Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
204/14.9T8PTL-A.G1
Relator: FRANCISCA MICAELA
Descritores: NOTIFICAÇÃO
INJUNÇÃO
NULIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/11/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: A notificação na injunção efectuada apenas por via postal simples (carta registada) com prova de depósito, sem mais e qualquer adicional formalidade, é nula.
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes da 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães:
I – RELATÓRIO
Por apenso à execução para pagamento de quantia certa nº 204/14.9T8PTL, na qual foi apresentado, como título executivo, um requerimento de injunção no qual foi aposta fórmula executória, que lhe moveu C…, SA, veio a executada F… intentar os presentes embargos de executado.
Alega o embargante, como fundamento para a oposição, a falta de notificação da injunção, a prescrição da dívida, de que não contraiu a dívida em causa, sendo-lhe estranha.
Ao mesmo tempo deduziu posição à penhora.
A exequente contestou os embargos pugnando pela improcedência dos mesmos e pela improcedência da oposição à penhora.
Findos os articulados foi proferido saneador-sentença em 22-05-2015, pela qual, foi julgada não verificada a nulidade da citação no procedimento de injunção e foram julgados improcedentes os embargos de executado bem como a oposição à penhora.
A executada não se conformou com o despacho e interpôs recurso de apelação terminando com as seguintes Conclusões:
1-A Oponente apresentou a sua Oposição, tendo afirmado que não correspondia à verdade o alegado pela Exequente.
2 - Na verdade, a ora Oponente não fora notificada da injunção, a dívida estará prescrita e a mesma Oponente nada deve à Exequente.
3 - Por outro lado, ao ora Oponente fora vedada a possibilidade do exercício pleno do contraditório e da sua defesa, designadamente a prescrição do peticionado, por se encontrar em fase executiva com base na injunção em causa.
4- Acresce a inconstitucionalidade invocada, porquanto "Nos termos expostos, o Tribunal Constitucional declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 814.°, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), na redacção do Decreto-lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro, quando interpretada no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de injunção à qual foi aposta a fórmula executória, por violação do princípio da proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.°, nº 1, da Constituição".
5 - Na verdade, "foi emitida douta decisão do Tribunal Constitucional - tirada com força obrigatória geral - que veio a declarar tudo isso inconstitucional, isto é, que, ao contrário do que dizia a lei, é ainda possível invocar outros fundamentos de oposição à execução que poderiam ter sido já aduzidos na fase declaratória, mesmo que a execução esteja baseada em requerimento de injunção a que tenha sido aposta fórmula executória.
6- Trata-se do douto Acórdão nº 388/2013, do Tribunal Constitucional, de 9 de Julho de 2013, tirado no seu processo nº 185/13, e publicado na 1ª Série do Diário da República n.? 184, de 24 de Setembro de 2013.
7 - Assim sendo, os fundamentos da oposição apresentada pela ora Recorrente, ainda que devessem ter sido invocados na fase declaratória, também na presente oposição poderão ser invocados, o que foram rejeitados com base na inconstitucionalidade referida e que se invoca para os devidos e legais efeitos.
8 - Está assim, pois, verificado o circunstancialismo que deve levar à procedência do presente Recurso.
9 - Com o devido respeito, entende o ora Recorrente que o Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento.
SEM PRESCINDIR,
10 - A despeito da Injunção em causa poder enfermar da excepção da ineptidão da causa de pedir, alegando factos que obstavam à apreciação do mérito da acção, nomeadamente a excepção de ineptidão da petição inicial, devido à falta de indicação da causa de pedir, nos termos do artigo 193°, nº 2, aI. a) do Código de Processo Civil;
11 - O Tribunal "a quo" deixou de se pronunciar sobre uma questão que devia apreciar, sendo que tal omissão determina a nulidade da sentença, nos termos do artigo 668°, nº 1, d), do CPC, uma vez não estão devidamente circunscritos os factos alegados pela A. e o Oponente contestou, cuja pronúncia se omitiu.
12 - Assim, outra não pode ser a ilação a retirar do que a efectiva falta da causa de pedir;
13 - No sistema jurídico processual português, vigora o princípio do dispositivo, pelo que é ao autor, que invoca a titularidade de um determinado direito, que cabe fazer a alegação dos factos de cuja prova seja possível concluir pela existência desse direito (artigo 264° do C.P.C.); ao ora Recorrente ter-Ihe-á sido vedado esse direito.
