Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
238/12.8PBPTG.E1
Relator: ANTÓNIO LATAS
Descritores: CRIME INFORMÁTICO
FALSIDADE
ELEMENTOS DA INFRACÇÃO
Data do Acordão: 05/19/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Sumário: 1. O tipo objetivo do crime de falsidade informática previsto no nº 1 do artigo 3º da Lei nº 109/2009, de 15 de setembro, é integrado, no plano objetivo, pela introdução, modificação, apagamento ou supressão de dados informáticos ou por qualquer outra forma de interferência num tratamento informático de dados, de que resulte a produção de dados ou documentos não genuínos, consumando-se o crime apenas com a produção deste resultado.
2. Do ponto de vista subjetivo, o tipo legal supõe o dolo, sob qualquer das formas previstas no artigo 14º do Código Penal, exigindo, enquanto elemento subjetivo especial do tipo, a intenção de provocar engano nas relações jurídicas, bem como, relativamente à produção de dados ou documentos não genuínos, a particular intenção do agente de que tais dados ou documentos sejam considerados ou utilizados para finalidades juridicamente relevantes como se fossem genuínos.
3. O crime de falsidade informática previsto no artigo 3º da Lei nº 109/2009 visa proteger a segurança das relações jurídicas enquanto interesse público essencial que ao próprio Estado de Direito compete assegurar e não a confidencialidade, integridade e disponibilidade de sistemas informaìticos, de redes e de dados informaìticos.
4. A utilização do nome ou de parte do nome de outrem no nome de utilizador e/ou endereço eletrónico, por parte de quem criou conta de correio eletrónico, traduz, no plano objetivo, a produção de dados ou documentos não genuínos, mediante a introdução de dados informáticos, e é idóneo a fazer crer que foi a pessoa a quem respeita o nome ou parte de nome quem efetivamente criou e utilizou a conta de correio eletrónico em causa.
Decisão Texto Integral:


Em conferência, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:


Relatório

1. Nos presentes autos de processo comum com intervenção do tribunal singular que corriam termos no 2 Juízo do T. Judicial de Portalegre, foram acusados e sujeitos a julgamento GMCM e MAT, a quem o MP imputara a prática de um crime de falsidade informática, p. e p. pelo artigo 3º, n.ºs 1 e 3, da Lei n.º 109/2009, de 15 de Setembro.

2. A Assistente CF deduziu acusação particular contra os mesmos arguidos, imputando-lhes a prática de dois crimes de difamação, p. e p. pelo art. 180º e 182º do CP.
O Assistente FS deduziu igualmente acusação particular, imputando aos arguidos a prática de um crime de difamação, p. e p. pelo art. 180º do CP e de um crime de injúria p. e p. pelo art. 181º do CP, ambos agravados pelo art. 183º, n.º 1, als. a) e b) do CP.
Ambos os assistentes deduziram pedidos de indemnização cívil.
A Assistente CF peticionando o pagamento de uma indemnização de € 10.000,00 e o Assistente FS peticionando uma indemnização de € 3.000,00, por danos emergentes dos crimes em que são ofendidos.

3. Realizada Audiência de Julgamento, o tribunal singular decidiu:
a) - Absolver os Arguidos GMCM e MAT, da prática de um dos crime de difamação que lhes era imputado (na acusação deduzida pela assistente CF);
b) Condenar o arguido GMCM, pela prática de um crime de falsidade informática, p. e p. pelo artigo 3º, n.ºs 1 e 3, da Lei nº 109/2009, de 15 de Setembro, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 7,50;
c) Condenar o arguido GMCM, pela prática de um crime de difamação, p. e p. pelos arts. 180º e 182º do CP agravado pelo art. 183º, n.º 1, al. a) do CP, praticado contra a Assistente CF, na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de € 7,50;
d) Condenar o arguido GMCM, pela prática de um crime de difamação, p. e p. pelos arts. 180º e 182º do CP agravado pelo art. 183º, n.º 1, al. a) do CP (em concurso aparente com um crime de injúria), praticado contra o Assistente FS, a pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 7,50;
e) Em cúmulo jurídico, condenar o arguido GMCM, numa pena única de 200 dias de multa à taxa diária de € 7,50, o que perfaz o montante de € 1.500,00;
f) Condenar o arguido MAT, pela prática de um crime de falsidade informática, p. e p. pelo artigo 3º, n.ºs 1 e 3, da Lei nº 109/2009, de 15 de Setembro, na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de € 9,00;
g) Condenar o arguido MAT, pela prática de um crime de difamação, p. e p. pelos arts. 180º e 182º do CP agravado pelo art. 183º, n.º 1, al. a) do CP, praticado contra a Assistente CF, na pena de 100 dias de multa, à taxa diária de € 9,00;
h) Condenar o arguido MAT, pela prática de um crime de difamação, p. e p. pelos arts. 180º e 182º do CP agravado pelo art. 183º, n.º 1, al. a) do CP (em concurso aparente com um crime de injúria), praticado contra o Assistente FS, a pena de 130 dias de multa, à taxa diária de € 9,00;
i) Em cúmulo jurídico, condenar o arguido MAT, numa pena única de 250 dias de multa à taxa diária de € 9,00, o que perfaz o montante de € 2.250,00;
j) (…)
k) Julgar parcialmente procedentes, por parcialmente provados, os pedidos de indemnização civil deduzidos pelos Demandantes e, consequentemente:
k.1) Condenar os Arguidos/demandados GMCM E MAT, solidariamente, a pagar à Demandante CF, a quantia de € 1.500,00 a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros vincendos, à taxa de 4%, contados desde a data da presente decisão até efectivo e integral pagamento;
k.2) Condenar os Arguidos GMCM e MAT, solidariamente a pagar ao Demandante FS, a quantia de € 1.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescidos de juros vincendos, à taxa de 4%, contados desde a data da presente decisão até efectivo e integral pagamento.

