Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
751/03.8TBGMR-C.G1
Relator: MANUELA FIALHO
Descritores: FUNDO DE GARANTIA DE ALIMENTOS A MENORES
DESPACHO
FUNDAMENTAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/29/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Sumário: Ao despacho de manutenção da prestação social de alimentos a menor, proferido na sequência do disposto no Artº 9º/4 do DL 164/99 de 13/05, não se aplicam as exigências de fundamentação constantes do Artº 158º/1 do CPC.
Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL interpôs recurso do despacho que renovou anterior despacho.
Pede a sua revogação, com substituição por outra.
Formula as seguintes conclusões:
• O Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS) foi condenado a pagar, em substituição dos devedores, uma prestação mensal aos guardiões do menor, L….
• Esta decisão parece ter preterido a aplicação das alterações introduzidas aos diplomas que regulamentam o FGADM, isto é, ao DL n." 164/99, de 11 de Maio, alterado pela Lei n." 64/2012, de 20 de Dezembro, e à Lei n." 75/98, de 19 de Novembro, alterada pela Lei n." 66-B/2012, de 31 de Dezembro, aplicáveis à data em que foi proferida.
• O valor de referência a ter em conta para efeitos de comparação com o rendimento per capita do agregado familiar do menor, deixou de ser o salário mínimo nacional, sendo substituído pelo valor do indexante dos apoios sociais (IAS) vigente nessa data.
• A decisão «a quo» não faz qualquer menção à composição e aos rendimentos anuais do agregado familiar em que se encontra inserido o menor.
• A douta decisão recorrida violou o disposto nos artigos 158.°, n.os 1 e 2, e 668.° n.? 1, alínea b), ambos do CPC, por falta insuprível de fundamentação.
O MINISTÉRIO PÚBLICO contra-alegou, concluindo que o despacho recorrido fez correcta apreciação da matéria de facto e uma correcta aplicação do direito, pelo que é infundado o recurso interposto.
A Sr.ª Juíza pronunciou-se sobre a invocada nulidade, repudiando-a.
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Das conclusões acima exaradas que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso, extrai-se uma única questão a decidir: a decisão violou o disposto nos Artº 158º/1 e 2 e 668º/1-b) do CPC?
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É o seguinte o teor do despacho recorrido:
“Renovo o despacho de fls. 246/247, ante o teor dos documentos de fls. 278, demonstrativos da manutenção da situação de carência económica do agregado familiar onde se encontra inserido o menor (com uma capitação inferior ao salário mínimo nacional) e as informações de fls. 286, demonstrativos da insusceptibilidade de recurso ao mecanismo previsto no Artº 189º da OTM.”

Por sua vez, a fls. 246 consta:
“Por decisão datada de 01.04.2008, a fls. 124ss, já transitada, foi determinado que o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores pagasse a quantia de C150 ao menor L… em substituição dos seus progenitores (€75 por cada progenitor), por impossibilidade destes em cumprir a obrigação de prestação de alimentos que sobre si recaía.
O FGA encontra-se a pagar a prestação de alimentos substitutiva.
A fls. 225 vieram os legais guardiães do menor informar manterem-se os pressupostos que subjazeram à tomada da decisão de fls. 124ss.
Cumpre decidir nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 3.º/6 L 75198, de 19.11 (LGADM) e 9.º/4 e 5 DL 164/99, de 13.05.
Prescreve o art. 1. º LGADM que "Quando a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos a menor residente em território nacional não satisfizer as quantias em dívida pelas forma previstas no art, 189.º DL 314/78, de 27.10 [OTM], e o alimentando não tenha rendimento líquido superior ao salário mínimo nacional nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, o Estado assegura as prestações previstas na presente lei até ao início do efectivo cumprimento da obrigação.", esclarecendo o art. 3.º/3 DL 164/99, de 13.05 (que regulamenta a LGADM) que 'Entende-se que o alimentando não beneficia de rendimentos de outrém a cuja guarda se encontre, superiores ao salário mínimo nacional, quando a capitação de rendimentos do respectivo agregado familiar não seja superior àquele salário”.
