Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1129/09.5TBVRL-H.G1
Relator: JORGE TEIXEIRA
Descritores: EMBARGOS DE TERCEIRO
INDEFERIMENTO LIMINAR
CADUCIDADE
CONHECIMENTO OFICIOSO
PRINCÍPIO DA PRECLUSÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 09/24/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I- No regime actual, por força do disposto no artigo 345, C.P.C., a petição de embargos de terceiro deve ser liminarmente indeferida se não for apresentada a tempo, pelo que a excepção da caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso se os factos respectivos resultarem da petição inicial.

II- O prazo de caducidade de embargar de terceiro a que se reporta o artigo 344º, nº 2, do Código de Processo Civil só é aplicável aos embargos de função repressiva, não prevendo a lei prazo fixo para a dedução de embargos de terceiro de função preventiva, podendo deduzi-los entre a data do despacho que ordena a diligência e a sua efectiva realização.

III- Por decorrência do princípio da preclusão, impõe-se que, quer todos os fundamentos da acção, quer todos fundamentos da defesa sejam alegados de uma vez, cabendo alegar logo mesmo todos os que afigurem essenciais e relevantes, para o reconhecimento do direito que se pretenda fazer valer, e os que pareçam secundários, na eventualidade de serem também relevantes.

IV- Este princípio tem a ver com exigência de lealdade dos diversos sujeitos processuais e visa impedir que algum deles use a táctica de reservar algum argumento apenas para quando o achar mais oportuno.

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: AAA.

Recorrido: BBB.

Tribunal Judicial de Vila Real, Instância Central – Secção de Competência Cível.

AAA, com sede social na Rua RRR, vem deduzir embargos de terceiro com função preventiva.

Alega para tanto e, em síntese, que no apenso de providência cautelar n.º 1129/09.5TBVRL-C, onde é Requerente CCC e Requerida DDD, a que esta acção de embargos de terceiro corre por apenso foi decretada a entrega judicial da fracção predial designada pela letra M, correspondente ao rés-do-chão direito, e a dois lugares de garagem, de um prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, conhecido como Edifício EEE, Bloco I, sito na cidade de Vila Real, descrito, na Conservatória do Registo Predial daquela cidade, na ficha número ZZZZZZZ, da Freguesia FFF, então ainda sem número 1 de polícia, nem 2 inscrição na matriz, mas cuja participação para essa inscrição havia já sido feita, no 3 dia 31 de Outubro de 2001, tendo a esse prédio cabido, primeiro, o artigo 1.453, 4 urbano, da Freguesia FFF, do concelho de Vila Real, e, depois, o artigo ZZZ, 5 também urbano, da freguesia União de Freguesias de Vila Real, igualmente do 6 concelho de Vila Real, e que, desde 01 de Outubro de 2005, se encontra na posse da referida fracção, titulada, de boa-fé, pacifica e pública, por via de sucessivos contratos celebrados e que identifica, desde 01 de Outubro de 2005, que efectuou obras novas na referida fracção, cujo valor ascende a 51.325,00 euros, e lhe dão o direito de retenção sobre tal fracção até ao seu ressarcimento e que direito a receber do CCC.

Mais alega que, apesar de ter já deduzido os embargos de executado que correm termos sob o apenso e exista identidade parcial de pedidos, entende que as causas de pedir são diversas e, por isso não há litispendência ou caso julgado.

Por despacho proferido a 16/01/2015, constante de fls. 186 e seguintes dos autos, tais embargos foram liminarmente rejeitados, por caducidade na sua dedução, tendo as Embargadas sido absolvidas da instância.

Inconformada com tal decisão, apela a Embargante, e, pugnando pela respectiva revogação, formula nas suas alegações as seguintes conclusões:

“PRIMEIRA CONCLUSÃO

Apesar de estar convencida que aos presentes embargos de terceiro seria aplicável o CPC 1961 a recorrente aceita, apesar de com ela não concordar, a posição da Senhora Juíza sob recurso, segundo a qual se aplica a estes embargos de terceiro CPC 2013.

SEGUNDA CONCLUSÃO

No dia 14 de Janeiro de 2015, a recorrente apresentou, através de transmissão 9 electrónica de dados, via sistema Citius no Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, o requerimento inicial dos presentes embargos de terceiro, com eles pretendendo a embargante/recorrente reagir preventivamente contra a entrega, então já judicialmente ordenada, mas ainda não realizada (situação essa que se continua a manter ainda hoje, 22 de Janeiro de 2015), da fracção predial autónoma mais bem identificada nos autos, à requerente do procedimento cautelar, correspondente ao apenso C, isto é à CCC.

TERCEIRA CONCLUSÃO

Os embargos de terceiro em causa foram rejeitados liminarmente pela Exma. Senhora Doutora Juíza sob recurso, em virtude de, no entendimento daquela ilustre Magistrada, estar caduco o direito potestativo que a embargante/recorrente tinha de deduzir os embargos de terceiro em causa, por força do estatuído no artigo 344.°-2, do CPC 2013, e de há muito terem já decorrido os 30 dias, previstos em tal norma legal, cujo dies a quo a Senhora Juiz em questão entendeu ser aquele em que a embargante/recorrente tinha tido conhecimento de que havia sido judicialmente ordenada a entrega da fracção predial autónoma em causa nestes autos à requerente do procedimento cautelar atrás referido, ou seja, à CCC, dia esse que havia ocorrido já em Maio de 2010.

