Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
596/20.0GDSTB.E1
Relator: CARLOS DE CAMPOS LOBO
Descritores: AMEAÇA
BEM JURÍDICO PROTEGIDO
Data do Acordão: 12/15/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I – A tipicidade do crime de ameaça que se mostra inserta no artigo 153º do CPenal acolheu uma ideia de bem jurídico intrassocial, onde subjaz uma certa tensão entre o interesse na salvaguarda da liberdade de decisão e de acção e o interesse em não limitar excessivamente a liberdade social de acção.
II – Deste modo, o bem jurídico acautelado é a liberdade de decisão e de ação, o que decorre da circunstância de, ao se provocar um sentimento de receio / medo / insegurança / intranquilidade no destinatário da ameaça, naturalmente se desencadeia que a paz / serenidade do visado podem ser afetados e sequentemente a sua liberdade.
III – Como seus elementos constitutivos despontam o objetivo – prática de um crime contra a vida, contra a liberdade pessoal, contra a liberdade e autodeterminação sexual, contra bens patrimoniais de valor considerável, não sendo o bastante uma mera advertência ou aviso – e o subjetivo , sendo que imprescindível é que a ameaça se destine a um mal futuro.
IV - Assim, em termos objetivos, o preenchimento do tipo depende da verificação cumulativa das seguintes características: ameaça com um mal, que tanto pode ser de natureza pessoal como patrimonial; o mal da ameaça tem de ser futuro (e não iminente); a ocorrência do mal futuro decorre da vontade do agente, sendo que a ameaça tem de ser adequada a provocar ao sujeito passivo medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação.
V - Míster também é que se patenteie o dolo, por via da consciência da adequação da ameaça a provocar medo ou intranquilidade no ameaçado.
VI – Perante tal verbalizar agora é que vais ver como elas te mordem desacompanhado de um qualquer gesto elucidativo de agressão ou outro, para além de não demonstrar carga bastante para ser entendido como uma ameaça relevante, pois desconhece-se a quê – se a integridade física, se a liberdade pessoal, se a bens patrimoniais - ante o vocábulo agora, o que se denota é atualidade / imediato / no preciso tempo, falhando assim a condição de que o mal que é objecto da ameaça seja futuro.
Decisão Texto Integral:
Acordam em Conferência na Secção Criminal (2ª subsecção)

I – Relatório

1. No processo n.º 596/20.0GDSTB da Comarca de Setúbal – Juízo Local Criminal de Setúbal – Juiz 4, o arguido AA, nascido a .../.../1976, natural de ..., filho de BB e de CC, ..., com morada no ..., n.º ..., ... ..., foi acusado pelo Digno Mº Pº, imputando-lhe a prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça, p. e p. pelo artigo 153º, nº 1 do CPenal (acusação acompanhada pelo Assistente) e, pelo Assistente, onde foi acompanhado pelo Digno Mº Pº, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de injúria p. e p. pelo artigo 181º do mesmo diploma legal.
Igualmente, o Assistente, deduziu pedido de indemnização cível, reclamando a título de danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, o quantitativo de 1.900,00 (mil e novecentos) Euros.
Na sequência do julgamento efetuado, foi proferida sentença, decidindo:
- Absolver o Arguido AA da prática de um crime de ameaça, p. e p. pelo artigo 153º, nº 1, do CPenal;
b) Condenar o Arguido AA pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo artigo 181º, nº 1, do CPenal, na pena de 40 dias de multa, à taxa diária de € 7,00;
c) Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização cível deduzido pelo Assistente, e consequentemente, condenar o demandado no pagamento da quantia de € 200,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa de 4% desde a data de notificação do pedido de indemnização civil até integral pagamento, absolvendo-o do demais peticionado.
Ainda em sede de audiência de discussão e julgamento, o Assistente, requereu a junção aos autos de cópia do despacho de suspensão provisória do processo nº 163/20.... em que foi arguido o mesmo deste processo nº 596/20.0GDSTB, sendo que, como defendeu, os factos ali em causa eram semelhantes e pelo mesmo tipo de crime ao que aqui se pondera.
Este pedido foi indeferido.

2. Inconformado com o decidido recorreu o Assistente:

A) Questionando o despacho de não admissão da junção de cópia do despacho proferido no processo nº 163/20...., concluindo: (transcrição)

1. O recurso submetido à mui douta e criteriosa apreciação de Vossas Excelências vem do douto despacho proferido em 23/03/2022, que indeferiu o requerimento formulado pelo Assistente nos tramos do nº 1 do artigo 340º do CPP, em vista da junção de cópia de despacho que determinou a suspensão provisória do inquérito nº 163/20...., onde o aqui arguido figura igualmente como arguido, o aqui Assistente figura também como ofendido, e onde estão em causa factos e é imputado crime da mesma natureza.
2. No decurso da audiência de 23/03/2022, o arguido prestou declarações registas no ficheiro ..., negou a existência de outros processos anteriores, nomeadamente tendo por objecto factos praticados em Março de 2020, da mesma natureza, onde também figura como arguido, e onde figura como ofendido o aqui Assistente (de 00:23:40 a 00:25:18).
3. O arguido reiterou que nunca praticou factos da mesma natureza contra o Assistente, e declarou não havia qualquer motivo para que este último o temesse (de 00:35:34 a 00:35:35).
4. A Mma. Juiz a quo verificou que dos autos constava informação sobre a aplicação de suspensão provisória do processo como sendo negativa, e que a 12/10/2022 não havia registo de aplicação de suspensão provisória ao arguido (de 00:33:19 a 00:33:51).
5. Tendo presente a circunstância de o arguido ter negado a existência de outro processo em que lhe eram imputados factos e crime da mesma natureza e de as suas declarações serem falsas e desmentidas por decisão proferida no inquérito nº 163/20...., o Assistente requereu fosse junta cópia de douto despacho que determinou a suspensão provisória em tal inquérito, onde o arguido figura também como arguido, o Assistente figura como ofendido, e onde, como aqui, lhe era imputada a prática de factos e crime de ameaça, previsto e punido pelo nº 1 do artigo 153º do CP.
6. Foi proferido o douto despacho agora recorrido, que indeferiu tal requerimento com fundamento na circunstância de a junção daquele documento não se revelar essencial para os autos aqui em causa.
7. A informação constante dos autos está descatualizada em face da evolução e desfecho do referido inquérito nº 163/20...., de que nestes autos existe notícia apenas até 12/10/2021, e a junção requerida é essencial desde logo para que a decisão a proferir tenha em consideração informação actualizada, verdadeira e rigorosa.
8. Essa informação actualizada, rigorosa e verdadeira e rigoroso está vertida em douto despacho judicial proferido no referido inquérito nº 163/20...., como Assistente DD deu nota e de imediato requereu a junção de cópia – cfr. doc. nº 1 que ora junta.
9. É também patente que a junção requerida se afigura essencial para a descoberta da verdade, designadamente para que seja proferida de posse de melhor e mais amplo enquadramento da credibilidade das declarações do arguido.
10. Desde logo para constatar que este negou e reiterou em julgamento a inexistência de um processo e a prática de factos que objectivamente não desconhece nem podia desconhecer.
11. Ali foi constituído arguido, ali lhe foi aplicada suspensão provisória do processo e impostas várias injunções várias, em Dezembro de 2021, pelo período de 3 meses, que ainda nem sequer estava decorrido quando se realizou a audiência de 23/03/2022.
12. Sem prejuízo de a aplicação da suspensão provisória do processo não poder ser tida em conta enquanto antecedente criminal do arguido, a junção requerida se revela absolutamente necessária para que a boa decisão da causa, pelas razões expostas.
13. Ao decidir como decidiu, salvo o devido respeito, violou o Mmo. Tribunal a quo o nº 1 do artigo 340º do CPP, que se impunha antes de interpretar e aplicar no sentido de admitir ou ordenar a requerida junção aos autos do douto despacho em causa.

