mais, e, de trabalhos com esta mesma natureza, realizou nos meses subsequentes o valor de € 332.845,39, determinados pela ré.
19. A ré foi notificada pela autora em 15 de Junho de 2009 da constituição de um Tribunal Arbitral para dirimir o litígio, o qual foi declarado incompetente por Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, por ter sido constituído após o prazo fixado pelas partes para o efeito.
20. Nos termos do disposto na clausula 26ª, n.°2, do aludido Contrato de Empreitada, a A. ficou sujeita, por falta de cumprimento da data da conclusão dos trabalhos contratados, à multa convencionada de € 500,00 por cada dia de atraso.
21. Foi efectuada pela Ré uma alteração do projecto ao nível da cortina de estacas, o que determinou um atraso da obra de 30 dias.
22. Em 12 de Junho de 2006, a ré enviou à autora o desenho de localização de uns negativos a introduzir na laje do piso -1, mas sem a devida cotação que permitisse a sua execução.
23. Em 16 de Junho de 2006 foi entregue e definida a geometria dos muros e lajes confinantes com a Rua da Bandeira, estando ainda em falta a reformulação da laje do piso 0, sapata do núcleo nu5 e localização do depósito de gasóleo.
24. Em 29 de Junho de 2006 a Autora foi informada de quais os locais da estrutura a construir com betão à vista e o modo como deve ser executada a parede que intercepta a junta de dilatação, persistindo a indefinição sobre a laje do piso 0, confinante com a Rua da Bandeira e rotunda, cuja reformulação era aguardada e que o núcleo da escada devia subir cerca de 10 metros.
25. O início dos trabalhos de estacaria ocorreu no dia 20 de Março, quando estava previsto em termos de mapa de trabalhos a 21-02-2006.
26. O início dos trabalhos de betão armado estava previsto para 5-04-2006, quando ocorreu no dia 6-03-2006.
27. Na comunicação da prorrogação de prazo aceite, a Ré solicitou à autora que organizasse o trabalho de forma a garantir a entrada do empreiteiro de estruturas metálicas, a meados de Julho, na zona do corpo do Hotel.
28. No dia 5 de Maio de 2006 foi apresentado o mapa de trabalhos rectificado por parte da autora, com final dos trabalhos de betão na Obra, com a excepção da zona de influência de rocha, para final de Julho.
29. A licença de obra foi entregue pela Ré à Autora em 26 de Maio de 2006, podendo a partir desta data tratar-se da licença para uso de explosivos.
30. No dia 29-6-2006, depois de fornecidos os dados da empresa contratada pela autora para a utilização dos explosivos, já tinha sido entregue declaração da Câmara Municipal, para levantamento da Licença de Explosivos.
31. Apenas foram iniciados os trabalhos da laje do piso 0, zona do Hotel, no dia 6.7.2006, quando estava prevista a sua betonagem a 27 de Junho.
32. A autora justificou não ter começado esta laje mais cedo, por questões da gestão da cofragem.
33. A autora, através do seu subempreiteiro, para obstar ao levantamento da licença de explosivos, invocou que o não podia fazer sem uns dados apresentados na declaração da Câmara Municipal, quando esses não eram necessários para o efeito, tendo-se perdido, pelo menos um mês por causa deste assunto.
34. No dia 21.07.2006 a autora aceitou que a rocha que existia em Obra correspondia à prevista nos estudos geotécnicos e que a responsabilidade sobre a rocha é toda de sua parte.
35. Os trabalhos de utilização de explosivos apenas foram iniciados pela autora no dia 27.07.2006.
36. No dia 29.08.2006, ainda não havia condições para reiniciar os trabalhos de fundações na zona do corpo do Hotel, zona onde tinham estado parados.
37. Foi solicitado novo plano de trabalhos à autora, dado existir já um atraso de vários meses.
38. No dia 2 de Setembro de 2006, a autora entregou ao Dono da Obra novo mapa de trabalhos para os restantes 30% da Obra que não tinham sido abrangidos no planeamento anterior, solicitando cerca de 3 (três) meses para terminar a Obra.
39. A partir do final de Outubro de 2006 ocorreram novos atrasos na execução da sequência de montagem das lajes.
40. Pelo último planeamento apresentado, os trabalhos de betão deviam ter terminado a 30 de Novembro de 2006, situação muito longe da realidade, pois, na zona das piscinas ainda estavam a ser efectuados acertos na rocha de fundo, para proceder à montagem das fundações.
41. No dia 14.12.2006, ainda estavam a ser retirados produtos sobrantes da escavação na zona das piscinas e a giratória que estava a executar este trabalho ainda se encontrava na Obra, verificando-se a sua retirada apenas no dia 18-01-2007.
42. Só no início de Janeiro de 2007 foi terminada a laje do piso 0, zona 4, na base do Hotel.
43. Os trabalhos na zona das piscinas prolongaram-se até Abril de 2007, cerca de 5 meses depois da data prevista no último planeamento.
44. No 2 º Planeamento entregue a 5/5/2006, as betonagens estavam previstas e apenas foram realizadas nas datas supra indicadas: Betonagem da Laje zona 4, Piso -2 a 13-06 > estava prevista a 26 -05; Betonagem da Laje zona 2, Piso -2 a 21-06 > estava prevista a 31 -05; Betonagem da Laje zona 1, Piso -2 a 29-06 > estava prevista a 16 -06; Betonagem da Laje zona 3, Piso -2 a 07-07 > estava prevista a 30 -06; Betonagem da Laje zona 4, Piso -1 (primeira fase da laje) a 21-07, sendo terminada a 18-08 > estava prevista a 27 -06; Betonagem da Laje zona 2, Piso -1 a 4-08 > estava prevista a 28 -06; Betonagem da Laje zona 1, Piso -1 a 11-08 > estava prevista a 7 -07; Betonagem da Laje zona 3, Piso -1 a 18-10 > estava prevista a 28 -07.
45. No 3º planeamento, os trabalhos só decorreram de acordo com o planeamento durante cerca de 1 mês.
46. Apenas em Maio de 2006 a autora optou pela solução de explosivos, quando havia ficado acordado que o desmonte da rocha ficava a seu cargo.
47. Ocorreu diminuição de meios humanos e técnicos a partir de Setembro de 2006, por parte da autora, o que determinou o abrandamento da execução dos trabalhos.