14 - Desta forma, foi violado um dos princípios basilares do sistema judicial português: o principio do contraditório, pois o R. viu-se impedido de exercer o seu direito de defesa.
15 - Tratou-se de uma decisão sem que lhe tenha sido dada oportunidade de se defender cabalmente em relação a ela, em clara violação, além do mais, do disposto nos artigos 3°, n?º3, e n.3° -A do CPC;
16 - A falta da causa de pedir determina a ineptidão da petição inicial, conforme o art. 193°, n.º 2, alínea a), do C.P.C., que por sua vez, determina a nulidade de todo o processo, nos termos do art. 193°, n? 1, do C.P.C., e esta nulidade, consubstancia, uma excepção dilatória, prevista no art. 494°, b), do C.P.C.;
17 - Decorrendo do art. 660°, nº 1, do C.P.C a necessidade de conhecimento prioritário em sentença das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, sem prejuízo, embora, do disposto no n.º 3 do art. 288° do C.P.C.;
18 - A procedência da excepção dilatória na oposição pela R. dá lugar à absolvição da instância, nos termos do art. 288°, nº 1, alínea e);
19 - A falta da causa de pedir não foi, nem podia ser, sanada, nem se pode considerar aplicável o nº3 do art. 288° do C.P .C. ao caso concreto, por não ter sido a decisão favorável à Exequente;
20 - A vinculação do tribunal "a quo" à resolução de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, decorre, mais não seja, do art. 660.°, nº 2, do C.P.C.;
21 - Pelo que deve a sentença ser considerada nula por omissão de pronúncia sobre questões que deviam ser apreciadas pelo Sr. Dr. Juiz, nos termos do art. 668°, nº 1, alínea d), do C.P.C
Sem prescindir ainda,
22 - Acresce ainda que as inconstitucionalidades são expressas e se invocam e requerem para os devidos efeitos legais:
22- Em suma: o Tribunal recorrido ao dar por provados os pontos da matéria de facto supra transcritos, incorreu em erro de julgamento.
23. Pelo exposto, o Tribunal "a quo" terá violado o disposto no artigo 32.°, nºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente o princípio das garantias de defesa, da igualdade de oportunidades, consagrados no artigo 32°, nºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa.
24. Poderão ter sido violados pela sentença recorrida o Princípio do Estado de Direito Democrático (artigos 2° ego, alínea b), ambos da CRP); Princípio do Acesso ao Direito e da Tutela Jurisdicional Efectiva (artigo 20° da CRP); o Princípio da Igualdade (artº 13° da CRP), O Princípio da Força Jurídica dos Preceitos Constitucionais e da Inadmissibilidade de Restrições aos Direitos, Liberdades e Garantias (artº 18° da CRP) e Direito à protecção e efectivação da família (artigo 67° da CRP); Princípio da Função Jurisdicional (artigo 202° da CRP), da Justiça e da Fundamentação dos actos judiciais, consagrado no artigo 205°, nº 1, da Constituição.
25. Por um lado, todas estas questões de inconstitucionalidade material constituem a base fundamental do inconformismo do recorrente oponente, e, depois, com as decisões jurisdicionais que se lhe seguiram,
26. Por outro lado, também por violação do disposto e que são as que constam no n? 2 do artigo 18°, no nº2 do artigo 26°, no nº 2 do artigo 36° e em especial dos nºs 1 e 2 do artigo 67°, todos da Constituição da República Portuguesa.
27. De facto, nunca poderia o recorrente oponente conformar-se com a eventual ilegalidade de qualquer decisão (jurlsdlcional ou administrativa) que, também por omissão, violasse as normas ou os princípios constitucionais vigentes, por não cumprir e completar a formulação do Princípio da Igualdade e da Família.
28. Discorramos então sobre o incumprimento do artigo 412°, nOs 3, alínea b) e 4, do CPC, que segundo o acórdão e a sentença, foram concretamente incumpridos pelo Recorrente oponente;
29. Sem Prescindir, entende a ora Oponente que a sentença recorrida terá, incorrido em vício de nulidade, que expressamente se argui.
30. Sempre sem prescindir de tudo o que foi explanado, o Vício de Inconstitucionalidade :a decisão recorrida enferma de vício de inconstitucionalidade, de tipo material, por desconformidade e violação concreta das normas e Princípios Constitucionais supra expostos.
31.Assim também o caso "sub judice" deverá ser avaliado, julgado e decidido, atenta a avaliação dos factos apresentados pelo ora Oponente.
