Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
210/20.4GCBNV.E1
Relator: NUNO GARCIA
Descritores: SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
REVOGAÇÃO
DUPLA VALORAÇÃO
Data do Acordão: 01/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Alega o recorrente que a prática de novos factos no período da suspensão da execução da pena de prisão já foi considera para que lhe tenha sido aplicada prisão efectiva no âmbito de processo posterior a estes autos, pelo que ao considerar-se tal prática agora para operar a revogação da suspensão da pena, estar-se-ia a valorar duplamente tal reiteração.
Mas não há qualquer dupla valoração no mesmo processo e para o mesmo efeito.

No processo posterior a estes autos tratou-se de punir os factos aí praticados, posteriores à condenação ocorrida no presente processo. Aí, entendeu-se considerar para a fixação da pena, entre outras circunstâncias, que os factos foram praticados depois de ao arguido ter sido aplicada uma pena de prisão suspensa na execução.

Aqui, trata-se de extrair a conclusão relativamente à pena aplicada nestes autos.

A ser como alega o recorrente, então, a aplicação do artº 56º, nº 1, al. b), do Código Penal, ficaria esvaziada de conteúdo sempre que no “segundo” processo ocorresse condenação em prisão efetiva.

Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES QUE INTEGRAM A SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA
RELATÓRIO

O arguido AA foi submetido a julgamento, no âmbito do qual foi proferida sentença com o seguinte dispositivo (na parte que interessa):

“Em consequência do exposto, o Tribunal decide:

a) Condenar o arguido AA, pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.ºs 1, alíneas a) e n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de prisão.

b) Suspender a execução da pena pelo período de 3 (três) anos e 6 (seis) meses, sujeita a regime de prova a delinear pela DGRSP (artigos 50.º, do Código Penal e 34.º-B, n.º 1, da Lei n.º 129/2015 de 30 de Setembro), bem como subordinado às seguintes regras de conduta:

- Proibição de contactos por qualquer meio com a assistente/ofendida BB, salvo aqueles estritamente necessários ao exercício das responsabilidades parentais;

- Afastamento da residência e local de trabalho da assistente/ofendida BB;

- Sujeição do arguido a consulta médica para despiste de problemas do foro psicológico e caso necessário a tratamento.”

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Posteriormente, o Ministério Público promoveu a revogação da suspensão da execução da pena, alegando, em resumo, que:

(…) por Douto Acórdão de 07.02.2022, do Tribunal da Relação de Évora proferido no processo n.º 541/21.6…, transitado em 15.03.2023, foi confirmado o Acórdão proferido pelo J… do Juízo Central Criminal de …, no âmbito do qual foi condenado AA pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.ºs 1, alínea b), 4 e 5, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; de 1 (um) crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo artigo 353.º do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão; de 1 (um) crime de ofensa à integridade física, previsto e punido pelo artigo 143.º, nº 1, do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão; e de 1 (um) crime um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão; e, em cúmulo jurídico, na pena única de 4 (anos) anos de prisão e na pena acessória de proibição de qualquer contacto com a vítima BB pelo período de 3 (três) anos;

Vejamos,

Os fatos praticados no processo 541/21.6… ocorreram no período compreendido entre 25 de setembro de 2021 e 14 de setembro de 2021 e logo assim, no período de suspensão da pena de prisão aplicada nestes autos. E consistem, entre outros, na perseguição, controlo da (mesma) vítima a quem o condenado continuou a imputar relações extraconjugais, continuou a ameaçar e a agredir e ainda, no fato de o condenado infringir grosseiramente as regras de conduta a que sabia ter ficado sujeito nestes autos, das quais tinha conhecimento, contactado com a vítima.

Ouvido o condenado, o mesmo demonstra indiferença relativamente à primeira condenação desvalorizando os fatos e a cometidos e não reconhece a autoria dos fatos do processo 541/21.6… ou sequer gravidade das suas acções que voltou a cometer e pelas quais foi julgado e condenado, tão pouco reconhece ter incumprido as obrigações a que tinha ficado sujeito.

Dos comportamentos do condenado extrai-se que este não aceita o fim da relação, não se conforma com as condenações.

Em suma, o condenado não interiorizou o desvalor da sua conduta, nem aceita a sua punição em nenhum dos processos.”

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O arguido opôs-se ao referido requerimento.