Factos não provados:
Não se provaram quaisquer outros factos com relevo para a discussão da causa, nomeadamente os seguintes:
a) Apesar do referido em 9º, a ré não entregou à autora, no acto de consignação da obra, as peças escritas ou desenhadas complementares ao projecto necessárias à sua execução.
b) A conclusão da obra 334 dias após o prazo inicial, foi motivado pela realização dos “trabalhos a mais” aludidos em 7º, 12º e 17º, os quais condicionaram a realização dos trabalhos referidos em 11º, já que alguns só puderam entrar em execução após a conclusão daqueles.
c) A realização desses “trabalhos a mais” determinou que o prazo inicial tivesse de ser dilatado em mais 104,16 dias.
d) Em 12 de Janeiro de 2006 estavam ainda por resolver por parte da Ré os seguintes problemas na obra: ausência de resolução do rebaixamento do nível freático; falta do mapa de cargas das estacas de fundações; incorrecções na planta de implantação; a planta de vedação reduz a área do estaleiro, o que impede o manuseamento dos equipamentos; omissão do desvio das infraestruturas eléctricas; falta de energia e água para alimentar a obra, o que determinou um atraso na obra de 12 dias e, em 17 de Janeiro de 2006, a suspensão dos trabalhos por um dia.
e) A ausência da vedação da obra, a omissão quanto ao desvio de infraestruturas eléctricas e a falta de solução para as contenções periféricas condicionaram o andamento dos trabalhos.
f) A ré em 2 de Fevereiro de 2006 ainda não possuía energia eléctrica contratada para apoio ao estaleiro da obra, o que era indispensável para a realização dos trabalhos.
g) A ré apenas em 15 de Fevereiro de 2006 enviou à autora os desenhos e demais elementos para a solução estrutural da contenção periférica, sem os quais a autora não pôde fazer evoluir os trabalhos, ficando com equipamentos e mão-de-obra imobilizados.
h) Porém, esses elementos estavam errados, pelo que foi necessário aguardar pelo envio dos correctos.
i) Em 20 de Fevereiro de 2006 a Autora teve de suspender o movimento de terras, dado o elevado nível freático que impedia a movimentação das máquinas, dos veículos de transporte, dos trabalhadores e dos demais equipamentos.
j) E a escavação não podia ter continuidade na zona junto à escola por falta de vedação daquela área.
k) Em 2 de Março de 2006, a ré ainda não tinha procedido ao desvio das infraestruturas existentes, as quais continuavam a ser afectadas pela subida do nível freático.
l) Em 17 de Março de 2006 entrou em obra a máquina para execução das estacas das fundações, mas, como a ré ainda não tinha habilitado a autora sobre os elementos das suas características, este equipamento ficou parado.
m) A ré apenas em 7 de Abril de 2006 solicitou o preço para a realização da drenagem e impermeabilização do pavimento térreo, apesar da autora ter alertado a ré em 10 de Fevereiro de 2006 que os trabalhos de escavação e movimentação de terras não podiam progredir em zona freática e só em 20 de Abril de 2006 aprovou os preços para a impermeabilização do pavimento térreo.
n) Os trabalhos ficaram parados desde que, em 24 de Abril de 2006, tinha terminado a contenção periférica e as fundações indirectas para apoio a muros de suporte em estacaria.
o) Porque não era possível proceder ao desmonte da rocha, dado que a ré não possuía alvará de licença da obra e, por isso, não podia obter a licença de polícia para fazer uso de explosivos?
p) Caso não ocorressem todas estas circunstâncias, a autora teria entregue a obra no dia 30 de Julho de 2006?
q) A autora, durante esse período de tempo, teve sempre afectos e em permanência na obra um engenheiro director da obra, um técnico de segurança e um encarregado, um manobrador/condutor de máquinas, um operador de grua e ajudante de construção civil, bem como um conjunto de equipamentos constituído por rectroescavadora de pá, rectroescavadora giratória, viaturas de transporte de operários, contentor para escritório da direcção da obra e outro para escritório para a fiscalização, instalações sanitárias, equipamentos de segurança /postos SOS, grua torre, c/ lança a > 25mm e quadro eléctrico.
r) Com os recursos humanos e equipamentos referidos, a autora teve um custo, no período compreendido entre 31-06-2006 e 30-05-2007, de € 450.000,00.

Antes de entrarmos na apreciação da matéria de facto, importa efectuar uma correcção ao ponto 26 da matéria de facto provada que enferma de evidente lapso material, tendo sido trocadas as datas do início e da previsão dos trabalhos, erro que é manifesto no próprio contexto da decisão.
Assim o artº 26º passa a ter a seguinte redacção:
26. O início dos trabalhos de betão armado estava previsto para 06-03-2006, quando ocorreu no dia 05.04.2006.