4. Inconformados, recorreram ambos os arguidos, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões:
4.1. Arguido MAT

“CONCLUSÕES

O dever de fundamentar as decisões judicias decorre diretamente da Constituição: as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prescrita na lei”- artigo 205 nº1 da CRP.

O artigo 374 do CPP, ao estabelecer os requisitos da sentença penal precisa ainda mais o conteúdo do dever de fundamentação. No nº 2 estipula o referido preceito legal que “ ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível concisa, dos motivos de facto e direito. Que fundamentam a decisão, com a indicação e exame crítico das provas que serviram a convicção do Tribunal. Não basta assim, que o Tribunal forme a sua convicção sobre os factos, impondo a lei que essa convicção seja exteriorizada e explicitada através de um exame crítico das provas.
O que no caso em apreço não foi feito.

Verifica-se que a Sentença de que agora se interpõe recurso, padece de nulidade, por violação do disposto no art 374 nº 2 CPP. Em virtude de não proceder ao exame critico das provas, limitando-se o Tribunal a quo a efetuar meros juízos conclusivos, valorando provas que não existem e que apenas foram valoradas na medida e interesse do Tribunal.

O Tribunal não é claro e inequívoco , que o ora recorrente agiu com dolo, tal como a douta sentença veio a fixar.

O Tribunal limitou-se, apesar de não ter prova que o sustente, a simplesmente punir o ora recorrente sem qualquer fundamentação legal.
Senão vejamos, no que concerne ao crime de falsidade informática:

Mesmo que se quisesse tipificar o eventual crime no n.º 3 do Art.º 3.º da Lei 109/2009, de 15 se Setembro, como os Actos referidos no n.º 1 do artº 3º não se encontram preenchidos, nunca poderia ser tipificado como falsidade informática.

No que respeita à apreciação da prova:

Há que atentar ao facto de que um ficheiro de “log” existente num computador contendo o conteúdo de uma dada conversação realizada com recurso ao programa GTalk entre um utilizador desse computador e uma terceira pessoa assemelha-se, em tudo, a uma gravação de uma conversação telefónica feita pelo utilizador no momento dessa conversação,e realizada sem a autorização do terceiro com quem o utilizador entabulou a referida conversação. Além de que, sem qualquer dúvida, foi explicado ao tribunal que o conteúdo dos referidos ficheiros é alterável, por qualquer pessoa, não necessitando de conhecimentos especiais de informática.
Mais ainda, todo o conteúdo é alterável, desde o endereço eletrónico, ao dia, hora e conteúdo da conversação.

Não pode o Tribunal basear a sua convicção numa prova não credível.

Aliás, como podemos aceitar como prova um ficheiro editável?

Não podemos nunca esquecer que não foi encontrada qualquer correspondência desta conversação em nenhum dos computadores a que acede o Arguido MAT, ora Recorrente.

Assim sendo, o conteúdo desse ficheiro deverá ser considerado como prova proibida, e como tal insuscetível de ser utilizado.

Tratando-se de uma gravação não autorizada, e não tendo sido seguidas as regras processuais penais que permitem o recurso aos métodos de obtenção de prova restritivos desses direitos elencados no Art.º 126.º n.º 3 do CPP, estamos pois perante uma nulidade absoluta, que se caracteriza pelo facto de poder ser conhecida oficiosamente em qualquer estado do processo, e que não se sana sequer com o trânsito em julgado de sentença condenatória, como se conclui do Art.º 449.º n.º 1 alínea e) ao considerar que constitui fundamento para a interposição de um recurso extraordinário de revisão quando “Se descobrir que serviram de fundamento à condenação provas proibidas nos termos dos n.º 1 a 3 do artigo 126.º”

O nosso CPP, no capítulo das escutas telefónicas (artºs 187 a 190º) estendem o disposto nesse capítulo às comunicações transmitidas por qualquer meio técnico diferente do telefone, designadamente correio eletrónico ou outras formas de transmissão de dados por via telemática.

Mas então, conforme explanado no nº 1 do artº 187º só podem ser autorizadas durante o inquérito.