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Apreciando a referida promoção, foi proferido o seguinte despacho:

“Por sentença datada de 07.07.2021, transitada em julgado em 06.08.2021, o arguido AA foi condenado pela prática do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.ºs 1, alíneas a) e n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 (três) anos e 6 (seis) meses, sujeita a regime de prova a delinear pela DGRSP (artigos 50.º, do Código Penal e 34.º-B, n.º 1, da Lei n.º 129/2015 de 30 de Setembro), bem como subordinado às seguintes regras de conduta:

- Proibição de contactos por qualquer meio com a assistente/ofendida BB, salvo aqueles estritamente necessários ao exercício das responsabilidades parentais;

- Afastamento da residência e local de trabalho da assistente/ofendida BB

- Sujeição do arguido a consulta médica para despiste de problemas do foro psicológico e caso necessário a tratamento;

Por Douto Acórdão de 07.02.2022, do Tribunal da Relação de Évora proferido no processo n.º 541/21.6…, transitado em 15.03.2023, foi confirmado o Acórdão proferido pelo J… do Juízo Central Criminal de …, no âmbito do qual foi condenado AA pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.ºs 1, alínea b), 4 e 5, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; de 1 (um) crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo artigo 353.º do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão; de 1 (um) crime de ofensa à integridade física, previsto e punido pelo artigo 143.º, nº 1, do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão; e de 1 (um) crime um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão; e, em cúmulo jurídico, na pena única de 4 (anos) anos de prisão e na pena acessória de proibição de qualquer contacto com a vítima BB pelo período de 3 (três) anos.

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Sustenta o Digno Ministério Público que:

- Os factos praticados no processo 541/21.6… ocorreram no período compreendido entre 25 de setembro de 2021 e 14 de setembro de 2021 e logo assim, no período de suspensão da pena de prisão aplicada nestes autos. E consistem, entre outros, na perseguição, controlo da (mesma) vítima a quem o condenado continuou a imputar relações extraconjugais, continuou a ameaçar e a agredir e ainda, no fato de o condenado infringir grosseiramente as regras de conduta a que sabia ter ficado sujeito nestes autos, das quais tinha conhecimento, contactado com a vítima.

- Ouvido o condenado, o mesmo demonstra indiferença relativamente à primeira condenação desvalorizando os fatos e a cometidos e não reconhece a autoria dos fatos do processo 541/21.6… ou sequer gravidade das suas acções que voltou a cometer e pelas quais foi julgado e condenado, tão pouco reconhece ter incumprido as obrigações a que tinha ficado sujeito.

- Dos comportamentos do condenado extrai-se que este não aceita o fim da relação, não se conforma com as condenações.

- Em suma, o condenado não interiorizou o desvalor da sua conduta, nem aceita a sua punição em nenhum dos processos.

- Face ao quadro apresentado, e à personalidade manifestada pelo condenado, não é possível formular um juízo de prognose favorável quanto aos efeitos da ameaça que recaía obre o arguido de cumprimento da pena de prisão caso no futuro voltasse a praticar factos de similiar recorte, como fez.

- O arguido apresenta-se como instável e impulsivo, persecutório e assume uma posição auto-desresponsabilizadora e desta forma nos faz pensar de que a sua ressocialização já não pode ser alcançada em liberdade.

Pelo que promove a revogação da suspensão da execução da pena de prisão aplicada nos autos, e em consequência o cumprimento efetivo da pena de 2 anos e 11 meses de prisão fixada por sentença.

*

O arguido sustenta que:

- um dos argumentos essenciais para o TR Évora condenar o arguido no processo n.º 541/21.6… na pena de prisão efectiva de 4 anos foi precisamente o facto de o arguido se encontrar no período de suspensão da execução da pena de prisão aplicada nos presentes autos.

- Se for revogada a suspensão da pena de prisão em que o arguido foi condenado, será o equivalente a ser duplamente condenado pelos mesmos factos.

- O arguido foi condenado numa pesada pena única no processo n.º 541/21.6…: 4 (quatro) anos de prisão é um período suficientemente longo para assegurar as finalidades das penas no caso concreto.

- A Técnica da DGRSP ouvida na Audiência do Condenado de 26/06/2023 referiu que as coisas estavam a correr bem e que ficou surpreendida quando soube que ele estava detido.

- Referiu também que o arguido teve alta clínica antes do tempo, pois precisava de mais tempo de acompanhamento para superar questões passadas, por ter dificuldades em esquecer as coisas do passado, bem como que o referido acompanhamento psicológico poderia ter lugar em ambiente prisional.

- O arguido não interiorizou o desvalor da sua conduta, nem aceita a sua punição em nenhum dos processos. Porém, tal conclusão emerge das já referidas dificuldades do arguido em esquecer as coisas do passado e não de indiferença relativamente à primeira condenação, desvalorização dos factos cometidos ou da gravidade das suas acções.

- O arguido tem apoio familiar: para além do seu filho, tem ainda o apoio da sua filha CC, professora na Escola ….

- O arguido completa 69 anos de idade no dia …1954: a pena de prisão que o arguido irá cumprir no âmbito no processo n.º 541/21.6… servirá, em nosso entender, as finalidades da pena, atendendo também à sua idade.

*

Cumpre apreciar e decidir.

Nos termos do artigo 56.º, do Código Penal:

“1. A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso o condenado:

a) infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano individual de readaptação social, ou

b) cometer crime pelo qual venha a ser condenado e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.

2. A revogação determina o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença, sem que o condenado possa exigir a restituição das prestações que haja efectuado.”