32. Como tal, a decisão final do presente pleito é extremamente injusta e gravosa para o ora Recorrente.
33.Face ao expendido, pede-se que se julgue procedente a apelação e se declare nula a sentença recorrida por ineptidão de omissão de pronúncia sobre questões que deviam ser apreciadas, nos termos do art.° 668.°, nº1, alínea d), do C.P.C., alterando a sentença recorrida em ordem ao prosseguimento da respectiva oposição, com procedência da mesma”
Conclui pela revogação da sentença recorrida.
Não foram apresentadas contra – alegações.
O recurso foi recebido como de apelação, com subida imediata e com efeito meramente devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Cód. Processo Civil.
Porque assim, atendendo às conclusões das alegações recursórias apresentadas pela apelante, são as seguintes as QUESTÕES A DECIDIR:
1-Apreciar e decidir se na oposição à execução instaurada com base em requerimento de injunção à qual foi aposta a fórmula executória, existe limitação dos fundamentos de oposição.
2-Em caso negativo, apreciar e decidir se se verifica nulidade da notificação efectuada à recorrente/ oponente no procedimento de requerimento de injunção.
III – FUNDAMENTAÇÃO
3.1
Considerando o teor das alegações e das conclusões recursórias verificamos que está colocada neste recurso a seguinte questão: apreciar e decidir se na oposição à execução instaurada com base em requerimento de injunção à qual foi aposta a fórmula executória, existe limitação dos fundamentos de oposição, sendo certo que a Mma Juiz, acolheu o entendimento (passamos a citar) “ de que, no pressuposto da validade da citação para os termos da injunção, o requerido tem todas as possibilidades de se opor ao requerimento injuntivo, não havendo razões para que, perante a sua inércia ou decisão de não contestar lhe venha a ser atribuída, em sede de oposição à execução uma nova oportunidade de alegar "os fundamentos que possam ser invocados como defesa no processo de declaração”.
Afirmou também que a prescrição invocada não se enquadra na al. g) do artigo 729.° do CPC uma vez que se reporta a momento anterior em que foi conferida força executiva ao requerimento da injunção .
Nessa medida, afirmou que o artº 857.° do CPC, não padece de qualquer vício de inconstitucionalidade, não existindo qualquer fundamento para afastar a sua aplicação aos presentes autos.
Concluiu que o fundamento alegado pelo embargante não se subsume ao disposto nos art. 857.° n.º e 729.° do CPC e julgou improcedentes os embargos por falta de fundamento legal.
3.2 - São estes os factos a atender para a apreciação e decisão do presente recurso, com base nos elementos constantes dos autos e na posição da embargada vertida na contestação:
1-Cerdilima- Produtos Alimentares, SA instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa no valor de 8.127,71 €que corre termos com o nº 204/14.9T8PTL-A, contra a ora apelante, com fundamento num requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executória e que correu termos no processo de Injunção nº 48001/14.3YIPRT.
2-O processo onde correu o requerimento de injunção a que alude o nº1, foi remetido a este Tribunal e aí consta um documento epigrafado “ Requerimento de Injunção”, que aqui se dá por integralmente reproduzido e onde nomeadamente se lê:
“Requerida: ora oponente … domicílio convencionado? Sim.
Domicílio: Largo Sr dos Aflitos, nº184-Freixo, 4820-493, Ponte de Lima.
Exposição dos factos que fundamentam a pretensão:
A requerente desenvolve a actividade comercial de distribuição e fornecimento de produtos alimentares para revenda, designadamente, produtos de marcas fabricados e comercializadas pela empresa que gira sob a firma Unicer.
A requerida é proprietária de um estabelecimento de venda ao público de produtos alimentares, restauração e bebidas.
No exercício da sua atividade comercial, a requerente a pedido da requerida, forneceu para o estabelecimento deste, diversos artigos de bebidas designadamente, cerveja de marca "Super Bock", Cachaça Pirassununga, Compal Garrafa, Licor Tia Maria, Vodka Artic Morango, Aguardente Ponte Amarante, entre outros artigos melhor descritos na factura nº 101003946 de 26/08/2010, no total de 4685,91€, quantia essa que a requerida deve à requerente.