QUARTA CONCLUSÃO

Entendimento este que não tem qualquer suporte legal, na medida em que os embargos de terceiro em causa, porque deduzidos depois de ordenada judicialmente a entrega em questão, mas antes desta ser realizada, são os embargos de terceiro com função preventiva, previstos no artigo 350.°, do CPC 2013, não se lhes aplicando pois o prazo de 30 dias, a que alude o artigo 344.°-2, do mesmo CPC 2013, prazo esse que se aplica apenas e unicamente aos embargos de terceiro com função repressiva ou restitutiva, ou seja, àqueles que são deduzidos depois do acto ofensivo ter sido efectivamente realizado.

QUINTA CONCLUSÃO

Nem o prazo de 30 dias, a que alude o artigo 344.°-2, do CPC 2013, nem aliás qualquer outro prazo, tendo a dedução de embargos de terceiro, com função preventiva, apenas e unicamente, os dois limites temporais, constantes do artigo 350.°, do CPC 2013, dois limites temporais esses que são pois os seguintes: um termo inicial ou dias a quo, que coincide com o dia em que a realização do acto ofensivo é judicialmente ordenada, e um termo final ou dias ad quem, que é aquele em que esse acto ofensivo se realiza efectivamente.

SEXTA CONCLUSÃO

No nosso caso, os embargos de terceiro em questão foram deduzidos quando o acto de entrega em causa já havia sido judicialmente ordenado, mas não tinha ainda sido efectuado, pois que a entrega da fracção predial em causa não tinha ainda sido feita, situação esta que aliás se mantêm actualmente, pelo que os embargos de terceiro preventivos em questão eram então (14/01/2015), e continuam aliás agora a ser, perfeitamente tempestivos, não ocorrendo qualquer caducidade do direito potestativo que a embargante AAA, tinha na altura, e continua aliás a ter agora, de deduzir, como deduziu, tais embargos de terceiro, não sendo tal direito potestativo minimamente beliscado pelo fato da mesma embargante já ter conhecimento, desde Maio de 2010, que a entrega judicial em questão havia sido ordenada, pois que tal conhecimento é, para o assunto que estamos a analisar, isto é, para a dedução dos embargos de terceiro preventivos em causa, ter sido, ou não, tempestiva, completamente irrelevante.

SÉTIMA CONCLUSÃO

Sendo ainda certo que, mesmo nos embargos de terceiro repressivos ou restitutivos, esse prazo de 30 dias, previsto no artigo 344.°-2, do CPC 2013, se conta, não como se pretende, ou, pelo menos, se parece pretender, na sentença sob recurso, do conhecimento pelo futuro embargante do despacho que ordena o acto ofensivo, mas sim da realização efectiva desse acto.

OITAVA CONCLUSÃO

Assim, se é religiosamente certo que, como se pondera aliás na douta decisão que aqui e agora se está a porem crise, desde o dia 18 de Maio de 2010, em que, na visão, certamente correcta, de tal sentença, a embargante tomou conhecimento de que havia sido judicialmente ordenada a entrega à CCC, da fracção predial que tem vindo a ser referida, não menos religiosamente certo é também que esses 30 dias não relevam para os 30 dias referidos no artigo 344.°-2, do CPC 2013, pois que estes últimos 30 dias só começam a correr depois da realização da diligência ofensiva, - realização essa que ainda não se verificou, pelo que, desses 30 dias, nem um só segundo decorreu ainda.

NONA CONCLUSÃO

Acrescendo ainda que qualquer eventual caducidade do direito da embargante/requerente deduzir os embargos de terceiro que deduziu, se se verificasse, que não se verifica, nunca seria do conhecimento oficioso, por a matéria estar na disponibilidade das partes, e por força do estatuído nos artigos 303.°, 333.°-2 e 343.°-2, os três do CC.

DÉCIMA CONCLUSÃO

Violou pois a aliás douta sentença apelada várias disposições legais, designadamente os artigos 303.°, 333.°-2 e 343.°-2, os três do CC, e 344.°-2, 345.° e 350.°, todos do CPC 2013.

DÉCIMA PRIMEIRA CONCLUSÃO

Motivos pelos quais, e muito embora sem que isso constitua qualquer demérito, por pequeno que seja, para a Mui Distinta Magistrada que a proferiu, deve ser revogada a sentença, aliás douta, sob apelação, prolatando-se, em substituição de tal douta sentença, não menos douto Acórdão, que determine que os embargos de terceiro em causa foram tempestivamente apresentados em tribunal, devendo pois serem eles recebidos e prosseguirem os seus ulteriores termos processuais, nomeadamente com a suspensão da diligência de entrega que tem vindo a ser referida, o que tudo se requere”.

*

O Apelado apresentou contra alegações, nas quais concluiu pela improcedência da apelação.

*

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

*

II- Do objecto do recurso.

Sabendo-se que o objecto do recurso é definido pelas conclusões no mesmo formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso, as questões decidendas são, no caso, as seguintes:

- Analisar se os presentes embargos de terceiro terão ou não sido deduzidos tempestivamente e se o tribunal recorrido disso mesmo tinha legitimidade para conhecer.

- Analisar se, na hipótese de se entender terem presentes embargos de terceiro sido deduzidos tempestivamente, a Embargante poderia agora invocar novos fundamentos diferentes daqueles em que alicerçou outro processo de embargos de terceiro já deduzidos em data anterior e relativos ao mesmo acto ofensivo da sua posse.