No caso dos presentes autos, o arguido foi condenado por acórdão transitado em julgado pela prática, no período da suspensão da execução da pena de prisão, de crimes contra a, aqui, ofendida (que, como refere o Digno Ministério Público, consistem, entre outros, na perseguição, controlo da (mesma) vítima a quem o condenado continuou a imputar relações extraconjugais, continuou a ameaçar e a agredir) e violou grosseiramente as regras de conduta às quais ficou obrigado nestes autos e das quais tinha conhecimento.

Desta forma, há que concluir que o juízo de prognose favorável em relação ao comportamento do arguido, o qual estive subjacente à suspensão da execução da pena de prisão aplicada nos presentes autos, não se verificou, revelando o arguido, com o seu comportamento, que as finalidades que estiveram na base da suspensão não foram alcançadas.

No que concerne à argumentação do arguido, dir-se-á que uma pena de prisão suspensa na sua execução é uma pena de prisão que não é executada porque existem elementos no processo que levam a crer que a ameaça da prisão é suficiente para evitar a prática de novos factos. Se o arguido pratica novos factos, contra a mesma vítima, então não se pode afirmar que a ameaça foi suficiente. O arguido compreendeu a pena que lhe foi aplicada, compreendeu que as regras de conduta às quais ficou sujeito e compreendeu como teria de se comportar para não ser preso.

O acompanhamento psicológico não altera esta realidade. A ameaça de prisão não foi suficiente para alterar ou condicionar o comportamento do arguido.

No que concerne a estar em causa uma situação equivalente a uma dupla condenação pelos mesmos factos, naturalmente, em cada processo são valorados os factos praticados, os antecedentes do arguido e a sua personalidade.

O tribunal da segunda condenação fez essa valoração e tirou as conclusões que constam do acórdão em questão.

Nestes autos, em face dos comportamentos do arguido posteriores à condenação (os quais o mesmo sabia que eram condição para se manter em liberdade), revisita-se o juízo de prognose feito no momento da condenação.

São avaliações feitas em processos diferentes e com finalidades diferentes.

Não há dupla valoração dos mesmos factos.

Quanto ao suporte familiar de que o arguido beneficia, o mesmo será sempre importante para a ressocialização do arguido, mas, nesta sede, não poderá influir no juízo a formular, pois o arguido, nem com suporte familiar deixou de violar grosseiramente as regras de conduta que lhe foram impostas ou de praticar novos crimes.

Finalmente, a idade do arguido, aliada à pena de prisão de 4 anos que terá de cumprir são relevantes para os autos da segunda condenação. Nestes autos está em causa a primeira condenação e a verificação da suficiência/eficácia da suspensão da execução da pena e, contatou-se que a mesma não foi suficiente nem eficaz.

Face ao exposto e, concordando com a posição manifestada pelo Ministério Público, nos termos do artigo 56º, nº 1, alínea a) e b) nº 2 do Código Penal, declara-se revogada a suspensão da pena aplicada ao arguido AA e determina-se que este cumpra a pena de 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de prisão que lhe foi aplicada por sentença proferida nos presentes autos.

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Discordando do referido despacho, dele recorreu o arguido, tendo terminado a motivação de recurso com as seguintes conclusões:

“1 - O presente recurso vem interposto do douto Despacho de revogação da pena de prisão proferido em 01/08/2023 nos autos de processo Comum perante Tribunal Singular, que corre termos sob o n.º 210/20.4GCBNV, Juiz … do Juízo Local Criminal de … do Tribunal Judicial da Comarca de …, onde o arguido foi condenado, por sentença datada de 07/07/2021, transitada em julgado em 06/08/2021, pela prática do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.ºs 1, alíneas a) e n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 11 (onze) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 (três) anos e 6 (seis) meses, sujeita a regime de prova a delinear pela DGRSP (artigos 50.º, do Código Penal e 34.º-B, n.º 1, da Lei n.º 129/2015 de 30 de Setembro), bem como subordinado às seguintes regras de conduta:

- Proibição de contactos por qualquer meio com a assistente/ofendida BB, salvo aqueles estritamente necessários ao exercício das responsabilidades parentais;

- Afastamento da residência e local de trabalho da assistente/ofendida BB;

- Sujeição do arguido a consulta médica para despiste de problemas do foro psicológico e caso necessário a tratamento.

2 - O arguido foi posteriormente condenado no processo n.º 541/21.6… por Douto Acórdão de 07/02/2022 do Tribunal da Relação de Évora, transitado em 15/03/2023, o qual confirmou o Acórdão proferido pelo J… do Juízo Central Criminal de …, pela prática de: um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.ºs 1, alínea b), 4 e 5, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; de 1 (um) crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo artigo 353.º do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão; de 1 (um) crime de ofensa à integridade física, previsto e punido pelo artigo 143.º, nº 1, do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão; e de 1 (um) crime um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão; e, em cúmulo jurídico, na pena única de 4 (anos) anos de prisão e na pena acessória de proibição de qualquer contacto com a vítima BB pelo período de 3 (três) anos.