Da alteração da matéria de facto
O Tribunal da Relação pode alterar a matéria de facto se a prova produzida impuser decisão diversa (artº 662º, nº 1 do CPC).
A apelante fundamenta-se no depoimento das testemunhas CC e DD.
A testemunha CC é engenheiro e presta serviço para a EE, Lda., sociedade que procedeu à fiscalização da obra a cargo da R. , tendo a testemunha coordenado a fiscalização integral da obra na qualidade de fiscal residente.
A testemunha DD, igualmente engenheiro, foi o director de obra levada a cabo pela A., entre 2006/2007.
A apelante procedeu transcrição dos segmentos em que se fundamenta. A testemunha CC depôs no dia 4 de Abril e no dia 9 de Maio de 2016, num total de 4 horas de depoimento e a testemunha DD prestou depoimento no dia 24 de Fevereiro de 2016, durante mais de duas horas, mas os segmentos transcritos nas alegações, nos quais a A. se fundamenta, reconduzem-se a escassos segundos/minutos.
Por sua vez, a apelada deu cumprimento ao disposto no artº 640º, nº 2, alínea b) do CPC, procedendo à transcrição dos depoimentos que, em seu entender, não permitem a alteração pretendida pela A.. Juntou ainda a transcrição integral dos depoimentos prestados em audiência de discussão e julgamento.Prestaram depoimento em audiência um total de 5 testemunhas. Arrolada pela autora, apenas foi ouvida a testemunha DD, já referida e,arroladas pela R. foram ouvidas 4 testemunhas: CC, também já referida, Jorge Fernando Pereira Sodré de Albuquerque, autor do projecto do hotel que disse ter começado a desenhar a obra em 2003 e acompanhado todo o processo até 2008; José Fernando Coelho de Basto, empreiteiro de acabamentos da obra, tendo entrado na obra em Abril/Maio de 2006 e permanecido até final eFF, autor do projecto de estruturas da obra e contenção periférica.
Foram juntas com a contestação 50 actas relativas às reuniões semanais que foram realizadas durante a obra.O andamento dos trabalhos da obra de construção do Hotel ia sendo vertido nas actas de reuniões semanais em que estavam presentes, um representante do dono da obra, um representante da EE – a testemunha CC – e um ou dois representantes da A., nomeadamente a também testemunha DD. Estas actas foram elaboradas pela testemunha CC, a qual referiu que as mesmas retratavam o que se passava em obra. Dois/três dias após a reunião, as actas eram enviadas aos intervenientes e se alguma das partes não concordasse com o seu teor, teria que comunicar as divergências que seriam analisadas. As actas eram assinadas pelos participantes.Nestas 50 actas relativas a reuniões, consta como tendo estado sempre presente o engº CC e um representante da A., abrangendo o período de 02-03-2006 até 03-05-2007. Nalgumas reuniões estiveram ainda presentes representantes da A400 e da Scout, empresa responsável pela estrutura metálica e ainda de outras sociedades que terão participado na construção do Hotel de Viana do Castelo.
Procedeu-se à audição do depoimento de todas as testemunhas e à leitura das transcrições juntas.
Vejamos:
Pontos 33º e 34º da matéria de facto provada e alínea o) dos factos dados como não provados.
Estes factos têm a seguinte redacção:
33. A autora, através do seu subempreiteiro, para obstar ao levantamento da licença de explosivos, invocou que o não podia fazer sem uns dados apresentados na declaração da Câmara Municipal, quando esses não eram necessários para o efeito, tendo-se perdido, pelo menos um mês por causa deste assunto.
34. No dia 21.07.2006 a autora aceitou que a rocha que existia em Obra correspondia à prevista nos estudos geotécnicos e que a responsabilidade sobre a rocha é toda de sua parte.
o) Porque não era possível proceder ao desmonte da rocha, dado que a ré não possuía alvará de licença da obra e, por isso, não podia obter a licença de polícia para fazer uso de explosivos.

A A., baseando-se no depoimento da testemunha CC, refere que não havia licença de obra no início das obras. Ora este facto já resulta da factualidade dada como provada e não impugnada, tendo sido dado como provado que em 2 de Janeiro de 2006 a R. facultou à A. os locais onde haviam de ser executados os trabalhos e que a licença só foi entregue em 26 de Maio de 2006 (pontos 9 e 29).
Nos demais extractos de depoimento desta testemunha que a apelante transcreve, nada declara a testemunha, nem a testemunha DD que ponham em causa o facto dado como provado no ponto 33. Efectivamente, conforme resulta do depoimento da testemunha CC e da acta de reunião de 13.07.2016 – acta nº 19 – havia dúvidas se a quantidade de explosivos tinha de constar da licença camarária, dúvidas que tinham sido criadas pelo subempreiteiro da A. e que atrasaram a emissão da licença, porque a Câmara não a queria passar com essa menção, quando afinal a licença acabou por ser emitida sem que constasse a quantidade de explosivos.
Relativamente ao ponto 34, também a testemunha CC depôs no sentido do dado como provado, em termos que não nos suscitaram dúvidas. Na acta nº 19, de 13.07.2006, refere-se que a EE apresentou, tendo em conta os cortes disponíveis do levantamento geotécnico “uma simulação das zonas de rocha em obra, identificando-se, (sublinhado nosso) restando apenas algumas dúvidas na zona da piscina, onde não existem cortes que representem a rocha, todavia os cortes analisados deixam antever que também nesta zona à (sic) rocha pelo que não se justifica a surpresa da AA sobre as quantidades de rocha a encontrar na zona da escavação.” Mais se menciona que “A Europa Ar Lindo refere que a planta de fundações não se enquadra com os cortes do estudo geotécnico, pois verificam-se estacas em zona onde neste momento se encontra rocha”.
Na reunião realizada a 21.07.2006, fez-se constar que, sob a denominação “desmonte da Rocha” “no que diz respeito ao desmonte da zona de rocha, a AA refere que depois de analisar melhor a situação, concluiu que as questões levantadas na semana anterior não são para levar avante, pelo que este trabalho será assumido pela Empresa” (sublinhado nosso), pelo que é patente que a A. acabou por reconhecer a sem razão das suas objecções.
É certo que a testemunha DDse referiu a uma dimensão da rocha que não era expectável, tendo mencionado a descoberta de uma enorme bola de granito azul, mas este depoimento, para além de ter sido contrariado pelo depoimento da testemunhaCC que referiu que a divergência entre os estudos geotécnicos e o encontrado era mínimo, não encontra suporte nas actas referidas, pelo que não é de considerar.
Assim, não se afigura ter ocorrido qualquer erro de julgamento, ao serem dados como provados os factos constantes do ponto 34.
Relativamente à alínea o):
Não se compreende a impugnação isolada da o), pois que esta alínea é a continuação da alínea precedente, m), e sem a mesma não é possível estabelecer em que medida a entrega da licença da obra apenas em 26 de Maio (sendo que a data da entrega já consta como provada no ponto 29)), atrasou a obra.
De qualquer modo sempre se dirá que:
A apelante fundamenta-se também num dos dois relatórios periciais junto aos autos, fazendo referência às páginas 48 e 67 do relatório, mas sem indicar a que relatório pericial se está a referir, uma vez que existem duas perícias e, relativamente à 1ª perícia, ainda coexistem dois laudos autónomos: um subscrito pelo perito indicado pela R. (laudo minoritário) e outro subscrito pelos peritos indicados pelo Tribunal e pela A. (laudo maioritário).
Sobre a repercussão da falta de licença de obra no atraso dos trabalhos, como condição para a emissão da licença de explosivos – os senhores peritos da 1ª perícia tiveram entendimentos diferentes. Pelo perito da R. foi entendido que implicava a prorrogação do prazo em 18 dias, mas por outro lado também refere não ter repercussão porque a A. tinha muitos outros trabalhos para ir desenvolvendo enquanto não lhe fosse entregue a licença de construção e a licença de utilização de explosivos (pag. 88 do relatório). Já os peritos do laudo maioritário concluíram que o atraso na entrega da licença da obra pela perturbação que causou ao plano de trabalhos da A., deveria sofrer uma deslocação de prazo de 51 dias (p. 72 do relatório).