A conversação gravada (o Log) é anterior a ato processual, como tal, não foi validada dentro do prazo legal, estamos perante uma prova proibida e como tal insuscetível de ser utilizado.

De acordo com a Jurisprudência e a Doutrina, a verificação ou não, num determinado caso concreto, se quaisquer expressões utilizadas numa dada situação correspondem à conduta típica prevista nos Artigos 180.º e 181.º do CP, deverá atender, em primeiro lugar, ao contexto situacional de vivência humana em que essas expressões foram produzidas.

Como supra ficou demonstrado, somente o arguido GMCM falou no ora recorrente durante toda a discussão e audiência de julgamento , mas mesmo

Por mera cautela de patrocínio, se chama esta questão à colação, na medida em que no presente recurso se pugna pela inocência do ora recorrente, não tendo este praticado os crimes pelos quais vem acusado e condenado, daí a única solução possível no caso dos autos será, a absolvição.

Tecendo ainda algumas considerações. Dir-se-á que se está de acordo com o que escreve o conceituado professor Faria Costa in Comentário Conimbricense do Código Penal.

o significado das palavras, para mais quando nos movemos no mundo da razão prática, tem um valor de uso. Valor que se aprecia, justamente, no contexto situacional e que ao deixar intocado o significante ganha ou adquire intencionalidades bem diversas no momento em que apreciamos o significado”

Por outro lado, considera a Doutrina e a Jurisprudência que o Direito Penal não deve servir para criminalizar condutas comuns, simples desrespeitos, descortesias ou más educações.

Conforme o Acórdão da Relação de Lisboa de 09/02/2011,

“Tem que haver um mínimo de significado da conduta, um mínimo de gravidade, para que se considere ter a mesma alcançado o patamar da tipicidade e para se lhe conferir dignidade penal.
É que os tribunais não existem para apelidar de criminosas pessoas que adotam comportamentos destemperados, incorretos e avessos a uma conduta bem educada, mas que no contexto de uma situação de grande discórdia [...] não deixam de ser socialmente tolerados, embora criticáveis.
Isto não significa que se não defenda a existência de um dever comportamental de educação e respeito nas relações entre as pessoas e que o desejável não seja a sua estrita observância nas relações pessoais. Significa, simplesmente, que nem tudo o que viola as regras de bom comportamento e de boa educação constitui crime tutelado pelo artigo 181.º do Código Penal.” in Acórdão da Relação de Lisboa de 09/02/2011

Que concluir então sobre como saber se uma dada conduta preenche ou não o tipo legal de crime de Injúria ou de Difamação?

De acordo com a Jurisprudência e com a Doutrina, cada conduta terá de ser analisada em face da situação concreta em que a mesma se produziu e do meio sócio cultural do agente e da vítima.

Ora no caso presente, o email em questão versava temas políticos e foi enviado única e exclusivamente a um conjunto de militantes do (.....) de (.....) e não para um número indeterminado de pessoas com vem referido na douta sentença .
Não se tratou de nenhum post num qualquer blog, acessível a qualquer pessoa situada em qualquer lugar do Mundo com acesso à Internet.

Os destinatários do referido texto são no dia-a-dia da sua vivência partidária confrontados com estilos de linguagem muito mais agressivos do que aquele que foi utilizado no referido texto, nomeadamente nos momentos de uma acesa disputa partidária como foi o caso.

Em suma, tratou-se apenas de um texto, de gosto eventualmente duvidoso, mas num estilo que não ultrapassou o sarcasmo e que nunca em momento algum ultrapassou limites intoleráveis de má-educação, e cujo estilo de linguagem e expressões utilizadas são comuns na disputa política.

Sendo assim, não pensamos estar sequer perante nenhum crime de injúria ou de difamação.

Finalmente, e sobre o facto do nome que consta como remetente no referido mail ser parecido (mas não igual) com o nome de um dos assistentes, apenas poderemos concluir que se tratou tão somente de uma coincidência.

De notar que o referido mail não estava sequer assinado, pelo que se o autor desse texto quisesse dar a entender que a assistente era a autora do mesmo tê-lo-ia decerto assinado como sendo da assistente.

E, se quisesse dar a entender que a assistente era a autora do texto, com toda a certeza não teria incluído a assistente na lista de destinatários do mail, pois sendo essa lista de destinatários visível por quem quer que tivesse recebido o mail, não seria de forma alguma credível que o autor do mail enviasse o mail para si próprio.

A presente condenação do Arguido, ora recorrente, MAT prejudica um futuro promissor. Mais grave que o boato, por se tratar de um veredito oficial do Tribunal, de grande responsabilidade, que incute a certeza absoluta de que uma grande pena aplicada é sinonimo de um crime grave praticado que torna o seu agente, de certo modo desprezível e indigno do bom nome a que todo o cidadão normal tem direito.

