Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1926/16.5T8VRL.G1
Relator: EDUARDO AZEVEDO
Descritores: COMPETÊNCIA MATERIAL
TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS
CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
DOCUMENTOS PARTICULARES
FORÇA PROBATÓRIA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/17/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE O RECURSO DA A

PROCEDENTE O RECURSO DO R
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
1- A competência material para conhecimento do pedido de regularização das contribuições devidas aos serviços sociais competentes quanto ao período de 2006 a 2015 deve ser diferido aos tribunais administrativos.

2- Deve ser suscitada oficiosamente enquanto não houver sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa.

3- Constitui nulidade da sentença, nos termos do artº 615º, nº 1, alª d), do CPC, o não conhecimento da incompetência material do tribunal relativamente a esse pedido.

4- O princípio da livre apreciação da prova não cede perante a situação em que se não se verifica a prova tarifária ou legal plena como por exemplo a prevista no artº 376º do CC em certas condições.

5- A força probatória segundo este preceito decorre do facto de se estar perante uma verdadeira confissão e daí que a mesma apenas se verifica em relação ao declaratário e não relativamente a terceiros.

6- A declaração emitida pela entidade empregadora relativa à situação laboral de um trabalhador tendo como declaratária uma instituição bancária e destinada a produzir efeitos úteis no quadro de relação jurídica alheia a essa situação não tem força probatória plena quanto a esta nesta acção, pelo que deverá ser avaliada segundo a livre convicção do juiz.

7- A impugnação da decisão em matéria de facto “( ... ) terá de assentar na violação dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na convicção ou porque se violaram os princípios para aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma, seria a inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão (...)”.

8- O mecanismo previsto no artº 662º, nº 2, alªs a) e b) do CPC não é concebido para superar a possibilidade de não alteração da decisão sobre a matéria de facto através do conhecimento da sua impugnação.

9- O mesmo não deve ser subvertido por situação de falta de êxito na prova no que respeita ao respectivo ónus ou à postergação do princípio do dispositivo.

10- No julgamento da matéria de facto os poderes da 2ª instância estão delimitados pelo nº 1 do artº 662º do CPC (artº 640º, nº 1, alª b) do CPC), pelo que a decisão sobre a matéria de facto só deve ser alterada se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

11- Por isso devem ser especificados não meios de prova que admitam, permitam ou consintam decisão diversa da recorrida mas antes que imponham decisão diversa da impugnada.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães

Maria intentou em 16.11.2016 acção com processo comum contra José.

Pediu: a declaração de ilicitude quanto à cessação do contrato de trabalho, bem como a condenação no pagamento de 12.650,00€ a título de indemnização pelos danos patrimoniais decorrentes da mesma, de 5.000,00€, acrescidos de juros moratórios e na regularização das contribuições devidas aos serviços sociais competentes quanto ao período de 2006 a 2015.

Alegou, em síntese: a celebração dum contrato de trabalho verbal em meados de 1992 mediante o qual foi admitida pelo R ao serviço para exercer as funções de assistente dentária na sua clínica, mediante o pagamento mensal de 550,00€; em 2005, no seguimento de inspecção levada a cabo pelos competentes serviços sociais, o R celebrou um contrato de trabalho de forma a regularizar a situação contributiva, tendo pago todas as contribuições devidas desde 1997 a 2005; em Agosto de 2015 o R celebrou novo contrato de trabalho tendo-se candidatado ao programa de estímulo de emprego, não tendo liquidado mais contribuições à Segurança Social entre 2005 e 2015; em Setembro de 2016 foi despedida verbalmente; e o R deve 5.000,00€ por dívida por si assumida no caso de despedimento sem justa causa, acrescida da indemnização estabelecida na lei.

Foi deduzida contestação, pela qual se alegou, em súmula: em 12.10.2016 foi instaurado procedimento disciplinar contra a A, tendo sido emitida em 25.10.2016 nota de culpa com a comunicação da intenção de proceder ao seu despedimento que a mesma recepcionou em 17.11.2016; em 29.11.2016 a A respondeu a esta nota de culpa estando este procedimento disciplinar a seguir a sua normal tramitação; a A foi contratada em 31.12.1997 no seguimento da medida de incentivo de contratação de jovens à procura do primeiro emprego, tendo sido elaborado o contrato de trabalho junto aos autos pela A em 2005, mas em meados de 2006 a mesma comunicou ao R que pretendia passar a ser trabalhadora por conta própria e daí o demandado ter cessado o pagamento das suas contribuições para a Segurança Social, situação que se manteve até 2015; em Agosto de 2015 as partes celebram novo contrato de trabalho, inexistindo qualquer despedimento verbal; a A deixou de se apresentar no seu posto de trabalho a partir de 20.09.2016 por se encontrar de baixa médica; o documento junto pela A relativo ao crédito no valor de 5.000,00€ reporta ao contrato de trabalho que vigorou entre 1997 e 2006; o mesmo prescreveu; e a A agiu em abuso de direito ao peticionar a condenação do Réu no pagamento das contribuições obrigatórias para o regime da segurança social, desde o ano de 2006 até ao ano de 2015.

Elaborado saneador, foi identificado o objecto do litígio e formulados os temas de prova

Realizou-se audiência e julgamento, altura em que se decidiu a matéria de facto.

Foi proferia sentença, pela qual: “Tudo visto e nos termos expostos, julga-se esta acção parcialmente procedente por provada e em consequência, condena-se o R. a pagar à Segurança Social as contribuições relativas ao período de 2006 a 2015 relativas ao trabalho dependente prestado pela aqui A., absolvendo-se o demandado do demais peticionado.”.

A A recorreu e concluiu:

A - DA PROVA TESTEMUNHAL:

1. A recorrente não se conforma com as respostas do Tribunal a quo à matéria de facto consignada a artigos 6º, 7º e 8º e vem impugnar tais respostas em sede de recurso, nos termos do art. 640º do CPC;
2. A prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento impõe decisão diversa da recorrida sobre os pontos da matéria de facto impugnados.
3. Uma vez que os referidos meios probatórios que constituem fundamento do erro na apreciação da prova constam de gravação realizada no processo, a recorrente indica com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso.
4. A recorrente na sua motivação procede à transcrição dos excertos que considera relevantes na medida em que facilitam a percepção dos seus argumentos.
5. Pelas razões aduzidas a pontos 17, 18 e seguintes destas alegações, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, reapreciada a prova, deve este Tribunal de recurso alterar as respostas à matéria de facto dando como Provado:

a) Artigo 6º) - Cerca das 17h45 horas de 20/09/2016, o R. despediu a A. verbalmente dizendo-lhe “você é uma puta falsa; tem que ir para o olho da rua, não posso mais ver o seu focinho; é uma besta, cabra e está aqui para me deitar o consultório abaixo”.

Depoimento da testemunha A. C. (doravante designado por C)
(…)
b) Artigo 7º) – O R. solicitou-lhe nessa mesma ocasião, as chaves da clínica dentária.
Depoimento da testemunha A. C. (doravante designado por C)
(…)
6. Pelas razões aduzidas de pontos 6 a 9 destas alegações, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, reapreciada a prova, a resposta ao quesito 8° deve ser alterada para Provado, com a seguinte formulação:

Artigo 8º) – No dia 21/09/2016, por conversa telefónica, o R. reiterou o despedimento da A. dizendo que não conseguia trabalhar mais com ela e que estava despedida.
Depoimento da testemunha Isabel (doravante designado por H)
(…)
Depoimento da testemunha Jorge (doravante designado por L)
(…)
7. A reapreciação da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto releva sobremaneira porquanto e afinal, é da fixação desta matéria que depende a aplicação do direito determinante do mérito da causa e do resultado da ação, desde logo a verificação do despedimento e sua legais consequências.

SEM PRESCINDIR,

8. Nos termos da prerrogativa estabelecida no inciso 662º n.º 2 al. b) do CPC, a recorrente indica a testemunha Filipe, residente da Rua … Vila Real, por possuir conhecimento directo dos factos relativos ao despedimento e uma vez que não prestou o seu depoimento por se encontrar ausente do país na data do julgamento.
9. Assim, se a Veneranda Relação, na sua avaliação objetiva, revelar a existência de alguma possibilidade de superar dúvida objectiva e relevante quanto ao despedimento da A., solicita-se ao Mmo. Relator se digne ordenar a produção de prova que tanto pode traduzir-se na determinação da junção do depoimento escrito prestado pela referida testemunha no âmbito do processo disciplinar ou na produção de novo depoimento.

POR OUTRO LADO,

10. Paralelamente, a apelante perscruta criticamente a fundamentação vertida pela Mma. Juíza a quo, quer na decisão da matéria de facto, quer na douta sentença, atinente à verificação do despedimento;
11. Nessa matéria de motivação, no respectivo segmento das alegações a recorrente impugna expressamente as conclusões do raciocínio lógico/dedutivo aí expendido pela Mma. Juíza a quo, inferindo erros de apreciação cuja correcção e devida valoração, na sua óptica, são determinantes para alcançar a verdade material e realização de JUSTIÇA;

EM SÍNTESE,

12. Foi o marido da A. que recebeu e remeteu a baixa médica, no dia seguinte, para o R., mas ainda antes do telefonema efectuado pelo R. onde reiterou o despedimento.
13. O R. iniciou procedimento disciplinar em 25/10/2016, ié., cerca de mês volvido após o despedimento da apelante, em 20/09/2016, e após a solicitação desta da emissão de declaração da situação de desemprego, em dia 23/09/2016;
14. A nota de culpa foi recepcionada pela A. em 17/11/2016, tendo a mesma apresentado a respectiva resposta em 29/11/2016, na qual consigna que uma vez cessada a relação laboral, por ter ocorrido o despedimento verbal da arguida, o poder disciplinar já não pode ser exercido pela Entidade Patronal e o procedimento em curso terá que ser arquivado.
15. O que viria a culminar na decisão final de 17/02/2017, nos termos da qual o R. aplicou à R. a sanção disciplinar de despedimento com justa causa e sem indemnização ou compensação.
16. O R. durante as férias da A. vedou-lhe o acesso à televisão, ao computador, aos gabinetes, alterou o horário de trabalho, exigiu assinatura em livro de ponto bem e impôs mudança de indumentária com o uso constante de bata.
17. O R. mudou as fechaduras da porta da clínica no dia 27/09/2016, logo após o despedimento da A.