*

III- FUNDAMENTAÇÃO.

Fundamentação de facto.

O circunstancialismo fáctico e processual a ter em consideração para a decisão a proferir é, além do supra referido e constante do relatório do presente acórdão, o a seguir descrito:

A 16/01/2015, foi proferida nos autos decisão de rejeição liminar dos presentes embargos com os seguintes fundamentos de facto e de direito:

(…)

Cumpre decidir.

Sem necessidade de grandes fundamentos, desde já se adianta que os presentes autos devem ser liminarmente rejeitados, por ser manifesta a sua extemporaneidade.

Alias, tanto assim é, que a Embargante nem sequer ousou alegar a data em que teve conhecimento da decisão que decretou a providência cautelar que ordenou a entrega judicial da fracção em causa à Embargada e Requerente da Providência Cautelar, ou seja, que ofende o seu direito aqui invocado.

Ora, nesta matéria dispõe o artigo 344.º, do Novo Código de Processo Civil (aqui aplicável porquanto os presentes embargos de executado são uma acção declarativa e, por isso, não lhes é aplicável o disposto no artigo 7.º, n.º 2, da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho), “1- Os embargos são processados por apenso à causa em que haja sido ordenado o acto ofensivo do direito do embargante.

2 — O embargante deduz a sua pretensão, mediante petição, nos 30 dias subsequentes àquele em que a diligência foi efectuada ou em que o embargante teve conhecimento da ofensa, mas nunca depois de os respectivos bens terem sido judicialmente vendidos ou adjudicados, oferecendo logo as provas.”

Ora, o acto ofensivo do pretenso direito da embargante foi ordenado em 14 de Maio de 2010, por via da sentença proferida a fls. 120 e seguintes do apenso C, sendo ali ordenada a entrega judicial da fracção em causa também nos presentes embargos de terceiro.

Sendo certo que a aqui embargante teve conhecimento deste acto ofensivo do seu pretenso direito em data sempre anterior a 18 de Maio de 2010, data em que deduziu também embargos de terceiro, que correram termos sob o apenso E, que foram decididos e objecto de diversos recursos até ao Tribunal Constitucional, para finalmente e decorridos 4 anos transitar em julgado a decisão que os rejeitou.

Donde, desde o dia 18 de Maio de 2010 até à dedução dos presentes embargos de terceiros muitos 30 dias decorreram.

Nestes termos, independentemente do conhecimento da existência de caso julgado, é manifesto que se verifica a caducidade da Embargante em deduzir embargos de terceiro, excepção que é de conhecimento oficioso.

Pelo exposto, nos termos do disposto no artigo 345.º, do Código de Processo Civil, rejeitam-se liminarmente os presentes embargos, por caducidade na sua dedução, absolvendo-se as Embargadas da instância – artigos 577.º e 278.º, n.º 1, alínea e), ambos do Código de Processo Civil.

Custas pela Embargante, artigo 446.º, do Código de Processo Civil.

Fixo aos presentes Embargos o valor de € 60 000 (sessenta mil euros).

Notifique e registe.

*

Vila Real, d. s.”

(…)

Fundamentação de direito.

Cumpre então proceder à apreciação da pretensão recursória deduzida começando por se esclarecer que, pese embora a diferentes preceptivas e pontos de abordagem por que foi suscitada esta questão nas alegações e nas contra-alegações, tudo a mais se não resume do que à questão de saber se os presentes embargos de terceiro foram ou não deduzidos tempestivamente e se o tribunal recorrido disso mesmo tinha legitimidade para conhecer, e bem assim, se, na hipótese de resposta positiva a esta primeira questão, a Embargante poderia agora invocar novos fundamentos diferentes daqueles em que alicerçou outro processo de embargos de terceiro por si deduzidos, em data anterior, e relativos ao mesmo acto ofensivo da sua posse também agora em causa nos presentes.

Começando pela “competência” do tribunal para conhecer oficiosamente da tempestividade, cumprirá desde já referir que, efectivamente, o que aqui está em discussão não é a eventual caducidade do direito material da Embargante, mas sim a caducidade do seu direito processual de dedução embargos de terceiro, ou dito de outro modo, está em causa apenas a questão de saber se terão ou não sido deduzidos tempestivamente.

E, dada a linear evidência desta questão, por se entender desnecessário e injustificado, não lhe dispensaremos acentuado desenvolvimento.

Como é consabido, os embargos de terceiro não são um processo especial, como sucedia antes da revisão de 1995/1996 do Código de Processo Civil (artigos 1037.º a 1043.º do C.P.C/61), constituindo, isso sim, um incidente de oposição de penhora, ou de qualquer acto judicialmente ordenado de apreensão de bens, ofensivo da posse ou de qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa (artigo 342.º do C.P.C).

E, salvo o devido respeito, parece-nos que hoje, e à semelhança do que já sucedia no domínio da legislação processual anterior, a tempestividade de dedução dos embargos de terceiro pode e tem de ser conhecida oficiosamente na fase introdutória dos embargos, Cfr. neste sentido, Ac. do S.T.J. de 27-6-2006 (Borges Soeiro) (Revista nº 1239/2006). por decorrência de expressa previsão constante do artigo 345.º do C.P.C. (artigo 354, do anterior),onde expressamente se estipula que, “sendo apresentados em tempo e não havendo razões para o imediato indeferimento (…).