Salvo o devido e muito respeito que temos pelo Tribunal a pena aplicada, neste caso, é desproporcionada, na medida, e mais, na gravidade dos efeitos que ela produz no denegrir do bom nome e reputação do jovem MAT que só tem conhecido elogios na comunicação social e, agora, é esta, a noticiar publicamente a sua condenação, o que todas as pessoas estranharam.

Pensamos que, neste caso, se trata de uma acusação eivada de politiquices, de muito baixo nível para destruir outra pessoa por razões e interesses inconfessáveis inventando o “diz que disse e o diz que fez” e daqui nasce o silogismo da sua condenação.

Um jovem que no seu meio é considerado exemplar desde o ensino primário até ao Doutoramento, estimado por professores, chefes,colegas etc. , como comentador de radio e em todas as suas missões inclusive nos bombeiros locais (ver por exemplo o Jornal Fonte Nova do dia 23-11-2005 entre ), (revista de domingo – correio da manha de 10-03-07,destaque – Português da Semana – Titulo Um pacato professor de Psicologia de (.....) está a coordenar um projeto europeu de apoio às vitimas das catástrofes mundiais).

A medida da pena ora imposta não é baseada em fórmula matemática mas antes, em ónus de prova e, dentro do amplo campo do livre arbítrio do julgador.

No caso destes autos a prova é inconsistente porque as afirmações que levaram à condenação são muito subjetivas com base meramente política e o seu valor é relativo a antagonismo político.

No caso em apreço é bem claro e incontestável que não se trata de um pedante criminoso em que se imponha a aplicação de uma pena pesada para sua correção mas antes, em nosso modesto entendimento o Arguido MAT deveria ter sido julgado com isenção e imparcialidade que o caso requer porque sempre teve um comportamento digno e exemplar. Neste caso, uma pena agravada produz repulsa e não correção por esta ser inadmissível.

Nestas condições e nos demais de Direito aplicáveis rogamos a VªExªs Venerandos Desembargadores, se dignem admitir o presente recurso e que sufragados que sejam os vícios apontados, bem como a discordância sustentada quanto à incorreta qualificação jurídica dos crimes e a desajustada dosimetria da pena, a qual deverá passar pela absolvição total e integral do arguido.
E, caso assim não se entenda , o que só por mera hipótese académica se admite, deverão V/ Exªs decretar a anulação do Julgamento dos autos em causa e se determine a realização de novo Julgamento, em qualquer outro Tribunal que não o de (.....), sem ameaças ou qualquer obscuridade para apuramento da realidade dos factos, de forma justa.”

4.2. - O arguido GMCM:

“CONCLUSÕES


Assim, face ao exposto e pelo mais que V. Ex.as, doutamente, suprirão, não

pode deixar de concluir-se que:

A) A prova livre tem como pressupostos valorativos a obediência a critérios da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica.
B) Ora, partindo desses pressupostos, uma prudente e objectiva análise do conjunto da prova produzida, designadamente das declarações do co-arguido GMCM, dos Assistentes e das testemunhas, conjugada com as regras da experiência comum, os excertos da comunicações via chat constantes do apenso aos autos e o print das duas contas de mail criadas pelos mandatários do co-arguido GMCM e juntas aos autos na audiência de julgamento de 4-3-2014, forçoso será concluir que o tribunal não poderia ter dado como provados os factos nº 3º, 4º, 15º, 16º, 17º, 20º, 21º a 29º, 30º a 33º, 39º e 40º constantes da matéria provada na Sentença (ou, pelo menos, os factos nº 3º e 4º da maneira em que o foram) e deveria ter dado como provados factos essenciais para contextualizar os restantes factos, designadamente, o envio e o teor do mail.
C) Sendo certo que, relativamente aos factos nº 3º, 4º, 16º, 17º, 20º e 21º a 26º, o tribunal, ao considerá-los provados, incorreu num ERRO NOTÓRIO E MANIFESTO DA APRECIAÇÃO DA PROVA (artigo 410º, nº2-sl.c) do CPP).
D) Por sua vez, alterando-se os factos nº 3º e 4º (com a redacção que infra se propõe) e dando-se como não provados os factos nº 16º, 17º e 20º, terão de ser obrigatoriamente eliminados da matéria provada os factos nº 21º a 29º, uma vez que estes estão numa relação de absoluta dependência daqueles.
E) Devem ainda ser considerados não escritos os factos nº 24º e 30º da matéria provada, uma vez que se tratam de factos manifestamente conclusivos, encerrando juízos sobre a ilicitude da conduta dos arguidos o que apenas deve constar do enquadramento jurídico dos factos efetuado na sentença recorrida.
F) Devem ser aditados à matéria provada os seguintes factos que permitem contextualizar as afirmações constantes do mail enviado pelos arguidos:
2º-A O pai do Assistente (JJS) exerceu diversos cargos de nomeação política.

2º-B O Assistente FS trabalhou na câmara Municipal de (.....) no Pelouro do Desporto, durante os mandatos de MMCC.

2º-C A esposa do Assistente FS foi secretária do presidente da Câmara de (.....), durante os mandatos de MMCC, e desempenha actualmente funções na CIMAA - Comunidade Intermunicipal do (.....).



