Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1041/12.0TBGMR-I.G1
Relator: CONCEIÇÃO BUCHO
Descritores: CIRE
HOMOLOGAÇÃO
PLANO DE INSOLVÊNCIA
RECUSA
NORMA IMPERATIVA
CESSAÇÃO DA SUSPENSÃO DA LIQUIDAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/14/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1. Transitada em julgado a recusa da homologação do plano, cessa automaticamente a suspensão da liquidação, ficando o administrador reinvestido nos poderes de liquidação.
2. O regime estabelecido no artº 156º, nº 4 do CIRE, deve considerar-se imperativo e, consequentemente, subtraído à vontade dos próprios credores.
Decisão Texto Integral: Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

Proc. n.º 1041/12.0TBGMR-I.G1

I - Nos presentes autos em que é insolvente Investimento Certo, Ldª, foi proferido o seguinte despacho:

(…) Fruto da decisão proferida pela Instância de recurso, de recusa da homologação do plano, tal determina a transição imediata para a fase de liquidação dos bens apreendidos, tendo ficada afastada a possibilidade de apresentação novo plano de insolvência - vd. artigo 156°/4,b), do ClRE, que dispõe que a suspensão da liquidação e partilha cessa, entre outras causas, com a não homologação do plano de insolvência.
Deste modo, por força da decisão transitada em julgado de recusa da homologação do plano, nos termos do artigo 158°/1. do CIRE, determino o encerramento da actividade da insolvente e o início da liquidação dos bens da massa insolvente, indeferindo-se a apresentação de novo plano, por preclusão da fase a tal destinada.
Notifique.
Após trânsito deste despacho, comunique a decisão de encerramento da actividade da insolvente à Administração Fiscal, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 65°/3, do CIRE.

Inconformado o credor AA interpôs recurso, cujas alegações terminam com as seguintes conclusões:
I. Vem o presente recurso interposto do despacho proferido pela Meritíssima Juiz, o qual indeferiu a apresentação de novo plano, determinou o encerramento de atividade da insolvente e o início da liquidação dos bens da massa insolvente.
II. Fundamentando a sua posição no facto de ao plano anteriormente apresentado ter sido recusada a sua homologação pelos Venerandos Desembargadores desta Relação, e que tal, determina a imediata transição para a liquidação – artº 156.°, n.º4, alínea b) do CIRE.
III. Precludindo dessa forma a fase para a apresentação de novo plano de insolvência.
IV. A Recorrente não se conforma com tal decisão, uma vez que, e salvo o devido respeito por opinião diversa, a mesma é merecedora de censura, por fazer errónea apreciação de direito, da questão sub judíce, designadamente da aplicação dos art s 192.°, 193.°, 206.°, 207.° e 208.°, todos do CIRE.
V. A questão a decidir consiste pois, em saber se apresentado um plano de insolvência pela Devedora, que foi reprovado/não homologado, posteriormente, pode um grupo de credores apresentar um novo.
VI. Decorre dos factos que, face à não homologação do plano de insolvência apresentado, veio a fls. 598 e ss., o Recorrente, representando mais de um quinto do total dos créditos reconhecidos, requerer, nos termos do disposto no art.º 193.°, n.o 1 do CIRE a concessão de prazo de 10 dias para a apresentação de plano de insolvência, com estrutura e conteúdo diferente daquele que foi votado anteriormente e, face à manifestação de vontade em apresentar novo plano de insolvência, a suspensão da liquidação e partilha, nos termos do disposto no art." 206.° do CIRE.
VII. Por despacho ref.a 137436545, de 14/01/2015, veio a Mm.o Juiz a qua notificar os credores e o Sr. Administrador de Insolvência para se pronunciarem em 5 (cinco) dias, sobre o requerimento apresentado pelo credor AA.
VIII. Tendo o Administrador de Insolvência e os Credores, que assim o entenderam, manifestado a sua posição.
IX. Após a referida recolha de pareceres pela Mm.a Juiz a que, esta proferiu o despacho de indeferimento que aqui se recorre por fazer errónea interpretação e aplicação do direito.
X. Ora, face a esta factual idade, considera o Recorrente que a Mm.a Juiz a qua, faz uma errónea interpretação das seguintes normas: art," 156.°, n.04, alínea b); art.o 192.°, 193.°, n.o 1, 206.°, 207.° e 208.°, todos do CIRE.
XI. Entendeu a Mm.a Juiz a quo que, por força do disposto no art." 156.°, n.04, alínea b) do CIRE, a não homologação do plano implica a tramitação imediata para a fase da liquidação dos bens apreendidos, ficando afastada a possibilidade de apresentação de novo plano.
XII. O artigo 156.° refere-se à tramitação da Liquidação, e não a normas contundes à apresentação do plano de insolvência, que se encontram no Título IX, Capítulo I do CIRE.
XIII. Pelo que a não admissão da proposta de apresentação de novo plano teria de ser fundamentado nas alíneas do n.o1 do art.o 207.°, que se aplica diretamente à questão em análise.
XIV. Não se verificando, in casu, qualquer impedimento à apresentação de um novo plano de insolvência.
XV. Assim, aplicando as normas relativas à apresentação do plano de insolvência, aplicáveis ín casu, resulta do artigo 192.°, n.? 1, do CIRE, que aos credores é permitido escolher se querem obter pagamento por meio da liquidação integral do património do devedor ou através de um plano de insolvência que aprovem.
XVI. Ou seja, a lei atribui aos credores a faculdade de optarem pelo encerramento ou a admissão e aprovação de um plano, porquanto são estes que serão diretamente afetados pela medida adotada.
XVII. Cabendo ao Juiz, face à vontade dos credores, aferir a legalidade do conteúdo do plano, admitindo-o ou não 207.° do CIRE.
XVIII. E depois homologando-o ou não (214.° e ss. do CIRE).
XIX. Não cabe ao Mm.a Juiz decidir se os credores apresentam ou não um plano.
XX. Não podia assim a Mm.a Juiz a quo limitar a apresentação do plano, como requerido pelo Recorrente, com legitimIdade para o efeito (artIgo 193.° n.o1 do CIRE).
XXI. Não existe qualquer norma que impeça os credores de, ao longo do processo, apresentar uma proposta de plano de insolvência, desde que de conteúdo e estrutura diferentes daquela que anteriormente não foi aprovada.
XXII. É isso que se retira do disposto nos artigos 206°, nO 1, e 207°, nO 1, alínea d), do CIRE.
XXIII. Posição unânime na mais variada doutrina e jurisprudência (cfr. Acórdão da Relação do Porto, processo n.o 835/12.1TBPNF~T.P1, de 04/11/2013; e Acórdão da Relação de Guimarães processo 1147111.3TBVCT-O.G1, de 04/06/2013).
XXIV. Resulta assim de forma inequívoca que, nos termos do disposto nos art.os 193.°, 206.° e 208,°, todos do CIRE, é possível apresentar um novo plano após a não homologação do anterior, desde que não se verifique nenhuma situação prevista no art." 207.° do CIRE.
XXV. Consequentemente, deve a decisão recorrida ser revogada, substituindo-a por outra que admita a proposta apresentada pelo Recorrente, a fls. 598, determinando o cumprimento do disposto nos artigos 208.° e seguintes do CIRE, nomeadamente, com a recolha de pareceres e convocação da assembleia de credores.