B) Igualmente, recorreu da sentença proferida, evidenciando, para tanto, as seguintes conclusões: (transcrição)

1.Recorre o Assistente da mui douta sentença datada de 15/06/2022, referência ...47, porquanto considera que o Tribunal a quo efetuou uma menos ponderada e acertada apreciação da matéria de facto, como uma menos ponderada e acertada interpretação e aplicação do direito.

*
2.O Arguido tinha a real vontade de ofender a integridade física do Assistente, tendo-lhe comunicado a intenção de materializar tal vontade quando proferiu “agora é que vais ver como elas te mordem!”.
3.As palavras do Arguido são adequadas a provocar intranquilidade, insegurança e medo pela integridade física ao Assistente, como a afectar-lhe a liberdade de decisão e ação, o que representou e efectivamente veio a acontecer.
*
4.Frustrada a tentativa de ofender a integridade física do Assistente, o Arguido proferiu “és um filho da puta, eu sou mais maluco do que tu, o que te safa são as câmaras que tens em casa, eu e a GNR vamos dar cabo de ti!”.
5.Revela-se manifesto que o Arguido mantinha a vontade e predisposição de ofender a integridade física do Assistente, o que lhe transmitiu, e que só se inibiu pela presença das câmaras de vigilância instaladas na casa do Assistente.
6.Este anúncio é objectivamente apto a provocar medo, insegurança e intranquilidade ao Assistente, como a afectar-lhe a liberdade de decisão e ação, o que o Arguido necessariamente representou e pretendeu, e efectivamente veio a acontecer.
7.O Tribunal a quo realizou uma menos ponderada e acertada apreciação do facto porquanto se encontra demonstrado e deve ter-se como provado o facto constante em a).
ADEMAIS,
8.O Tribunal a quo entendeu que a expressão “agora é que vais ver como elas te mordem!” traduz um mal iminente, que não está preenchido o elemento objectivo do tipo de ilícito, pelo que decidiu pela absolvição do Arguido pela prática do crime de ameaça.
9.Contudo, como correctamente se tem posicionado a Jurisprudência, «A punição pela ameaça não é excluída (desde que preenchidos os demais elementos de ordem objetiva e subjetiva naturalmente), pela simples circunstância de ser proferida num contexto de execução iminente do crime prometido ou de crime por ele consumido, desde que a execução deste crime não chegue a ter lugar ou se a mesma execução não for punível, como sucede no caso de tentativa não punível de crime contra a integridade física»
10.O desvalor contido na ameaça cometida pelo Arguido não se esgota no desvalor do ilícito típico executado, devendo a ameaça efectivamente praticada e a supra referida tentativa serem encaradas como situações jurídico-penais autónomas.
11.O Arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a expressão supra referida consubstancia o anúncio de um mal pretendido contra a integridade física do Assistente, apto a provocar medo, inquietação e a prejudicar a liberdade de ação e determinação, o que efectivamente veio a acontecer, e que esta conduta era proibida e punida por Lei.
12.O Arguido afirmou ainda “és um filho da puta, eu sou mais maluco do que tu, o que te safa são as câmaras que tens em casa, eu e a GNR vamos dar cabo de ti!” em tom de voz elevado e hostil, na residência do Arguido, num contexto de animosidade, face à existência de queixas apresentadas pelo Arguido contra o Assistente e vice-versa, e após ameaça com mal iminente e tentativa de ofensa à integridade física.
13.O Arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que a expressão supra mencionada consubstancia o anúncio de um mal pretendido contra a integridade física do Assistente, apto a provocar medo, inquietação e a prejudicar a liberdade de ação e determinação, o que efectivamente veio a acontecer, e que esta conduta era proibida e punida por Lei.
14. Sem prejuízo do mui douto suprimento de V. Exas., Venerandos Senhores Juízes Desembargadores, o Tribunal a quo realizou uma menos ponderada e acertada interpretação e aplicação, entre mais, do disposto do artigo 153.º do Código Penal ao decidir pela absolvição do Arguido pela prática de dois crimes de ameaça.*
15. Na sequência da prolação das supra referidas ameaças, o Assistente sentiu medo, inquietação, insegurança e intranquilidade, afectando-lhe a paz individual que é condição de uma verdadeira liberdade de decisão e ação.
16. Ademais, o Arguido pratica reiteradamente crimes de ameaça contra o Assistente, tendo-lhe inclusive já sido aplicado o instituto da suspensão provisória do processo por crime de ameaça praticado contra o Assistente, pelo que se revelam elevadíssimas as exigências de prevenção especial.
17. Termos em que deve o Arguido ser condenado a pagar ao Assistente quantia não inferior a € 1.900,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.
18. Impondo-se, por tudo isto, revogar a douta Sentença proferida, substituindo-se por outra que condene o Arguido pela prática de dois crimes de ameaça, previstos e punidos pelo artigo 153.º do Código Penal, com as legais consequências, e a pagar ao Assistente quantia não inferior ao montante de € 1.900,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

3. O Digno Mº Pº, em resposta, veio alegar apresentando as seguintes conclusões: (transcrição)
- Em relação ao despacho recorrido:
A) Pelo Assistente foi interposto o recurso do despacho que proferido em audiência de julgamento realizada em 23/03/2022, referência ...97, que decide pelo indeferimento do requerimento formulado pelo Assistente nos termos do nº.1 do artigo 340º. do CPP, em vista da junção a estes autos de cópia de douto despacho que determinou a suspensão provisória do inquérito 163/20...., que correu termos no Departamento de Investigação e Acção Penal, 1ª. Secção de ....
B) A Mma Juiz decidiu indeferir com fundamento que uma vez que o Tribunal não pode ter em consideração o instituto da suspensão provisória do processo por não corresponder a nenhum antecedente criminal do arguido e que os factos alegadamente de tais autos não estão aqui em causa, indefere-se o requerido.
C) À luz do disposto no artigo 340.º do Código de Processo Penal tal decisão não merece censura.