B - DA PROVA DOCUMENTAL:

18. O documento particular lavrado e assinado pelo apelado, junto sob doc. 4 da PI, faz prova plena em relação às declarações atribuídas ao seu autor.
19. Pelo que, tendo reconhecido a sua autoria e assinatura, se considera verdadeira a letra e a assinatura desse documento particulares, nos termos do disposto no art. 374º, nº 1, do C. Civil.
20. Em decorrência, por força do consignado no art. 376º, nº 1 e 2, do C. Civil, esse documento “faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor”, considerando-se provados os factos contrários ao interesse do declarante.
21. Para contrariar essa “prova legal plena”, o apelado tinha que fazer prova que “mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objecto”, tal como impõe o regime consignado no art. 347º, do C.C..
22. Não tendo o apelado logrado contrariar, regular e eficazmente, a prova legal plena apresentada pela A., têm-se como provados os factos constantes das ditas declarações contrários aos interesses do declarante.
23. Nessa conformidade à formulação do artigo 1º dos temas de prova onde se indagava se “a A. por conta do R., sob sua direcção e fiscalização, no âmbito de contrato de trabalho verbal celebrado por ambos, desde meados do ano de 1992”, deve dar-se a resposta de Provado, ao invés do decidido cuja resposta foi de “Provado apenas que a A. trabalhou por conta do R., sob sua direcção e fiscalização, no âmbito de contrato de trabalho verbal celebrado por ambos, desde Abril de 1997 – cfr. ofícios da Seg. Social de 17/03/2017, junto aos autos, fls. 157 e de 29/06/2017 a fls. 371, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido”.
24. Ainda em decorrência, a resposta ao art. 9º dos temas de prova deve alterar-se para Não Provado que a A. foi contratada pelo R. em 1997 ao abrigo da medida de incentivo contratação de jovens do primeiro emprego.”.

Termina: “termos em que, no provimento do presente recurso, alterando-se a decisão proferida sobre a matéria de facto no sentido propugnado pela apelante, deve revogar-se a sentença recorrida e julgar-se totalmente procedente a acção intentada, sendo declarada a ilicitude do despedimento de que foi alvo a apelante e de consequentemente ser o R. condenado a pagar-lhe a quantia total de €17.650,00 a título de indemnização, acrescida dos respectivos juros moratórios vencidos à taxa legal”.

Contra-alegou-se.

Conclusões:

1 - A recorrente impugna a decisão da matéria de facto no que respeita às respostas aos artigos 1.º, 6º, 7º, 8º, 9.º, dos Temas de Prova, o que constitui o objecto do recurso (art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do CPC “ex vi” do art.º 87.º, n.º 1, do CPT);
2 - O documento n.º 4 junto com a petição inicial tem como destinatário o “Banco A”, destinando-se a produzir efeitos no âmbito de relação a estabelecer entre o Banco A e a recorrente, para um fim estranho à relação laboral, o que a testemunha Jorge também declarou (depoimento gravado aos 09:28 a 09:59);
3 - Houve lapso na indicação de “onze anos”, o que o recorrido impugnou, e juntou com a contestação os documentos n.ºs 6 a 9 demonstrativos da contratação da recorrente em 1997, ao abrigo da medida de incentivo contratação de jovens do primeiro emprego;
4 - A declaração foi feita a terceiro, ao Banco A, não se aplica o regime do artigo 376.º, n.º 2, do Código Civil, nem aquela goza de força probatória plena, sendo admissível a contraprova, podendo o documento ser avaliado segundo a livre convicção do juiz (art.ºs. 346.º, 358.º, n.º 4, do C. Civil);
5 - Os ofícios da Segurança Social de 17/03/2017 e de 29/06/2017 mostram que em 1992 a recorrente estava inscrita como trabalhador por conta de outrem de I. G., e só em 1997 foi enquadrada como trabalhador por conta de outrem do recorrido;
6 - A decisão da matéria de facto quanto aos artigos 1.º e 9.º dos temas de prova não merece qualquer reparo;
7 - A factualidade provada nos autos de que em 20/09/2016 a recorrente ao sair do consultório do recorrido lhe deixou as chaves em cima da secretária, porque este não possuía nenhum duplicado das mesmas e ainda permaneceu no consultório, e no dia seguinte informou o recorrido de que estava de baixa médica e ia remeter, como o fez, o certificado de incapacidade para o trabalho (respostas aos artigos 13. e 14. dos temas de prova), mostra que a recorrente não foi despedida verbalmente, contrariando totalmente o que pretende que seja dado por provado no âmbito dos artigos 6., 7., 8., dos temas de prova, pelo que tem de improceder a pretensão da recorrente;

SEM PRESCINDIR

8 - Quanto aos factos relativos à cessação do contrato de trabalho, a Sra. Juiz “a quo” fundou a sua convicção nos depoimentos das testemunhas M. T. e António que considerou que “de forma categórica” contraditaram o depoimento da testemunha A. C., e no facto da recorrente ter justificado a sua ausência nos dias seguintes, para o que remeteu ao recorrido o Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho, por correio registado;
9 - A recorrente impugna as respostas de “Não Provado” aos artigos 6. e 7. dos temas de prova invocando o depoimento da testemunha A. C., mas este “foi contraditado de forma categórica” pelos depoimentos das testemunhas M. T. (gravado no CD de 00:01 a 07:01, com início aos 01:43 e termo aos 06:41) e António (gravado no CD de 02:02 a 08:10), transcritos em III das alegações, e o que a recorrente reconhece;
10 - A recorrente pretende atacar a credibilidade das testemunhas, mas ao Tribunal de recurso não cabe interferir ou substituir-se ao juízo de credibilidade sobre as testemunhas formulado pelo Tribunal recorrido;
11 - As testemunhas António e M. T. explicaram que são pacientes do recorrido há vários anos, que em 20/09/2016 estiveram no consultório do recorrido para serem consultados e tratados, indicaram as horas a que chegaram e saíram do consultório, como entraram no consultório, quem os recebeu, descreveram o que se passou enquanto estiveram no consultório, resultando dos seus depoimentos a sua razão de ciência, e tais depoimentos mereceram a credibilidade do Tribunal da Primeira Instância;
12 - A Senhora Juiz “a quo” presenciou os depoimentos das testemunhas, inquiriu-as sobre a razão de ciência e as circunstâncias de tempo, lugar e modo de ocorrência dos factos sobre que depuseram, percepcionou as suas posturas, as suas expressões, as suas reacções, confrontou-as com documentos, solicitou-lhes os esclarecimentos que entendeu, e viu e ouviu as explicações das testemunhas, sendo tudo isto que a levou a formar um juízo sobre a credibilidade destas, decorrente da imediação e oralidade do julgamento, e que não cabe ser substituído pelo Tribunal de recurso;
13 - Não há qualquer fundamento para pôr em causa a decisão de “Não Provado” aos factos constantes nos artigos 6.º, 7.º e 8.º dos Temas de Prova, sendo os depoimentos das testemunhas elementos de prova apreciados livremente pelo Tribunal (art.ºs. 396.º do C. Civil e 607.º, n.º 5, do C.P.C.);

SEM PRESCINDIR

14 - Na decisão da factualidade referente à cessação do contrato a Senhora Juiz “a quo” especificou como fundamento decisivo para a sua convicção, além da prova testemunhal, o facto da recorrente ter remetido ao recorrido o certificado de incapacidade temporária (vulgo baixa médica) para justificar a sua ausência do posto de trabalho, facto provado no âmbito da resposta ao artigo 14. dos temas de prova, e conforme documento n.º 11 junto com a contestação, que não foi impugnado pela recorrente;
15 - A senhora Juiz “a quo” enunciou como a sua convicção foi adquirida, através de um processo racional e crítico alicerçado nos diversos dados trazidos ao processo através das provas, e que valorou de acordo com as regras comuns da lógica, da razão e regras da experiência, pois se a recorrente tivesse sido despedida verbalmente em 20/09/2016, não é natural, designadamente de acordo com as regras da lógica e da experiência que, no dia seguinte tivesse remetido ao recorrido um certificado de incapacidade temporária para justificar a sua ausência do posto de trabalho;
16 - Tem de improceder a pretensão de alteração da decisão da matéria de facto que respeita aos artigos 6, 7, dos temas de prova invocando o depoimento da testemunha A. C., porque tem que atender-se a todos os fundamentos e elementos de prova em que a Sra. Juiz “a quo” fundou a sua convicção;
17 - A apreciação da Senhora Juiz “a quo” de que as testemunhas Isabel e Jorge não presenciaram a factualidade referente à cessação do contrato de trabalho que a recorrente reportou a 20/09/2016, é correcta, porque foi isto mesmo que declararam a testemunha Isabel (depoimento gravado com início aos 07:53 e com termo aos 08:33), e a testemunha Jorge (depoimento gravado com início aos 15:29 e com termo aos 15:31), depoimentos transcritos em VI das alegações;
18 - A reiteração do despedimento em 21/09/2016 pressupunha, como é lógico, que a recorrente tivesse feito a prova de que o recorrido a despedira verbalmente no dia anterior, matéria que não ficou provada (respostas de “Não Provado” aos artigos 6 e 7 dos temas de prova);
19 - O que ficou provado foi que o recorrido telefonou à recorrente em 21/09/2016, tendo-lhe esta dito que se encontrava de baixa médica até 02/10/2016 e que lhe iria remeter o respectivo certificado, o que fez por via postal nesse mesmo dia (resposta ao artigo 14. dos temas de prova), e que contraria completamente os depoimentos das testemunhas Isabel e Jorge;
20 - Acresce ainda que, também pelas razões que se referiu acima nas conclusões 10, 12, 13, 14, 15, 16, que por razões de economia processual dá aqui por integralmente reproduzido, tem de improceder a pretensão da recorrente de que seja alterada a resposta ao artigo 8. dos temas de prova com base nos depoimentos das testemunhas Isabel e Jorge ;

SEM PRESCINDIR

21- A alegação de que “ foi o marido da A. que recebeu e remeteu a baixa médica no dia seguinte para o R., ainda antes do telefonema efectuado pelo R., onde este reiterou o despedimento” são factos novos, não alegados nos articulados, e os factos novos não podem ser conhecidos em sede de recurso;

SEM PRESCINDIR

22 - Está provado nos autos que, quando o recorrido telefonou à recorrente em 21/09/2016, esta disse-lhe que se encontrava de baixa médica até 02/10/2016 e que lhe iria remeter o certificado, o que fez por via postal nesse mesmo dia (resposta ao artigo 14.º dos temas de prova), o que desmente os depoimentos das testemunhas Isabel e Jorge, que são filha e marido da recorrente;