Sobre a mesma questão pronunciou-se a 2ª perícia nos seguintes termos “constata-se que à data a R. (refere-se por lapso a RR.) não tinha licença para uso de explosivos. No entanto o desmonte da pedra foi efectuado com métodos alternativos, como massa expansiva, darda e maquinaria existente em obra. Todavia, os métodos alternativos usados poderão ter rendimentos menores (pag 7 – fls 557 dos autos. E embora, quanto a alguns dos quesitos, os senhores peritos da 2ª perícia não estivessem unânimamente de acordo, quanto a este quesito não houve discordância.
No sentido da não prova dos factos constantes da alínea o) depôs a testemunha CC, fiscal da obra, cujo depoimento foi considerado pelo Mmo. Juiz a quo como “decisivo”, tendo ainda consignado na motivação da decisão de facto que “Esta testemunha elaborou as actas de reunião de periodicidade semanal, que foram juntas com a petição inicial, tendo referido que as mesmas retratavam o que se passava em obra (em caso de divergências, estas ficariam a constar da acta de reunião seguinte).
Prestou um depoimento extremamente seguro, coerente e demonstrativo do elevado conhecimento que tinha da obra e das suas vicissitudes (o que é ainda mais assinalável em virtude de terem já decorrido vários anos desde a realização da empreitada), revelando assim grande credibilidade, certeza e isenção, o que levou o tribunal a não ter quaisquer dúvidas sobre a idoneidade do seu depoimento.
Foi, pois, convincente quando demonstrou que os atrasos da obra não foram causados pela realização de trabalhos a mais (até porque a Autora já estaria a contar com eles, apesar de não se encontrarem no contrato inicial, não tendo sido orçamentados apenas porque existia na altura incerteza quanto às quantidades a utilizar), nem tão-pouco pela inexistência de licença e livro de obra. “.
E o Mmo Juiz a quo referiu a propósito dos relatórios periciais” Por fim, uma palavra para os relatórios periciais elaborados e juntos aos autos.
Apesar do esforço e trabalho desenvolvido pelos Srs. Peritos, a verdade é que o tribunal não conferiu grande relevância e utilidade aos exames periciais, pois as questões fulcrais em discussão nos autos apenas podiam ser demonstradas através de prova testemunhal e documental, como sucedeu com as exclusões contratuais sobre as quais os Srs. Peritos se debruçaram afincadamente e que se resolveram mediante uma mera interpretação das cláusulas contratuais.
Acresce que a primeira perícia realizada (cfr. relatórios de fls. 213 a 310 e de fls. 311 a 397, com os esclarecimentos de fls. 441 a 467 e de fls. 468 a 481) não obteve conclusões unânimes por parte dos Srs. Peritos, o que apenas sucedeu, no geral (já que ainda subsistiram algumas divergências), na segunda perícia (cfr. relatório de fls. 551 a 561). “