- Em relação à sentença:
1.A douta decisão não merece qualquer reparo.
2. O tribunal a quo fez uma correcta ponderação e apreciação da prova e, efectuou uma correcta qualificação jurídica dos factos.
3. O Arguido num primeiro momento proferiu as expressões “agora é que vais ver como elas te mordem!” e “és um filho da puta, eu sou mais maluco do que tu, o que te safa são as câmaras que tens em casa”, proferida depois de o Arguido chegado aquele local assim que o Assistente abriu o portão automático da residência, saiu do automóvel e aproximou-se do mesmo, interiorizando o Assistente a intenção do Arguido de que iria atingir o corpo do Assistente naquele momento e que o arguido não logrou continuar porque desistiu do prosseguimento da sua conduta.
4. Em seguida o Arguido proferiu a expressão “eu e a GNR vamos dar cabo de ti!”.
5. Em termos individuais o assistente declarou que criou a convicção de que , num primeiro momento quando o Arguido verbalizou “agora é que vais ver como elas te mordem!” e “és um filho da puta, eu sou mais maluco do que tu, o que te safa são as câmaras que tens em casa”, iria ser agredido naquele momento e quando o Arguido verbalizou “eu e a GNR vamos dar cabo de ti” o Assistente interiorizou que futuramente iria ser agredido.
6. Portanto, em termos globais, isto é, conjugando o elemento objectivo com a dimensão individual do Assistente, “apenas” a expressão “eu e a GNR vamos dar cabo de ti!”, no seu espírito, encerrava um mal futuro.
7. Portanto, no caso vertente o Assistente em termos individuais considerou haver receio quanto a expressão “eu e a GNR vamos dar cabo de ti”.
8. A expressão é polissémica podendo significar que o Arguido através da Guarda Nacional Republicana iria litigar contra o Assistente a Tribunal pretendendo vencê-lo, ou então iria haver uma batalha jurídica.
9. À luz do homem médio, salvo melhor opinião, a expressão não é idónea a produzir receio de que futuramente o Arguido e a Guarda Nacional Republicana iriam agredir fisicamente o Assistente.
10. No caso vertente o crime prometido ainda não se tinha iniciado mas estava iminente.
11. O critério determinante, para aferição da incriminação autónoma da “ameaça”, é que da conduta global do agente, praticada em dado momento, resulte que o desvalor contido na ameaça não se esgote no desvalor do ilícito típico executado na mesma ocasião, aferida esta pelo critério da unidade de sentido do acontecimento ilícito-global.

4. O Arguido, reagindo, em resposta, veio defender em conclusões: (transcrição)
-Quanto ao recurso interlocutório:
I. O Assistente veio interpor recurso do indeferimento do requerimento formulado por este nos termos do nº1 do artº 340º do CPP, com vista á junção de cópia do despacho que determinou a suspensão provisória do Inqº 163/20....,
II. O Recorrente concluiu que a Meritíssima Juiz a quo ao decidir como decidiu violou o nº 1 do artº 340 do C.P.P
III. A suspensão provisória de processo após cumprido implica o arquivamento, ou seja é como se não estivesse acontecido, não é feito qualquer menção no Registo criminal, e como tal não pode de forma alguma servir de prova.
IV.Tanto que a Meritissima Juiz a quo decidiu que o Tribunal não pode ter em consideração o Instituto da suspensão provisória do processo por não corresponder a nenhum antecedente criminal do arguido
V. Assim o Recorrido entende que o Tribunal a quo fez uma acertada interpretação e aplicação do artº 340, nº 1 do CPP
VI.Não há violação do artº 340. nº 1 do C.P.P. pelo indeferimento proferido pela Meritíssima Juiz a Quo, atento a fundamentação.

-Quanto à sentença:
I.Venerando Desembargadores, com o devido respeito, somos de entendimento que o Tribunal a quo, não merece qualquer reparo na Douta Sentença proferida nos autos.
II.A Sentença proferida pelo Tribunal a quo aplicou o Direito de forma correcta, não tendo violado o Tribunal a quo qualquer norma jurídica pelo que deverá a mesma manter-se na íntegra!
III.O arguido proferiu as palavras “ agora é que elas te mordem”, enquanto se dirigia ao Assistente, pelo que estamos perante uma tentativa de ofensa á integridade física no momento, (agora) e não perante um mal futuro.
IV.As palavras no seguimento proferidas “Eu e a gnr vamos dar cabo de ti “, não são idóneas para que um homem mediano- e com as características do assistente – curso superior – considere que o arguido em conjunto com a GNR tivesse a intenção no futuro atentar contra a integridade física deste.
V.ora os termos “Eu e a gnr vamos dar cabo de ti “, pode significar que o arguido através da GNR iria litigar em Tribunal contra o Assistente
VI.A Acusação formulada acusa o arguido de um crime de ameaça p e p pelo artº 153, nº 1 do C.P, e não de dois crimes de ameaça.
VII.A Acusação é o elemento chave, pelo que não pode posteriormente ser alterada.
VIII.Para que possa licitamente proceder-se à alteração da qualificação jurídica dos factos descritos na acusação, importa que pelo tribunal seja observado previamente o regime do artigo 358º, n.º 3, do Código de Processo Penal.
IX.Não pode assim o Assistente pretender ver o arguido ora ser condenado por dois crimes de ameaça, quando a qualificação jurídica constante da acusação identifica tão só um crime de ameaça.
X.O recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil só é admissível desde que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade desta alçada e estabelece o artigo 44.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto (Lei de Organização do Sistema Judiciário) que em matéria cível, a alçada dos tribunais da Relação é de (euro) 30 000,00 e a dos tribunais de primeira instância é de (euro) 5 000,00.
XI.Ora não é esse o caso o valor a titulo de indemnização civil peticionado pelo Assistente é de € 1900,00 e o arbitrado foi de e 300,00, pelo que não é admissível recurso nesta parte.

5. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que alude o artigo 416.º do Código de Processo Penal (diploma que se passa a designar de CPPenal), emitiu parecer pronunciando-se no sentido da improcedência de ambos os recursos, defendendo, em síntese :
a) No que concerne ao recurso interlocutório:
- Sendo a diligência pretendida essencial para a descoberta da verdade material deveria o Assistente invocar a existência de uma nulidade nos termos do artigo 120º, nº 2, alínea d) do CPPenal;
- Não o tendo feito tempestivamente, mostra-se a mesma sanada nos termos do preceituado no artigo 120º, nº 3, alínea a) do CPPenal;
- Todavia, mesmo que assim se não entenda, devia o Assistente ter oferecido ou requerido as diligências que entendesse necessárias na fase de inquérito ou de instrução, sendo que em julgamento cabe ao juiz avaliar, em exclusivo, quais os meios de prova cuja produção tem interesse à descoberta da verdade e à boa decisão da causa;
- Por outro lado, os elementos em causa não tinham pertinência para aferir dos antecedentes criminais do arguido ou interessassem para prova dos factos vertidos nestes autos.
b) No que tange à sentença:
- A factualidade em causa, mormente as expressões usadas pelo arguido, não integra nenhum dos elementos típicos e objetivos do crime em referência pois não existiu uma ameaça concreta dirigida a bens pessoais e patrimoniais do queixoso;
- Por outro lado, e contrariamente ao defendido na sentença, as expressões proferidas pelo arguido são manifestamente insuficientes para dar relevo valorativo à conduta daquele como indiciadora de qualquer ofensa corporal iminente, não se podendo assim sequer falar em tentativa de ofensa à integridade física não punível;
- Os factos dados como provados, pura e simplesmente, não são puníveis;
- A absolvição do arguido pelo crime de ameaça é a solução legalmente adequada.