SEM PRESCINDIR

23 - No documento n.º 11 junto com a contestação, não impugnado pela recorrente, consta que a correspondência em que foi remetida ao recorrido a baixa médica, expedida sob registo, foi apresentada nos correios em “2016-09-21 11:25:39 €2,95 Peso da Régua (art.º 28.º, n.ºs 1 e 2, do Regulamento do Serviço Público de Correios aprovado pelo DL n.º 176/88, de 18/05);
24 - O depoimento da testemunha Jorge, de que teria remetido o certificado de incapacidade temporária, entregando-o nos correios em 21/09/2016, pelas 9 horas, é totalmente contraditado pelo referido documento n.º 11;
25 - De qualquer forma, dado que o despedimento verbal que foi alegado teria sido no dia 20/09/2016, não tem qualquer justificação, segundo parâmetros da lógica do homem médio e das regras da experiência comum, a recorrente ter enviado no dia seguinte o certificado de incapacidade temporária para justificar a ausência ao trabalho;
26 - Deve improceder a pretensão da recorrente de que seja alterada a decisão da matéria de facto no que respeita ao artigo 8. dos temas de prova;
27 - Não tem qualquer fundamento o que a recorrente alega sobre a mudança da fechadura do consultório em 27/09/2016, nem tem qualquer relevância, pois está provado que em 20/09/2016, ao sair do consultório, a recorrente deixou as chaves deste em cima da secretária, e, a partir desta data não se apresentou mais no seu posto de trabalho (matéria assente no Despacho de 16/02/2017 e resposta ao art.º 13.º dos temas de prova), pelo que é manifesto que a mudança da fechadura, que só “a posteriori” se viria a verificar, nada teve que ver com a não comparência da recorrente ao trabalho;
28 - A mudança da fechadura em 27/09/2016 deveu-se ao facto das chaves do consultório terem ficado no seu interior, e quando aquela mudança ocorreu o recorrido solicitou ao senhor João que em 03/10/2016 fosse entregar à recorrente as novas chaves, conforme declarações prestadas pelo recorrido e que a testemunha João confirmou (depoimento gravado no CD com início aos 01:16 e com termo aos 03:51, transcrito em VIII das alegações);
29 - A matéria de facto provada no âmbito do artigo 5.º dos temas de prova não permite concluir que o recorrido planeava o despedimento da recorrente, nem ficou provado o despedimento verbal que a recorrente alegou;
30 - A recorrente tinha o ónus de demonstrar os pressupostos em que se fundamenta a alegada ilicitude e não os logrou provar (art.º 342º do C. Civil);
31 - O acto da recorrente ter justificado perante o recorrido a sua ausência ao trabalho a partir de 21/09/2016, é incompatível, porque notória e objectivamente em contradição, com o pretenso anterior “despedimento verbal” que aquela invocou;
32 - E apesar de na carta de 28/09/2016 o recorrido ter manifestado à recorrente que considerava que o contrato de trabalho se mantinha (documento n.º 12 junto com a contestação, não impugnado pela recorrente), não resulta dos factos provados, nem sequer foi alegado, que esta tenha tentado abordar o recorrido para esclarecer a situação, ou que tenha voltado a apresentar-se ao trabalho, o que não estava impedida de fazer, e seria de manifesta prudência para se certificar do alegado despedimento que veio invocar nesta acção;
33 - E quando a acção foi instaurada estava pendente o procedimento disciplinar instaurado em 12/10/2016, com nota de culpa enviada em 25/10/2016, e que apenas por facto que imputável à recorrente foi recebida em 17/11/2016 e a que esta respondeu (documento n.º 1 junto com a contestação), o que também inculca que o recorrido continuava convencido de que se mantinha a relação laboral, e a recorrente o manifestou ao responder;
34 - Todos estes factos contrariam a pretensão da recorrente de que seja considerado que houve “despedimento”, e “a jurisprudência tem sido unânime em restringir as situações em que se pode concluir pela existência de despedimento por parte do empregador, no sentido de que esta vontade há-de ser expressa e inequívoca, não sendo de admitir o despedimento tácito no seguimento do com maior amplitude é permitido pelo art. 217º do Cód. Civil”;
35 - Não há dúvida fundada sobre a prova realizada quanto aos factos relacionados com a cessação do contrato, não ocorrendo os pressupostos para a produção de novos meios de prova mediante inquirição de testemunha ao abrigo do art.º 662.º, n.º 2, alínea b) do C.P.C.;
36 - Os elementos de prova que a Sra. Juiz “a quo” apreciou, valorou e em que fundou a sua convicção, não foi apenas prova testemunhal, mas também prova documental e o que a recorrente alegou para impugnar a decisão da matéria de facto referente aos artigos 6.º, 7.º dos temas de prova foi questionar a credibilidade das testemunhas e atacar aquela convicção, não apontando erros de julgamento que pudessem justificar a procedência daquela impugnação;
37 - A matéria de facto provada no âmbito dos artigos 13. e 14. dos temas mostra que, perante a prova produzida existe uma grau de certeza suficiente sobre a factualidade ocorrida;
38 - Não se está perante um novo meio de prova porque o Filipe já tinha sido indicado como testemunha;
39 - A recorrente desistiu da testemunha Filipe, não sendo admissível vir agora requerer a sua inquirição em sede de recurso;
40 - A sentença recorrida na parte em que julgou a acção improcedente não merece qualquer reparo.”.

Termina; “nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. Sabiamente saberão suprir, deve ser negado provimento ao presente recurso, com as consequências legais, …”.

O R recorreu:

Conclusões:

1 - O Tribunal Judicial de primeira instância, o Juízo do Trabalho, é incompetente em razão da matéria para conhecer do pedido de condenação do recorrente no pagamento de contribuições em dívida à Segurança Social;
2 - Esta questão em litígio tem que ver com uma relação jurídica contributiva, de natureza tributária, que é distinta da relação de trabalho subjacente ou de qualquer relação conexa com a relação de trabalho, e a entidade empregadora não está constituída perante o trabalhador em qualquer dever jurídico, sendo perante a Segurança Social que aquela deve cumprir a obrigação contributiva;
3 - Os Tribunais da Jurisdição Administrativa e Fiscal são competentes para administrar a justiça nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais (artigos 1.º, 4.º, 49.º do ETAF);
4 - Trata-se de questão da competência dos Tribunais Tributários, sendo neste sentido a jurisprudência uniforme e reiterada do Tribunal dos Conflitos;
5 - A incompetência absoluta pode ser arguida pelas partes, e deve ser suscitada oficiosamente pelo tribunal, enquanto não houver sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa, dado que a violação das regras de competência em razão da matéria respeita a tribunais de diferente categoria (art.º 97.º do C.P.C., art.º 29.º da Lei n.º 62/2013, de 26/08);
6 - A arguição pelo recorrente da incompetência do Tribunal em razão da matéria é tempestiva, sendo excepção de conhecimento oficioso, e que acarreta a absolvição da instância (art.ºs. 576.º, 577.º e 578.º do C.P.C.);
7 - Deve ser declarada a incompetência do Tribunal em razão da matéria para conhecer do pedido de condenação do recorrente a pagar à Segurança Social as contribuições relativas ao período de 2006 a 2015, com as consequências legais, revogando-se a sentença recorrida na parte em que julgou a acção procedente;

SEM PRESCINDIR

8 - Tem de ser tido em consideração que é nula a sentença recorrida na parte em que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou o recorrente a pagar à Segurança Social as contribuições relativas ao período de 2006 a 2015 relativas ao trabalho dependente prestado pela recorrida, por omissão de pronúncia, conforme arguido pelo recorrente no requerimento de interposição do recurso (art.ºs.1 615.º, n.º 1, al. d), do CPC aplicável “ex vi” do art.º 1.º, n.º 2, do CPT);

SEM PRESCINDIR

9 - O recorrente impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto no que respeita aos concretos pontos de facto referidos na conclusão 10, os quais devem ser considerados provados;
10 - Deve ser dada por provado que: foi ao abrigo da Medida Estímulo Emprego, criada e regulamentada pela Portaria n.º 149-A/2014, de 24 de Julho, que foi celebrado o contrato de trabalho entre recorrente e recorrida de 01 de Agosto de 2015; em 2015 a recorrida inscreveu-se como desempregada no Instituto do Emprego e da Formação Profissional, I.P.; em 12/11/2011 a Autora declarou exercer, esporadicamente, as funções de recepcionista;
11 - Esta matéria de facto está provada por confissão da recorrida, pelos documentos n.ºs 10 e 11 juntos com a petição inicial, pelo documento n.º 13 junto com a contestação e não impugnado pela recorrida, pela informação prestada pelo Instituto do Emprego e da Formação Profissional, I.P. por requisição do tribunal (art.ºs. 355.º, 356.º, n.º 1, 358.º, n.º 1, 436.º, 439.º, do Código Civil);
12 - Trata-se de factos provados que são úteis e relevantes para a decisão final da causa, para que esta corresponda à resolução justa do litígio, nomeadamente por serem demonstrativos do abuso de direito invocado pelo recorrente, pelo que houve erro de julgamento que determina o aditamento aos factos provados dos factos referidos na conclusão 10;

SEM PRESCINDIR

13 - Não há factos provados que permitam ao senhor Juiz “a quo” concluir que recorrida estivesse subordinada ao recorrente por contrato de trabalho, e decidir pela condenação do recorrente no pagamento à Segurança Social, pelo que há erro de julgamento;
14 - O que está provado é que em 2006 a recorrida deixou de declarar rendimentos de trabalho dependente para efeitos fiscais, em 2015 inscreveu-se como desempregada e celebrou contrato de trabalho com o recorrente;
15 - Em 2011, quando de acção inspectiva da Entidade Reguladora de Saúde a recorrida declarou estar “ali a exercer, esporadicamente, as funções de recepcionista” e disse à testemunha Dra. G. C. que estava a recibos verdes;

SEM PRESCINDIR

16 - Ao longo de quase 10 anos, a recorrida prestou serviços ao recorrente comportando-se como prestadora de serviços, designadamente em matéria fiscal e da segurança social, recebendo os montantes pagos pelo recorrente sem quaisquer deduções ou retenções de quantias para entrega na Segurança Social e Finanças pelo recorrente;
17 - O que resulta dos factos provados, nomeadamente de que a A. a partir de 2006 deixou de declarar rendimentos para efeitos fiscais e o R. cessou o pagamento das contribuições mensais à Segurança Social, a A. manteve-se nesta situação até 2015, data em que celebraram o contrato de trabalho de 01/08/2015 ao abrigo da Medida Estímulo Emprego criada e regulamentada pela Portaria n.º 149-A/2014, de 24 de Julho, estando a recorrida inscrita como desempregada no Instituto do Emprego e da Formação Profissional, I.P., em 12/11/2011 a recorrida declarou “exercer, esporadicamente, as funções de recepcionista”;
18 - Tendo em conta que de 1997 a meados de 2006 entre a recorrida e o recorrente vigorou um contrato de trabalho, a recorrida sabia perfeitamente como se processava a relação de trabalho dependente em matérias fiscal e Segurança Social e não podia desconhecer que não era trabalhadora dependente, nem deixar de aceitar a eventualidade de não poder usufruir as garantias inerentes a um inequívoco contrato de trabalho, nomeadamente no que respeita a haver “descontos”, contribuições obrigatórias, para a Segurança Social;
19 - E, por sua vez, é razoável que o recorrente se tivesse convencido de que existia uma relação de prestação de serviços com a recorrida durante esse período de quase 10 anos, e que relativamente a esta não tinha que fazer pagamento de contribuições para a Segurança Social, nem deduzir montantes para este efeito às quantias que pagou à recorrida;
20 - O pedido da recorrida de condenação do recorrente “… no pagamento das contribuições obrigatórias para o regime da segurança social, desde o ano de 2006 até ao ano de 2015, que se encontram por liquidar” é manifestamente contraditório com o anterior comportamento daquela, excedendo a recorrida os limites impostos pela boa fé e agindo esta com manifesto abuso de direito, na modalidade de “venire contra factum proprium” (art.º 126º do CT, art.º 334º do C.Civil);
21 - O abuso de direito torna ilegítimo o seu exercício, tudo se passando como se não existisse o direito, e obsta a que possa proceder aquele o pedido da recorrida, pelo que a sentença recorrida na parte em que julgou a ação parcialmente procedente e condenou o recorrente deve ser revogada e substituída por outra que absolva o recorrente;

SEM PRESCINDIR

22 - A obrigação de pagamento das contribuições e de quotizações, respectivos juros e outros valores devidos à Segurança Social, prescreve no prazo de 5 anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida (art.º 187.º, n.º 1, do C. Contributivo);
23 - A prescrição das dívidas à Segurança Social é de conhecimento oficioso (art.º 175.º do C.P.P.T).;
24 - E o conhecimento oficioso da prescrição de uma dívida por contribuições de segurança social não é reservado aos processos de natureza tributária;
25 - Estão prescritas eventuais obrigações do recorrente perante a Segurança Social que tivessem de ser cumpridas há mais de 5 anos a contar da data em que deveriam ter sido cumpridas, nomeadamente referentes aos anos de 205 a 2011;
26 - Pelo que a sentença recorrida na parte em que condenou o recorrente a pagar à Segurança Social as contribuições relativas ao período de 2006 a 2015 relativas ao trabalho dependente prestado pela recorrida, tem de ser revogada;
27 - A sentença recorrida na parte em que condenou o recorrente a pagar à Segurança Social as contribuições relativas ao período de 2006 a 2015 violou, designadamente, o disposto nos art.ºs. 126.º do CT, 97.º, 576.º, 577.º e 578.º do C.P.C., 29.º da Lei n.º 62/2013, de 26/08, 1.º, 3.º, da Portaria n.º 149-A/2014, de 24 de Julho, 334.º, 355.º, 356.º, n.º 1, 358.º, n.º 1, 436.º, 439.º, do C. Civil, 187.º, n.º 1, do C. Contributivo, 175.º do C.P.P.T, 1.º, 4.º, 49.º, do ETAF.”.