Por seu turno, estipula o art. 2.º/2 DL 164/99,de 13.05, que "Compete ao Fundo [o Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores - dr. art. 2.º/1 DL 164/99] assegurar o pagamento das prestações de alimentos atribuídas a menores residentes em território nacional, nos termo dos arts. 1.º e 2.º da L 75/98, de 19.11", acrescentando o n. º 3 que "O pagamento das prestações referidas no n.º anterior é efectuado pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, na qualidade de gestor do Fundo, por ordem do tribunal competente, através dos centros regionais de segurança social da área de residência do alimentando [sublinhado meu]”.
Do manancial probatório carreado para os autos, nomeadamente dos documentos de fis. 240 e 243ss resulta que se mantém, efectivamente, a situação de carência económica do agregado familiar onde se encontra inserido o menor L… e de fls. 238 e 239 que se mantém inalterada a (in) capacidade dos progenitores em prestar alimentos.
Mantendo-se os condicionalismos que subjazeram à tomada da decisão de tis. 75ss decido, ao abrigo dos referidos arts. 3.º/6 L 75198, de 19.11 (LGADM) e 9.º/4 e 5 DL 164/99, de 13.05, manter a prestação de alimentos ao menor que actualmente impende sobre o FGADM.”

Paralelamente importa salientar que, por sentença proferida em 1/04/2008, se determinou que o Fundo procedesse ao pagamento, em substituição da progenitora, e a título de alimentos ao menor, da quantia de 150,00€.
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Delimitado o objecto do recurso pelas respectivas conclusões, detenhamo-nos, então, sobre a invocada nulidade por falta insuprível de fundamentação.
O Artº 668º/1-b) do CPC dispõe que é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
Esta disposição aplica-se, até onde for possível, aos próprios despachos (Artº 666º/3 do CPC).
Por sua vez, o Artº 158º/1 do CPC contém o fundamento para aquela nulidade – as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas.
Do exposto, podemos desde já concluir que o especial dever de fundamentação existe em presença de controvérsia processual.
No caso, não há notícia de que o despacho recorrido tenha sido proferido na sequência de alguma intervenção de parte que suscitasse alguma concreta questão.
E aqui reside o cerne da questão.
É que, tendo o montante a prestar pelo Fundo sido determinado por sentença, o mesmo mantém-se enquanto se verificarem as circunstâncias subjacentes á sua concessão e até que cesse a obrigação a que o devedor está obrigado (Artº 3º/4 da Lei 75/98 de 19/11 e Artº 9º do DL 164/99 de 13/05).
Não se está, pois, no momento, a decidir atribuir uma determinada prestação, mas tão só a verificar da manutenção da mesma, com base na renovação anual de prova estipulada pelo nº 4 do Artº 9º acima citado que, aliás, na leitura que fazemos do regulamento da garantia de alimentos devidos a menor nem sequer carece de decisão. Trata-se de uma formalidade de controle jurisdicional que visa aquilatar da eventual cessação ou alteração da prestação social, circunstâncias que, essas sim, carecem de adequada fundamentação e, por força do princípio do pedido, de concretização de pretensão para o efeito.
Donde, este não é um despacho ao qual se apliquem as normas relativas à nulidade da sentença por omissão de fundamentação, visto que estas só se aplicam até onde for possível.
Por fim, e não obstante, não podemos deixar de sublinhar que o despacho recorrido nem sequer pode ser acusado de omitir fundamentação, na medida em que opera as remissões de que demos conta.
A tudo acresce que o Recrte. peticiona a revogação da decisão, com substituição por outra, sem sequer especificar o que, a final, pretende.
E se, em presença dos elementos de prova a que teve acesso, entendia dever reclamar por algo – designadamente a alteração ou a cessação da prestação –, deveria ter adoptado no processo a conduta processual correspondente.
Improcede, deste modo, a questão que nos ocupa.
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Em conformidade com o exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmar o despacho recorrido.
Custas pelo Recrte..
Notifique.
Manuela Fialho
Edgar Valente
Paulo Barreto