O Assistente veio apresentar resposta ao parecer insistindo no anterior posicionamento assumido nos autos e vertido nos requerimentos recursórios.
Em reação ao posicionamento constante do Parecer, em matéria de recurso interlocutório, sustenta que o despacho em sindicância é passível de recurso, que o Assistente pode requerer a produção de meios de prova em audiência de discussão e julgamento e que a junção requerida é absolutamente necessária para a descoberta da verdade material.
Concernente à sentença, mantém a mesma linha de raciocínio vertida no recurso.

5. Efetuado exame preliminar e colhidos que foram os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir.

II – Fundamentação

1. A decidir

Sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, designadamente a verificação da existência, ou não, dos vícios indicados no art.º 410°, n° 2 do CPPenal, o âmbito do recurso é dado, nos termos do art.º 412º, nº 1 do citado complexo legal, pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, nas quais sintetiza as razões do pedido - jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das secções do STJ de 19/10/95 in D.R., I-A de 28/12/95.
Tendo em conta os fundamentos dos recursos interpostos pelo Assistente e os poderes de cognição deste tribunal, ressaltam como temas de discussão:
- indeferimento da junção de elemento de prova – verificação da nulidade inserta no artigo 120º, nº 2, alínea c) do CPPenal, violação do disposto no artigo 340º, nº 1 do citado complexo legal;
- cometimento pelo arguido de dois crimes de ameaça;
- montante indemnizatório fixado.

2. Apreciação

2.1. O Tribunal recorrido considerou provados os seguintes factos: (transcrição)

1. Factos provados
Com interesse para a decisão da causa provaram-se os seguintes factos:

1. No dia 23 de Julho de 2020, pelas 16h00m, o Arguido dirigiu-se à residência do Assistente EE, sito no ..., n.º ..., em ..., ..., conduzindo uma viatura automóvel de marca e matrícula não concretamente apuradas.
2. Aí chegado, o Arguido, assim que o Assistente abriu o portão automático da residência, saiu do automóvel e aproximou-se do mesmo.
3. Acto contínuo, o Arguido, em tom de voz elevado e hostil, disse ao Assistente. “agora é que vais ver como elas te mordem!”, e “és um filho da puta, eu sou mais maluco do que tu, o que te safa são as câmaras que tens em casa, eu e a GNR vamos dar cabo de ti!”, colocando-se em fuga para parte incerta logo após.
4. O Arguido tinha a real intenção de agredir o Assistente, não o chegando a fazer por se inibir com o conhecimento da existência de câmaras de vigilância no local, e por ter aparecido a testemunha FF.
5. O Arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que dirigia palavras e expressões ofensivas da honra e consideração do Assistente, e que esta conduta era proibida e punida por Lei.
6. O Assistente sentiu-se humilhado.
7. O Assistente sente-se molestado na honra e bom-nome.
8. O Assistente sente diminuído o seu prestigío e consideração social, designadamente junto da testemunha FF, que presenciou os acontecimentos.
Mais ficou provado que:
9. O Arguido:
-É ..., auferindo mensalmente quantia não concretamente apurada;
-Vive com a esposa – que trabalha por conta de outrem, auferindo quantia não concretamente apurada, em casa própria, pagando mensalmente a quantia não concretamente apurada a título de prestação para amortização de um crédito contraído;
-Tem um filho de 13 anos de idade, que estuda em estabelecimento de ensino estatal;
-Paga mensalmente quantia não concretamente apurada a título de prestação para amortização de um crédito pessoal contraído para aquisição de um veículo automóvel;
-Tem uma licenciatura em ...;
-Não tem quaisquer antecedentes criminais registados.

2. Factos não provados
Com interesse para a decisão da causa não se provaram quaisquer outros factos, nomeadamente não se provou que:
a)O Arguido sabia que as expressões que dirigiu ao Assistente eram de molde a provocar-lhe justificado receio pela sua integridade física, dada a forma initimidatória como se lhe dirigiu e ao seu conteúdo, agindo com o propósito de provocar temor e de limitar a liberdade do mesmo, ciente de que a sua conduta era apta a tal, como efectivamente veio a acontecer.
b)Em consequência da conduta adoptada pelo Arguido, o Assistente evita que os seus filhos se desloquem à sua habitação e aí pernoitem.
c)Teme pela integridade física, saúde e bem-estar destes.
d)Os próprios filhos, após terem tomado conhecimento do sucedido, sentem receio de se deslocar à habitação do pai.
e) E de passear ou de o acompanhar na rua, razão pela qual tem diminuído substancialmente o tempo de convivência entre o Assistente e os seus filhos, circunstância que causa grande angústia ao Assistente, levando ao seu progessivo isolamento a cada dia que passa.
f)O Assistente sente vergonha do receio que tem de uma possível aproximação deste e de não conseguir andar sozinho em locais pouco movimentados.