G) Relativamente ao facto nº 2º-A, o mesmo foi confirmado, designadamente, pelo Assistente FS, pelo arguido GMCM e pela testemunha JPP e são de conhecimento público porque todos eles tiveram publicação em Diário da República (vide Despacho conjunto nº204/2004, de 1 de Abril de 2004, publicado na II Série do Diário da República onde todos os cargos vêm discriminados).
H) Provas e passagens concretas dos depoimentos que impõe e fundamentam tal aditamento:
(a) Depoimento do co-arguido GMCM, do dia 04-03-2014 das 11:39:32 às 12:21:35, minutos 00:10 a 01:08;

(b) Depoimento do Assistente FS, do dia 04-03-2014, das15:0:04 às 15:43:13, minutos 16:10 a 18:07 e 24:27 a 25:12;

(c) Depoimento da testemunha JPP, do dia 2-03-2014, das 10:02:22 às 10:23:56, minutos 17:15 a 17:57;

(d) Despacho 47/SESS/90, de 12/6, publicado na II série do DR.

(e) Despacho conjunto n.º204/2004 de 1/04, publicado na II série do DR.

I) Relativamente ao Facto nº 2º-B, o mesmo foi confirmado, designadamente, pelo Assistente FS, pelo arguido GMCM e pela testemunha JPP, vereador do Pelouro da Cultura da Câmara de (.....) com quem o Assistente trabalhou.
J) Provas e passagens concretas dos depoimentos que impõe e fundamentam tal aditamento:
(a) Depoimento do co-arguido GMCM, do dia 04-03-2014 das 11:39:32 às 12:21:35, minutos 00:10 a 01:08;

(b) Depoimento do Assistente FS, do dia 04-03-2014, das 15:0:04 às 15:43:13, minutos 16:10 a 18:07 e 27:37 a 30:02;

(c) Depoimento da testemunha JPP, do dia 25-03-2014, das 10:02:22 às 10:23:56, minutos 17:59 a 18:18;


K) Relativamente ao Facto nº 2º-C, o mesmo foi confirmado, designadamente, pelo Assistente FS, no seu depoimento, pela testemunha MSS, pelo arguido GMCM e pela testemunha JPP e são de conhecimento público porque tiveram publicação em Diário da República.
L) Provas e passagens concretas dos depoimentos que impõe e fundamentam tal aditamento:
(a) Depoimento do co-arguido GMCM, do dia 04-03-2014 das 11:39:32 às 12:21:35, minutos 00:10 a 01:08;

(b) Depoimento do Assistente FS, do dia 04-03-2014, das15:0:04 às 15:43:13, minutos 25:37 a 26:38;

(c) Depoimento da testemunha JPP, do dia 25-03-2014, das 10:02:22 às 10:23:56, minutos 17:59 a 17:37;

(d) Depoimento da testemunha MSS, do dia 25-03-2014, das 14:09:36 às 14:31:32, minutos 0:16 a 0:22.

(e) Aviso n.º 3592/2009. D.R. n.º 30, Série II de 2009-02-12.

M) Deve ser alterado o facto n.º 3, passando o mesmo a ter a seguinte redacção:
3 - Os arguidos movidos por divergências políticas com o Assistente FS e em resposta ao slogan por este utilizado contra ambos durante a campanha interna para as eleições da concelhia do (.....) de (.....)- "Vamos acabar com os mamões do Partido" - conceberam um plano com vista a responder a esta acusação do Assistente FS.


N) O Tribunal dá como provado a parte final do facto nº3 ("movidos por divergências políticas que os opunham aos assistentes CF e FS, engendraram entre si um plano com vista a denegrir a imagem e reputação dos mesmos junto dos demais militantes do (.....) de (.....)") com base exclusivamente "no depoimento do co-arguido GMCM, conjugado com os print das conversações via chat que os arguidos mantiveram, constantes do Apenso aos autos".
O) Ora, do depoimento do co-arguido GMCM resulta, sem qualquer sombra de dúvida, que este não conhecia a Assistente CF, nem fazia ideia se a mesma pertencia a alguma facção do partido.
P) Sendo certo que a Assistente não participou sequer nas eleições concelhias do partido, como resulta do próprio depoimento dos Assistentes.
Q) Ou seja, as únicas divergências políticas dos arguidos eram exclusivamente com o Assistente FS e era apenas esta pessoa que o mail visava atingir, em virtude de este ter usado como slogan da sua campanha interna para a concelhia a frase: "Vamos acabar com os mamões do partido!", como resulta dos depoimentos das testemunhas JPP (candidato da lista vencida) e AHH (presidente da comissão política cessante e que conduziu o acto eleitoral), conjugado com o teor do próprio mail e do depoimento do co-arguido GMCM.
R) Ocorreu, por conseguinte, um erro notório da apreciação da prova, nos termos do artigo 410º/2 al. c) do CPP.
S) Provas e passagens concretas dos depoimentos que impõe e fundamentam tal alteração:
(a) depoimento do co-arguido GMCM, do dia 04-03-2014 das 11:39:32 às 12:21:35, minutos 00:20 a 01:08, 03:50 a 04:34, 06:33 a 06:47, 13:20, 13:30, 14:22 a 14:42;

(b) Depoimento da testemunha JPP, do dia 25-03-2014, das 10:02:22 às 10:23:56, minutos 17:59 a 17:377

(c) Depoimento da testemunha AMTT, do dia 25-03-2014, das 15:40:56 às 15:47:49, minutos 03:00 a 04:22, 06:06 a 06:43;

(d) print das conversações via chat constante do apenso aos presentes autos;

(e) print do mail de fls. 3 e ss.