3 - Analisado o douto Despacho recorrido verifica-se que não foi feita qualquer análise crítica às declarações prestadas pelo condenado em sede de audiencia de audição de condenado, pois não existe uma única alusão às declarações deste.

4 - Tais declarações foram prestadas perante a Meritíssima Juiz de Direito titular do presente processo e a decisão recorrida foi proferida pela Meritíssima Juiz de Direito que se encontrava de turno. Esta analisou toda a prova existente nos autos relevante para a boa decisão da causa, mas, porém, não ouviu de viva voz as declarações do condenado, nem analisou a sua postura corporal e emocional e as suas reacções perante as questões que lhe foram colocadas na Audiência de Audição de condenado.

5 - Ou seja, em nosso entender, qual tal acontece, o Princípio da Imediação não pode ser plenamente cumprido, com eventuais prejuízos para os condenados, o que se verificou, salvo o devido respeito, no presente caso. Pois, o aludido Princípio da Imediação exige uma relação próxima entre as provas e o Juiz, de tal forma que, desta relação, decorrerá uma perceção material por parte do Juiz e esta perceção estará, naturalmente, na base da sua decisão.

6 - Ao contrário do que é referido pelo M. P. na sua douta promoção, o arguido não se apresentou instável, impulsivo e persecutório. Pelo contrário, apresentou-se sereno e ciente dos seus actos e das consequências dos mesmos, tendo demonstrado arrependimento, emocionando-se ao relatar as circunstâncias em que os factos aconteceram, conforme resulta das declarações prestadas pelo arguido na audiência de audição de condenado realizada no dia 26/06/2023, que tiveram inicio às 11:15 e terminaram às 11:49, disponíveis na plataforma citius e que se juntam em anexo como doc n.º 1.

7- Porém, o Tribunal a quo não fez qualquer referência ou análise sobre as declarações do arguido, sobra a sua postura, sobre o seu arrependimento, não valorando de todo as mesmas quer positiva, quer negativamente.

8 - Igualmente, no douto despacho recorrido, também não é feita qualquer referencia às declarações da Senhora Técnica da DGRSP, a qual foi ouvida na Audiência do Condenado de 26/06/2023 e referiu que as coisas estavam a correr bem e que ficou surpreendida quando soube que ele estava detido e que o arguido teve alta clínica antes do tempo, pois precisava de mais tempo de acompanhamento, acrescentando que planeava propor um plano para acompanhamento, conforme resulta das declarações prestadas pela Sra. Técnica na audiência de audição de condenado realizada no dia 26/06/2023, que tiveram inicio às 11:49 e terminaram às 12:03, disponíveis na plataforma citius e que se juntam, em anexo, como doc n.º 2.

9 - A Sra Técnica referiu que acompanhamento psicológico poderia ter lugar em ambiente prisional, uma vez que o arguido se encontra atualmente detido.

10 - Compulsado o douto Despacho recorrido verifica-se que, também quanto às declarações da aludida Técnica da DGRSP, não foi feita pelo Tribunal a quo qualquer análise crítica às mesmas, num claro e manifesto prejuízo para o arguido.

11- A revogação da suspensão da pena de prisão em que o arguido foi condenado o mesmo equivale a o arguido ser duplamente condenado pelos mesmos factos.

Na verdade, no processo n.º 541/21.6… teve um peso preponderante o facto de a pena não privativa da liberdade anteriormente aplicada não ter servido de suficiente advertência contra o crime. e nos presentes autos são os mesmos factos utilizados para fundamentar a decisão de revogação da pena de prisão.

12 - Os factos respeitantes ao crime de violência doméstica praticados pelo arguido em causa no processo n.º 541/21.6… conduziram à sua condenação no crime de violência doméstica, no crime de violação de imposições, proibições ou interdições e, agora, nos presentes autos, para o Tribunal a quo, os mesmos factos determinaram a revogação da suspensão da pena de prisão.

13 - Verifica-se, assim, há uma “dupla” valoração dos mesmos factos.

14 - O arguido necessita de acompanhamento psicológico; não necessita de um período de prisão ainda mais prolongado, pois a ressocialização do arguido não irá acontecer através do cumprimento de uma longa pena de prisão, mas sim através de acompanhamento psicológico.

O arguido completa 69 anos de idade no dia …/2023, pelo que atendendo à sua idade, a pena de prisão que o arguido irá cumprir no âmbito no processo n.º 541/21.6… servirá, plenamente as finalidades da pena.

15 - A douta promoção do Ministério Público remete, na sua douta Promoção, para os fundamentos invocados no douto Acórdão de 07/02/2022 do TR de Évora no processo n.º 541/21.6…, no qual o arguido foi condenado, em cúmulo jurídico, na pena única de 4 (quatro) anos de prisão. Por sua vez, o Tribunal "a quo" baseia a sua decisão em pouco mais do que foi argumentado na aludida Promoção do M.P.