2.2. Motivação da Decisão de Facto (transcrição):

O Tribunal formou a sua convicção, para a determinação da matéria de facto dada como provada e não provada, na análise crítica e conjugada da totalidade da prova produzida, valorada à luz das regras de experiência comum, nos termos do disposto no artigo 127.º do Cód. Proc. Penal.
O Tribunal ponderou as declarações da Arguido, as declarações do Assistente e o depoimento das testemunhas FF, GG, HH, II, JJ e KK.
O facto constante em 1. resultou provado com base nas declarações consonantes do Arguido e do Assistente, que relataram de forma unânime que, no dia e local dos factos, o Arguido se dirigiu à residência do Assistente, aí o tendo abordado.
O Arguido negou a prática dos factos. Esclareceu que, na sequência de conflitos de vizinhança existentes entre os seus sogros e o Assistente, se deslocou à GNR para apresentar queixa e que, no regresso, se dirigiu até ao portão da residência do Assistente, onde, desde o interior do seu veículo, solicitou de forma educada ao Assistente para cessar com as condutas que vinha adoptando contra os seus sogros.
O Assistente apresentou uma versão dos factos diferente da do Arguido. Na verdade, narrou que, no dia e local dos factos, quando se preparava para sair da sua residência no seu automóvel, o Arguido parou o seu veículo na entrada da sua residência, saiu do mesmo, se aproximou de si e lhe dirigiu as expressões constantes em 3., expressões que escreveu de imediato num papel.
O Assistente esclareceu espontaneamente que o Arguido ia agredi-lo, o que não fez por ter sido alertado por si para a existência de câmaras no local. O Assistente foi peremptório ao afirmar que estava em causa uma agressão iminente, que não se concretizou.
Tanto o Arguido como o Assistente apresentaram um relato espontâneo e assertivo.
A testemunha FF, ex-mulher do Assistente, asseverou encontrar-se presente no dia e local dos factos, tendo esclarecido o Tribunal que trabalha juntamente com o Assistente, deslocando-se, por esse motivo, com frequência, à residência deste.
Relatou de forma espontânea e pormenorizada os factos que presenciou, corroborando a versão dos factos aqui descrita pelo Assistente, mormente, as expressões dirigidas pelo Arguido ao Assistente, e, consequentemente, infirmando o relato efectuado pelo Arguido.
Acresce que, não obstante a relação de proximidade que a testemunha FF mantém com o Assistente, a mesma depôs de forma objectiva, limitando-se a descrever o que presenciou, sem tecer quaisquer comentários quanto à conduta adoptada pelo Arguido, não tendo do decurso dos autos resultado que tivesse qualquer interesse ou intenção de prejudicar o aqui Arguido.
Não foi ouvida em sede de audiência de julgamento qualquer outra testemunha presencial dos factos, sendo certo que as convicções das testemunhas GG (sogro do Arguido), HH (sogra do Arguido) e II (esposa do Arguido) quanto à eventual conduta adoptada por este se mostram irrelevantes.
Concatenando os referidos elementos probatórios, mormente, o depoimento da testemunha FF, que corroborou, na íntegra, a descrição dos factos efectuada pelo Assistente, o Tribunal decidiu atribuir maior credibilidade a este último em detrimento do Arguido e, como tal, dar como provados os factos constantes em 2. a 4.
O facto constante em 5. resultou provado da conjugação dos factos ora descritos com as regras de experiência comum. Na verdade, é do conhecimento comum que não se pode proferir expressões ofensivas da honra e consideração de outrem. Dos autos nada resultou no sentido de que o Arguido não tivesse plena capacidade de entendimento. Assim, cotejando todos estes elementos com as regras de experiência comum, apenas se pode concluir que o Arguido quis praticar os factos pelos quais vem acusado, bem sabendo que a sua conduta lhe era vedada por lei.
Os factos constantes em 6. a 8. ficaram provados com base nas declarações do Assistente, que descreveu em Tribunal os seus sentimentos na sequência dos factos, sentimentos que se mostram compreensíveis e credíveis ao abrigo das regras de experiência comum.
No que concerne às condições socio económicas do Arguido, o Tribunal atendeu às suas declarações, por as mesmas se terem mostrado sinceras e como tal credíveis.
Relativamente aos antecedentes criminais do Arguido, o Tribunal teve em consideração o seu certificado do registo criminal.
O facto constante em a) resultou não provado em face da descrição efectuada pelo Assistente. Conforme referido supra, o Assistente referiu de forma espontânea e peremptória que o Arguido
se preparava para agredir o Arguido, o que não concretizou por ter sido alertado para a existência das câmaras, descrição corroborada pela testemunha presente no local dos factos. Tal foi a percepção das pessoas presentes no local, que presenciaram a conduta adoptada pelo Arguido, conduta esta que os levou a intuir, sem qualquer dúvida, que o Arguido tinha a real intenção de agredir o Assistente, conforme afirmado em sede de acusação particular deduzida por este.
Da descrição efectuada pelo Assistente dúvidas não restam que as expressões proferidas pelo Arguido traduziam um mal iminente, que o Arguido não concretizou em face das câmaras existentes no local e, bem assim, da presença da testemunha FF.
Para além disso, das declarações prestadas pelo Arguido e pelo Assistente resultou clara a existência de uma enorme litigiosidade entre os mesmos, tendo ambos referido a existência de apresentação de queixas de um contra o outro, sendo certo que as testemunhas GG, HH e II corroboraram a existência de tais conflitos.
Considerando o teor da expressão proferida pelo Arguido “eu e a GNR vamos dar cabo de ti”, as relações de vizinha conflituosas existentes entre o Assistente e os sogros do Arguido e a existência de queixas apresentadas pelo Arguido contra o Assistente e vice versa, conforme referido por este, não se consegue descortinar de forma inequívoca que o Arguido, ao proferir a referida expressão, pretendia dirigir ao Assistente um mal contra a sua vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor, ou seja, um mal que configura em si mesmo um facto ilícito típico.
Assim sendo, em face das circunstâncias concretas que rodearam estes factos, não sendo possível descortinar da expressão proferida pelo Arguido “eu e a GNR vamos dar cabo de ti”, de forma inequívoca, um mal que configure um facto ilícito típico, impõe-se dar como não provado o facto constante em a).
Os factos constantes em b) a f) foram dados como não provados em face da insuficiência de prova, na medida em que a testemunha FF afirmou peremptoriamente que o Assistente não tem medo pelos seus filhos, os quais deixaram de pernoitar em sua casa por motivos totalmente alheios aos presentes factos.

