Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | CONCEIÇÃO BUCHO | ||
Descritores: | INSOLVÊNCIA RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS VERIFICAÇÃO DE CRÉDITOS ACÇÃO DECLARATIVA | ||
Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 09/12/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | JULGADA IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | I - O credor que tenha o direito de crédito reconhecido por decisão definitiva tem de o reclamar no processo de insolvência a fim de, querendo, nele obter pagamento, e dentro do prazo fixado na sentença declaratória de insolvência, artigo 128º do CIRE. II - Passado o prazo aludido naquele apontado normativo ainda há lugar a verificação de outros créditos e através de acção declarativa a propor contra a massa insolvente, os credores e o devedor nos termos do artigo 146º, nº 1, do CIRE III - A massa insolvente abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência e destina-se ao pagamento, em primeiro lugar das dívidas da massa e, depois, das dívidas da insolvência (vd. art. 46.º do CIRE). | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães. I – B…, Lda., instaurou acção declarativa de condenação, sob a forma sumária, contra C…, S.A. (antes denominada C…, Lda.), pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 8.910,97, sendo o montante de € 6.245,52 a título de capital, e o de € 2.665,45 a título de juros de mora vencidos. Alegou em síntese que a ré, ainda enquanto sociedade por quotas, foi declarada insolvente por sentença datada de 6 do Junho de 2007, embora se tenha mantido em actividade na sequência da aprovação de um plano de recuperação que o permitiu, após esta data, em regime de subempreitada, a autora prestar à ré, a seu pedido, diversos serviços, em mais do que uma obra, fornecendo os materiais para o efeito necessários. Entre outros, forneceu-lhe e aplicou os materiais constantes da factura nº 1275, de 19-06-2007, concretamente 780,69 metros de telas duplas ao preço unitário de 8,00 €, por metro, num total de € 6.245,52. Refere que os serviços foram prestados e o material foi aplicado numa obra que a ré trazia em execução no edifício da Câmara Municipal de Fafe. Após, emitiu a factura respectiva e entregou-a à ré, para pagamento, como sucedia até então, no prazo de 30 dias após a emissão da factura. Contudo, alega que, apesar de sucessivamente interpelada para proceder ao pagamento da quantia referida, inicialmente na pessoa do administrador da insolvência e, depois, na própria ré, até à presente data não o fez. Notificada para contestar ré veio fazê-lo a fls. 14 e segs. dos autos, invocando além do mais que a factura junta pela autora tem data de emissão de 19.06.2007, reportando-se os trabalhos ali referidos a Maio de 2007, ou seja, a data anterior à publicação da declaração de insolvência da ré, o que aconteceu em 26 de Junho de 2007. Conclui que o crédito é pois relativo à ré enquanto insolvente e não à massa insolvente per se. Deveria a ré reclamar tal crédito no âmbito da insolvência, o que fez conforme reclamação de créditos apresentada em 09.07.2007, e veio a ser reconhecido pelo Sr. Administrador de Insolvência. Afinal pugna pela improcedência da acção. Os autos prosseguiram e foi proferida decisão nos seguintes termos: Pelo exposto e sem necessidade de mais considerações, na presente acção declarativa de condenação em que é autora “B…, Lda.” e ré “C…, S.A.”, julga-se verificada a existência de uma excepção dilatória inominada, e em consequência, absolve-se a ré da instância. Inconformada a autora interpôs recurso, cujas alegações terminam com as seguintes conclusões: 1º- Discorda a Recorrente da decisão proferida pelo Tribunal a quo, tanto no que concerne à matéria de facto, como à aplicação do Direito. 2º- Sob o ponto “5” da matéria assente, é dado como provado que a sentença homologatória do plano de insolvência não transitou em julgado, por força da interposição de recurso. 3º- Acontece que, ao invés do que apontam os documentos a que se reporta o Tribunal a quo, datados de 2007, a referida decisão transitou em julgado em 26/05/2008 – Cfr. Publicação on-line de acto societário de 2008-07-25 in www.publicacoes.mj.pt – o que determinou o encerramento do processo, nos termos do artigo 230º, n.º 1, al. b) do CIRE. 4º- Posto isto, salvo melhor entendimento, a questão a decidir prende-se, tão-só, em saber se o crédito em que assenta a pretensão da Recorrente teve origem antes ou depois da declaração de insolvência da Recorrida. 5º- E sobre isso não foi feita qualquer prova ou obtido acordo. 6º- Não pode o Tribunal a quo, partindo do facto de ter existido uma reclamação de créditos, no âmbito da insolvência – que, por lapso do Mandatário, contemplou o crédito em crise –, deduzir que o crédito da Recorrente é um crédito sobre a insolvência, e assentar toda a sua decisão neste falso pressuposto. 7º- A acção não foi interposta na pendência ou antes do início do processo de insolvência, pelo que a decisão a proferir – acerca da pretensão da Recorrente em ver reconhecido um direito de crédito sobre a Recorrida e a correspondente condenação desta no cumprimento da obrigação contraposta –, está subtraída a aplicação de qualquer norma do CIRE, mesmo que de cariz estritamente processual. 8º- Nos presentes autos, não há que estabelecer qualquer relação com o processo de insolvência já findo, à data da propositura da acção. 9º- Com efeito, não se verifica a existência de qualquer excepção dilatória que impeça o Tribunal a quo de se vir a pronunciar sobre o mérito da causa. 10º- Ao decidir no sentido em que decidiu, o Tribunal a quo violou as normas previstas nos artigos 288º, n.º 1, al. e), 493º, n.º 2, 510º, n.