Como refere Salvador da Costa, “no regime processual anterior, entendia-se que a caducidade do direito de embargar não podia nem ser conhecida oficiosamente e que a não expiração do prazo não era um elemento constitutivo do direito do embargante, por só se traduzir na inexistência de uma causa extintiva dele, e que não cabia ao embargado a alegação e prova do seu decurso.

No regime actual, por força do disposto no artigo 354 (actual artigo 345), a petição de embargos de terceiro deve ser liminarmente indeferida se não for apresentada a tempo, pelo que a excepção da caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso se os factos respectivos resultarem da petição inicial, configurando-se, assim, neste procedimento, mais uma excepção à regra constante do nº 2, do artigo 333, nº 2, do Código Cível”. Cfr, Salvador da Costa, Os Incidentes da Instância, 5ª ed., pg. 225.

Isto assente, passemos então ao conhecimento da questão fulcral suscitada na presente apelação e que, como se deixou dito, contende com a eventual intempestividade da sua dedução.

Pronunciando-se no sentido da sua tempestividade, alega a Recorrente como fundamento e, em síntese, que, contrariamente ao que se entende na decisão recorrida, estando-se perante embargos de terceiro com função preventiva, nem o prazo de 30 dias, a que alude o artigo 344.°, nº 2, do CPC 2013, nem qualquer outro prazo, podendo os mesmos ser deduzidos dentro dos dois limites temporais, constantes do artigo 350.°, do CPC 2013, limites temporais esses que são pois os seguintes: um termo inicial ou dias a quo, que coincide com o dia em que a realização do acto ofensivo é judicialmente ordenada, e um termo final ou dias ad quem, que é aquele em que esse acto ofensivo se realiza efectivamente.

Ora, em tese, e abstraindo da solução da concreta a adoptar na presente situação, em razão das suas especificidades, perfilhamos também o entendimento defendido no Acórdão de 22/05/2005, produzido no domínio da legislação processual anteriormente vigente, e que é a seguinte: Cfr. Acórdão do S.T.J., de 22/05/2005, proferido no processo nº 2981/2005 de 2-6-2005 publicado in www.dgsi.pt.

“(…)

Estamos, portanto, face a embargos deduzidos, a título preventivo, antes de realizada, mas depois de ordenada a diligência de entrega da loja susceptível de ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito dessa mesma diligência (artigos 351º e 359º do C.P.C.).

Ora, no que respeita aos embargos deduzidos a título preventivo, o prazo que rege não é o que consta do actual artigo 353º (actual artigo 344) mas sim o que conta do artigo 359º ambos do C.P.C. (actual artigo 344).

Assim ensinava Alberto dos Reis: “ se os embargos tiverem função preventiva, equivalente a da acção possessória de prevenção, isto é, se tiverem por fim evitar o esbulho e por fundamento o justo receio dele, rege o artigo 1039º e não a 1ª alínea do artigo 1037º, na parte relativa ao prazo.

O art. 1039º (actual artigo 350) diz: os embargos podem ser deduzidos antes de realizada, mas depois de ordenada, a diligência a que se refere o artigo 1036º (actual artigo 342).

Não há, neste caso, prazo fixo; há dois limites processuais. Os embargos não podem ser deduzidos antes de ordenada a diligência, porque, enquanto o não for, não há justo receio de esbulho; também o não podem ser depois de efectuada a diligência, porque, se esta já se realizou, o esbulho é um facto consumado, o possuidor já está privado da posse e portanto já não tem cabimento embargos com função preventiva.

Pretendeu-se recentemente aplicar aos embargos de carácter preventivo o prazo estabelecido no artigo 1037º (actual artigo 344), fazendo decorrer os vinte dias desde a data em que foi ordenada a diligência. Tal entendimento é manifestamente inaceitável. O que regula é o artigo 1039º (actual artigo 350), que não fixa prazo, como assinalámos, e unicamente nos limites relacionados com o estado do processo” (Processos Especiais, Vol 1º, pág. 436/437).

Ora o entendimento do recorrente vai precisamente no sentido daquele que o citado autor considerava inaceitável.

Nos embargos preventivos não há que falar em violação do direito que só se dá com o acto de esbulho judicialmente ordenado.

Os embargos foram, pois, deduzidos tempestivamente face ao disposto no artigo 359º/1 do C.P.C (actual 350)”.

E, como se conclui nesse mesmo Acórdão, “Este entendimento não foi afastado pelo Supremo Tribunal de Justiça: veja-se o Ac. do S.T.J. de 9-2-2006 (Salvador da Costa) (P. 14/2006) assim sumariado quanto a esta questão: “o prazo de caducidade de embargar de terceiro a que se reporta o artigo 353º, nº 2, do Código de Processo Civil só é aplicável aos embargos de função repressiva, não prevendo a lei prazo fixo para a dedução de embargos de terceiro de função preventiva, podendo deduzi-los entre a data do despacho que ordena a diligência e a sua efectiva realização”.

Assim, e como decorre da jurisprudência defendida neste acórdão, e com a qual se concorda, o prazo de caducidade a que alude o artigo 344, nº 2, do C.P.C. não será de aplicar quando se esteja perante embargos de terceiro com função preventiva, sendo que, nestes casos, a tempestividade é aferida pelos limites definidos no artigo 350º do C.P.C. que visa precisamente os embargos deduzidos, antes de realizada, mas depois de ordenada a diligência ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com o seu âmbito.