Termina: “deve ser dado provimento ao presente recurso, declarando-se a incompetência do Tribunal em razão da matéria para conhecer do pedido da recorrida de “condenar-se o R. no pagamento das contribuições obrigatórias para o regime da segurança social, desde o ano de 2006 até ao ano de 2015, que se encontram por liquidar”, com as consequências legais;
caso assim não se entenda, deve ser revogada a sentença recorrida na parte em que julgou a ação procedente e condenou o recorrente a pagar à Segurança Social as contribuições relativas ao período de 2006 a 2015 relativas ao trabalho dependente prestado pela recorrida, substituindo-se por outra que julgue a acção totalmente improcedente, com as consequências legais, …. ,”.

Não se contra-alegou.
Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido do recurso da A não merecer provimento e do recurso do R proceder.
Efectuado o exame preliminar e corridos os vistos legais, cumpre decidir.

As questões a apreciar revertem, sucessivamente e sem prejuízo das conclusões do recurso bem como das que se encontrem prejudicadas pelo conhecimento de outras, para as nulidades da sentença, as impugnações da decisão da matéria de facto, a renovação de prova, a produção de novo meio de prova, a ilicitude do despedimento, a indemnização por este, os juros, a regularização das contribuições à Segurança Social e o exercício abusivo de direito,

Na sentença considerou-se assente:

1- A A exerceu por conta do R as funções de assistente dentária, executando todas as tarefas inerentes à sua categoria profissional, na clínica dentária do demandado sita na Av. Dr …, em Peso da Régua.
2- Ultimamente a A auferia a remuneração mensal de 550,00€, acrescida de subsídio de alimentação no valor de 4,27€/dia útil de trabalho – cfr doc de fls 13 cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
3- Em 2005 A. e R. celebraram o contrato de trabalho que consta do documento de fls. 25 e vº e cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
4- No ano de 2015 o R candidatou-se ao programa de estímulo ao emprego, tendo em Agosto de 2015 celebrado com a A o contrato de trabalho constante do documento de fls. 31 e vº cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
5- A A esteve presente em consulta médica no dia 20.09.2016 e foi-lhe emitido certificado de incapacidade temporária para o trabalho, com data de início em 21/09/2016 e pelo período de 12 dias – cfr documentos de fls 32 e 33 cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
6- A partir de 20.09.2016 a A não se apresentou mais no seu posto de trabalho.
7- No dia 23.09.2016 a A. solicitou, por comunicação remetida por via postal ao R., a emissão da declaração da situação de desemprego, a qual nunca foi emitida pelo demandado.
8- O R. subscreveu a declaração constante do documento de fls 21 cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido, datada de 01.06.2005.
9- Em 25.10.2016 o R enviou à A nota de culpa com a comunicação da intenção de lhe aplicar a sanção de despedimento – cfr documento de fls 81 vº a 82, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
10- Esta nota de culpa foi recepcionada pela A em 17.11.2016, tendo a mesma apresentado a respectiva resposta em 29.11.2016 – cfr documento de fls 92 a 96 cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
11- A A. trabalhou por conta do R., sob a sua direcção e fiscalização, no âmbito de contrato de trabalho verbal celebrado por ambos, desde Abril de 1997 – cfr ofícios da Seg. Social de 17/03/2017, junto aos autos, fls 157 e de 29.06.2017 a fls. 371, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
12- A A cumpria um horário de trabalho de 2º a 6ª feira, das 09h30 às 12h30 horas e das 14h30 às 18h30 horas, com descanso aos sábados e domingos.
13- No ano de 2005 o R. foi alvo de acção inspectiva pelo IDICT, tendo sido notificado para apresentar as folhas de remunerações da Segurança Social e por esse motivo regularizou as contribuições obrigatórias relativas ao período de 1997 a 2005.
14- De Junho de 2006 a Agosto de 2015, o R. não procedeu ao pagamento de contribuições à Segurança Social, relativamente à aqui A. – cfr. documentos da Segurança Social de fls. 26 a 27vº, 157 a 159vº, 237 a 241 e 324 a 328, dando-se integralmente por reproduzidos os respectivos teores.
15- No dia 15.09.2016, quando regressou do seu período de férias, a A deparou-se com um papel na sua secretária com a alteração do seu horário de trabalho, não dispondo de ligação eléctrica que lhe permitisse ligar o computador, estando os gabinetes da clínica trancados e a televisão sem comando.
16- A A foi contratada pelo R em 1997 ao abrigo da medida de incentivo à contratação de jovens à procura do primeiro emprego.
17- A A a partir de 2006 deixou de declarar rendimentos para efeitos fiscais e o R cessou o pagamento das contribuições mensais à Segurança Social.
18- A A manteve-se nesta situação até 2015, data em que celebraram o contrato de trabalho acima referido na factualidade assente.
19- A partir de 2015 a A passou a cumprir um horário de trabalho de 2ª a 6ª feiras das 09h00 às 18h00 horas, com intervalo das 13h00 às 14h00 horas de cada dia.
20- No dia 20.09.2016, a A ao sair do consultório do R, deixou as chaves das mesmas instalações em cima da secretária, porque o R não possuía nenhum duplicado das mesmas e ainda lá permaneceu após a saída da demandante, tendo a A sido nesse mesmo dia assistida no Centro de Saúde.
21- O R telefonou à A em 21.09.2016, tendo-lhe esta dito que se encontrava de baixa médica até 02.10.2016 e que lhe iria remeter o respectivo certificado, o que fez por via postal nesse mesmo dia.
22- A A consta como estando inscrita no IEFP como desempregada a partir de 05.12.2016 – cfr ofício desta mesma entidade de fls. 281, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.

Das nulidades da sentença

O R, no seu recurso, invocou antes do mais a nulidade da sentença nos termos do artº 615º, nº 1, alª d), do CPC (quando inexiste pronuncia sobre questões que se deva apreciar) quanto à excepção de incompetência material do tribunal relativamente ao último pedido (regularização das contribuições devidas aos serviços sociais competentes quanto ao período de 2006 a 2015).
Entende que são os tribunais da jurisdição administrativa e tributária os materialmente competentes para dele conhecer.
Quando o que se debate substantivamente não respeita aos tribunais judiciais é consabido o regime da arguição e do conhecimento da incompetência absoluta (em razão da matéria).
Na verdade, pode ser suscitada oficiosamente enquanto não houver sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa. Concomitantemente pode também ser arguida até aí (artºs 97º a 100º do CPC).
No caso de se verificar a incompetência material do tribunal que proferiu a sentença o tribunal a quo devia então tê-la apreciado na sentença.
No parecer conclui-se, ao que aderimos, que para o conhecimento da matéria envolvida por tal pedido não têm competência os tribunais de trabalho, para tanto tendo os tribunais administrativos, pelo que se verifica a nulidade da sentença a ser sanada por esta instância de recurso:

“As nulidades da sentença são apenas as irregularidades formais, como tal taxativamente previstas no art. 615º do CPC, que geram dúvidas sobre a sua autenticidade, ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que se decide em determinado sentido e não noutro, quer ainda porque essa explicação conduz, logicamente a resultado diverso do seguido, não se confundindo com erros de julgamento - errada subsunção dos factos ao direito - ou com nulidades processuais, que se traduzem em desvios ao formalismo processual previsto na lei, quer ainda por falta de apreciação das questões suscitadas pelas partes nos articulados, ou de o tribunal devia conhecer oficiosamente.
A nulidade por omissão de pronúncia, assenta na inobservância do dever imposto ao juiz no art. 608º, nº 2 do CPC, isto é de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e ainda daquelas que a lei lhe permite ou impõe o conhecimento oficioso.

Dispõe o art. 64º do CPC que "são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional".
Prescreve-se também no art. 96º, nº l do CPC que a infracção das regras de competência em razão da matéria, determinam a incompetência absoluta do tribunal.

Nos termos do art. 97º, nº l do CPC determina-se que a incompetência absoluta, que implica a absolvição da instância (art. 98º daquele código), pode ser arguida pelas partes ou suscitada oficiosamente pelo tribunal, até ao trânsito em julgado da decisão proferida sobre o fundo da causa.
Ora, tal como sustenta o recorrente Réu, o Tribunal do Trabalho é materialmente incompetente para conhecer do pedido de condenação no pagamento de contribuições em dívida à Segurança Social, atenta a sua natureza tributária, competência reservada aos tribunais tributários, de acordo com os arts. 4º, nºs 1, alínea a) e 3, alínea d) e 49º, nº l, alínea c) do ETAF, aprovado pela Lei 13/2002, de 19.02 (alterado pela Lei n.º 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, da Lei n.º 107-D/2003, de 31 de Dezembro, pela Lei n.º 1/2008, de 14 de Janeiro, pela Lei n.º 2/2008, de 14 de Janeiro, pela Lei n.º 26/2008, de 27 de Junho, pela Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto, pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro e pelo Decreto-Lei n.º 166/2009, de 31 de Julho), embora possa ser competente para o reconhecimento da existência de uma relação laboral.