º 1, al. a), 655º e 659, nº 3 do Código do Processo Civil. A recorrida apresentou contra-alegações que constam dos autos a fls. 189 a 195, e nas quais pugna pela manutenção do decidido Colhidos os vistos, cumpre decidir. II – É pelas conclusões do recurso que se refere e delimita o objecto do mesmo, ressalvadas aquelas questões que sejam do conhecimento oficioso – artigos 684º, e 685-A do Código de Processo Civil -. Em 1ª instância foi dada como provada a seguinte matéria de facto: 1- A ré, antes denominada C…, Lda. foi declarada insolvente, no âmbito do processo nº2084/07.1TBGMR, que correu termos pelo 2º Juízo Cível do Tribunal de Guimarães, por sentença de 06 de Junho de 2007 – doc. de fls. 18; 2- No âmbito desse processo, a autora reclamou o seu crédito no montante global de € 152.249,83 – cfr. fls. 20 e segs.; 3- (…) onde se mostra englobada a factura com o nº1275, datada de 19 de Junho de 2007, no montante de € 6.245,52 – cfr. fls. 22 e fls. 51; 4- O Administrador de Insolvência apresentou, ao abrigo do disposto no artigo 129º, do CIRE, relação dos créditos por si reconhecidos, onde consta além do mais, o crédito reclamado pela aqui requerente, sob o número 132 – cfr. 69 e segs.; 5- Em 20.11.2007 foi proferida sentença de homologação de plano de insolvência, a qual não transitou em julgado por ter sido interposto recurso – cfr. fls. 98 e fls. 156. ** O artigo 88º do CIRE, na 1ª parte do seu nº 1, dispõe que “A declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência”. O credor que tenha o direito de crédito reconhecido por decisão definitiva tem de o reclamar no processo de insolvência a fim de, querendo, nele obter pagamento, e dentro do prazo fixado na sentença declaratória de insolvência, artigo 128º do CIRE. Passado o prazo aludido naquele apontado normativo ainda há lugar a verificação de outros créditos e através de acção declarativa a propor contra a massa insolvente, os credores e o devedor nos termos do artigo 146º, nº 1, do CIRE A massa de insolvência abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência e destina-se ao pagamento, em primeiro lugar das dívidas da massa e, depois, das dívidas da insolvência (vd. art. 46º do CIRE). As dívidas da insolvência são as que têm fundamento anterior à data da declaração de insolvência (artigo 47º do CIRE). Àquelas referem-se, entre outros, e como já se referiu, os artigos 88º e 90º do CIRE. Dívidas da massa são designadamente as resultantes da actuação do administrador da insolvência no exercício das suas funções (artigo 51º do CIRE). A estas refere-se, designadamente, o artigo 89º, nºs 1 e 2, do CIRE. Nos termos do art.º 146, nº 1, al.ª b) do CIRE, a acção destinada à verificação de crédito sobre a massa que seja interposta para além do prazo das reclamações - a chamada verificação ulterior - pode ser exercida no prazo de um ano subsequente ao trânsito em julgado da sentença de declaração de insolvência ou no prazo dos três meses seguintes à respectiva constituição, caso termine posteriormente. No caso dos autos, a recorrente reclamou no processo de insolvência o crédito peticionado, que foi reconhecido e graduado. Nesta acção veio alegar que, afinal o crédito advém de serviços que prestou à ré, posteriores à declaração de insolvência. Ora, como é alegado pela própria recorrente a factura diz respeito a trabalhos que a recorrida tinha em execução: como também consta dos autos a factura tem a data de 19/6/07. A sentença de declaração de insolvência está datada de 6/6/07 e foi publicada no diário da República de 26/06/07. Assim sendo o crédito agora peticionado diz respeito à massa de insolvência que abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência - 26/06/07. Esse crédito terá pois, que ser pago de acordo com o plano que consta dos autos de insolvência, que foi homologado em 20/11/07. Por outro lado, o CIRE expressamente consagra a possibilidade de prosseguimento das execuções pendentes contra o insolvente, após o encerramento do processo. Este é declarado pelo juiz, nos termos do art. 230º, quando se verifique alguma das situações previstas nas suas alíneas (realização do rateio final; após o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de insolvência, a pedido do devedor, quando deixe de estar em situação de insolvência ou quando todos os credores prestem o seu consentimento e quando o administrador constate a insuficiência da massa insolvente para satisfazer as custas do processo as restantes dividas da massa insolvente). Assim o artigo 233º, n.º 1, al. c) prevê como um dos efeitos do encerramento do processo de insolvência que os credores recuperam a possibilidade de fazer seguir acções executivas e instaurar novas execuções, com as restrições constantes do eventual plano de insolvência e plano de pagamento (cf. neste sentido Menezes Leitão, CIRE Anotado, pág.129). Ora, não é o caso dos autos, nem está alegada na petição qualquer das circunstâncias previstas neste artigo. Improcede, deste modo, o recurso. Em síntese: O credor que tenha o direito de crédito reconhecido por decisão definitiva tem de o reclamar no processo de insolvência a fim de, querendo, nele obter pagamento, e dentro do prazo fixado na sentença declaratória de insolvência, artigo 128º do CIRE. Passado o prazo aludido naquele apontado normativo ainda há lugar a verificação de outros créditos e através de acção declarativa a propor contra a massa insolvente, os credores e o devedor nos termos do artigo 146º, nº 1, do CIRE A massa de insolvência abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência e destina-se ao pagamento, em primeiro lugar das dívidas da massa e, depois, das dívidas da insolvência (vd. art. 46º do CIRE). ** III - Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirma a sentença recorrida. Custas pela recorrente. Guimarães, 12 de Setembro de 2013 Conceição Bucho Antero Veiga Maria Luísa Ramos |