Esclarecido este aspecto, passemos então à análise da essencial questão suscitada, e que consiste na de saber se, na concreta situação, os presentes embargos de terceiro terão ou não sido deduzidos atempadamente.

Como refere Salvador da Costa, e é consabido, “(…) A estrutura dos embargos de terceiro é essencialmente caracterizada, não tanto pela particularidade de se consubstanciarem numa acção declarativa que corre por apenso à acção ou ao procedimento de tipo executivo, com a especificidade de inserirem uma sub-fase introdutória de apreciação sumária da sua viabilidade, mas, sobretudo, por a pretensão do embargante se inserir num processo pendente entre outras partes e visar a efectivação de um direito incompatível com a subsistência dos efeitos de algum acto judicial de afectação ilegal de um direito patrimonial do embargante.

Apesar de regulados em sede de incidentes da instância, configuram-se como uma verdadeira acção declarativa, autónoma e especial, conexa com determinado procedimento de tipo executivo.

Através deles, agora relativamente desvinculados da posse, pode o embargante efectivar ou defender, para além da posse, qualquer direito de conteúdo patrimonial ilegalmente afectado pela diligência judicial de tipo executivo. Sobre a causa de pedir nos embargos de terceiro, veja-se o Ac. da Relação do Porto, de 24.11.87, CJ, Ano XII, Tomo 5, pág. 195..

Assim, pode o embargante invocar, no âmbito do próprio processo em que ocorreu o acto judicial lesivo, qualquer direito que seja incompatível com o acto de penhora, arresto, arrolamento, apreensão ou entrega da coisa certa ao exequente, sem necessitar de recorrer à demorada acção de reivindicação e poder evitar, directamente, a afectação negativa directa ou indirectamente decorrente daqueles actos.

É incompatível com o acto judicial de tipo executivo, o direito de terceiro de natureza impeditiva da realização da sua função, a venda executiva ou qualquer outra. JOSÉ LEBRE DE FREITAS, "A Acção Executiva à Luz do Código Revisto", 2001, págs. 243 a 246.

O direito de terceiro envolvente da posse, da propriedade ou de outra relação jurídica idónea, impeditivo da venda do respectivo objecto no processo de execução, é incompatível com o acto de penhora, mas insusceptível de ofensa pelo seu registo provisório ou definitivo. Ac. do STJ, de 30.11.2006, Revista n.° 4244/06,7ª Secção.

O conceito de direito incompatível apura-se, pois, no confronto da finalidade da diligência em causa, e é de considerar como tal, no confronto com qualquer das referidas diligências judiciais, o direito de terceiro idóneo a impedir a realização daquela função.

Um mero direito de crédito, derivado de benfeitorias, feitas num prédio que foi penhorado, não envolve direito incompatível com o acto de penhora justificativo de embargos de terceiro”. Ac. do STJ, de 17.1.2008, Processo n.° 4239/2007,7ª Secção.

(…)

“E, continua o mesmo Autor, “Os embargos de terceiro são, pois, instrumentalizados através de petição inicial, a que é aplicável o regime previsto no artigo 467.°. Assim, deve o embargante designar o tribunal, o número do processo, o juízo e a secção, indicar a forma de processo, ordinário ou sumário, conforme os casos, expor os factos e as razões de direito que servem de fundamento aos embargos, declarar o valor destes, e pode logo arrolar testemunhas e indicar outros meios de prova.

(…)

“A causa de pedir dos embargos de terceiro é a factualidade integrante do direito invocado, seja a posse, seja a propriedade, seja algum outro direito incompatível com a finalidade da diligência judicial que se pretende impugnar, bem como a factualidade integrante daquela diligência.

Assim, tem o embargante que articular, a título de causa de pedir, os factos donde derive o direito ou a situação invocada legalmente incompatíveis com a finalidade do acto judicial em causa”.

Tecidos estes considerando, passemos então à análise dos factos.

- O acto ofensivo do alegado direito do Recorrente foi ordenado por decisão proferida a 14 de Maio de 2010;

- A 18 de Maio de 2010 o aqui Embargante deduziu embargos de terceiro que foram decididos e objecto de vários recursos, designadamente, para Tribunal Constitucional, que obteve decisão definitiva em 2 de Dezembro de 2014, que negou provimento ao recurso interposto pela aqui Recorrente;

- No dia 14 de Janeiro de 2015 a Recorrente deu entrada dos presentes embargos, com fundamentos diversos dos primeiros;
- A decisão aqui recorrida foi proferida em 16 de Janeiro de 2015.
- Em 20 de Janeiro de 2015, a Juiz a quo determinou que a diligência de entrega se efectuaria no dia 27 de Janeiro de 2015;
- A diligência de entrega veio efectivamente a realizar-se naquele dia 27 de Janeiro de 2015.

Em face de uma tal factualidade, como linear se impõe a constatação de que, passados cerca de 5 anos contados, quer da data em que foi proferida a decisão que ordenou o acto alegadamente ofensivo da sua posse, quer da data em que resulta demonstrado que teve conhecimento dessa mesma decisão (data em que deduziu os primeiros embargos), o Recorrente, embora com fundamentos diversos, deduziu novos embargos de terceiro com função preventiva.

Ora, a questão que, com toda a pertinência se deve colocar, em primeiro lugar, é a de saber se um tal conduta se afigura possível e consistente de pontos de vista do cumprimento das regras processuais e substantivas a ter em consideração na situação.