A requerente, para além do referido valor, também tem direito a receber juros de mora à taxa legal de 8% que vigorou desde 01/07/2009 a 30/06/2011, de 8,25% que vigorou entre 01/07/2011 a 31/12/2011, de 8% que vigorou entre 01/01/2012 e 31/12/2012, de 7,75%, que vigorou desde 01/01/2013 a 30/06/2013 de 7,5% que vigorou desde 01/07/2013 a 31/12/2013 e de 7,25% que vigora desde 01/01/2014 até à presente data, contados desde a data de vencimento da factura até efectivo pagamento, visto tratar-se de transacções entre comerciantes e no exercício da sua actividade comercial, juros esses que por ora já se computam em 1338,48€.
Pelo que, neste momento, o requerido deve à requerente a quantia de 6024,39€.
A referida factura, não obstante se ter vencido na referida data de emissão, ainda não foi paga pela requerida.
Por diversas vezes interpelada pela requerente, a requerida reconheceu a dívida e prometeu pagar, o certo é que não o fez até esta data.
Daí o recurso à presente injunção.”
3- A fls 25 dos presentes autos, encontra-se uma informação do Balcão Nacional de Injunções, a qual, se dá por integralmente reproduzida e onde se lê que o processo apenas existe na forma digital, tendo sido anexadas cópia da notificação enviada à ora oponente para o domicilio referido.
4- A notificação da ora oponente do requerimento de injunção foi enviada através de notificação via postal simples, com prova de depósito feita a 29-04-2014.
5- Não foi dado cumprimento ao art. 233º do CPC.
6 – Nem no procedimento da injunção nem nestes autos foi junto qualquer contrato escrito assinado pelas partes para o efeito de o eventual devedor ser procurado pelo credor ou por algum órgão judicial ou administrativo com vista ao cumprimento das obrigações dele decorrentes.
7- Não só não há contrato escrito como muito menos há convenção de domicílio.
3.3 - Fundamentação de Direito.
3.3.1.
A decisão recorrida, afirmou que o artigo o artº 857.° do CPC, não padece de qualquer vício de inconstitucionalidade, não existindo qualquer fundamento para afastar a sua aplicação aos presentes autos e concluiu que o fundamento alegado pelo embargante não se subsume ao disposto nos art. 857.° n.º1 e 729.° do CPC, julgando improcedentes os embargos por falta de fundamento legal.
E esse entendimento foi desenvolvido tendo por referência o Acórdão nº 388/2013, do Tribunal Constitucional, que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 814.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, na redação do Decreto-Lei 226/2008, de 20 de novembro, quando interpretada no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de injunção à qual foi aposta a fórmula executória.
Todavia, resulta da sentença recorrida, que o Mmo Juiz da 1ª instância, a montante, pronunciou-se sobre a arguida nulidade traduzida na falta de notificação da injunção no procedimento de injunção, tendo, de seguida afirmado que os restantes fundamentos alegados pela embargante (prescrição e não existência da dívida) não se subsumiam ao disposto nos art. 857.° n.º e 729.° do CPC).
Ora, resulta para nós que existe uma contradição no raciocínio desenvolvido na sentença, porquanto, determinante para o sentido desta, foi também o facto de o tribunal a quo ter considerado que não houve notificação da requerida, ora recorrente, traduzindo tal situação hipótese equiparável à falta de citação, hipótese subsumível à previsão do artigo 729.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Civil.
Procedendo a oposição à execução também com este fundamento, resulta que, in casu, a afirmada limitação operada no artigo 857.º aos meios de defesa oponíveis pelo executado em caso de execução baseada em requerimento de injunção - limitação essa circunscrita aos fundamentos de embargos previstos, precisamente, no artigo 729.º - não terá produzido quaisquer efeitos nos autos.
Isto porque, não obstante a afirmação dessa limitação o tribunal de primeira instância conheceu da alegada falta de citação da requerida, ora recorrente.
3.3.2.
Feitas estas considerações, importa desde já referir que, a nosso ver, a decisão recorrida não pode ser confirmada.
Assim, porque o presente recurso acaba por ter por objeto o artigo 857.º, n.º 1, do Código de Processo Civil vigente, aprovado pela Lei 41/2013, de 26 de Junho, quando interpretado no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de injunção à qual foi aposta a fórmula executória, urge referir que a sentença recorrida acaba por não atender às decisões recentes do Tribunal Constitucional quanto à norma em causa.