T) Deve ser alterado o facto n.º 4 e eliminados os factos 16º, 17º e 21º a 29º passando o facto provado 4º a ter a seguinte redacção:
4 - Os arguidos decidiram, então, criar uma conta de correio eletrónico com o endereço "(.....)" e, através da referida conta, enviar o mail descrito no Facto Provado nº14 aos militantes e filiados do (.....) de (.....).


U) O Tribunal dá como provado o facto 4º com base exclusivamente "no depoimento do co-arguido GMCM, conjugado com os print das conversações via chat que os arguidos mantiveram, constantes do Apenso aos autos".
V) Ora, do depoimento do co-arguido, conjugado com os print das conversações via chat, não podia o tribunal extrair tais factos.
W) Trata-se de um erro notório da apreciação da prova, nos termos do artigo 410º/2 al. c) do CPP.
X) Em primeiro lugar, porque o co-arguido GMCM, que criou a conta, não só não conhecia a Assistente CF, como resulta do seu depoimento e do print das conversações do chat, que apenas lhe foi sugerido o nome "CF", como resulta do print das conversações do chat.
Y) Ora, se o co-arguido não conhecia a Assistente CF, tendo-lhe sido sugerido apenas o nome "CF", nome esse que não utilizou sequer, não podia obviamente, ter criado uma conta de correio electrónico utilizando o nome e demais dados da Assistente, como não utilizou.
Z) O endereço de correio electrónico escolhido e criado pelo arguido GMCM foi "(.....)" e o nome de utilizador (.....), o que é manifestamente insuficiente para sustentar, de forma séria, a afirmação de que os arguidos utilizaram o nome e demais dados da Assistente.
AA) Com efeito, o arguido não usou quaisquer dados de identidade da Assistente na criação da conta: não usou o seu nome, nem foto, nem profissão, nem idade, nem data de nascimento, nem localidade, nem morada, etc.
BB) O arguido GMCM limitou-se a usar o pseudónimo (.....) como utilizador da conta (as iniciais dos arguidos/autores da conta M e GMCM e o apelido F do endereço electrónico), sendo certo que o co-arguido GMCM, como resulta CCmente do seu depoimento e do print das conversações do chat, apenas sabia que o nome a usar era "CF".
CC) Aliás, nem na fundamentação de facto da sentença se extrai qual é que foi o “nome e demais dados da Assistente” que os arguidos utilizaram”, pois que já se viu que não utilizaram, nem dos documentos juntos aos autos tal resulta, o que encerra uma notória ausência de fundamentação do facto ora em questão e, consubstancia a nulidade da sentença (artigo 374º/2 e 379/1al.a) do CPP).
DD) Em segundo lugar, se o arguido quisesse mesmo utilizar o nome da Assistente, poderia tê-lo feito porque os endereços electónicos "(.....)" ou "(.....)" estavam disponíveis, inclusive, à data do julgamento, conforme documentos comprovativos juntos aos autos na audiência de julgamento de 4-3-2014.
EE) Finalmente, o tribunal não pode dar como provado, invocando as regras da experiência comum, que a intenção dos arguidos era levar os militantes do (.....) de (.....) a crer que tais mensagens eram escritas e enviadas pela Assistente CF, quando das regras da experiência resulta precisamente o contrário.
FF) Como efeito, se a intenção fosse essa: (I) o texto do mail teria terminado com a assinatura "CF" (o que não aconteceu: o texto não está assinado); (II) o endereço criado seria "(.....)" e não "(.....)s"; (III) o texto não teria seguido para o mail da Assistente CF ((.....) (.....)) e com todos os endereços de mail dos destinatários visíveis, permitindo, por um lado, que os destinatários vissem que o texto foi enviado para o mail da Assistente CF, o que só podia significar que não tinha sido enviado por esta, e por outro, que a Assistente pudesse esclarecer qualquer dúvida, de imediato, como o fez, reenviando para todos os mails a informação de que o mail em questão não tinha nada a ver com ela, nem com o mail dela.
GG) O que os arguidos pretendiam era apenas isto: por um lado, enviar o mail sem serem identificados; e, por outro, que o e-mail fosse efectivamente lido pelos seus destinatários, para o que necessitavam de colocar um nome no endereço de e-mail que não levasse os seus destinatários a considerar a mensagem como SPAM, tendo surgido, por sugestão do co-arguido MAT, o nome "CF".
HH) Consequentemente, não pode dar-se como provado, obviamente, que os arguidos utilizaram os dados pessoais da Assistente, nem que ao criarem a referida conta de correio electrónico, simularam ser a Assistente, fingiram ser a Assistente ou pretenderam que alguém considerasse que a conta que criaram era da Assistente, pelo que não criaram ou produziram qualquer engano, nem colocaram em causa a integridade dos sistemas informáticos, nem agiram sabendo que tal fosse proibido e punido por lei.
II) Pelo que se impõe a eliminação dos Factos Provados nº 21º a 26º da matéria provada, pois que, só por erro notório de apreciação da prova (artigo 410º/2,al.c) do CPP), os mesmos se deram como provados.
JJ) Finalmente, do supra exposto, resulta que JAMAIS os arguidos quiseram ou tiveram sequer a intenção, ao criar a referida conta de e-mail, de colocarem em causa a credibilidade pessoal e política da Assistente, de denegrir a sua imagem junto dos membros do (.....), de a envergonhar e humilhar ou de ofender na sua honra e consideração, desde logo porque aquela conta de correio electrónico nada tem a ver com a Assistente CF, pessoa que o arguido GMCM nem sequer conhecia, o que impõe a eliminação dos FACTOS PROVADOS Nº 24º a 29º,
KK) O mesmo se diga, no que concerne ainda ao facto provado nº 24 e no que respeita ao Assistente FS, uma vez que nunca foi intenção dos arguidos, ao enviarem a mensagem, colocar em causa a imagem e a credibilidade pessoal e política do Assistente, como infra melhor se explicará.
LL) Provas e passagens concretas dos depoimentos que impõe e fundamentam tais alteração e eliminações:
(a) depoimento do co-arguido GMCM, do dia 04-03-2014 das 11:39:32 às 12:21:35, minutos 03:25 a 04:34, 06:08 a 06:25, 37:56 a 40:46;