A BB SA apresentou contra-alegações nas quais pugna pela manutenção do decidido.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II – É pelas conclusões do recurso que se refere e delimita o objecto do mesmo, ressalvadas aquelas questões que sejam do conhecimento oficioso – artigos 635º e 639º Código de Processo Civil -.

A única questão a decidir no recurso é a de saber se a liquidação deve ser suspensa a fim de ser concedida a possibilidade do recorrente apresentar novo plano para homologação.

De acordo com o disposto no artigo 206º, n.º do CIRE a requerimento do respectivo proponente, o juiz decreta a suspensão da liquidação da massa insolvente e da partilha do produto pelos credores da insolvência se tal for necessário para não pôr em risco a execução de um plano de insolvência proposto.
De acordo com o disposto no nº 1 do artigo 193º do CIRE, podem apresentar proposta de plano de insolvência o administrador da insolvência, o devedor, qualquer pessoa que responda legalmente pelas dívidas da insolvência e qualquer credor ou grupo de credores cujos créditos representem pelo menos um quinto do total dos créditos não subordinados reconhecidos na sentença de verificação e graduação de créditos ou na estimativa do juiz, se tal sentença ainda não tiver sido proferida.
No caso dos autos, o plano foi aprovado na Assembleia de Credores e, posteriormente veio a ser revogado por decisão deste Tribunal da Relação.
A decisão transitou em julgado e um mês após o recorrente veio requerer a concessão de prazo para apresentação de novo plano.
Como se refere no Ac. da Rel. do Porto de 4/11/13, in www.dgsi.pt, “o CIRE não consagra qualquer proibição de se apresentar um plano de insolvência, após o trânsito em julgado da decisão de não aprovação de um anterior. Não existe qualquer norma que impeça os credores de, ao longo do processo, apresentar uma proposta de plano de insolvência, desde que de conteúdo e estrutura diferentes daquela que anteriormente não foi aprovada.
Só que no caso, após o trânsito em julgado da decisão de não homologação o recorrente veio solicitar novo prazo – um mês depois do trânsito em julgado – para poder apresentar novo plano.
De acordo com o disposto no artigo 156º do CIRE cessa a suspensão – da liquidação – determinada pela assembleia se o plano apresentado não for subsequentemente admitido, aprovado ou homologado.
Como escrevem Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, in CIRE anotado, pag. 527 “ a celeridade processual constitui assumidamente, um dos grandes desígnios do CIRE e um motor da regulamentação da insolvência. Intenta-se banir todos os expedientes dilatórios e, bem assim, excluir procedimentos que obstaculizem a eficaz prossecução da finalidade do processo, traduzida na satisfação dos interesses dos credores”
E é nesse contexto que se entende o regime fixado no n.º 4 que deve considerar-se imperativo e consequentemente subtraído à vontade dos próprios credores.
E como dizem os referidos autores é de concluir pelo automatismo da cessação, ficando então o administrador da insolvência imediatamente reinvestido nos poderes de liquidação, devendo iniciar o cumprimento do artigo 158º.
Por isso, e como se diz na decisão recorrida, tal determina de imediato a transição para a fase de liquidação. De outro modo, a aceitar-se a visão do recorrente, poder-se-ia eternizar a suspensão da liquidação.

III - Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.

Guimarães, 14 de Maio de 2015,
Conceição Bucho
Maria Luísa Ramos
Raquel Rego