Com efeito, a sentença recorrida, acolheu entendimento diverso daquele que foi acolhido no Acórdão nº 388/2013, do Tribunal Constitucional, que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 814.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, na redação do Decreto-Lei 226/2008, de 20 de novembro, quando interpretada no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de injunção à qual foi aposta a fórmula executória
E, por conseguinte, divergiu do entendimento acolhido recentemente no Acórdão do Tribunal Constitucional 264/2015 de 8 de Junho de 2015, publicado no Diário da República, 1.ª série –nº110, de 8 de Junho de 2015, que “decide -se declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 857.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, quando interpretada “no sentido de limitar os fundamentos de oposição à execução instaurada com base em requerimentos de injunção à qual foi aposta a fórmula executória”, por violação do princípio da proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.
Com efeito, o artigo 857.º reproduz, no essencial, aquela que já era a doutrina do artigo 814.º do CPC antigo e que foi declarada inconstitucional por sucessivos acórdãos, nomeadamente pelos acórdãos 468/2012 e 529/2012 e pelas Decisões Sumárias n.os 490/2012, 571/2012, 581/2012, 89/2013 e 112/2013, embora nem todos com a mesma fundamentação, e finalmente pelo acórdão 388/2013 que declara a inconstitucionalidade da norma com força obrigatória geral.
Nos referidos Acórdãos do Tribunal Constitucional. – disponíveis, assim como os demais adiante citados em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ - entendeu o Tribunal, que a equiparação entre a "sentença judicial" e o "requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória", enquanto títulos executivos, para efeitos de determinação dos possíveis fundamentos de oposição à execução, traduzia uma violação do princípio da proibição da indefesa, em virtude de restringir desproporcionadamente o direito de defesa do devedor em face do interesse do credor de obrigação pecuniária em obter um título executivo "de forma célere e simplificada". Em causa estava, por conseguinte, o problema de saber em que termos e com que alcance pode o desenvolvimento do procedimento de injunção - maxime o prévio confronto do executado com uma exigência institucional, formal e cominada à satisfação do crédito invocado e a sua inércia quanto à apresentação de defesa perante esse ataque - ser tido como aceitação - ou, pelo menos, como reconhecimento tácito da ausência de litígio - idóneo a repercutir-se, como valor negativo, na limitação dos meios de oposição à execução (cf. também o Acórdão 176/2013).
A aprovação do novo Código de Processo Civil pela Lei 41/2013, de 26 de Junho (doravante "NCPC") introduziu algumas alterações nesta matéria . É o seguinte o texto da nova lei:
Transcrevendo parte do citado Acórdão nº 264/2015 do Tribunal Constitucional , proferido no processo º 264/2015, e seguindo de perto o raciocínio aí vertido diremos o seguinte :
A regra continua a ser a da equiparação do requerimento de injunção a que tenha sido aposta fórmula executória à sentença judicial, para efeitos de determinação dos meios de defesa ao alcance do executado. É este o alcance que resulta da remissão operada pelo artigo 857.º, n.º 1, do NCPC para o artigo 729.º Verifica-se, no entanto, que os nºs 2 e 3 procedem ao alargamento de tais meios de defesa, atenuando, por essa via, o efeito preclusivo da defesa perante a execução.
Todavia, este alargamento não é suficiente para dar resposta aos fundamentos do juízo positivo de inconstitucionalidade relativo ao regime anterior - aquele que resultava do Decreto-Lei 269/98, de 1 de Setembro.
Com o regime de 2013, passa a estar prevista a possibilidade de alegar meios de defesa não supervenientes ao prazo para dedução de oposição no processo de execução em duas situações distintas: (i) em caso de justo impedimento à oposição (artigo 857.º, n.º 2); e (ii) quando existem exceções dilatórias ou perentórias de conhecimento oficioso (artigo 857.º, n.º 3).
Persiste, contudo, a regra da equiparação deste título executivo a título executivo judicial, com os efeitos preclusivos que a mesma acarreta ao nível dos meios de defesa ao alcance do executado. E, com igual importância para a análise desta questão, subsiste igualmente o mesmo regime em sede de injunção que conduziu aos juízos de censura que o Tribunal Constitucional formulou no passado a este propósito. Na verdade, o alargamento dos meios de defesa à falta de pressupostos processuais, à existência de exceções de conhecimento oficioso e a factos extintivos ou modificativos da obrigação exequenda, desde que supervenientes ao prazo para oposição não tem por efeito sanar as diferenças incontornáveis entre a execução baseada em injunção e a execução baseada em sentença. Tais diferenças fazem-se sentir no modo como ao devedor é dado conhecimento das pretensões do credor e, de outra banda, na probabilidade e grau de intervenção judicial no processo.