(b) Depoimento da Assistente CF, do dia 04-03-2014, das 14:14:23 às 14:52:39, minutos 02:00 a 04:53, 05:27 a 08:54;

(c) Depoimento da testemunha JJJ, do dia 04-03-2014, das 17:25:47 às 17:40:54, minutos 00:12 a 00:18, 03:58 a 05:21;

(d) Depoimento da testemunha JPP, do dia 25-03-2014, das 10:02:21 às 10:23:56, minutos 02:45 a 03:34; 03:40, 04:30 a 05:20, 15:10 a 15:20 e 15:37 a 15:43;

(e) Depoimento da testemunha AJA, do dia 25-03-2014, das 10:24:50 às 10:38:26:, minutos 01:05 a 02:20 , 07:04 a 07:40 e 12:32 a 13:07;

(f) print das conversações via chat constante do apenso aos presentes autos;

(g) print do mail de fls. 3 e ss.

(h) print das duas contas de correio electrónico "(.....)" ou "(.....)" juntas aos autos na audiência de julgamento de 4-3-2014.

Q) Deve ser alterado o facto n.º 15, passando o mesmo a ter a seguinte redacção:
15 - O texto da mensagem dirigida aos militantes do (.....) foi elaborado pelo arguido MAT, com a preocupação de aparentar a quem a lesse que era redigido por uma mulher.


R) O Tribunal dá como provado este facto com base exclusivamente "no depoimento do co-arguido GMCM, conjugado com os print das conversações via chat que os arguidos mantiveram, constantes do Apenso aos autos".
S) Ora, o que resulta claramente do depoimento do co-arguido GMCM, conjugado com os print das conversações via chat que os arguidos mantiveram, é que o mentor da ideia de se enviar aquele mail e o autor do texto foi o co-arguido MAT, tendo o co-arguido GMCM criado a conta e reencaminhado o mail que recebeu com o texto do M.
T) Provas e passagens concretas que impõe e fundamentam tal alteração:
(a) depoimento do GMCM, do dia 04-03-2014 das 11:39:32 às 12:21:35, minutos 00:56 a 01:06, 09:24 a 11:34

(b) print das conversações via chat constante do apenso aos presentes autos.

U) Deve, também, SER ELIMINADO O FACTO PROVADO N.º 20.
V) Este é mais do que um erro notório da apreciação de prova (artigo 410/2 al. c) do CPP): é um facto que é FALSO e que o tribunal não pode deixar de saber que é FALSO.
W) A própria Assistente CF, em quem o tribunal se baseia para dar este facto como provado, foi categórica no seu depoimento quando afirmou que apenas tem 3 contas de correio eletrónico e nenhuma do mail (….).
X) Acresce que se encontra junto aos autos documento comprovativo de que a conta de e-mail (.....) foi criada pelo defensor do co-arguido GMCM na véspera do julgamento, conforme documento junto aos autos durante a audiência de julgamento de 4-3-2014.
Y) Provas e passagens concretas que impõe e fundamentam tal eliminação:
(a) Depoimento da Assistente CF, do dia 04-03-2014, das 14:14:23 às 14:52:39, minutos 03:37 a 04:40;

(b) Print do mail de fls. 3 e ss.;

(c) print das duas contas de correio electrónico "(.....)" ou "(.....)" juntas aos autos na audiência de julgamento de 4-3-2014.