2.3. Da matéria a decidir

Num primeiro passo, importa ponderar a vertente recursiva interlocutória em que o Assistente recorrente questiona o posicionamento tomado pelo tribunal recorrido, defendendo verificar-se a violação do disposto no artigo 340º, nº 1 do CPPenal.
Suportando este segmento de defesa vem aquele opinar que (…) a junção requerida se afigura essencial para a descoberta da verdade, designadamente para que seja proferida de posse de melhor e mais amplo enquadramento da credibilidade das declarações do arguido (…) para constatar que este negou e reiterou em julgamento a inexistência de um processo e a prática de factos que objectivamente não desconhece nem podia desconhecer (…) Ali foi constituído arguido, ali lhe foi aplicada suspensão provisória do processo e impostas várias injunções várias, em Dezembro de 2021, pelo período de 3 meses, que ainda nem sequer estava decorrido quando se realizou a audiência de 23/03/2022 (…) Sem prejuízo de a aplicação da suspensão provisória do processo não poder ser tida em conta enquanto antecedente criminal do arguido, a junção requerida se revela absolutamente necessária para que a boa decisão da causa, pelas razões expostas.
O preceito em referência surge, ao que parece, na sequência de cópia da sistemática do projetto preliminare italiano de 1978, sendo que versando sobre aquisição de prova está enquadrado no momento da produção da prova em sede de audiência e julgamento.
Diga-se, também, que o inciso em ponderação, em termos interpretativos, deve ter como mote três dimensões do direito probatório as quais se sintetizam em admissibilidade da prova, aquisição da prova (admissão e assunção da prova) e a valoração da prova. Aqui o que efetivamente releva é a aquisição da prova[1].
Assim sendo, parece igualmente claro que estando em causa aspetos atinentes com a aquisição da prova é de crucial exigência que se atenha a regras e princípios sobre admissibilidade da prova e que se execute um juízo de necessidade e / ou relevância das eventuais provas a produzir, para o efeito que se pretende atingir – a verdade material.
Ora, a relevância, por seu turno, deve ser encarada por via de dois elementos – a materialidade e o valor probatório.
Materialidade não é mais do que a relação entre a prova e a factualidade relevante no que constitui o objeto do processo, ou seja, reporta-se à relação existente entre as proposições que determinado meio de prova visa demonstrar e as notas que são o núcleo essencial da materialidade dos autos, sendo que esta essencialidade não é apenas respeitante às questões fundamentais a decidir, mas também abrange outros fatores que possam por algum modo influenciar todo o quadro[2].
De outra banda, o aspeto valor probatório encerra a ideia de aptidão do meio probatório para um juízo sobre a existência de um facto relevante para o processo ser mais provável ou menos provável do que seria sem a existência dessa prova[3].
A notar, também, o juízo de necessidade / relevância / importância da produção de determinada prova cabe ao tribunal pois, a decisão sobre a necessidade ou a desnecessidade da prova, sobre a admissibilidade da prova, pertence naturalmente àqueles que têm de apreciar a prova e julgar a causa[4].
Sopesando todos estes considerandos e transportando-os para o caso aqui em presença, cumprirá então apurar se alguma censura se impõe ao decidido pelo tribunal ad quo.
Atentando, desde logo, no entendimento do Assistente recorrente, é-se tentado, no imediato a seguir a linha do despacho em sindicância.
Com efeito, pretendendo Assistente recorrente, por via da diligência em causa, não só questionar a credibilidade das declarações do arguido e, bem assim, que teria havido em momento anterior um processo onde estariam em causa factos similares aos destes autos, envolvendo o mesmo arguido e o mesmo Assistente, não se retira a menor utilidade e relevância para provar ou não a materialidade que se discute neste processo.
Para apurar da bondade / verticalidade das declarações do arguido, quanto aos factos que aqui em demanda, é o que este declara a respeito do que se discute no processo em que as presta e como o faz, não assumindo importância o que terá acontecido num outro processo que, aliás, como o próprio Assistente reconhece não conduziu a qualquer condenação.
Acresce que, como transparece do aqui decidido, e de forma cristalina, o tribunal recorrido, em sede de motivação, afirma Tanto o Arguido como o Assistente apresentaram um relato espontâneo e assertivo, o que parece demonstrar o como da valoração levada a cabo.
Sublinhe-se, ainda, e talvez o fator de maior preponderância, o facto de o arguido alegadamente ter estado envolvido em factos anteriores semelhantes, onde o Assistente recorrente foi também interveniente, o que desenrolou um processo que culminou com uma suspensão provisória, não tem qualquer significado em termos probatórios para este processo. O que se passou ali, foi ali tratado e ponderado e, sequentemente decidido.
Defender o contrário, é pretender que havendo um antecedente processual qualquer, é mote para consolidar que outros posteriores eventualmente existentes, se bastam com aquele para se concluir como verificados e provados os factos que nestes se pleiteiam. Crê-se que esta linha de pensamento não tem o menor ancoradouro legal, nem doutrinário.
Em último, reiterando o supra aduzido, coube ao Tribunal decidir da relevância deste elemento para a decisão a tomar, e como se mostra claro, foi entendido não ser necessário o mesmo para proferir a decisão final.
Assim sendo, há que considerar que não merece censura o decidido.
Todavia, ainda neste conspecto, importa percorrer o aventado pelo Digno Mº Pº em sede de segunda instância.
Sugere-se que a verificar-se alguma falha, esta desenharia antes a nulidade prevenida no artigo 120º, nº 2, alínea d) do CPPenal – omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade.
Na verdade, esta previsão destina-se a abranger as situações de omissão de atos processuais na fase de julgamento e de recurso, sendo que o aqui se acalenta como nulidade é a denegação da prática de actos processuais probatórios que a lei classifica como prova “essencial””, “indispensável”, “absolutamente indispensável” e “estritamente indispensável” na fase de julgamento e de recurso[5].
Por seu turno, e a seguir este rumo argumentativo, aquela só pode ser conhecida a requerimento do interessado, ou seja, o titular do direito protegido pela norma violada, pelo que, dissecando o nº 2 do citado inciso legal, conjugadamente com a alínea a) do nº 3, deveria a mesma ter sido suscitada na audiência de discussão e julgamento, o que não aconteceu.
Não sendo aduzida tempestivamente, como se pode extrair da normação em evidência, está a mesma sanada. Com efeito, (a)s nulidades do artigo 120º, nº 2 alíneas a) a d) (e outras previstas no mesmo regime) ficam sanadas se não forem arguidas nos termos e nas condições processuais referidas no nº 3 do artigo 120º.
Ora, como bem explana o Digno Mº Pº, neste quadrante, não é unânime o entendimento de que em caso do tipo, se está na verdade na presença de uma nulidade cuja sindicância só pode ter lugar nos termos sobreditos.
Seguindo o defendido pelo Digno Mº Pº, para além do aresto citado a fls. 279, pode ainda notar-se que a violação do artº 340º, nº 1 do C. Processo Penal e por via dela, a violação do princípio da investigação, na sequência do indeferimento da renovação de prova pericial, só pode originar uma nulidade sanável, a enquadrar na alínea d), do nº 2, do art. 120º do C. Processo Penal, e sujeita ao regime de arguição previsto no nº 3 do mesmo artigo (…) Tendo o arguido e a sua defensora estado presentes na audiência de julgamento em que foi proferida a decisão e não tendo reagido até ao termo da mesma arguindo o vício, nem tendo recorrido atempadamente da decisão, sanou-se o vício o que, juntamente com o caso julgado formal entretanto verificado, impede que no recurso interposto do acórdão condenatório se conheça do acerto do ali decidido[6].
Não sendo, na verdade, líquido este percurso, pode concluir-se, pensa-se, que quer pela primeira via argumentativa, quer por via de eventual nulidade sanada, sucumbe este segmento recursivo.