16 - De onde se conclui que um dos argumentos essenciais para o TR Évora condenar o arguido no processo n.º 541/21.6… na pena de prisão efectiva de 4 anos foi precisamente o facto de o arguido se encontrar no período de suspensão da execução da pena de prisão aplicada nos presentes autos. Ou seja, os factos em causa no processo n.º 541/21.6… foram valorados várias vezes no sentido de condenar o arguido.

17 - Importa portanto saber se à data da prolação do despacho recorrido, estavam verificados os pressupostos da revogação da suspensão da execução da pena de prisão e se está, irremediavelmente, posto em causa o juízo de prognose favorável que esteve subjacente à suspensão da execução da pena de prisão aplicada nestes autos.

18 - A revogação da suspensão da pena só deve ter lugar como última ratio, isto é, só deve ser determinada quando estiverem esgotadas ou se revelarem de todo ineficazes as restantes providências previstas no art.º 55.º do Código Penal, (cfr. Ac. da RP de 16-11-2005, proferido no processo n.º 0542196, pelo relator António Gama, in www.dgsi.pt).

19 - Pelo que se impõe uma especial exigência na verificação e apreciação de todos os factos e circunstâncias suscetíveis de relevar na aferição da possibilidade de manutenção ou não do juízo de prognose favorável relativo ao comportamento que o condenado irá de futuro adotar.

O que, não foi feito pelo Tribunal "a quo"!

20 - As necessidades de prevenção geral afiguram-se elevadas, contudo, as exigências de prevenção especial serão, in casu, forçosamente diminutas, pelo que a condenação do arguido numa pena de quatro anos, que está presentemente a cumprir, será suficiente para serem alcançadas e cumpridas as finalidades da punição.

21 - Existindo, face à idade do arguido e sua capacidade de interiorização e de reconhecimento das consequências dos seus actos, manifestada em sede de audiência de audição de condenado, fundadas expectativas de ressocialização, é razoável admitir um comportamento futuro conforme com os ditames do direito, pelo que deverá ser mantida a suspensão da execução da pena de prisão aplicada nos presentes autos.

22 - O Tribunal “a quo” ao decidir nos termos do douto despacho recorrido, não fez a adequada ponderação dos factos e uma correcta aplicação do Direito, pois ao não apreciar criticamente os depoimentos do condenado e da Sra. Técnica da DGRSP, violou o disposto no artigo 124.º do CPP e, ainda, ex vi art. 4.º do CPP, o disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC.

E, ainda, o decidir como decidiu, o Tribunal "a quo" violou também o disposto nos arts. 40.°, 55.° e 56.º do Código Penal, uma vez que a revogação da suspensão da pena só deve ter lugar como última ratio, isto é, só deve ser determinada quando estiverem esgotadas ou se revelarem de todo ineficazes as restantes providências previstas no art.º 55.º do Código Penal.

Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser reformulada a decisão recorrida nos termos supra expostos, fazendo-se, deste modo, a costumada Justiça.”

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O Ministério Público respondeu ao recurso, sem apresentar conclusões e pugnando pela sua improcedência.

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A assistente também respondeu ao recurso, tendo terminado a resposta com as seguintes conclusões:

“A) O presente recurso vem interposto do douto despacho proferido nos autos em 01/08/2023, com a referência citius n.º …, nos termos do qual o Tribunal a quo decidiu revogar a suspensão da execução da pena de prisão em que o arguido foi condenado e, em consequência, determinar que o mesmo cumpra a pena de 2(dois) anos e 11 (onze) meses de prisão que lhe foi aplicada por sentença transitada em julgado em 07/07/2021.

B) O Tribunal a quo considerou que o juízo de prognose favorável em relação ao comportamento do arguido, que esteve subjacente à suspensão da execução da pena de prisão que lhe foi aplicada nos autos, não se verificou, porquanto, o mesmo foi condenado, por acórdão já transitado em julgado, pela prática, no período da suspensão da execução da pena, do mesmo crime (violência doméstica) contra a mesma vítima (a aqui assistente), tendo, assim, violado de forma grosseira as regras de conduta às quais ficou obrigado nos autos, e das quais tinha perfeito conhecimento.

C) Salvo o devido respeito, o recurso do arguido carece de qualquer fundamentação lógica, devendo, em consequência, ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo, nos seus exactos termos.

D) O recorrente começa por considerar que o Tribunal a quo violou o Princípio da Imediação, porquanto não foi feita qualquer analise crítica às declarações prestadas pelo arguido, o mesmo sucedendo quanto ao depoimento prestado pela Senhora Técnica da DGRSP.

E) Na sua perspectiva, tal decorre do facto de a decisão ter sido proferida pela Meritíssima Juiz de turno, e não pela Meritíssima Juiz titular do processo, que foi quem ouviu o arguido e a Senhora Técnica em declarações.