Assim, no tocante ao primeiro aspeto, enquanto que, tratando-se de sentença, o devedor é chamado à ação através de citação (artigo 219.º, n.º 1, do NCPC), no primeiro caso o requerimento de injunção é-lhe comunicado por via de notificação (artigos 12.º e 12.º-A do regime anexo ao Decreto-Lei 269/98, de 1 de setembro), sendo por conseguinte menores as garantias de cognoscibilidade do respetivo conteúdo.
Ora, como referido no Acórdão 529/2012, citado no Acórdão do TC nº 264/2015:
«Esta preclusão dos meios de defesa anteriores à aposição da fórmula executória consistirá num sibi imputet que é excessivo face ao regime de formação do título. O conteúdo da notificação a efetuar ao requerido no processo de injunção é legalmente determinado (artigo 13.º do Regime dos procedimentos a que se refere o artigo 1.º do Decreto-Lei 269/98, de 01 de setembro), importando notar que esta notificação provém da entidade a que passou a competir o processamento das injunções - o Balcão Nacional de Injunções - e dela não consta qualquer referência ou advertência de que a falta de oposição do requerido determinará o acertamento definitivo da pretensão do requerente de injunção. Essa notificação apenas não permite ao requerido ignorar que, na falta de oposição, será aposta a fórmula executória no requerimento de injunção, assim se facultando ao requerente da injunção a instauração de uma ação executiva. Perante o teor da notificação, o requerido fica ciente de que está sujeito a sofrer a execução, mas não necessariamente de que o âmbito da defesa contra a pretensão do exequente, se essa hipótese se concretizar, estará limitado pela preclusão dos fundamentos que já pudesse opor-lhe no momento do requerimento de injunção. Para que exista um "processo justo" é elemento essencial do chamamento do demandado a advertência para as cominações em que incorre se dele se desinteressar (cf. artigo 235.º, n.º 2, in fine do CPC).
E igualmente improcedente se afigura o argumento de que, por esta via, o processo de injunção fica esvaziado de efeito prático, o que vale por dizer que a limitação dos fundamentos de defesa na fase executiva seria necessária para que se atingissem os fins de proteção do credor e, reflexamente, de tutela geral da economia que se visou com o novo mecanismo. Na verdade, esse procedimento permite ao credor obter de forma expedita um título que lhe abre a via da ação executiva e que lhe permite a imediata agressão do património do devedor, sendo a citação deste diferida (cf. artigos 812.º-C alínea b) e 812.º-F, n.º 1, do CPC). Assim, sempre se atinge o objetivo de facultar ao credor um meio expedito de passar à realização coerciva da prestação, mediante uma solução equilibrada entre os interesses concorrentes que não comporta compromisso desnecessário da defesa do executado.»
Como salientam Mariana França Gouveia e João Pedro Pinto-Ferreira, em recente anotação ao Acórdão nº 388/2013 , «o exercício efetivo do contraditório em sede de injunção pressupõe que o requerido tome conhecimento do procedimento e dos efeitos preclusivos associados à falta de oposição. Ora, tal não é assegurado pela notificação pela via postal registada e ou simples para um ou mais locais que podem não corresponder à morada ou sede do requerido nem pelo conteúdo da notificação» (ob. cit., p. 328).
No que se refere à intervenção judicial, enquanto a sentença é produto, por definição, de um procedimento judicial, sendo um ato materialmente judicial, a injunção tem um caráter não jurisdicional. A intervenção judicial apenas ocorre se for apresentada oposição pelo requerido mas, nesse caso, o processo segue os termos da ação declarativa especial (cf. artigo 17.º do regime anexo ao Decreto-Lei 269/98, de 1 de setembro). Esta regra apenas conhece a exceção do artigo 14.º, n.º 4 do regime referido, que prevê a possibilidade de reclamação para o juiz em caso de recusa pelo secretário judicial de aposição de fórmula executória quando o pedido não se ajuste ao montante ou à finalidade do procedimento de injunção. Como se referiu no Acórdão 399/95, «[a]ssumindo o processo de formação deste tipo específico de título executivo índole essencialmente tabeliónica (trata-se de verificar a regularidade formal de papéis e levá-los, por via postal, ao conhecimento de alguém), é natural que o legislador, em homenagem aos objetivos de simplificação da atividade jurisdicional que motivaram a injunção, não tenha sobrecarregado a atividade do juiz com mais esse encargo. Daí, a sua entrega ao secretário judicial [...]».