Tal vem sendo o entendimento uniforme do Tribunal de Conflitos e do STA, como resulta evidenciado do recente acórdão daquele Tribunal Superior, proferido em 28.02.2018, no processo nº 0907/17,disponível em www.dsgi.pt, onde, a dado passo se escreveu:

“3.2. O STA nos acórdãos de 16-05-2012, Proc. 0212/12 e 19-10-2016, Proc. 0623/16, apreciou já questão semelhante à dos presentes autos.
Pretendia o autor naquele 1º acórdão que a Ré fosse obrigada a proceder à reconstituição da carreira contributiva do autor junto da Segurança Social, procedendo ao pagamento das contribuições que ele considera estarem em falta ou que condenasse a ré a pagar à Segurança Social as diferenças respeitantes às contribuições que considera serem as devidas com referência ao trabalho prestado no período em causa.
Pretendia o autor neste 2º acórdão que lhe fosse reconhecido a existência de contrato de trabalho entre ela e a demandada, a inexistência de pagamento de contribuições à segurança social naquele período e a condenação da entidade patronal a proceder ao respectivo pagamento junto da segurança social.
Entenderam os referidos acórdãos serem tais acções da competência dos tribunais tributários.
Acompanham estes acórdãos a jurisprudência uniforme deste Tribunal de Conflitos que identificam.

Por isso, de perto, seguiremos o caminho trilhado por aqueles acórdãos que acompanharam esta jurisprudência.
A jurisprudência, designadamente do Tribunal de Conflitos, tem vindo a considerar que os tribunais tributários são competentes para conhecer da acção intentada pelo trabalhador contra a entidade patronal, pedindo a condenação desta a proceder aos pagamentos contributivos considerados em falta.
É que (i) a relação jurídica contributiva onde se inscreve o litígio submetido ao julgamento do tribunal é distinta da relação de trabalho subjacente ou de qualquer relação conexa com a relação de trabalho e (ii) a entidade empregadora não está constituída perante o trabalhador em qualquer dever jurídico, sendo perante a Segurança Social que deve cumprir a sua obrigação contributiva.

Com efeito a Constituição da República (CRP) estabelece no seu artigo 211.º, n.º 1, o princípio da plenitude da jurisdição comum, estatuindo que os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens jurisdicionais. Aos tribunais administrativos e fiscais atribui a Lei Fundamental a competência para o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais (cfr. art. 212.º, n.º 3).

No que concerne à competência dos tribunais administrativos e fiscais importa ter em atenção os preceitos aplicáveis do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro (Com as alterações da Lei n.º 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, da Lei n.º 107-0/2003, de 31 de Dezembro, da Lei n.º 1/2008, de 14 de Janeiro, da Lei n.º 2/2008, de 14 de Janeiro, da Lei n.º 26/2008, de 27 de Junho, da Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto, da Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro e pelo Decreto-Lei n.º 166/2009, de 31 de Julho), que, dando concretização ao referido art. 212.º da CRP, dispõe, logo no n.º 1 do seu art. 1.º, que «[o]s tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais».

Também o artigo 4.º do ETAF, dispondo sobre o âmbito da jurisdição dos tribunais administrativos e fiscais estatui que lhes compete a apreciação de litígios que tenham por objecto a tutela de direitos fundamentais, bem como dos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares directamente fundados em normas de direito administrativo ou fiscal ou decorrentes de actos jurídicos praticados ao abrigo de disposições de direito administrativo ou fiscal (n.º 1, alínea a) e b)), ou que tenham por objecto "relações jurídicas administrativas e fiscais que não digam respeito às matérias previstas nas alíneas anteriores (nº 1, alínea o).

Simultaneamente exclui do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal, entre outras matérias, a «apreciação de litígios decorrentes de contratos de trabalho, ainda que uma das partes seja uma pessoa colectiva de direito público, com excepção dos litígios emergentes do vínculo de emprego público» (n.º 4, alínea b)).

Mais especificamente, em relação à competência dos tribunais tributários, o art. 49.º do ETAF insere, no vasto elenco das matérias abrangidas, o conhecimento «[d]as acções destinadas a obter o reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos em matéria fiscal» (n.º 1, alínea c)).
O que, em princípio, releva para a apreciação da competência em razão da matéria são os termos em que a acção é proposta, o modo como o autor estrutura o pedido e os respectivos fundamentos.

O pedido referido insere-se no âmbito da relação jurídica contributiva e visa assegurar o cumprimento, pela entidade empregadora, da respectiva obrigação contributiva, que as sucessivas Leis de Bases da Segurança Social têm vindo a estabelecer. Com efeito, quer a Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto (art. 24.º), quer a Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto (arts. 60.º e 52.º), quer a Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro (arts. 45.º e 47.º, n.º l), quer finalmente a Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro (arts. 56.º, n.º 1, e 59.º, n.º 1) impõem a obrigação de contribuição para os regimes de Segurança Social aos beneficiários e, no caso de exercício de actividade profissional subordinada, às respectivas entidades empregadoras, estabelecendo mesmo a responsabilidade destas pelo pagamento das quotizações dos trabalhadores ao seu serviço, pelo que devem, para o efeito, proceder, no momento do pagamento das remunerações, à retenção na fonte dos valores correspondentes, e fazer o respectivo pagamento juntamente com a contribuição própria.
A obrigação contributiva da entidade empregadora constitui-se - como também decorre dos diplomas citados - com o início do exercício da actividade profissional dos trabalhadores ao seu serviço.

Está, assim, delineada, nestes diplomas, uma relação jurídica bilateral, de natureza contributiva, que impõe à entidade empregadora a obrigação de efectuar uma prestação pecuniária (a contribuição), correspondendo a tal obrigação o direito da Segurança Social a essa prestação. Embora fundada na relação laboral, esta relação jurídica contributiva não se confunde com ela, e apenas incide sobre um dos sujeitos da relação laboral, a entidade empregadora, pois que, como vimos, é esta a responsável pelo pagamento, mesmo na parte respeitante ao trabalhador.

Como tem vindo a ser referido pela jurisprudência do Tribunal dos Conflitos, no âmbito desta relação jurídica contributiva a entidade empregadora não está constituída perante o trabalhador em qualquer dever jurídico; é perante as instituições de Segurança Social, que integram a chamada administração indirecta do Estado, pois são entidades públicas, revestidas de autoridade pública, designadamente tendo poderes para intervenções coactivas, que as entidades empregadoras têm de cumprir a sua obrigação contributiva.

Hoje, após uma longa discussão doutrinária sobre a natureza das contribuições para a Segurança Social, é inequívoco que estas constituem verdadeiros impostos.
Seja como for, se é certo que a relação jurídica contributiva se estabelece tendo como pressuposto a existência de um contrato de trabalho, verdade é também que ela não emerge de relação conexa com a relação de trabalho. Ela concretiza-se sob a forma de uma relação jurídica bilateral entre o empregador e o Estado, no âmbito da qual, a entidade empregadora se acha constituída face à Segurança Social numa obrigação a ser cumprida perante esta.

Sem prejuízo do que ficou dito, o trabalhador sempre terá o direito a que a sua entidade patronal cumpra com aquela obrigação perante o Segurança Social, pois desse cumprimento depende a possibilidade de ele poder vir a auferir da Segurança Social, e pelo montante coreto, as prestações que a lei lhe reconheço.
Em face desse direito e da natureza indiscutivelmente tributária da relação jurídica em causa, a jurisprudência tem vindo a entender que é da competência dos tribunais tributários conhecer da acção intentada pelo trabalhador contra a entidade patronal, pedindo a condenação a proceder aos pagamentos contributivos considerados em falta”.

Ora, sendo o TT materialmente incompetente para conhecer do pedido de condenação da Ré no pagamento de contribuições em dívida à SS, a julgadora da lª instância estava obrigado a conhecer oficiosamente dessa excepção dilatória, ao proferir sentença, nos termos do art. 608º, nº 2 do CPC.
E não o tendo feito, incorreu na nulidade prevista no art 615º, nº l, alínea d) do CPC, como invocou o Réu - nesse sentido v. ac. do STJ de 13.09.2007, proc. nº 0782522, dsgi.net.
É certo que, no despacho saneador, de que o Réu não recorreu, se considerou que inexistiam excepções de que cumpria conhecer - v. fols. 132.

Mas, como vem entendendo a jurisprudência - v. ac. do STJ de 05.02.2009, proc. nº 0851425, dsgi.net - tal despacho tabelar - que se não pronuncia, em concreto, sobre qualquer específica excepção - não forma caso julgado formal - v. nesse sentido, ac. da RP de 03.11.2010, CJ, 2010, 5º, pág.175, onde em sumário se escreveu: "I -O despacho tabelar que aprecia genericamente as excepções dilatórias não produz quanto a estas caso julgado formal, pelo que pode ser oficiosamente apreciada em fase posterior, a questão da competência do tribunal em razão da matéria.”.

De todo o modo, a decisão recorrida, sempre padeceria do invocado vício, por não haver conhecido das questões de direito, suscitadas pelo Réu na sua contestação, que poderiam influir no mérito da causa - sobre o abuso de direito e a prescrição de dívidas à segurança social -, matérias sobre que não escreveu uma linha e se não mostram prejudicadas pela solução dada a outras.
Deverá, assim, ser declarada por esta Relação a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, sobre a questão do conhecimento oficioso da excepção de incompetência em razão da matéria, no que se refere ao pedido de condenação do Réu, do pagamento de contribuições obrigatórias para a Segurança Social.
E, no uso dos poderes conferidos pelo art. 665º, nº 2 do CPC, dado dispor de todos os elementos disponíveis, deve este Tribunal Superior, julgar verificada a excepção de incompetência material, relativamente ao pedido de condenação do Réu no pagamento à Segurança Social de contribuições em dívida, absolvendo o Réu da instância, nessa parte.”.
Deste modo, nos termos conjugados dos artºs 99º, 576º e 577º do CPC deve a sentença ser revogada no que concerne a tal pedido e o R absolvido da instância quanto ao mesmo.

Nesta medida carecendo este tribunal de competência material e não se estando no âmbito de recurso subordinado ou de ampliação do recurso da A (artºs 633º e 636º do CPC), resta acrescentar que o recurso do R fica prejudicado relativamente às demais questões que suscita e que têm a ver ou unicamente com a matéria que consubstancia o pedido em causa ou com a finalidade exclusiva do recurso da sentença, concernente apenas à condenação, como sejam: as nulidades por não pronuncia sobre a prescrição de “dívida por contribuições de segurança social” e o exercício abusivo de direito referente à pretensão, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto e a própria verificação dessa prescrição e do exercício ilegítimo do direito.

Da impugnação da decisão relativa à matéria de facto da A

Esta discorda com a decisão sobre a matéria dos nºs 1 e 6 a 9 dos temas de prova (a A trabalhou por conta do R., sob a sua direcção e fiscalização, no âmbito de contrato de trabalho verbal celebrado por ambos, desde meados do ano de 1992? - provado apenas que a A trabalhou por conta do R, sob a sua direcção e fiscalização, no âmbito de contrato de trabalho verbal celebrado por ambos, desde Abril de 1997 – cfr. ofícios da Seg. Social de 17.03.2017, junto aos autos, fls. 157 e de 29.06.2017 a fls 371, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido; cerca das 17h45 horas de 20/09/2016, o R despediu a A verbalmente dizendo-lhe “você é uma puta falsa; tem que ir para o olho da rua, não posso mais ver o seu focinho; é uma besta, cabra e está aqui para me deitar o consultório abaixo”? - não provado; o R solicitou-lhe nessa mesma ocasião, as chaves da clínica dentária? - não provado; no dia 21.09.2016, por conversa telefónica, o R. reiterou o despedimento da A? - não provado; e, a A foi contratada pelo R em 1997 ao abrigo da medida de incentivo à contratação de jovens à procura do primeiro emprego? - provado).