*
Prosseguindo, há que debruçar a análise sobre o alegado cometimento pelo arguido de dois crimes de ameaça, como propugna o Assistente, sendo certo que a matéria de facto se mostra fixada.
Em primeiro lugar, cabe notar que o recurso da matéria de facto pode ocorrer por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, do CPPenal, no que se convencionou chamar de “revista alargada”, ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412º, nºs 3, 4 e 6, do mesmo diploma.
Ora, em sede recursiva, o Assistente, por nenhuma destas formas, questiona a factualidade dada como provada e não provada, sendo que do requerimento de interposição do recurso em análise, quer das motivações, quer das conclusões, nada exubera nesse sentido.
Por seu turno, pretendendo o Assistente que se conclua pela imputação ao arguido a prática de dois crimes de ameaça, não explicando o mesmo como a tal conclusão chega, parece olvidar que o que fixou o objeto do processo, nesta vertente, foi a acusação pública deduzida a qual nunca foi questionada.
Com efeito, parece inexorável que é a acusação, vista no seu todo, que fixa o objeto do processo, dentro do qual se vai mover toda a ação do juiz de instrução e / ou do julgamento, apresentando-se como a base onde se vai desenrolar o contraditório, o exercício do direito de defesa.
Em última análise o que está aqui em causa é a garantia constitucional de defesa do arguido com o princípio, também constitucional, do contraditório que é inerente àquele e cuja efetividade implica uma definição clara e precisa do objeto do processo - artigo 32.º, nºs 1 e 5 da CRP.
Nesta senda, nunca tendo o Assistente posto em causa o libelo acusatório apresentado pelo Digno Mº Pº, tendo-o até acompanhado expressamente[7] não pode agora em sede recursiva trazer à discussão a verificação de dois crimes de ameaça.
Ultrapassado este vetor, toca ponderar da efetiva existência ou não, perante a factualidade narrada em primeira instância, do cometimento pelo arguido do crime de ameaça.
Olhando o tipo inserto no artigo 153º do CPenal, crê-se que o legislador seguiu uma linha de afastamento de uma conceção abstrata e transsocial da liberdade para acolher, antes, uma ideia de bem jurídico intrassocial, onde subjaz uma certa tensão entre o interesse na salvaguarda da liberdade de decisão e de acção e o interesse em não limitar excessivamente a liberdade social de acção[8].
Por outra banda, o bem jurídico acautelado é a liberdade de decisão e de ação, o que decorre da circunstância de, ao se provocar um sentimento de receio / medo / insegurança / intranquilidade no destinatário da ameaça, naturalmente se desencadeia que a paz / serenidade do visado podem ser afetados e sequentemente a sua liberdade[9].
Como elementos constitutivos da infração despontam o objetivo – prática de um crime contra a vida, contra a liberdade pessoal, contra a liberdade e autodeterminação sexual, contra bens patrimoniais de valor considerável, não sendo o bastante uma mera advertência ou aviso – e o elemento subjetivo[10], sendo que imprescindível é que a ameaça se destine a um mal futuro[11].
Precisando, em termos objetivos, o preenchimento do tipo depende da verificação cumulativa das seguintes características: (i) ameaça com um mal, que tanto pode ser de natureza pessoal como patrimonial; (ii) o mal que é objecto da ameaça tem de ser futuro (e não iminente); (iii) a ocorrência do mal futuro decorra da vontade do agente, característica que se revela fundamental para, no tratamento a dar ao caso concreto, se poder determinar se existe uma ameaça ou antes uma simples advertência, e (iv) que a ameaça seja adequada a provocar ao sujeito passivo medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação[12].
Sopesando todos os ditos considerandos e olhando ao caso sub judice, crê-se que a sentença revidenda, neste conspecto da não verificação do crime de ameaça, não padece que qualquer falha.
Em imediato passo, tendo-se concluído como provado que o arguido proferiu as expressões agora é que vais ver como elas te mordem! (…) eu sou mais maluco do que tu, o que te safa são as câmaras que tens em casa, eu e a GNR vamos dar cabo de ti, a verdade é que igualmente foi considerado como não provado, e tal nunca foi questionado pelo Assistente em sede recursiva, O Arguido sabia que as expressões que dirigiu ao Assistente eram de molde a provocar-lhe justificado receio pela sua integridade física, dada a forma initimidatória como se lhe dirigiu e ao seu conteúdo, agindo com o propósito de provocar temor e de limitar a liberdade do mesmo, ciente de que a sua conduta era apta a tal, como efectivamente veio a acontecer.
Tais incontornáveis dados, por ausência do elemento subjetivo do ilícito em causa fazem soçobrar, de pronto, o entendimento perfilhado pelo Assistente.
Na verdade, míster é que se patenteie o dolo, por via da consciência da adequação da ameaça a provocar medo ou intranquilidade no ameaçado[13] o que, como se viu, não se provou.
Por seu turno, ainda que assim se não entenda, o que se não concede, os ditos apontados ao arguido, como proferidos, por si só, não parece envergarem a carga adequada a provocar medo ou inquietação na pessoa do destinatário ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, tendo em atenção critério objetivo – apelo ao homem médio / comum – e individual – considerando as capacidades pessoais do concreto atingido para se sentir tocado pela ameaça.
Verbalizar agora é que vais ver como elas te mordem desacompanhado de um qualquer gesto elucidativo de agressão ou outro, desde logo, não demonstra carga bastante para ser entendido como uma ameaça relevante, muito menos desconhecendo-se a quê – o Assistente nunca refere em recurso o que sentiu ameaçado; se a integridade física, se a liberdade pessoal, se bens patrimoniais…
Tendo abstratamente uma possível leitura de que se pretende agredir / molestar alguém, o certo é que, dentro de todo o contexto de conflitualidade existente, também pode ser vista numa outra perspetiva, como por exemplo a possibilidade de existência de uma queixa, de um processo a intentar pelo arguido contra o Assistente.
Acresce, neste segmento, que a sufragar que efetivamente era intento de o arguido agredir / molestar o Assistente, ante o vocábulo agora, o que se denota é atualidade / imediato / no preciso tempo. Ora, como se viu, é condição do iter criminis em presença que o mal que é objecto da ameaça tem de ser futuro.
Outra expressão em que o Assistente sedimenta a sua tese é eu e a GNR vamos dar cabo de ti. Admitindo-se que afirmar “vamos dar cabo de ti” pode entender-se como fazer mal físico a alguém, causar graves danos físicos a alguém, o certo é que aqui aquela não pode ser lida isoladamente.
Primeiramente, não faz qualquer sentido que o arguido se fosse socorrer da GNR, um órgão de polícia criminal e garante da ordem e do respeito pelas regras vigentes, para infligir um mal físico ou outro, ao Assistente. Ao que soma, a existência de processos entre o Assistente e o arguido, o que inculca a ideia de que o objetivo seria mais um processo contra o Assistente, mais uma queixa contra o Assistente, estes de maior densidade.
Em último, atente-se no aparente detalhe - (…) eu e a GNR vamos dar cabo de ti!”, colocando-se em fuga para parte incerta logo após. Não se vislumbra como perante esta afirmação seguida de uma fuga, se pode pensar que era intento do arguido, por alguma forma, provocar medo / receio / inquietude no Assistente. Crê-se que quem pretende intimidar, causar intranquilidade não foge, mas antes se mantém numa postura de ascendente / poder / pressão, para assim causar o efeito pretendido da insegurança / fragilidade / temor / apavoramento.
Neste seguimento, parece que efetivamente não se desenham os traços mínimos da configuração do crime de ameaça.
Ainda neste vetor, ainda que telegraficamente, uma menção a dois pontos que exuberam.
O primeiro prende-se com a referência do Digno Mº Pº, nesta instância, a propósito do entendimento seguido pelo tribunal recorrido que se transporta no seguinte traço decisório a expressão proferida pelo Arguido traduz um mal iminente e, por isso, conforma um acto de execução do crime de que, afinal, o Arguido não logrou concretizar (…) atenta a factualidade dada como provada, entende-se que o Arguido praticou actos de execução de um crime de ofensa à integridade física simples na forma tentada.
Efetivamente, não se retira de todo o provado em 1ª instância, apenas com base numa declaração desacompanhada de qualquer ato / movimento / ação, que faça muito sentido em falar em ato de execução de um crime de ofensa à integridade física.
Como acima se firmou, dizer agora é que vais ver como elas te mordem pode ser lido de diferentes formas e, despida de outros dados / elementos que melhor a concretizem e adensem, não permite, sem mais, deduzir que há um intento inicial de agredir / atingir o corpo de alguém. Seguir tal linha afigura-se algo temerário.
De outra banda, aspeto não apontado em qualquer momento, poder-se-ia ilustrar na sentença proferida, a dado passo, o vício expresso na alínea c) do artigo 410.º, nº 2 do CPPenal, ou seja, erro notório na apreciação da prova visto este , como tudo o “(…) que não pode ter acontecido, ou quando, usando um processo racional e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória, ou notoriamente violadora das regras de experiência comum, sendo o erro de interpretação detectável por qualquer pessoa” (…) aquele erro de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem médio facilmente dele se dá conta”[14].
Decerto, afirmando o tribunal recorrido o Arguido, em tom de voz elevado e hostil, disse ao Assistente. “agora é que vais ver como elas te mordem!”, e “és um filho da puta, eu sou mais maluco do que tu, o que te safa são as câmaras que tens em casa, eu e a GNR vamos dar cabo de ti!”, colocando-se em fuga para parte incerta logo após e de seguida O Arguido tinha a real intenção de agredir o Assistente, não o chegando a fazer por se inibir com o conhecimento da existência de câmaras de vigilância no local, e por ter aparecido a testemunha FF, teria sido importante que outros factos emergissem ligando / conjugando o que imediatamente parece pouco lógico / anormal acontecer.
Fica por saber qual o rumo traçado para o Tribunal, sem mais materialidade, dar como provado que o arguido fugiu e, em simultâneo, tinha a real intenção de agredir o Assistente. A reforçar, escapam razões que esclareçam em que se baseou o tribunal ad quo para concluir que era intenção do arguido agredir o Assistente. Não se escalpelizou este hiato factual, mormente com eventuais gestos / posicionamentos / ações do arguido relativamente ao Assistente que, pese embora a fuga, o arguido queria na verdade atingir fisicamente o Assistente.
Todavia, como se entende que este contorno, ainda que aqui salientado, em nada altera ou alteraria o processo decisório em sede de 2ª instância, conclui-se pela desnecessidade de daqui retirar quaisquer consequências.
*