Ora, como realçado no Acórdão 176/2013, do Tribunal Constitucional as «exigências de eficácia do sistema de execução, e o relevo que reconhecidamente assumem para a dinâmica económica e o tráfego comercial, não consentem que, a partir de uma fase não jurisdicional, sujeita a um controlo meramente formal da competência do secretário judicial, em que se prescinde "de qualquer juízo de adequação do montante da dívida aos factos em que ela se fundaria" (Lebre de Freitas, ob. cit., p. 182-183), se funde mais uma mera aparência da existência de um crédito e se opere efeito preclusivo para o qual não houve advertência. Em substância, essa ausência de advertência, conjugada com a simplificação e desburocratização que caracteriza o procedimento de injunção, significa que as vias de defesa no âmbito da injunção e no processo executivo não podem ser assimiladas, em termos de se conformarem como mutuamente equivalentes na perspetiva de quem organiza a sua defesa processual.»
Posto isto, permanecem inalterados estes aspetos relativos ao regime específico da injunção, concluindo – se que o alargamento dos meios de defesa operado pelo artigo 857.º, n.ºs 2 e 3, do NCPC não afasta os fundamentos que conduziram, no passado, ao juízo de inconstitucionalidade de solução legal semelhante, subsistindo a razão de ser que esteve na base da censura jus constitucional da solução que mantém as restrições do direito de defesa em sede de execução e da obtenção de pronúncia judicial sobre as razões oponíveis ao direito exercido pelo credor prévias à aposição da fórmula executória, por violação do princípio da proibição da indefesa, consagrado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição.
Logo, porque a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral tem força formal de lei, afecta normas ou actos jurídicos, faz cessar a sua vigência, retira-lhes efectividade e destrói-as, vinculando além do legislador, os próprios tribunais, todas as entidades públicas e privadas, quer os órgãos governativos, os quais não podem mais adoptar a norma inconstitucional como critério de referência, como os órgãos administrativos, e os particulares, que não podem mais invocar a norma nos seus actos jurídico-privados ou em tribunal, este tribunal entende que a ora recorrente ( oponente ) podia e pode deduzir embargos de executado à execução apensa com os fundamentos invocados.
Posto, isto, e porque a alegada falta de notificação do requerimento de injunção se enquadra no fundamento de oposição previsto no artigo 729º, alínea d) do CPC, fundando-se a execução em requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória, a oposição pode ter como fundamento a nulidade da notificação do oponente na injunção.
Passaremos a apreciar a arguida nulidade.
E desde já assinalamos que não pode ser confirmada a decisão recorrida nessa parte.
Assim, na sentença recorrida, no tocante à arguida falta de notificação da injunção no procedimento de injunção, o Mmo Juiz do tribunal a quo refere e passamos a transcrever:
“Da nulidade da falta de notificação da injunção.
No que diz respeito á falta de notificação da injunção não assiste qualquer razão à oponente.
Na verdade como se encontra documentado a fls, 25 a 28, carta enviada com AR e recebida pela embargante, a qual depois de junto aos autos não sofreu qualquer impugnação por banda da embargante, tando tal documento de ser considerado como verdadeiro.
Assim este documento faz prova cabal do recebimento da notificação da embargante da injunção.
Esta notificação foi enviada para a morada indicada pela embargante para onde era enviada a faturação emitida pela exequente.
Termos em que que se decide considerar a embargante devidamente notificada da injunção e daí improceder a nulidade invocada.”
A notificação da ora oponente, na injunção, não pode deixar de ser considerada nula (cfr. 191.º/1 do CPC).
E a notificação do oponente na injunção, é nula por ter sido efectuada “apenas e só” por via postal simples (carta registada) com prova de depósito; sem mais e qualquer adicional formalidade.
Não por lapso do Balcão Nacional de Injunções; mas sim por lapso da exequente/recorrida, por ter dado, no preenchimento do requerimento de injunção, uma informação incorrecta.
Disse que havia “domicílio convencionado”, o que não é verdade.
Citando o Senhor Juiz Conselheiro Salvador da Costa , por domicílio convencionado deve entender-se “o que é fixado pelas partes em contratos escritos para efeito de o eventual devedor ser procurado pelo credor ou por algum órgão judicial ou administrativo com vista ao cumprimento das obrigações deles decorrentes”.
Ora, no caso – em face do alegado na contestação à oposição – resulta “confessado” que não só não há contrato escrito como muito menos há convenção de domicílio.