O caso julgado material pode valer como autoridade de caso julgado, quando o objecto da acção subsequente é dependente do objecto da acção anterior, ou como excepção do caso julgado, quando o objecto da acção posterior é idêntico ao objecto da acção antecedente.

Pode assim concluir-se que os efeitos do caso julgado material se projectam “em processo subsequente necessariamente como autoridade de caso julgado material, em que o conteúdo da decisão anterior constitui uma vinculação à decisão do distinto objecto posterior, ou como excepção de caso julgado, em que a existência da decisão anterior constitui um impedimento à decisão de idêntico objecto posterior”. Cfr. Autor e obra citados na nota anterior, p. 168

Daqui decorre que “o trânsito em julgado de uma decisão de mérito faz precludir a possibilidade de, em acção subsequente, poderem vir a ser utilizados para a contrariar questões que, na primeira acção, poderiam ter sido invocados como meios de defesa”. Cfr. Ac. do STJ de 8/04/10, proc. nº 2294/06.9TVPRT.S1, in http://www.dgsi.pt/jstj.

É que, como refere Manuel de Andrade, “devendo os fundamentos da defesa ser formulados todos de uma vez num certo momento, a parte terá de deduzir uns a título principal e outros in eventu – a título subsidiário, para a hipótese de não serem atendidos os formulados em primeira linha (Noções Elementares de Processo Civil, pág. 382), ónus este imposto por razões de lealdade no combate judiciário, a que subjazem também razões de segurança e de certeza jurídica que impedem que, tornada definitiva uma sentença, os seus efeitos sejam postergados com base em novos argumentos que em tal acção não foram - mas poderiam ter sido – invocados” Cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 382..

Na verdade, “seria intolerável que cada um nem ao menos pudesse confiar nos direitos que uma sentença lhe reconheceu; que nem sequer a estes bens pudesse chamar seus, nesta base organizando os seus planos de vida; que tivesse de constantemente defendê-los em juízo contra reiteradas investidas da outra parte, e para mais com a possibilidade de nalguns dos processos eles lhe serem negados pela respectiva sentença”, concluindo que “se a sentença reconheceu, no todo ou em parte, o direito do autor, ficam precludidos todos os meios de defesa do réu, mesmo os que ele não chegou a deduzir, e até os que poderia ter deduzido com base num direito seu (p. ex., ser ele, réu, o proprietário do prédio reivindicado)...” Cfr. Manuel de Andrade, ob. cit., págs. 306 e 324..

Assim, com o trânsito em julgado da sentença “ficam precludidos todos os factos que poderiam ter sido invocados como fundamento de uma contestação, tenham ou não qualquer relação com a defesa apresentada”, o que se funda em razões atinentes com a boa administração da justiça, com a funcionalidade dos tribunais e com a salvaguarda da paz social, ficando excluída a possibilidade de confrontar o tribunal com “toda a situação contraditória ou incompatível com aquela que ficou definida na decisão transitada”. Cfr. Estudos sobre o Processo Civil, 2ª ed., págs. 568, 579 e 586.

Todavia, e pese embora a existência de uma decisão já transitada em julgado, relativa ao embargos de terceiros primeiramente deduzidos pela Recorrente, a questão fulcral que aqui, pertinentemente, e em substância, poderá ser colocada, mais não é do que a de saber se se estará ou não perante uma eventual violação do princípio da preclusão ou da concentração da defesa contra o acto ofensivo do direito do Recorrente (embora haja quem os distinga e diferencie), que, como é consabido, em termos gerais, tem um efeito preclusivo, obstando a que o réu venha alegar, depois da contestação, factos então não alegados (nº 1 do artigo 573º do Código de Processo Civil), e bem assim, que tais factos possam servir de causa de pedir em acções cujo desfecho possa conduzir uma decisão em contradição com a já proferida.

Dito de outro modo, a questão a nosso ver, consistirá em saber se, existindo vários fundamentos passíveis de alicerçar a dedução de embargos de terceiro que visem a defesa da posse, com coexistência simultânea, ou seja, todos já existentes no momento em que o embargante toma conhecimento decisão ofensiva da sua posse, lhe será ou não legítimo deduzi-los como fundamento de processos diversos, da mesma natureza, em momentos temporais diferentes, aproveitando, designadamente, a não consumação dos efeitos da apreensão ou entrega de bens decidida, ou seja, a não realização da diligência ou medida determinada, decorrente da dedução dos primeiros embargos, para, na hipótese de improcedência destes, deduzir novos embargos de terceiro, com diverso fundamento, mas já verificado e existente aquando da dedução do primeiro processo de embargos.

Na situação vertente, como se deixou já dito, veio o Recorrente invocar nos presentes embargos o seu direito de retenção sobre “obras novas e inovações” que, segundo alega, terão sido realizadas em 2005 (cfr. doc. 17, junto com a petição), tendo invocado nos primeiros embargos que instaurou, a titularidade da posição de locatária do contrato de locação financeira celebrado entre CCC e a sociedade DDD, sendo que, como resulta evidente do supra exposto, quando interpôs os primeiros embargos (18/10/2010), as aludidas “obras e inovações” que agora invoca a fundamentar as presentes embargos, já existiam nessa data, razão pela qual como inquestionável resulta que também as poderia ter já invocado como fundamento dos primeiros embargos de terceiro que deduziu, o que, contudo, assim, não sucedeu.