F) Em suma, na sua opinião, a Meritíssima Juiz a quo que decidiu, não obstante ter analisado toda a prova existente (palavras do arguido), não o ouviu de viva-voz, quando o mesmo prestou declarações, nem analisou a sua postura corporal e emocional e as suas reacções perante as questões que lhe foram sendo colocadas.

G) O recorrente parece querer referir-se, não só ao princípio da imediação, como, também, ao princípio do Juiz natural, na medida em que, não só põe em causa a apreciação da prova (análise crítica), como, também, o facto de, não obstante as declarações do arguido terem sido prestadas perante a Meritíssima Juiz titular do processo, ter sido a Meritissima Juiz de Turno quem proferiu a decisão.

H) Salvo melhor opinião, os Princípios da Imediação e do Juiz natural reportam-se, sobretudo, à produção de prova em sede de Julgamento.

I) Pelo que, não se pode afirmar que a produção de prova efectuada fora do contexto da imediação, como é o caso, viole este princípio, o mesmo se dizendo quanto ao princípio do Juiz natural.

J) De outro modo, fazendo o despacho de revogação da suspensão da execução da pena de prisão, parte integrante da sentença de condenação (a decisão é um todo), teria de ser a Meritíssima Juiz que proferiu a sentença, a avaliar o cumprimento do 16/20 regime de prova e das regras de conduta impostas ao arguido, para efeitos de revogação, ou não, da suspensão da execução da pena de prisão, o que não é praticável, nem é o que resulta da lei.

K) Por outro lado, estar-se-ia a violar o preceito legal que prevê a substituição dos Juízes e dos magistrados do Ministério Público, quando os mesmos se encontram impedidos, designadamente, por força do gozo das suas férias, como parece ter sido o que ocorreu no presente caso (cfr. artigo 86.º, da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto)

L) O arguido foi ouvido em data próxima às férias judiciais, sendo que os presentes autos têm carácter urgente, o que significa que, perante o impedimento da Juiz titular, a Meritíssima Juiz de turno tinha plena competência para despachar o processo, como fez.

M) Acresce, por outro lado, que a Meritíssima Juiz tomou em consideração a posição das partes, designadamente, as declarações do arguido e da Senhora Técnica da DGRSP, como facilmente se percebe pela leitura atenta do despacho agora em crise.

N) Finalmente, não pode concordar-se que o arguido, na sua audição, se mostrou sereno e ciente dos seus actos, tendo demonstrado arrependimento, emocionando-se ao relatar as circunstâncias em que os factos aconteceram.

O) Com efeito, o que resulta das suas declarações, é que o arguido tem consciência de que violou as regras de conduta às quais ficou obrigado nos presentes autos e que não interiorizou o desvalor da sua conduta.

P) O que o arguido revelou foi desprezo pelas obrigações a que estava adstrito, sendo que o seu choro não foi de arrependimento, mas consequência do facto de se ter apercebido que estaria na iminência de cumprir mais alguns anos de prisão.

Q) Mas ainda que não tivessem sido relevadas as declarações do arguido e da Senhora Técnica da DGRSP, estamos em crer que, perante a objectividade dos factos que motivaram a revogação da suspensão da pena de prisão, o pretenso arrependimento do arguido é irrelevante.

R) O que importa aferir é se o arguido, ao ter praticado os factos que deram origem ao processo n.º 541/21.6…, pelos quais foi condenado por acórdão transitado em julgado, violou, de forma grosseira, as regras de conduta às quais ficou obrigado e se é, ainda, possível, fazer o juízo de prognose favorável que esteve na base da suspensão da pena de prisão que lhe foi aplicada nos presentes autos.

S) Acreditamos que não possível, perante as evidências, fazer um juízo de prognose favorável em relação ao arguido.

T) Igualmente, somos de parecer que o “arrependimento” posterior, manifestado em sede de audição de condenado, não afasta, nem diminui, a gravidade dos factos, nem tem a virtualidade de influenciar a decisão.

U) Se não houver uma forte exigência no cumprimento das regras que estão subjacentes à suspensão da pena de prisão, e se se fizer depender a revogação do arrependimento posterior do arguido, esta dificilmente teria lugar, para já não falar que o “arrependimento” é um sentimento fácil de simular.

V) Assim, somos de parecer que os princípios da imediação e do Juiz natural não foram violados.

W) O arguido alega, também, que sendo revogada a suspensão da pena de prisão em que foi condenado, o mesmo equivale a ser duplamente condenado pelos mesmos factos, porquanto, os factos que determinaram a revogação são os mesmos que conduziram à condenação do arguido no processo n.º 541/21.6….

X) Mais uma vez, não lhe assiste razão.

Y) Como muito bem refere o Tribunal a quo, “… Nestes autos, em face dos comportamentos do arguido posteriores à condenação (os quais o mesmo sabia que eram condição para se manter em liberdade), revisita-se o juízo de prognose feito no momento da condenação. São avaliações feitas em processos diferentes e com finalidades diferentes…” – negrito nosso.