A convenção de domicílio, para o efeito processual tido em vista, tem que ser uma cláusula explicitamente inserida no texto escrito do contrato, tem que ser uma cláusula em que ambas as partes declaram e aceitam, para o caso de litígio dele derivado, que certo lugar de domicílio, certa residência, valem para o efeito de receber a citação ou a notificação no quadro dum concreto processo.
Para este “conceito” e efeito, não revela a alegação na contestação que a morada indicada correspondia à que a oponente indicara para efeitos de facturação, porquanto, tal alegação é vaga; não é o texto escrito do contrato, não é uma cláusula inserida no texto do contrato, o seu conteúdo nada tem a ver com o que se disse sobre o “conceito” em causa, não é da autoria de ambas as partes.
Enfim, a partir desta vacuidade “documental” (tendo presente o referido “conceito” e fim tido em vista com a convenção de domicílio), mal se compreende/justifica a informação incorrecta prestada pela exequente/recorrente, no preenchimento do requerimento de injunção, dizendo, sem qualquer fundamento, que havia “domicílio convencionado”.
Informação incorrecta que gerou, logicamente, a nulidade de citação.
Colocado perante tal informação, o Balcão Nacional de Injunções tinha que notificar a requerida de acordo com o disposto nos art.º 2.º/1 do Diploma Preambular e 12.º-A/1 do Anexo, do DL 269/98, de 1 de Setembro; isto é, bastava-lhe enviar “notificação via postal simples” ao notificando, considerando-se a notificação realizada com a certificação, pelo distribuidor do serviço postal, do depósito da carta na caixa de correio do notificando. Foi isto que Balcão Nacional de Injunções fez, tendo enviado carta simples com prova de depósito.
Porém – é o ponto – não havendo, como é o caso, nem contrato reduzido a escrito nem “domicílio convencionado”, a notificação da requerida, ora oponente, tinha que ser feita nos termos do art.º 12.º do Anexo ao DL 269/98, isto é, por carta registada com aviso de recepção, sendo-lhe aplicável, “com as devidas adaptações”, o disposto nos n.º 2 a 5 do art. 228º do CPC, o mesmo é dizer, tendo o distribuidor de serviço, no caso da entrega da carta a terceiro, de fazer a entrega a pessoa que se declarasse em condições de a entregar prontamente ao notificando e de a advertir expressamente do dever de tal pronta entrega; e tendo a secretaria, em tal hipótese, que enviar, nos 2 dias úteis seguintes, carta registada ao notificando, “comunicando-lhe a data e o modo por que o acto se considera realizado, o prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta, o destino dado ao duplicado e a identidade da pessoa em quem a citação foi realizada” – (cfr. 233º do CPC, aplicável por “remissão” do 228º/2 do CPC).
Significa isto que a notificação efectuada (na injunção) à aqui oponente não observou, como devia, as formalidades acabadas de referir e também prescritas na lei, o que, nos termos do art. 191.º/1 do CPC, acarreta a sua nulidade, uma vez que não é possível afirmar que a ausência de tais cuidados e advertências não prejudicaram a sua defesa, sendo que as prescrições legais no âmbito das citações e notificações, devem ser escrupulosamente cumpridas.
Assim, a circunstância da carta (enviada por via postal simples) haver sido recebida por terceiro não apaga a omissão de tais formalidades.
Enfim, o erro na notificação, provocado pela exequente/recorrente, era potencialmente prejudicial ao exercício dos direitos de defesa da oponente/recorrente- nada sendo aduzido no sentido de afastar tal prejuízo potencial.
Esse erro viciou o procedimento injuntivo e a constituição do próprio título executivo, ou seja, em face da nulidade da notificação da ora oponente na injunção, não pode a oponente ser executada na acção executiva a que estes autos estão apensos, por não se ter formado título executivo, ficando prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas no recurso, devendo, oportunamente, o Tribunal da 1ª instância retirar no processo de execução as consequências da procedência da oposição à execução.

IV- DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação procedente e revogando a sentença recorrida declaram verificada a nulidade da citação da recorrente/ requerida no procedimento de injunção e, consequentemente, julgam procedente a oposição deduzida, devendo, oportunamente, serem retiradas no processo de execução as consequências da procedência da oposição.
Custas a cargo da recorrida/ exequente.
Notifique.
Guimarães, 11-02-2016
(Processado e revisto com recurso a meios informáticos)
(Francisca Micaela Fonseca da Mota Vieira)
(Fernando Fernandes Freitas)
(António M. A. Figueiredo de Almeida)