Finalmente a questão do montante indemnizatório.
Sendo imediamente percetível que defende o Assistente (…) que deve o Arguido ser condenado a pagar ao Assistente quantia não inferior a € 1.900,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, não logrou o mesmo, em sede conclusiva, sustentar razões que o justifiquem
Conquanto, atentando nas motivações, ao que tudo indica, o sustentáculo da aludida pretensão é o facto de o Assistente ter entendido que estaria consubstanciada a prática pelo arguido de dois crimes de ameaça, quadro este que determinou que aquele tivesse sentido medo, inquietação, insegurança e intranquilidade, afectando-lhe a paz individual que é condição de uma verdadeira liberdade de decisão e ação.
Deste modo, face ao tudo acima decidido, falha o suporte para acalentar este traço recursório.

Por seu turno, e porventura a razão mais exuberante, parece claro que aqui, carece o recorrente de cobertura legal para reagir.
De acordo com o que reza o artigo 44º, nº 1 da Lei nº 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário) sob a epígrafe Alçadas em matéria cível, a alçada dos tribunais de primeira instância é de 5.000,00 Euros.
Ora, estando em causa um pedido de indemnização cível inicial de 1.900,00 Euros – cfr. fls. 100 -, o qual se reitera em sede recursiva, é óbvio que esta matéria não é passível de recurso, sucumbindo assim, também, este ponto do pretendido pelo Assistente.

III – Dispositivo
Nestes termos, acordam os Juízes Secção Criminal – 2ª Subsecção - desta Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto pelo Assistente e, em consequência decidem manter a decisão recorrida.
Custas pelo Assistente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (artigo 515º, nº 1, alínea b) do CPP).

Évora, 15 de dezembro de 2022
(o presente acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo relator, seu primeiro signatário – artigo 94.º, nº 2, do C.P.P.)

(Carlos de Campos Lobo - Relator)
(Ana Bacelar- 1ª Adjunta)
(Renato Barroso – 2º Adjunto)


_________________________________________
[1] Neste sentido, GAMA, António, LATAS, António, CORREIA, João Conde, LOPES, José Mouraz, TRIUNFANTE, Luís Lemos, SILVA DIAS; Maria do Carmo, MESQUITA, Paulo Dá, ALBERGARIA, Pedro Soares de e MILHEIRO, Tiago Caiado, Comentário Judiciário de Código de Processo Penal, Tomo IV Artigos 191º a 310º, 2ª Edição, 2022, Almedina, p. 411.
[2] Deste modo, podem assumir relevo todos aqueles elementos de prova que por algum modo pretendam questionar a credibilidade de testemunhas, a bondade e adequação de uma perícia.
Neste sentido, ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 3ª edição actualizada, Universidade Católica Editora p. 852.
[3] Ideia decorrente do artigo 401 das Federal Rules of Evidence dos EUA - Evidence is relevant if:,
(a) it has any tendency to make a fact more or less probable than it would be without the evidence; and
(b) the fact is of consequence in determining the action.
[4] GASPAR, António Henriques, SANTOS CABRAL, José António Henriques dois Santos, COSTA, Eduardo Maia, OLIVEIRA MENDES, António Jorge de, MADEIRA, António Pereira, GRAÇA, António Pires Henriques da, Código de Processo Penal, Comentado, 2016, 2ª edição revista. Almedina, p. 1049.
[5] ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, ibidem, p. 306.
[6] Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 01/02/2012, proferido no Processo nº 416/10.4JACBR.C1.
[7] Cfr. fls.
[8] DIAS, Jorge de Figueiredo, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I – Artigos 131º a 201º, 1999, Coimbra Editora, p. 340.
[9] Neste sentido, ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 4ª edição actualizada, Universidade Católica Editora p. 654.
Igualmente GARCIA, M. MIGUEZ, RIO, J.M. Castela, Código Penal – Parte geral e especial, Com Notas e Comentários, 2015, 2ª Edição, Almedina, p. 663– O bem jurídico protegido nos crimes contra a liberdade pessoal, não é, pura e simplesmente, a liberdade, mas a liberdade de decidir e de atuar: liberdade de decisão (formação) e de realização da vontade.
[10] Neste sentido, LEAL-HENRIQUES, Manuel, Anotação e Comentário ao Código Penal de Macau (Parte Especial) – Volume III Crimes Contra a Pessoa (Artigos 128º a 195º), 2014, Centro de Formação Jurídica e Judiciária, p. 240.
[11] Neste sentido o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 11/10/2022, proferido no Processo nº 11/17.7GAGDL.E1, disponível em www.dgsi.pt - Através da incriminação da ameaça no artigo 153º do CP, pretendeu o legislador reprimir jurídico-penalmente os ataques ou afetações ilícitas da liberdade individual de decisão e de ação, tutelando-a enquanto interesse jurídico individual e próprio de cada indivíduo à imperturbada formação e atuação da sua vontade, à possibilidade de, nas múltiplas formas de interação social, tranquilamente se conformar e dispor de si mesmo, o que vale por dizer que, para efeito de preenchimento tipo legal, o mal prometido ou anunciado deverá ser, necessariamente, futuro.
[12] Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 21/01/2020, proferido no Processo nº 231/18.7GGSTC.E1, disponível em www.dgsi.pt.
[13] Neste sentido o Acórdão do STJ, de 26/04/2001, proferido no Processo nº 467/01-5ª, referido em LEAL-HENRIQUES, Manuel, ibidem, p. 245.
[14] Ver os Acórdãos do STJ de 12.11.98, BMJ 481, p.325 e de 9.12.98, BMJ 482, p.68.