O Mmo Juiz a quo não se fundamentou no depoimento da testemunha DDporque “esta, apesar de ter mencionado que a inexistência de licença de obra e outra documentação não impediu o prosseguimento dos trabalhos, referiu a ocorrência de diversas vicissitudes em obra que condicionaram o andamento normal da mesma, como o nível freático, os trabalhos a mais e a escavação de sobre larguras. Porém, ao contrário do que sucedeu com a testemunha CC, não foi seguro e consistente no seu depoimento, não tendo assim logrado convencer o tribunal desta realidade, nomeadamente que as circunstâncias que foram encontrando no local não fossem desde logo previsíveis (até porque foram realizados os respectivos estudos geológicos) e que devem ser imputadas à inércia da Ré quanto à resolução destes problemas.
Por outro lado, assumiu a autoria de uma suposta tabela de custos (doc. nº 98 junto com a petição inicial), mas não conseguiu justificar os valores obtidos e os tempos que aí fez constar, denotando uma absoluta falta de rigor e total subjectivismo na elaboração deste documento (certamente a pedido da própria Autora, com vista a tentar fundamentar uma eventual indemnização a pedir no futuro, como sucedeu com a propositura da presente acção). Os elementos constantes desta tabela não se apresentaram fiáveis e sustentados em quaisquer dados objectivos demonstrados.
Em face da falta de suficiente rigor demonstrada por esta testemunha e de consistência no seu depoimento, o tribunal não lhe conferiu credibilidade. “
Ora a opção do Mmo. Juiz a quo não se nos afigura merecedora de censura. A força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal (artº389º do CC). A realização de uma segunda perícia não invalida a primeira, sendo uma e outra livremente apreciadas pelo tribunal (artº 498º, nº 2 do CPC). No entanto, porque as perícias são efectuadas por pessoas com formação específica para o efeito que o julgador não possui, não devem os resultados obtidos serem afastada sem justificação.No entanto, o Mmo Juiz justificou a sua posição e acabou por não afastar as conclusões dos dois relatórios, embora não o referindo expressamente, adoptando de perto o relatório da 2ª perícia, nomeadamente no que concerne ao prazo de prorrogação imputável à 2ª R., que entendeu ser de 30 dias, muito próximo do prazo referido no relatório da 2ª perícia,pelos peritos do tribunal e da R., que fixaram o atraso imputável à R., em 35 dias[30 motivados pelo atraso e cinco pela necessidade de trabalhos diversos, respeitante aos trabalhos extras para além dos pedidos, como ocorre em todas as empreitadas (p. 5 e 3 do relatório)].
O Mmo. Juiz fundamentou-se no depoimento de uma testemunha que tem a mesma formação específica que os senhores peritos intervenientes nas duas perícias (são todos engenheiros), sendo que o engº CC tem um conhecimento mais directo da matéria em discussão pois que acompanhou os trabalhos directamente e elaborou as actas de reunião, enquanto os senhores peritos tiveram apenas conhecimento dos documentos existentes. E ouvida a prova não vislumbrámos quaisquer razões para desconsiderar a opção do julgador da 1ª instância, não nos oferecendo dúvidas o depoimento da testemunha CC.Note-se que embora não possuindo o tribunal especiais conhecimentos de engenharia ou arquitectura, a leitura das actas e da correspondência trocada entre as partes, nas quais se basearam os peritos, não é de difícil compreensão, permitindo ao tribunal formar uma convição.
Relativamente ao depoimento da testemunha DD: o depoimento desta testemunha afigurou-se de difícil audição, pois que toda a gravação tem eco, distorcendo o som, tendo também nos socorrido das transcrições.
A propósito do aumento dos custos do estaleiro a testemunha foi confrontada com os documentos de fls 98 (estimativa dos custos médios do estaleiro) e 100 (cronologia dos acontecimentos) juntos com a p.i.
O Mmo Juiz formulou diversas questões com o fim de se esclarecer, mas também nós concordamos com a conclusão que verteu na motivação, não tendo ficado esclarecido porque razão foram pedidos estes custos e não outros. A testemunha repetiu diversas vezes que apresentou aqueles custos reportados apenas a 6 meses e não aos onze que esteve a mais, por lhe ter parecido “o justo”, “o que achou correcto”, não tendo considerado todos os onze meses porque nestes foram realizados trabalhos a mais, e no pagamento destes trabalhos já estava reflectido nos custos do estaleiro, mas não foi clara no sentido de que o equipamento e o pessoal a que se refere o documento nº 98 junto com a petição inicial esteve presente durante todas as horas que foram consideradas.Esta falta de rigor, acrescido da circunstância de, no confronto com os depoimentos das testemunhas CC, FF, GG, se ter constatado que a testemunha empolou situações cuja dimensão afinal era muito inferior, como seja o controlo do nível freático, a não correspondência entre o estudo geotécnico e a rocha que vieram a encontrar, o problema das sobrelarguras, acabou por conferir pouca credibilidade ao seu depoimento.
Acresce que foram dados como provados outros factos que a apelante não impugnou e que afastam o nexo de causalidade entre a entrega da licença da obra apenas em 26 de Maio de 2008 com o consequente reflexo no atraso do pedido de obtenção de licença de explosivos, para o qual era necessária a licença de obra e o protelamento dos trabalhos para além do prazo convencionado e posteriormente prorrogado. São eles os factos dados como provados no ponto 46(a apelante embora defendendo que a opção pelos explosivos foi da R., não impugnou este ponto da matéria de facto) onde dá como provado que foi a A. que optou pelo uso de explosivos e apenas em Maio de 2006, pelo que até essa altura a A. não precisava da licença da obra e os factos dados como provados nos pontos 30 e 35. É que no dia 29/06/2006 já tinha sido entregue declaração da Câmara Municipal para levantamento da licença de Explosivos (ponto 30), mas os trabalhos só foram iniciados em 27.07.2006, cerca de um mês após, o que demonstra que não foi a entrega da licença apenas em 26 de Maio que fez atrasar os trabalhos com recurso a explosivos, pois que, mesmo após a obtenção da licença de explosivos, os trabalhos só se iniciaram quase um mês depois.
Não assiste razão à A. quando defende que por falta de licença de obra exigível por força do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE) aprovado peloDL n.º 555/99, de 16 de Dezembro, na redacção vigente à data dos factos (artº 4º, nº1 e nº2, alínea c)), cuja falta constitui uma contraordenação– cfr. art. 98º, n.º 1, al. a) RJUE, deveria iniciar-se a contagem do prazo de execução da empreitada contratualmente previsto,apenas a partir da data da sua obtenção, implicado per se a faltade licença de obra um atraso de 118 dias. Ora, uma questão é a responsabilidade contra-ordenacional em que a R. poderia incorrer e outra questão diferente é o nexo de causalidade entre a falta de licença e o protelamento dos trabalhos e apenas esta releva nesta sede e não foi demonstrada.
Não se vislumbra assim a ocorrência de qualquer erro de julgamento.