Z) Acrescentaríamos: são avaliações de factos e de contextos diferentes.

AA) De outro modo, também a este pretexto, nunca seria possível revogar a suspensão da pena de prisão e a norma legal que a prevê seria praticamente inócua.

BB) Não se trata de condenar o arguido, porque ele já foi condenado nos presentes autos. Logo, não pode haver dupla condenação.

CC) Trata-se de avaliar as circunstâncias em que a suspensão da execução da pena foi concedida ao arguido e, bem assim, se essas circunstâncias se mantêm para efeitos de se perceber se ainda se mantém o juízo de prognose favorável.

DD) Não há, por consequência, uma dupla valoração dos mesmos factos.

EE) Finalmente, alega o arguido que, no presente caso, não se encontram verificados os pressupostos da revogação da suspensão da execução da pena de prisão ( que deve ter lugar como última ratio), porquanto, a condenação do arguido numa pena de prisão de 4 anos, que está a cumprir, é suficiente para serem alcançadas e cumpridas as finalidades da punição, existindo, face à idade do arguido, e à sua capacidade de interiorização dos seus actos, fundadas expectativas de ressocialização e de um comportamento futuro conforme as regras do direito.

FF) É certo que, a revogação da suspensão da pena de prisão deve ser entendida como a última solução.

GG) No presente caso, verifica-se que o arguido, não só praticou vários crimes no período da suspensão, como, também, que o fez no mesmo ano em que foi condenado nos presentes autos, isto é, num curtissimo espaço de tempo.

HH) Por outro lado, o arguido foi condenado, por acórdão transitado em julgado, pela prática do mesmo crime (violência doméstica), contra a mesma vítima, tendo utilizado o mesmo modus operandi (perseguição, controlo, imputação de relações amorosas, ameaças e agressões).

II) Acresce que o arguido, não obstante a narração que fez das várias situações que desencadearam um novo processo, que confessou, assumiu, perante os factos, uma postura instável, contraditória, de auto desresponsabilização e de vitimização, não aceitando a punição em nenhum dos processos.

JJ) O que significa que não interiorizou o desvalor/ilegalidade da sua conduta, antes revelou desprezo pelas regras de conduta a que estava obrigado judicialmente e que foram condição da suspensão da execução da pena de prisão, as quais compreendeu perfeitamente.

KK) O arguido revelou, sim, ser persecutório, propenso à prática do crime de violência doméstica, necessitando de ajuda profissional para ultrapassar e combater esta tendência.

LL) Assim, não revogar a suspensão neste caso, seria ignorar os sucessivos comportamentos reincidentes do arguido, e desvalorizar completamente a decisão condenatória do Tribunal, que lhe impôs o cumprimento de regras de conduta para que pudesse beneficiar da suspensão e que o mesmo violou de forma grosseira.

MM) Neste contexto, somos de parecer que o Tribunal a quo fez uma correcta interpretação e aplicação do que dispõem os artigos 40.º, 55.º e 56.º do Código Penal, devendo, assim, manter-se a decisão de revogação da suspensão da pena de prisão em que o arguido foi condenado nos presentes autos, com as legais consequências.

Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado improcedente, por não provado e, em consequência, ser mantida a decisão de revogação da suspensão da pena de prisão em que o arguido foi condenado, nos seus exatos termos, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!”

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Neste tribunal da relação, o Exmº P.G.A. emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso e, cumprido que foi o disposto no artº 417º, nº 2, do C.P.P., não foi apresentada resposta.

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APRECIAÇÃO

A única questão que importa analisar no presente recurso é a de se saber se deve, ou não, ser revogada a suspensão da execução da pena de prisão aplicada nestes autos.

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Para além da condenação proferida nestes autos, cujos termos já se deixaram referidos, importa considerar que por acórdão de 7/2/2022, deste tribunal da relação, proferido no processo n.º 541/21.6…, transitado em julgado em 15.03.2023, foi confirmado o acórdão proferido pelo J… do Juízo Central Criminal de …, no âmbito do qual foi o arguido condenado pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.ºs 1, alínea b), 4 e 5, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; de 1 (um) crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo artigo 353.º do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão; de 1 (um) crime de ofensa à integridade física, previsto e punido pelo artigo 143.º, nº 1, do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão; e de 1 (um) crime um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão; e, em cúmulo jurídico, na pena única de 4 (anos) anos de prisão e na pena acessória de proibição de qualquer contacto com a vítima BB pelo período de 3 (três) anos.

Resulta do exposto que a vítima no processo 541/21.6… é precisamente a mesma dos presentes autos.

E os factos pelos quais o arguido foi condenado em ambos os processos são também idênticos: agressões físicas, injúrias, ameaças, perseguições.