Pretende que a matéria dos nºs 1, 6 e 7 seja integralmente dada como assente, sendo a do nº 7 com o acrescento final “dizendo que estava despedida”, a do nº 9 como não provada e a do nº 8 referindo que no dia 21/09/2016, por conversa telefónica, o R. reiterou o despedimento da A. dizendo que não conseguia trabalhar mais com ela e que estava despedida.

O tribunal a quo fundamentou a sua convicção:

“Entre os factos acima descritos, há que destrinçar aqueles que dizem respeito ao início e desenrolar do vínculo contratual existente entre as partes, e quanto a esta matéria de facto, o Tribunal considerou a prova documental aqui junta aos autos, designadamente os documentos acima descritos, os quais corroboram, sem sombra de dúvida de que o vínculo laboral entre os aqui intervenientes apenas existe a partir de Abril de 1997, já que em 1992 a A. encontrava-se inscrita nos respectivos serviços sociais como trabalhadora dependente de outra pessoa singular. No decurso da vigência do contrato de trabalho houve um período de interregno em que o demandado não efectuou o pagamento de contribuições à Segurança Social e em que a A. não declarou quaisquer rendimentos à autoridade tributária para efeitos fiscais. Contudo, nem a A., nem o R. demonstraram que a primeira estivesse estado inscrita, durante esse período – de 2006 a 2015 – no regime de trabalhadora independente, pelo que sabendo ambos que as contribuições à Segurança Social não eram liquidadas e que não foram declarados quaisquer rendimentos fruto de trabalho dependente por parte da A. pese embora se tenha mantido no seu posto de trabalho de forma ininterrupta, estamos aqui perante uma actuação conjunta de ambos os intervenientes no sentido de se eximirem ao cumprimento das suas obrigações quer junto da Segurança Social, quer junto do Fisco e que o Tribunal não deixará de assinalar em sede própria comunicando estes ilícitos a quem detém a competência para os apurar e punir devidamente.

Já no que se refere à factualidade referente à cessação do contrato de trabalho em apreço e às expressões imputadas ao R., o Tribunal atendeu aos depoimentos das testemunhas Jorge, cônjuge da A., de Isabel, filha da A. Ambas as testemunhas referidas confirmaram o que lhes foi dito pela A. a este propósito, não tendo assistido a qualquer conversa entre o R. e a A. em que tivessem sido proferidas quaisquer expressões injuriosas ou em que tivesse sido expressamente dito pelo R. que a A. estava despedida. Acresce que estando despedida no dia 20/09/2016, dificilmente se explica o motivo pelo qual a A. sentiu a obrigação de no dia seguinte remeter ao R. um certificado de incapacidade temporária (vulgo baixa médica) para justificar a sua ausência do posto de trabalho. Já o depoimento da testemunha A. C. que afirmou encontrar-se no consultório do R. no dia 20/09/2016, tendo assistido às expressões proferidas pelo R., tal como descritas pela A., foi contraditado de forma categórica pelos depoimentos das testemunhas M. T. e António e sem prejuízo deste último ser ainda primo do R., as suas declarações foram coincidentes e não mereceram do Tribunal menor credibilidade do que o depoimento da testemunha A. C.. Assim, e sendo que o ónus de demonstrar esta matéria de facto recaía sobre a A., considerou-se que a mesma não logrou convencer o Tribunal de que aquela factualidade ocorreu do modo como o descreveu e daí as respostas acima consignadas.

Quanto à carreira contributiva da A. salienta-se ainda que o R. admitiu, no âmbito das suas declarações de parte que foi modificando o vínculo contratual que tinha com a A. ao longo dos anos, primeiro passando esta a ser trabalhadora sob o regime de trabalho independente e depois como desempregada junto do IEFP, mas ao longo dos anos e de forma ininterrupta, de 1997 a 2016 a A. sempre trabalhou por sua conta e direcção, em regime de exclusividade como uma trabalhadora dependente auferindo a mesma quantia mensalmente a título de retribuição, pese embora o demandado atribua estas alterações à vontade expressa da A. e esta as atribua, pelo contrário, aos interesse exclusivos do R. que deste modo, obtinha proveitos fiscais e ao nível das contribuições devidas à Segurança Social.
A este respeito há que salientar que todas as testemunhas, de forma unânime, declararam que estavam convictas de que a A. era trabalhadora dependente do R. e que assim foi ao longo de todos os anos em que trabalhou no seu consultório dentário.

Finalmente, fazer referência ao depoimento de parte da A. que não contribuiu para a formação da convicção do Tribunal por ter corroborado integralmente a sua versão dos acontecimentos e não ter confessado quaisquer factos que lhe fossem desfavoráveis.”
No que concerne à matéria dos pontos 1 e 9
É entendimento da A que o documento endereçado pelo R a terceiro faz prova plena contra o emitente, pelo que impunha a admissão integral da matéria do ponto 1 e a não aceitação da matéria do ponto 9.
Como se anteviu no primeiro perguntava-se se o vinculo laboral iniciou-se por contrato de trabalho verbal no ano de 1992 e no segundo se antes foi no ano de 1997 por contrato ao abrigo de programa de incentivo à contratação de jovens à procura do primeiro emprego, respondendo-se à matéria deste como provado e à do primeiro, coerentemente, ainda com o provado quanto à matéria do ponto 3 dos temas de prova, de forma restritiva que esse vinculo tinha sido iniciado em Abril de 1997, veiculando-se o tribunal a quo em ofícios da Segurança Social em que a recorrente surge no ano de 1992 como tendo outro empregador e o R apenas no ano de 1997.

Versa o dito documento do R:

“Ao Banco A
Exm.º Senhor

Venho por este meio informar Vª Exª que a S. D Maria é minha assistente de consultório à onze anos aproximadamente com um vencimento mensa de 500 Euros mais subsídios. Com os melhores cumprimentos”; em lugar inferior consta assinatura, carimbo e data reportada a 21.05.2003.

O R não impugnou a letra e assinatura respectivas.

Alegou na contestação (nºs 14 e 15) que esse documento “foi emitido pelo Réu, a pedido e no interesse daquela, para entregar no Banco para efeitos de obtenção de financiamento bancário, ao que o Réu acedeu dada a relação de amizade e confiança que existia entre Autora e Réu”, e, “a referência feita a “onze anos aproximadamente” tratou-se de lapso na indicação do número de anos da duração do contrato de trabalho da Autora à data de 21/05/2003 e, nessa parte, o texto do documento não corresponde à realidade, não corresponde à verdade dos factos, pelo que o Réu impugna o teor do documento n.º 4, que o mesmo seja exacto e verdadeiro, bem como impugna o sentido e alcance que a Autora lhe quer atribuir.”.
Mas nem por isto, apesar de encerrar declaração que só ao R deve ser atribuído o documento goza da força probatória plena relativamente à A.
O elemento literal do mesmo tem necessariamente como declaratária instituição bancária e certamente destinou-se apenas a produzir efeitos úteis no quadro de relação jurídica que se estabelecesse com a mesma.

Nas contra-alegações, pois, o recorrido apontou correctamente jurisprudência ao citar o acórdão do STJ de 03.12.2003 (procº 2287/02, www.dgsi.pt), no qual se decidiu:

“A razão de ser da atribuição de força probatória plena às declarações desfavoráveis ao declarante que constem documento particular radica na circunstância de ela poder ser entendida com o valor de uma confissão extrajudicial. É o que se depreende das disposições conjugadas dos artigos 358º, n.º 2, e 376º, n.º 2, do Código Civil.

A confissão é "o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária" - artigo 352º. Se tal confissão for efectuada em documento autêntico ou particular, "considera-se provada nos termos aplicáveis a estes documentos, e se for feita à parte contrária ou a quem a represente, tem força probatória plena" - artigo 358º, n.º 2. A norma remete, pois, para o disposto no artigo 376º, n.º 2, no que aos documentos particulares concerne, e é à luz do regime nela definido que haverá de interpretar-se o princípio de direito probatório material que nessa última disposição se contém. Isto é, tratando-se de um documento particular, os factos compreendidos na declaração consideram-se plenamente provados na medida em que sejam desfavoráveis ao declarante; mas a regra tem em si pressuposta a ideia de que a declaração é recipienda, pelo que os seus efeitos jurídicos se produzem apenas quanto ao seu real destinatário.

Por outro lado, o artigo 358º do Código Civil distingue consoante o destinatário é a parte contrária ou um terceiro: no primeiro caso, tem força probatória plena (n.º 2), ao passo que, no segundo, o seu valor probatório é livremente apreciado pelo tribunal (n.º 4), sendo que tal distinção se baseia nas maiores garantias de seriedade e de ponderação que a confissão oferece no primeiro caso (cfr. PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, vol. I, Coimbra, 1967, pág. 234).

Como defende LEBRE DE FREITAS (A Falsidade no Direito Probatório, pág. 56, nota 119), quando a confissão é feita perante terceiro, a norma do artigo 376º, n.º 2 do Código Civil cede perante a do artigo 358º, n.º 4, pelo que não constitui prova legal bastante do facto confessado. E nesse sentido, ensinava também, o Prof. VAZ SERRA, ao escrever que "o documento pode ser invocado como prova plena, pelo declaratário contra o declarante; em relação a terceiros, tal declaração não tem eficácia plena, valendo apenas como elemento de prova a apreciar livremente" (in R.L.J., ano 114º, p. 178).

E é esse também o entendimento jurisprudencial, conforme decorre, entre outros, do acórdão do STJ de 26 de Fevereiro de 2003 (proferido no recurso n.º 1198/02, da 4ª secção), de cujo sumário é possível destacar o seguinte: "os documentos particulares cuja autoria seja reconhecida só fazem prova plena quanto aos factos neles referidos que sejam contrários ao interesse do declarante (art.º 376, n.º 2 do CC.), podendo o declaratário invocar tal prova plena contra o declarante que emitiu uma declaração desse teor; nas relações com terceiros, a declaração constante de documento particular só vale como elemento de prova a apreciar livremente pelo tribunal segundo o princípio da liberdade de julgamento (art.º 655 do CPC), tal como sucede relativamente à confissão extra-judicial (art.º 358, n.ºs 2 e 4 do CC)."

Ora, no caso dos autos, nada permite concluir que a declaração em causa visasse o próprio trabalhador. Antes, o que se indicia é que ela foi emitida pela entidade patronal para ser utilizada perante uma terceira entidade e para um fim inteiramente estranho à relação laboral, assim se explicando a proximidade temporal entre a sua emissão (1 de Abril de 1992) e a proposta de concessão de crédito (2 de Abril de 1992). A declaração não pode, pois, ter o efeito de confissão perante o trabalhador.”.
5. Sem dúvida que é ao autor que cabe o ónus da prova dos factos constitutivos do seu direito, incluindo os que respeitam ao valor das retribuições que se encontram em dívida.