Certo que, não directamente nestas situações, mas noutras de plena analogia, ou seja, atinentes aos pedidos reconvencionais, não tem sido pacífica a orientação da doutrina e da jurisprudência com relação à questão dos efeitos preclusivos inerentes ao trânsito em julgado de uma sentença e sua conexão com a figura da reconvenção, havendo, contudo, uma orientação que vai no sentido de que “o réu que se absteve de alegar direitos acaba por ver precludida a possibilidade de vir a obter uma futura decisão que afecte, na prática, o resultado anteriormente alcançado pelo adversário”, razão pela qual, ainda que a reconvenção seja facultativa, considera que o réu deverá reconvir “para se livrar de um prejuízo futuro e eventual (não certo): o prejuízo de preclusão do seu direito”, ficando, por isso, “inibido de propor uma contra-acção independente, baseando-se em factos anteriores deduzidos sem êxito ou que, podendo ter sido deduzidos em sua defesa, o não foram” Cfr. Miguel Mesquita, Reconvenção e Excepção em Processo Civil, págs. 418 e segs, 429, 441 e 453., concluindo, assim, que o réu tem “sempre de jogar, no momento em que contesta, com a possibilidade de vir a ser proferida uma sentença favorável ao autor. Porque sobre esta se forma caso julgado material, o réu não pode, através de uma acção, com base em factos anteriores, vir a afectar o teor da sentença neste proferida”.

Mas, e a propósito da autoridade do caso julgado e do princípio da concentração da defesa, e com plena pertinência para a resolução da questão em apreço, refere o S.T.J. o seguinte:

“É verdade que a reconvenção tem, em regra, natureza facultativa. Sendo concedida ao réu demandado em determinada acção a faculdade de aproveitar a mesma instância processual para formular uma pretensão autónoma contra o autor, forçoso é afirmar-se que, em princípio, o não uso dessa faculdade não interfere negativamente na consistência do direito material de que porventura o réu seja titular”. Cfr. Acórdão citado na nota que antecede.

Trata-se, assim, de uma asserção que não é absoluta e que deve ser contrastada com o objecto da primeira acção, não se admitindo que o réu, depois de ter sido atingido pelos efeitos definitivos de uma sentença de mérito proferida no âmbito de um processo em que teve ampla possibilidade de se defender, faça uso autónomo do direito de acção para, em boa verdade, provocar o esvaziamento daquela sentença, com prejuízo para o direito que pela mesma foi reconhecido.

Esta parece-nos ser, inegavelmente, a posição que melhor articula todos aspectos envolvidos na análise da questão, quer sejam os de natureza substantiva, quer os de ordem adjectiva, conexos com as figuras da excepção peremptória, da reconvenção e da autoridade do caso julgado.

Com efeito, e como é consabido, por princípio, o efeito preclusivo dos meios de defesa apenas abarca o que constitui matéria de excepção que integre factos modificativos ou extintivos apostos à pretensão do autor, dele se excluindo as pretensões autónomas.

Ora, na situação vertente, como se deixou dito, o Recorrente quando instaurou os primeiros embargos de terceiro, já conhecia e poderia também ter invocado os fundamentos de que se serviu para alicerçar os segundos embargos de terceiro que deduziu, ou seja, os presentes.

Portanto, assim sendo, em nosso entender, por não os poderem desconhecer (são factos pessoais), impunha-se à Recorrente que, ao instaurar os primeiros embargos de terceiro, tivesse também alegado os fundamentos de que se serviu para instaurar os presentes.

E assim sendo, sendo certo que, a existirem tais obras, teria conhecimento delas, o Recorrente não invocou, como lhe competia, todos os factos que poderia invocar como fundamento de oposição à consumação do acto lesivo da sua posse, fazendo, por isso, todo o sentido, nessas circunstância, fazer precludir o exercício desse seu direito, com os fundamentos que agora deduz.

Na verdade, mesmo que se queira interpretar os embargos, não como um acto de oposição à concretização de um acto ofensivo da posse, mas antes como uma acção com estrutura declarativa destinada à afirmação de um direito, não pode esquecer-se que o princípio da preclusão se traduz no reconhecimento de que o direito adjectivo tem ciclos processuais, cada um com a sua finalidade própria e formando compartimentos estanques, dentro dos quais os actos respectivos devem ser praticados, sob pena de ficarem precludidos.

É que este princípio, não é apenas aplicável à defesa.

Com efeito, por decorrência do princípio do dispositivo incumbe ao autor o ónus de alegação dos factos integrantes da causa de pedir - o facto ou factos que fundamentam o pedido -, estando a actividade processual limitada a esses factos - sem prejuízo da inclusão de outros que desses sejam instrumentais, complementares ou notórios -, sendo que, como é sabido, a ausência de uma causa de pedir determina a ineptidão da petição inicial - al. a) do nº 2 do art. 186º, do C.P.C. - e a causa de pedir invocada condiciona o desenvolvimento da instância, sendo limitadas as situações da sua alteração ou ampliação - art. 264º (acordo das partes) e nº 1 do art. 265º.

E assim sendo, por decorrência do princípio da preclusão, impõe-se que, quer todos os fundamentos da acção, quer todos fundamentos da defesa sejam alegados de uma vez, cabendo alegar logo mesmo todos os que afigurem essenciais e relevantes, para o reconhecimento do direito que se pretenda fazer valer, e os que pareçam secundários, na eventualidade de serem também relevantes - cfr. art. 552º, nº 1 al d), quanto à petição; 572º e 573º em relação à contestação.