Na sentença proferida no presente processo, a propósito da aplicação da suspensão da execução da pena de prisão, escreveu-se:

“Os princípios de prevenção especial são assim, aqueles que estão subjacentes à suspensão da execução de uma pena privativa de liberdade, tanto mais que, na situação do ilícito dos presentes autos, sempre se dirá que essa mesma suspensão apenas ocorrerá com sujeição a regime de prova, pois só um acompanhamento direccionado para aquele arguido em concreto, permitirá que o mesmo se consciencialize dos actos por si praticados, e do desvalor dos mesmos, e só dessa forma se alcançará, de modo pleno, a promoção da reintegração do condenado na sociedade.

Tudo considerado, permite realizar um juízo de prognose favorável ao arguido, e desse modo concluir pela forte probabilidade de que não venha a praticar novos crimes; considerando ainda que a reprovação do crime cometido, através da aplicação da pena fixada, serão elementos bastantes para que não venha a reincidir.

Afigura-se assim que, a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”

Ora, facilmente se conclui, face ao exposto, que a suspensão da execução da pena aplicadas nestes autos não surtiu qualquer efeito.

Na realidade, logo no mês a seguir ao trânsito em julgado da sentença proferida nos presentes autos, o arguido voltou a importunar seriamente a vítima, tal como se considerou provado no procº 541/21.6….

O arguido voltou a praticar factos idênticos, tendo como alvo a mesma vítima, pelos quais foi condenado no referido processo 541/21.6…, em pena de prisão efectiva, conforme resulta da certidão junta a estes autos em 13/4/2023.

Não só arguido voltou a praticar factos idênticos aos anteriormente objecto de condenação, como violou a imposição de não contactar com a vítima, tendo sido igualmente condenado pela prática de crime de violação de imposições.

É, assim, evidente que não foram alcançadas as finalidades que se pretendiam atingir com a suspensão da execução da pena de prisão, pelo que bem andou o despacho recorrido ao determinar a revogação dessa suspensão.

Alega o recorrente que não foi considerado o seu depoimento prestado nos termos do artº 495º, nº 2, do C.P.P., em 26/6/2023.

Ora, se é certo que no despacho recorrido não se faz qualquer alusão concreta a esse depoimento, não é menos certo que no mesmo se consideraram as explicações dadas pelo arguido com a vista a justificar o seu comportamento.

Por outro lado, resulta bem patente do despacho recorrido que se entendeu, e bem, que o alegado pelo arguido não justifica que tenha persistido no seu comportamento e tenha desrespeitado a imposição de afastamento da vítima.

Aliás, ouvida que foi a gravação das declarações prestadas em 26/6/2023, as mesmas mais não são do que “reiteração de defesa” relativamente ao processo 541/21.6…, imputando acusações à vítima.

Alega também o recorrente que a prática de novos factos no período da suspensão da execução da pena de prisão já foi considera para que lhe tenha sido aplicada prisão efectiva no âmbito do processo 541/21.6…, pelo que ao considerar-se tal prática agora para operar a revogação da suspensão da pena, estar-se-ia a valorar duplamente tal reiteração.

Como é bom de ver, com o devido respeito, trata-se de um entendimento “enviesado”.

Com efeito, não há qualquer dupla valoração no mesmo processo e para o mesmo efeito.

No processo 541/21.6… tratou-se de punir os factos aí praticados, posteriores à condenação ocorrida no presente processo. Aí, entendeu-se considerar para a fixação da pena, entre outras circunstâncias, que os factos foram praticados depois de ao arguido ter sido aplicada uma pena de suspensão a pena de prisão.

Aqui, trata-se de extrair a conclusão relativamente à pena aplicada nestes autos.

A ser como alega o recorrente, então, a aplicação do artº 56º, nº 1, al. b), do Código Penal, ficaria esvaziada de conteúdo sempre que no “segundo” processo ocorresse condenação em prisão efectiva.

Não tem o recorrente qualquer razão quanto a esta questão.

Apela, ainda, o arguido à sua idade (actualmente 69 anos) para justificar a revogação do despacho recorrido.

Acontece que é precisamente a idade que o arguido tem que o deveria ter levado a reflectir e a inverter o seu percurso “perturbador” da vítima.

É que nem a ameaça da execução da pena de prisão o fez afastar desse percurso, dominado por ciúmes descontrolados. Foi o arguido que não aproveitou a oportunidade que lhe foi dada, tendo continuado como se nada tivesse acontecido.

Resta referir que as declarações da Srª técnica de reinserção social no que diz respeito à alta médica do arguido são, com o devido respeito, inconsequentes, sendo certo que é ao médico que cabe determinar essa alta, baseado em razões clínicas, como certamente foi.

Face a tudo o exposto, resulta que está preenchida a previsão do artº 56º, nº 1, al. b), do Cód. Penal, tendo sido acertada a decisão de revogação da suspensão a execução da pena de prisão.

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DECISÃO

Face ao exposto, acordam os Juízes em julgar o recurso improcedente.

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Deverá o arguido suportar as custas, com taxa de justiça que se fixa em 3 UCs.

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Évora, 23 de Janeiro de 2024

Nuno Garcia

Maria Filomena Soares

J.F. Moreira das Neves