E tendo o autor apresentado documento que revela o montante da remuneração mensal auferida (documento de fls 57), era à ré que incumbia o ónus da contraprova. Há aqui, no entanto, que efectuar uma precisão: se a parte a quem incumbe o ónus probandi fizer prova livre que seja de per si suficiente, o adversário terá, por seu lado, de fazer prova que invalide ou neutralize aquela; se a prova da remuneração tiver sido efectuada através de documento com força probatória plena, à ré não basta fazer a prova contrária, em vista a tornar incerto o facto visado, tendo antes de fazer a prova do contrário, ou seja, a prova destinada a tornar certo não ser verdadeiro o facto já demonstrado, formalmente, por prova plena (MANUEL ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, 1976, pág. 207).

Dito de outro modo: se a parte que detém o ónus da prova fizer prova livre ou prova não plena, à contraparte basta criar no espírito do juiz um estado de dúvida ou incerteza (convicção negativa), não carecendo de persuadir o juiz de que o facto em causa não é verdadeiro; se, ao contrário, a parte fizer prova plena, o adversário terá demonstrar, não apenas que o facto é incerto, mas que o facto não é verdadeiro - convicção positiva (ibidem).

É esse o regime que emana com linear clareza das normas dos artigos 346º e 347º do Código Civil, que estatuem:

"Artigo 346º
(Contraprova)
Salvo o disposto no artigo seguinte, à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos; se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova.

Artigo 347º
(Modo de contrariar a prova legal plena)
A prova legal plena só pode ser contrariada por meio de prova que mostre não ser verdadeiro o facto que dela for objecto, sem prejuízo de outras restrições especialmente determinadas na lei."
Ora, no caso em apreço, como se explicitou, a prova documental apresentada pelo autor não tem o valor de força probatória plena, visto não lhe ser aplicável o regime do citado artigo 376º, n.º 2, do Código Civil, pelo que apenas poderia ser avaliada segundo a livre convicção do juiz. E, deste modo, à ré apenas se exigia que efectuasse a contraprova, suscitando a dúvida ou incerteza quanto à verdade dos factos a que se reportam o documento, nos precisos termos do artigo 346º do Código Civil.” (cfr ainda acórdão desta secção social do TRG de 04.10.2017, procº 941/16.3T8BCL.G1).
Daqui podendo ser dito também que o princípio da livre apreciação da prova (art. 657º, nº 5 do CPC) não cede perante situação em que não se verifica a prova tarifária ou legal plena como por exemplo a prevista no artº 376º do CC em certas condições (artº 347º do CC).
E no pressuposto de que o valor probatório do documento destacado pela A admite mera contraprova logo, o entendimento do tribunal a quo que outra prova documental por si considerada não só tornou duvidoso o facto por aquele referido como impôs por si a própria valia probatória é admissível.

Com efeito, como antevisto, esse documento só deve ser entendido com tendo utilidade e fim específico alheios à relação laboral.
Aí ficou esgotada a justificação da sua emissão.

Em contraste, os documentos em que se fundou a convicção desse tribunal, não se podendo colocar de parte ter sido reforçada pelas declarações do R quanto à carreira contributiva como consta da fundamentação transcrita, têm proveniência pública e devem ser considerados documentos autênticos relativamente aos quais não se alcança que se tenha invocado a sua falsidade (artºs 369º, 371º e 372º do CC).
Ademais a A nem sequer formula qualquer juízo em detrimento deles, pelo que a reponderação da prova indicada pela A, em nome da unidade da prova, também estava a priori prejudicada.
Ao não atender à unidade da prova como foi concebida pelo tribunal a quo, para isso servindo a obrigação da fundamentação, a censura que a A exerce sobre o juízo desse tribunal é, assim, inconsistente e inconclusiva para se alterar a decisão sobre a decisão sobre a matéria de facto: as provas que serviram de fundamento à decisão sobre um determinado facto têm que ser analisadas e examinadas em conjunto e não isoladamente.

Efectivamente, ainda, a fonte probatória do tribunal a quo respeitante à sua convicção é diferente daquela que que o recorrente invoca para a rebater e exercer a sua censura.

Conforme se salienta no douto Acórdão do Tribunal Constitucional nº 198/04, publicado no DR, II Série, de 02.06.2004, a impugnação da decisão em matéria de facto “(...) terá de assentar na violação dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na convicção ou porque se violaram os princípios para aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma, seria a inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão (...)”.
O que se compreende porquanto é o juiz a quo quem procede ao julgamento da causa e acerca dos factos nele aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção e não o Tribunal de recurso, cujo poder de intervenção se circunscreve a reapreciar pontos concretos da decisão da matéria de facto especificados nas conclusões do recurso com vista a reparar erros de julgamento ali cometidos.

Por tudo isto a impugnação nesta parte é improcedente.

E da matéria dos pontos 6 a 8

Trata-se daquela que versa, alegadamente, o modo como o R fez cessar o contrato, ou seja, com impropérios em contexto de despedimento expresso e com a solicitação de chaves do local de trabalho em 20.09.2016, reiterado telefonicamente no dia seguinte.

O ónus da sua demonstração pertencia à A (artº 342º, nº 1 do CC).
O que desde logo é inviável nesta impugnação no que ao ponto 8 respeita é a circunstância aditada (dizendo que conseguia trabalhar mais com ela e que estava despedida).
A mesma não foi expressamente alegada na petição inicial.
Se estivéssemos perante matéria com interesse para a descoberta da verdade deveria antes ter sido averiguada através do mecanismo do artº 72º do CPT.

No entanto, este preceito não poderia vir ao caso nesta oportunidade porquanto a sua não utilização na audiência de julgamento (aditamento de factos relevantes à boa decisão da causa não alegados pelas partes, tutelando-se o interesse processual de quem deles possa beneficiar) a consistir na prática de irregularidade encontra-se sanada por não ser arguida tempestivamente (artºs 195º a 202º do CPC).
Voltando directamente à essência desta parte da impugnação, quanto à convicção sobre esta matéria, o tribunal a quo conjugou os depoimentos do marido e filha do A, respectivamente Jorge e Maria (“não tendo assistido a qualquer conversa entre o R. e a A. em que tivessem sido proferidas quaisquer expressões injuriosas ou em que tivesse sido expressamente dito pelo R. que a A. estava despedida”), e o de A. C., cliente do R, segundo ela terá assistido à pronúncia das invectivas, e confrontou-os com os depoimentos coincidentes de M. T. e António, uma paciente do R e outro primo do R.

Considerou nomeadamente que o de A. C. foi contraditado pelos dos dois últimos sendo que todos eles não lhe mereceram menor credibilidade.

Por seu turno ainda considerou a prova de que terá resultado a matéria do nº 21 da factualidade assente constante da sentença e que não foi impugnada (o R telefonou à A em 21.09.2016, tendo-lhe esta dito que se encontrava de baixa médica até 02.10.2016 e que lhe iria remeter o respectivo certificado, o que fez por via postal nesse mesmo dia).
Atento ao citado ónus de prova e ao disposto no artº 346º, nº 3 do CC a questão da admissão da factualidade foi decidida pelo tribunal a quo contra a A.
E auditados os excertos os depoimentos do marido e da filha da A no que concerne à matéria do ponto 8, indicados pela recorrente por terem a percepção directa de telefonema entre os contendores, sendo certo, segundo o seu interesse processual serão certamente os mais importantes substantivamente para a descoberta da verdade material, concluímos que não logram desmentir tal fundamentação do tribunal a quo.
Além do mais, a filha da A refere a dita circunstância que incongruentemente nem foi alegada pela A no articulado inicial e a exigência de assinatura de documento sob pena de “ser despedida sem direitos nenhuns”.
O mesmo acontece com o marido da A e em ambos os casos sem saberem indicar o tipo de documento proposto para assinar ou sem justificarem a razão pela qual tiveram necessariamente a oportunidade de ouvir o telefonema que fosse aceitável segundo as regras de experiência comum, sobretudo se foi por motivos acidentais respeitantes a ambas as testemunhas.
Estas imprecisões e omissões relativizam o deposto sobre esta matéria do ponto 8 e são susceptíveis de abalar a sua credibilidade no confronto com a demais prova produzida citada a propósito pelo decisor da 1ª instância.

Daí que só por isto não se possa ter a mesma como assente, sem prejuízo ainda do que se referirá relativamente ao significado que assume a remessa do certificado de incapacidade temporária na valorização da matéria tanto deste ponto como dos demais impugnados.

Com efeito, já pronunciando-nos sobre a matéria dos pontos 6 e 7 (a este indevidamente pretendendo-se, por não ter sido deste modo alegado e não constar na sua formulação, que se acrescente “dizendo que estava despedida”), e o significado dessa remessa na avaliação da prova, perante ainda a falta de melhor justificação para esta, mesmo que apresentada anteriormente no articulado da A, o que não aconteceu, o envio do certificado é elemento tendencialmente inequívoco que não favorece a impugnação.
Cessado o contrato conforme tese da A, de forma lícita ou não, para quê, sem mais, a necessidade de serem justificadas faltas por eventual doença que tenha sobrevindo?

A A admite a eventual desnecessidade, embora refira que foi o marido que remeteu a baixa médica no dia 21.09.2016 e fosse absolutamente alheia às “questões do foro administrativo, uma vez que a A. se encontrava transtornada e a necessitar de repouso”.

Contudo sem que no excerto do depoimento deste (Foi o Sr. que envio a baixa, não foi? E foi esse o certificado? L: Sim. Acho que sim.) e em contradição com o teor de fls 74 a 76, 84 a 86, 124 e 125 relativamente à hora da remessa postal, e da sua filha, indicado agora por causa dessa remessa, se apresentem motivos plausíveis e consistentes para tanto.
Para mais se como a filha mencionou no outro excerto “Quarta-feira de manhã a entidade patronal ligou, como já sabíamos de tudo o que tinha acontecido e como a minha mãe estava de repouso na cama... Fui eu que lhe levei o telemóvel e decidi por em alta voz, porque, para tentar perceber o que iria acontecer e era o Dr. António a reiterar o despedimento,…” o que .

De resto até se deu como assente que “o R telefonou à A em 21.09.2016, tendo-lhe esta dito que se encontrava de baixa médica até 02.10.2016 e que lhe iria remeter o respectivo certificado, o que fez por via postal nesse mesmo dia”, sem que esta matéria tivesse sido impugnada.
Aliás não fora a contestação do R nem vinha ao conhecimento directo do tribunal a remessa do certificado; e quanto a ter sido o marido da A formula-se a mesma observação que acima se fez relativa ao artº 72º do CPT com a mesma consequência.
Por sua vez, no excerto do depoimento da aludida testemunha A. C., em que a A sublinha os “limites realísticos do seu depoimento”, o mesmo é apenas parcialmente coincidente com o elemento literal dos pontos 6 e 7 e sincopado de algum modo.
Não podendo ser tomado como categórico não vislumbramos como não permitiria oposição de prova em contrário que como resulta da fundamentação do tribunal a quo, por merecer maior credibilidade que outros depoimentos que a propósito desta matéria se pronunciaram.
E de facto a A admite também que “De facto os referidos depoimentos entram em total contradição na medida em que se verificam duas versões antagónicas e incompatíveis sobre a mesma realidade”.