Este princípio tem a ver com exigência de lealdade dos diversos sujeitos processuais e que visa impedir que algum deles use a táctica de reservar algum argumento apenas para quando o achar mais oportuno. Cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, ed. 76, pg. 38.

Assim, atentando em que, visando-se através da consagração deste princípio da preclusão, primordialmente – e além da prossecução de interesses ligados à celeridade processual -, a imposição de uma actuação leal entre as partes, de uma conduta transparente desde o início, que habilite cada uma delas a agir e a reagir de boa fé, excluindo que os argumentos de uma possam ser feitos valer quando a outra está menos habilitada para o fazer, eventualmente até condicionada pela sua actuação anterior, outra não poderia ser a solução senão a de o aplicar com igual rigor à conduta processual de todas as partes.

Destarte, parece-nos incontornável que, na presente situação, uma vez que os actos processuais não foram praticados no ciclo próprio, não foram invocados nos primeiros embargos de terceiro deduzidos pela Recorrente todos os fundamentos em que os poderia alicerçar, ficaram precludidos para servirem de fundamento dos presentes embargos.

A assim se não entender, à luz de que princípios e para salvaguarda de que valores ou interesses, ainda que exclusivamente do Recorrente, se iria impor ao Recorrido a eventualidade de ter de aguardar, talvez até por muitos mais anos, por uma decisão definitiva que, de um modo também definitivo, decidisse da validade e eficácia do direito que lhe foi reconhecido, quando o Recorrente, em tempo adequado e próprio, e sem prejuízos acrescidos para ninguém, podia ter invocado em fundamento da subsistência da sua posse, tudo quanto agora invocou.

Podendo fazê-lo, mas não o tendo feito, embora não por mera ou estrita intempestividade, mas por preclusão do substrato factual alicerçante do efeito jurídico que se pretende obter com a instauração da presente acção, ou seja, tendente à afirmação de um direito incompatível com a subsistência dos efeitos do acto judicial determinado, consistente na entrega do bem imóvel decidida, afigura-se-nos como incontornável que a presente apelação deverá ser julgada improcedente, com a consequente manutenção da decisão recorrida.

Improcede, assim, e na íntegra, a presente apelação.

Sumário – artigo 663, nº 7, do C.P.C..

I- No regime actual, por força do disposto no artigo 345, C.P.C., a petição de embargos de terceiro deve ser liminarmente indeferida se não for apresentada a tempo, pelo que a excepção da caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso se os factos respectivos resultarem da petição inicial.

II- O prazo de caducidade de embargar de terceiro a que se reporta o artigo 344º, nº 2, do Código de Processo Civil só é aplicável aos embargos de função repressiva, não prevendo a lei prazo fixo para a dedução de embargos de terceiro de função preventiva, podendo deduzi-los entre a data do despacho que ordena a diligência e a sua efectiva realização.

III- Por decorrência do princípio da preclusão, impõe-se que, quer todos os fundamentos da acção, quer todos fundamentos da defesa sejam alegados de uma vez, cabendo alegar logo mesmo todos os que afigurem essenciais e relevantes, para o reconhecimento do direito que se pretenda fazer valer, e os que pareçam secundários, na eventualidade de serem também relevantes.

IV- Este princípio tem a ver com exigência de lealdade dos diversos sujeitos processuais e visa impedir que algum deles use a táctica de reservar algum argumento apenas para quando o achar mais oportuno.

IV- DECISÃO.

Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção cível em julgar totalmente improcedente o presente recurso, mantendo-se, na íntegra, a decisão recorrida.

Custas pela Apelante.

Guimarães, 24/ 09/2015.

Jorge Alberto Martins Teixeira

Jorge Miguel de Pinto Seabra

José Fernando Cardoso Amaral

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Cfr. neste sentido, Ac. do S.T.J. de 27-6-2006 (Borges Soeiro) (Revista nº 1239/2006).

Cfr, Salvador da Costa, Os Incidentes da Instância, 5ª ed., pg. 225.

Cfr. Acórdão do S.T.J., de 22/05/2005, proferido no processo nº 2981/2005 de 2-6-2005 publicado in www.dgsi.pt.

Sobre a causa de pedir nos embargos de terceiro, veja-se o Ac. da Relação do Porto, de 24.11.87, CJ, Ano XII, Tomo 5, pág. 195.

JOSÉ LEBRE DE FREITAS, "A Acção Executiva à Luz do Código Revisto", 2001, págs. 243 a 246.

Ac. do STJ, de 30.11.2006, Revista n.° 4244/06,7ª Secção.

Ac. do STJ, de 17.1.2008, Processo n.° 4239/2007,7ª Secção.

Cfr. Autor e obra citados na nota anterior, p. 168

Cfr. Ac. do STJ de 8/04/10, proc. nº 2294/06.9TVPRT.S1, in http://www.dgsi.pt/jstj.

Cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 382.

Cfr. Manuel de Andrade, ob. cit., págs. 306 e 324.

Cfr. Estudos sobre o Processo Civil, 2ª ed., págs. 568, 579 e 586.

Cfr. Miguel Mesquita, Reconvenção e Excepção em Processo Civil, págs. 418 e segs, 429, 441 e 453.

Cfr. Acórdão citado na nota que antecede.

Cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, ed. 76, pg. 38.