Alíneas b), d) e e) n dos factos não provados
A redacção destas alíneas é a seguinte:
b) A conclusão da obra 334 dias após o prazo inicial, foi motivado pela realização dos “trabalhos a mais” aludidos em 7º, 12º e 17º, os quais condicionaram a realização dos trabalhos referidos em 11º, já que alguns só puderam entrar em execução após a conclusão daqueles.
d) Em 12 de Janeiro de 2006 estavam ainda por resolver por parte da Ré os seguintes problemas na obra: ausência de resolução do rebaixamento do nível freático; falta do mapa de cargas das estacas de fundações; incorrecções na planta de implantação; a planta de vedação reduz a área do estaleiro, o que impede o manuseamento dos equipamentos; omissão do desvio das infraestruturas eléctricas; falta de energia e água para alimentar a obra, o que determinou um atraso na obra de 12 dias e, em 17 de Janeiro de 2006, a suspensão dos trabalhos por um dia.
e) A ausência da vedação da obra, a omissão quanto ao desvio de infraestruturas eléctricas e a falta de solução para as contenções periféricas condicionaram o andamento dos trabalhos.
Alega a apelante que a extensão dos trabalhos realizados pela A. de acordo com as regras da experiência e da apreciação prudente sempre teria levado a concluir que implicaram um atraso superior a 30 dias.
E baseou-se ainda nolaudo maioritário da 1ª perícia, pretendendo que se dê como provado que o estaleiro da recorrente permaneceu em obra por mais 206 dias do que o previsto por responsabilidade da recorrida. Assim, embora a apelante comece por dizer que pretende que os factos constantes da alínea b) sejam dados como provados, o que pretende afinal, é que se dê como provados não o atraso 334 dias a que a alínea b) alude, mas somente 206 dias de atraso.
Os senhores peritos basearam as suas respostas na correspondência trocada entre as partes e a empresa incumbida da fiscalização e nas actas das reuniões, como já referimos, e ponderaram-nas à luz dos seus conhecimentos técnicos.
Na 1ª perícia, o perito do laudo minoritário - o perito da R. - entendeu que a A. deveria ser ressarcida do custos do estaleiro para um período equivalente a 53,4 dias (34,4 dias devido ao período de indefinição decorrente da alteração do processo de fundações, 1 de suspensão de trabalhos e 18 dias decorrentes da demora na obtenção da licença de obra), sendo que apenas 34,4 dias imputou a título de trabalhos a mais (p. 309 e 310, 466).
E os peritos do laudo maioritário entenderam que os trabalhos a mais aludidos em G), M) e R), (que corresponde aos pontos 7º, 12º e 17º da sentença e aos quais se refere a alínea b) dos factos não provados) motivaram a dilação do prazo inicial em 124 dias, sendo ainda de imputar à R. mais 60 dias do prolongamento do prazo (fls 386 e 481 dos autos).
Na 2ª perícia tendo se perguntado aos senhores peritos se a realização dos “trabalhos a mais” determinou que o prazo inicial tivesse sido dilatado em mais 334 dias, a resposta também não logrou obter unanimidade.
O perito nomeado pela A. entendeu que em virtude dos trabalhos a mais, o prazo inicial teve que ser dilatado em 99 dias e o perito nomeado pela R. e o indicado pelo tribunal consideraram que foram necessários mais 35 dias, sendo que 30 dias foram aceites pelo dono da obra, mais 5 dias pela necessidade de trabalhos diversos, respeitante aos trabalhos extras para além dos pedidos, como ocorre em todas as empreitadas, como já se referiu. O perito nomeado pelo tribunal referiu ainda que “pela análise ao processo na globalidade, e tendo em conta os constrangimentos da obra, o perito signatário entende que o justo para a finalização e boa execução da empreitada se configurava no prazo de 85 dias. Contudo, face à inépcia do A., ao não justificar devidamente as prorrogações de prazo solicitadas e a necessidade do mesmo para a execução dos trabalhos, entende o perito nomeado por este Tribunal, que o prazo inicial não deverá ser dilatado em mais 104,16 dias, mas apenas em 35 dias. Tais 35 dias referem-se à prorrogação aceite pelo dono da obra em 30 dias, mais 5 dias para os trabalhos diversos, respeitante ao ponto 8 do 1º quesito “ (fls 555). Os trabalhos a mais para os quais foi considerado ser necessário a prorrogação do prazo, dizem respeitoapenasà colocação de estacas, estando excluídos desta necessidade os trabalhos a que aludem as alíneas d) e e), e porque o trabalho se iniciou mais tarde do que estava previsto. E para este trabalho a R. concedeu a prorrogação de 30 dias.