De resto igualmente em patente contradição com a matéria ficada assente e mais uma vez não impugnada: “no dia 20.09.2016, a A ao sair do consultório do R, deixou as chaves das mesmas instalações em cima da secretária, porque o R não possuía nenhum duplicado das mesmas e ainda lá permaneceu após a saída da demandante, tendo a A sido nesse mesmo dia assistida no Centro de Saúde”.

Enquanto isso auditados os excertos dos depoimentos das citadas testemunhas António e M. T., apenas estes relevados para a impugnação considerando o disposto no artº 640º do CPC, de forma alguma eles “desafiam mesmo as probabilidades mais elementares” quanto à matéria discutida através dos pontos 6 e 7, que não se aborda nesses trechos, e à razão de ciência pela qual foram prestados os respectivos depoimentos.

Sucede que o dia 10.09.2016 referido pela segunda coincidiu antes com um sábado.

Não sendo este o dia da semana referido pela primeira testemunha em que o R dava consultas no local de trabalho da A não é por isso que a consulta no dia 10 não pudesse ter ocorrido segundo um padrão de vicissitudes susceptíveis de ocorrer no agendamento da prestação do tipo de serviços em causa.
Recorde-se de qualquer modo que o dia 10.01.2017 para o qual foi marcada outra consulta que a mesma testemunha referiu é uma terça-feira, pelo que nem por isto em contradição com o depoimento da primeira como a A menciona.
Por tudo isto, assim, estes depoimentos não poderiam deixar de produzir de efeito de contraprova perante o que a A pretendesse demonstrar.

Acresce, no excerto do depoimento de Maria T., pessoa que conhece as partes e que trabalha ao lado do consultório, aludindo-se a mudança de fechaduras no consultório não se precisa o momento em que tal ocorreu.
É certo que a circunstância tem em si importância meramente relativa para a tese da A no conjunto com a demais prova que já se analisou.
Mas se outro fosse o seu valor essa imprecisão acabaria por jogar em desfavor dessa tese, porquanto não se deixaria de sopesar a distância de tempo que mediou entre a mudança e o ocorrido no dia 20.09.2017.
Por seu turno o trecho do depoimento de parte do R surge antes como justificação da mudança de fechadura, pelo que destoando da tese da A o que é natural.
A ambivalência da mudança de fechadura para a descoberta da verdade é reforçada pela circunstância da A ter saído do consultório no dia 20.09.2017 sem as chaves e não mais ter lá voltado, como se provou também.
Doutro passo temos a matéria dos nºs 7, 9 e 15 dos factos assentes constantes da sentença (no dia 23.09.2016 a A solicitou, por comunicação remetida por via postal ao R., a emissão da declaração da situação de desemprego, a qual nunca foi emitida pelo demandado; em 25.10.2016 o R enviou à A nota de culpa com a comunicação da intenção de lhe aplicar a sanção de despedimento – cfr documento de fls 81 vº a 82, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido; e, no dia 15.09.2016, quando regressou do seu período de férias, a A deparou-se com um papel na sua secretária com a alteração do seu horário de trabalho, não dispondo de ligação eléctrica que lhe permitisse ligar o computador, estando os gabinetes da clínica trancados e a televisão sem comando), relativamente à qual a A não aponta qualquer contradição com qualquer outra matéria dada como provada, o teor do documento junto a fls 129v e as vicissitudes que se apontam ao processo disciplinar que não são obstativos de qualquer das conclusões a que até agora chegamos.
Estamos perante circunstâncias que não tem significado unívoco pelo que quanto à admissão judiciária da sua motivação pré ordenada ou final não pode ficar pela discussão de meras hipóteses.
Todavia nem por isto deixa de ser aceitável a asserção constante na sentença, porque na linha adoptada na acima transcrita fundamentação, de que “A demandante afirmou no seu articulado que teria sido despedida nesta data, mas não demonstrou este despedimento, já que tal como se deixou exposto na motivação de facto constante da resposta à matéria de facto vertida nos temas da prova, no dia seguinte entrou de baixa médica e remeteu, em 21/09/2016, o respectivo certificado ao R. de forma a justificar a sua ausência, o que do nosso ponto de vista se mostra incompatível com a convicção pela A. de que o seu contrato de trabalho teria cessado na véspera – 20/09/2016. Assim, também terá entendido o R. que iniciou procedimento disciplinar contra a A. em 25/10/2016 [o termo de abertura data de 12.10.2016; fls 71], com a remessa da respectiva nota de culpa e a declaração de intenção de lhe aplicar a sanção de despedimento, o que, novamente, inculca a noção de que mais de um mês decorrido desde a data do pressuposto despedimento, o demandado, entidade empregadora, ainda estava convicto de que se mantinha a relação laboral com a A., já que caso contrário teria cessado o poder disciplinar sobre a mesma.”.
E se é certo que ficou provado o que consta no citado nº 7 dos factos assente também é verdade que o R instaurou procedimento judicial à A na data citada e da carta de fls 78v, 79 também se poderia concluir que o R se mantinha na convicção da manutenção da relação laboral.

Por fim, quando na sentença se refere que “Mais, a própria A. na sua resposta àquela nota de culpa, subscrita pela sua Ilustre mandatária judicial – cfr. fls. 69 a 73 – não se refere uma única vez à existência de factor de cessação do contrato de trabalho, fosse por iniciativa de quem fosse, limitando-se a refutar os factos descritos na mesma nota de culpa, sendo que este procedimento criminal cessou sem que tivesse sido deduzida a decisão final, já que entretanto foi instaurada a presente acção.”, mais não se pode dizer que se se está perante lapso de raciocínio o mesmo não contende com a convicção do tribunal a quo quanto à prova manifestada na decisão sobre a matéria de facto autónoma da sentença e, como tal, sendo agora irrelevante para a averiguação do sentido correto da prova e da factualidade que se pretende como assente ou não assente.
Nestes termos é improcedente in toto a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

Bem como ser mantida incólume, sem mais, a que o tribunal a quo considerou assente já que não há justificação para renovarem-se meios de prova ao abrigo do artº 662º, nº 2, alª b), do CPC, designadamente quanto às citadas testemunhas António e M. T. e ordenar o depoimento de nova testemunha Filipe ou a junção do respectivo “depoimento escrito prestado … no âmbito do processo disciplinar”, nos termos da alª b) do nº 2 do mesmo preceito.

A última testemunha foi arrolada pela A no articulado inicial e inclusivamente foi prescindida na audiência de julgamento, sem constar em acta qualquer declaração sobre o motivo.
Durante a audiência nada foi requerido no sentido das primeiras duas testemunhas fossem contraditadas ou acareadas (artºs 521º a 524º do CPC).

No recurso o mais que a A alegou foi no sentido de questionar de forma inconsequente a sua credibilidade nos termos já acima analisados e de forma alguma está em causa o próprio sentido do seu depoimento.

No recurso, igualmente, não se deduz em que é que se possam suportar os requisitos da dúvida fundada sobre a prova realizada ou seja, ainda, que para além dos meios de prova produzidos fundadamente pudessem existir outros que inequivocamente contribuíssem para a descoberta da verdade, ademais sendo o conhecimento da sua existência posterior ao momento da discussão da causa em audiência.
Na fundamentação transcrita é feita análise crítica da prova e são assegurados os raciocínios e seus percursos que presidiram à opção da matéria de facto discutida, sendo admitida ou repudiada.

Não se fazem afirmações inconciliáveis entre si.

Sem premissas incompatíveis, cada uma delas subsiste utilmente por si.

Nesta medida, nada se lhe há-de apontar e nem a coerência formal desse processo lógico progressivo é propriamente questionada pela recorrente.
Tudo, nesta perspectiva, insusceptível de afectar a transparência da decisão.
Não será necessário um exercício de exegese exigente para se concluir deste modo.

Determina o artº 662º, nº 2, alªs a) e b) do CPC:

“2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;”.

Trata-se de mecanismo processual que não é concebido para superar a possibilidade de não alteração, o que ocorre com basta frequência, da decisão sobre a matéria de facto através do conhecimento da sua impugnação, nos termos dos artºs 640º e 662º do CPC.

Portanto, o mesmo não deve ser subvertido por situação de falta de êxito na prova no que respeita ao respectivo ónus ou de postergação do princípio do dispositivo.

Para o fazer operar deve ser identificada uma “efectiva necessidade de produção de prova complementar susceptível de sanar dúvidas fundadas, objectivas, sérias, que emergem da prova que foi realizada, importa que não se desconsidere também o modo como [as partes] exerceram os respectivos ónus de prova e de contraprova nos momentos processualmente ajustados, para que não se subvertam, por via de um mecanismo que deve ser excepcional, as boas regras processuais conexas com os princípios do dispositivo ou do contraditório” e não poderá “deixar de ser ponderado que o ónus de proposição de meios de prova se deve materializar também através da sua apresentação em momentos processualmente ajustados, com previsão de efeitos preclusivos que não podem ser ultrapassados só pela livre iniciativa da parte” (Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, 231 a 233).

Nestes termos, também por isto a impugnação seria irremediavelmente improcedente.

Por último ainda, diremos que para além não se poder conferir aos excertos dos depoimentos e declaração realçados pela recorrente o significado que a mesma pretende, eles não teriam a virtualidade de imporem a modificação da decisão de facto como se reclama nos artºs 640º, nº 1, alª b), e 662º, nº 1, do CPC (“…que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida” ou “… impuserem decisão diversa”).

Efectivamente, é apodíctico, para estes normativos convém especificar não meios de prova que admitam, permitam ou consintam decisão diversa da recorrida mas, antes, que imponham decisão diversa da impugnada.
E toda a apreciação da prova pelo tribunal a quo tem ainda a seu favor o importante princípio da imediação que não pode ser descurado no convencimento da veracidade ou probabilidade dos factos sobre que recaiu a mesma, segundo o princípio da liberdade de julgamento.

No nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a lei exigir, para a existência ou prova do facto jurídico, qualquer formalidade especial.

O julgador deverá avaliar o depoimento em conformidade com as impressões recolhidas da sua audição e com a convicção que delas resultou no seu espírito, de acordo com as regras de experiência (Miguel Teixeira de Sousa, A Livre Apreciação da Prova em Processo Civil, Scientia Iuridica, tomo XXXIII, 1984, 115 e seg).

Devendo-se concluir assim que a factualidade posta em crise pela recorrente não se revelando grosseiramente apreciada pela primeira instância sempre seria de confirmar.
Fixada a factualidade assente, na medida em que a recorrente não chega a questionar a decisão de mérito que nela se alicerça, por isto ficando prejudicado o conhecimento de qualquer outra questão que o recurso interpele a jusante, é o recurso da A julgado improcedente.

Pelo exposto é julgado procedente o recurso do R e improcedente o da A.

Decisão

Acordam os Juízes nesta Relação em julgar improcedente o recurso da A e procedente o recurso do R, pelo que confirmando-se no mais a sentença, revoga-se esta quanto ao pedido de condenação no “pagamento das contribuições obrigatórias para o regime da segurança social, desde o ano de 2006 até ao ano de 2015, que se encontram por liquidar”, dele absolvendo-se o R da instância.
Custas pela A quanto a ambos os recursos.
*****
O acórdão compõe-se de 42 folhas, com os versos não impressos.
******
17.05.2018

Eduardo Azevedo
Vera Sottomayor
Antero Veiga