A apelante fundamenta-se no laudo maioritário da 1ª perícia, mas em momento algum procura demonstrar porque razão não deveria o Tribunal a quo se ter fundamentado no depoimento da testemunha CC(e no laudo da 2ª perícia), nunca tendo posto em causa a credibilidade, imparcialidade e razões de ciência da testemunha e também não procurou demonstrar porque razão o tribunal deveria ter privilegiado a 1ª perícia, em detrimento da demais prova produzida.
Está em causa nos presentes autos a reclamação pela A. dos denominados custos de estaleiro – custos com pessoal, máquinas e contentores - à razão de 75.000,00 euros/mês durante um período que a A. estimou ser de seis meses, sendo que efectivamente a A. permaneceu em obra mais 11 meses do que o prazo inicialmente acordado de seis meses.
Após a produção de prova ficou claro que o prazo previamente acordado de 6 meses foi mal avaliado, tendo a testemunha CCreferido que “nos seis meses era quase impossível fazer a obra”. Esta testemunha justificou a indicação do prazo de seis meses pelo empreiteiro pela vontade deste empreiteiro de apresentar um prazo bom e com custos bons para ganhar o concurso.
Mas a questão que se coloca e é isso que está em discussão é se o prolongamento da obra para além dos 6 meses inicialmente acordados, mais um de prorrogação de prazo que as partes acordaram, num total de sete meses, é de imputar à R.
Nos trabalhos a que se refere o contrato de empreitada estavam incluídos os custos de estaleiro, assim como nos trabalhos a mais que foram deixados de fora do contrato, e que a A. efectuou e que foram facturados e pagos à parte, pela dúvida quanto aos seus reais custos. Assim, ainda que os trabalhos a mais tivessem causado o prolongamento do prazo, para além da prorrogação de 30 dias acordada posteriormente, os custos com o estaleiro foram previstos e pagos (cfr. resulta do depoimento das testemunhas em que a apelante se fundamenta).
As testemunhas foram essencialmente inquiridas sobre os seguintes trabalhos/fases da obra:
. fundações (directas e indirectas);
. escavações (incluindo sobre larguras);
. controlo do nível freático;
. falta de licença de obra necessária para a obtenção da licença de explosivos;
.desmontagem da rocha; e,
. realização de trabalhos a mais.
Sobre todos estes pontos foi ouvida a testemunha CC que de modo que se nos afigurou sincero foi dando explicações e excluindo a responsabilidade da R. nos atrasos dos trabalhos. Esta testemunha demonstrou exaustivo conhecimento dos factos e uma memória só explicada por ter certamente relido as actas antes do julgamento e consultado outros elementos da altura. Também sobre as fundações foi ouvida a testemunha Francisco José Bernardo, autor do projecto de estruturas e contenção periférica. Esta testemunha explicou que o projecto tinha sido feito partindo de um pressuposto cauteloso de que o terreno era pior do que se veio a verificar. Esta constatação teve como consequência que as fundações que estavam previstas serem indirectas – mediante estacas – passassem a ser directas, mediante a construção de sapatas, o que teve repercussões tanto ao nível do tempo, como dos gastos do empreiteiro, pois que exige menos tempo e menor dispêndio de custos. Assim, se por uma lado surgiram problemas que levaram mais tempo do que o previsto, como aconteceu com as escavações, por outro, houve trabalhos que acabaram por levar menos tempo do que o previsto.
Quanto ao controlo do nível freático foi explicado pela testemunha CC que com a colocação de uma barreira e com a colocação de várias bombas em funcionamento que desviavam a água, era possível continuar a trabalhar.
Relativamente à rocha encontrada, já nos pronunciámos, assim como relativamente à falta da licença de explosivos.
Quanto à falta da licença de obra que foi admitida pela R., sendo que era à R como dona da obra que incumbia obter esta licença, também não foi demonstrado que esta falta de licença tivesse contribuído para o atraso da obra, para além do que já se referiu a propósito da licença para uso de explosivos.
O facto de se ter dado como provado a existência de trabalhos a mais, essa existência não tinha necessária e logicamente que conduzir a que se considerasse pelo menos a necessidade da extensão da obra em mais 1/3 de tempo.
E não pode deixar de se estranhar que a apelante não tenha requerido por mais vezes a prorrogação do prazo, havendo apenas registo do pedido de 60 dias em 6.04.2006, dos quais apenas foram concedidos 30pela R. (documento nº 51 junto com a contestação, prorrogação que na perspectiva da R. “a prorrogação de prazo resultante dos trabalhos a mais facturados e os trabalhos a mais resultantes da alteração de fundações”)e em 29.05.2006, de 65dias, pedido de prorrogação que não foi considerado justificado pela EE, pelo que a própria apelante, ao longo da obra, apenas pediu a prorrogação de 135 dias e não os 206 que agora vem reclamar que eram necessários e só no final da obra é que apresentou a reclamação dos custos com o estaleiro no valor de 450.000,00 (Cfr. foi referido pela testemunha CC) .
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Por último refira-se que a apelante vem referir na conclusão 26 que a presença dos meios da recorrente em obra resulta com abundância dos documentos 81, 82, 83, 84, 88, 92, 93, 94 e 98- actas 26, 27, 29, 36, 40, 41, 42, 45 e 46 , mas não impugnou os factos provados no ponto 47 onde se deu como provado que ocorreu diminuição de meios humanos e técnicos a partir de Setembro de 2006, por parte da autora, o que determinou o abrandamento da execução dos trabalhos.
Da leitura das actas resulta que a A. mantinha no terreno uma grua (ainda em Março de 2007-acta 46, ponto 6) e que ultimava vários trabalhos, que em finais de Janeiro de 2007 ia regressar à obra uma mini giratória para retirar o resto do desaterro que ainda existia (ponto 1 da acata 40) mas não fornece indicações precisas sobre o número de pessoas e a totalidade dos meios técnicos existentes.
No sentido da diminuição do números de pessoas e de máquinas da A. na obra, a partir de determinada altura, depuseram as testemunhas José Fernando Basto, empreiteiro de acabamentos que esteve na obra desde Abril/Maio de 2006 até final que depôs no sentido da diminuição dos meios, a partir do fim do Verão de 2006, CC que referiu que o engº DD esteve na obra até Outubro/Novembro de 2006 e que a partir dessa altura passou a ir apenas às reuniões semanais e referiu quais as máquinas que se mantiveram e as que foram retiradas, assim como os funcionários da A. presentes.
Relativamente à Scout, empresa contratada para proceder à montagem da estrutura metálica, não resulta dos factos provados a sua contribuição para o prolongamento dos trabalhos pela R.
Os factos dados como provados e não provados pelo tribunal a quo têm apoio na prova produzida, não se detectando qualquer violação das regras da experiência e da lógica, na apreciação feita na sentença recorrida, pelo que não se altera a matéria de facto.

Do Direito
Indemnização pelos prejuízos causados pela permanência em obra da A. para além do prazo acordado
Relativamente à indemnização peticionada pela apelante no montante de 450.000,00: esta indemnização tem como pressuposto a prova de que que o atraso na entrega da obra, é de imputar à R., o que pressupunha a alteração da matéria de facto por este Tribunal. Tendo a matéria de facto se mantido inalterada pelas razões supra expostas, mantém-se inalterada a decisão de mérito neste particular.


Da aplicação da multa por incumprimento do prazo de execução
Na cláusula 26º, nº 2 do contrato de empreitada celebrado entre as partes, estas acordaram o pagamento de uma multa no montante de 500,00 euros, por cada dia de atraso.
Insurge-se a apelante contra a sua condenação em multa, pelo retardamento na conclusão da obra que foi entregue 304 dias depois do prazo, já descontados os 30 dias da prorrogação, no montante de 152.000,00 (304 dias x 500,00 de multa por dia).
Invoca a apelante que na sentença recorrida não se atentou no disposto na cláusula 21º, nº 3 do contrato de empreitada, na qual as partes acordaram que “a aplicação de multas contratuais será precedida de auto lavrado pela fiscalização, do qual o dono da obra enviará uma cópia ao empreiteiro, notificando-o para, no prazo de uma semana, deduzir a sua defesa”.
Acresce que o artº 143º, nº 2 do DL 59/99 para o qual a cláusula 25º do contrato de empreitada remete, exige que sempre que, nos termos do mesmo diploma ou do contrato deva lavrar-se auto da diligência efectuada, será o mesmo assinado pelo fiscal da obra e pelo empreiteiro ou representante, ficando um duplicado na posse deste, não tendo no caso sido lavrado qualquer auto.
Em seu entender, as penalidades contratuais visam compelir o empreiteiro a terminar os trabalhos dentro do prazo, devendo como tal ser aplicadas no decurso da empreitada, não podem ser aplicadas após conclusão da empreitada, nem podem ser aplicadas judicialmente em momento posterior, prescindindo da sua tramitação formal e sem conceder ao empreiteiro defesa quanto à aplicação das mesmas.
A R. nunca alegou ter notificado a A. para aplicação da multa contratualmente prevista.
Por sua vez a apelada defende que não tinha que notificar a apelante. Só o teria que fazer se o fundamento da multa fosse o cometimento de quaisquer irregularidades ou quaisquer erros na execução da obra/empreitada, que justificaria a participação da Fiscalização e só nesse caso estaria obrigada ao cumprimento do disposto no artº 21º, nº 3 do contrato de empreitada.
Embora a A. na resposta à reconvenção tivesse suscitado a questão da falta de cumprimento pela R. do disposto no artº 21º, nº 3 do contrato de empreitada, o Mmo Juiz a quo não se pronunciou sobre esta questão na sentença recorrida.
Na contestação nunca alegou a R. ter alguma vez advertido a A. de que pretendia aplicar a multa contratualmente estipulada pelo atraso na conclusão da obra, nem o referiu na tréplica que apresentou. E nada foi dado como provado nesse sentido, não tendo sido cumprido o disposto no artº 21º, nº 3 do contrato de empreitada, na qual as partes acordaram que “a aplicação de multas contratuais será precedida de auto lavrado pela fiscalização, do qual o dono da obra enviará uma cópia ao empreiteiro, notificando-o para, no prazo de uma semana, deduzir a sua defesa”.
Ora, conforme se defendeu no Ac. do STJ, de 02.05.2012, proferido no proc. 3507/06 citado pela apelante, confirmando a decisão do Tribunal da Relação que tinha alterado a decisão quanto a essa questão,do tribunal de 1ª instância, por não existir auto de fiscalização, e por a autora (a dona da obra) não ter colocado a ré ( a empreiteira) perante a possibilidade de lhe aplicar uma multa pelo atraso na conclusão da empreitada, não podia em sede judicial ser a mesma aplicada. Neste acórdão, tal como no caso presente estava em discussão a aplicação de uma multa por incumprimento do prazo acordado para a empreitada. No mesmo sentido se decidiu no Ac. do TRL de 7.04.2011, proferido no proc.1033/10, interposto na sequência de recurso de acórdão arbitral, que considerou a aplicação de multas, após a recepção provisória da obra, ineficaz.
No artigo 25º do contrato de empreitada as partes acordaram que “em tudo o que não estiver expressamente e diversamente regulado no presente contrato e seus anexos, serão aplicáveis as normas em vigor sobre o regime jurídico de empreitadas de obras públicas, actualmente contidas no DL 59/99 de 2 de Março e legislação complementar, considerando-se tais normas, nesse caso, como parte integrante deste contrato”.
O DL 59/99 aprovou o Regime Jurídico da Empreitada de Obras Públicas e foi revogado pelo DL.º 18/2008, de 29 de Janeiro. Era pois o diploma que estava em vigor à data do início do contrato e da conclusão das obras. A cláusula 21º, nº 3 do contrato de empreitada reproduz quase praticamente na totalidade o artº 201º, nº 5 do DL 59/99 que dispunha que “a aplicação de multas contratuais nos termos dos números anteriores será precedida de auto lavrado pela fiscalização, do qual o dono da obra enviará uma cópia ao empreiteiro, notificando-o para, no prazo de 8 dias, deduzir a sua defesa ou impugnação”. O artigo 201º do DL 59/99 estatui para os casos de incumprimento dos prazos acordados e suas prorrogações, estabelecendo multas para serem aplicadas até ao fim dos trabalhos ou à rescisão do contrato por dia de atraso que vão aumentando no seu valor, à medida que o prazo vai aumentando (artº 201º, nº 1 e nº 2 do DL 59/99).

E dispõe o nº 4 do artº 233º do DL 59/99 que feita a recepção provisória, não poderá haver lugar à aplicação de multas contratuais correspondentes a factos ou situações anteriores.
O defendido no Ac. do Tribunal Central Administrativo Norte, citado pela apelada, proferido no processo 00796/08.1BECBR, de 05.02.2016, de que não carece de auto da fiscalização nos casos em que está em causa somente o incumprimento dos prazos, mas apenas em caso de irregularidades ou quaisquer erros na execução da obra/empreitada é que se justificará a participação da Fiscalização, enquanto garante do cumprimentodo contrato, do caderno de encargos e do plano de trabalhos em vigor, não tem aplicação no caso presente. Por um lado, face ao disposto na cláusula 21ª, nº1, que estabelece que “ao dono da obra assiste o direito de tomar as medidas necessárias no sentido de que a empreitada termine até à data da conclusão”, não permite a interpretação que o auto apenas é exigível quando o motivo dos atrasos é a defeituosa execução dos trabalhos, pois que o nº1 da cláusula 21º não o distingue. Por outro lado, com o devido respeito por opinião diferente, o artº 201º nº 5 do DL 59/994, faz também preceder de auto lavrado pela fiscalização, a aplicação de multas contratuais pelo incumprimento do prazo. De qualquer modo, sempre a situação dos autos excluiria o direito reclamado, por força do disposto nos artºs 201º, nº 1 e artº 233º, nº 4 do DL 59/99. A aplicação das multas tem como fim pressionar o empreiteiro a cumprir o prazo, pelo que têm de ser aplicadas em momento anterior à entrega da obra. Isso mesmo resulta também da cláusula 21ª, nº 1 do contrato de empreitada, onde é manifesto o carácter compulsório da multa. No caso analisado no referido acórdão do TCA Norte, e diferentemente do que se verifica no caso presente, o dono da obra já tinha aplicado a multa antes da data da recepção provisória da obra. Posteriormente só remeteu à empreiteira a nota de débito reclamando o seu pagamento.

Não subsistindo o crédito da R., não há que operar a compensação, pelo que é devida à A. a quantia de 15.000,00, montante arbitrado na decisão recorrida a título de indemnização pelos prejuízos que a permanência em obra por mais 30 dias lhe causou, acrescida de juros.

IV – Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em julgar parcialmente procedente a apelação da A. e, consequentemente revogam a sentença recorrida e julgam parcialmente procedente a acção, condenando a R. a pagar à A. a quantia de 15.000,00, , acrescida de juros à taxa de juros supletiva, contados desde 15.06.2009 até integral pagamento e julgam improcedente a reconvenção.
Custas da acção em 1ª instância pela A. e pela R. na proporção do decaimento.
Custas da reconvenção pela R.
Custas da apelação por ambas as partes na proporção do decaimento.
Notifique.
Guimarães, 20 de Abril de 2017

(Helena Gomes de Melo)

Este acórdão tem voto de conformidade da Exmªa 1ª Adjunta, Desembargador Higina Orvalho Castelo que não assina por não estar presente. A relatora:

(João Peres Coelho)