Z) Devem, também, ser ELIMINADOS OS FACTOS PROVADOS Nº 32º, 39º E 40.
AA) O Tribunal deu como provado o FACTO Nº 32º de acordo com as regras da experiência comum conjugadas com a restante prova produzida, que, na verdade não se sabe qual seja (???!!!...)
BB) Por sua vez, os FACTOS PROVADOS nº 39º e 40º deu-os como provados de acordo com os depoimentos das testemunhas JPP, JCC (cunhado) e MSS (esposa).
CC) Ora, segundo as regras de experiência comum, se o Assistente FS se tivesse sentido profundamente ofendido, vexado e desrespeitado como pessoa e enquanto Presidente da Concelhia do (.....) em (.....), não tinha andado a divulgar o mail, reencaminhando-o, imprimindo-o e distribuindo-o aos militantes por altura da campanha eleitoral para as autárquicas e quando já ninguém se lembrava disso, como resulta CCmente dos depoimentos dos militantes do (.....) MMB e JAA, este último candidato do (.....) a presidente da câmara.
Q) Provas e passagens concretas dos depoimentos que impõe e fundamentam tais alteração e eliminação:
(a) Depoimento da testemunha MMB, do dia 25-03-2014, das 10:39:30 às 10:53:14, minutos 12:15 a 13:34.

(b) Depoimento da testemunha AJA, do dia 25-03-2014, das 10:24:50 às 10:38:26:, minutos 01:05 a 01:41 , 02:17 a 02:20 e 07:04 a 07:40.

R) Devem ser ELIMINADOS OS FACTOS PROVADOS Nº 31º E 33º.
S) Os arguidos tiveram apenas um único propósito e que ressalta à evidência da simples leitura do texto em causa e do depoimento do co-arguido GMCM: o de apresentar e fazer crítica política à actuação do Assistente FS, enquanto “homem político” e o de responder aos ataques efectuados por este aos arguidos na campanha eleitoral interna, no decorrer da qual foram apelidados, pelo Assistente, de “mamões do partido”.
T) Provas e passagens concretas que impõe e fundamentam tal alteração:
(a) Depoimento do co-arguido GMCM, do dia 04-03-2014 das 11:39:32 às 12:21:35, minutos 00:20 a 01:08, 03:50 a 04:34;

(b) Print do mail de fls. 3 e ss.

U) No pressuposto de que a impugnação da matéria de facto não deixará de proceder, forçoso será concluir que o arguido não poderá ser condenado pelos crimes de falsidade informática e de difamação contra os Assistentes, por total ausência de preenchimento dos tipos legais referidos.
V) Na verdade, e no que concerne ao crime de falsidade informática, o que simplesmente aconteceu foi que os arguidos, para enviarem uma mensagem de e-mail que pretendiam que fosse lida e recebida por vários militantes do (.....) de (.....), sem que os seus autores fossem descobertos, criaram uma conta de correio electrónico no domínio do SAPO com o endereço (.....) e o nome de utilizador (.....) e através dela enviaram a referida mensagem, mensagem essa que foi recebida pelos seus destinatários, entre os quais figurava a Assistente CF e o Assistente FS.
W) Ora, o anonimato e o uso de pseudónimos não são proibidos em Portugal, nem ao que se saiba a Assistente (ou qualquer outra pessoa) tem direitos exclusivos de utilizar o seu nome ou nome parecido na criação de endereços de e-mail.
X) Ou seja, a assistente que nem se chama CFs, não tem exclusividade em Portugal e no estrangeiro para usar nos endereços de correio electrónico de todos os servidores e domínios existentes no País e no estrangeiro, qualquer combinação de palavras que tenha incluídas as palavras “CC” e “Fs” ou "F".
Y) Ora, no crime em questão – falsidade informática - o bem jurídico protegido é a integralidade dos sistemas informáticos, que, no caso sub judice, não foi minimamente beliscado.
Z) Para se compreender a injustiça e o absurdo da condenação dos arguidos pelo crime em análise, façamos o paralelo com o crime de falsificação de documentos, p. e p. pelo artigo 256º do CP.
AA) Seria possível os arguidos serem condenados pelo crime de falsificação de documento por terem enviado uma carta anónima (não assinada, tal como o mail referido), pelos CTT (equivalente ao domínio do SAPO), dentro de um envelope em cujo remetente surge, processado a computador, unicamente os seguintes dizeres “CFS” e nos destinatários os vários militantes do (.....)????!!!!...
BB) Concluindo: a conduta penal dos arguidos não tem dignidade penal.
CC) Ainda assim, e sem conceder, caso a impugnação da matéria de facto não proceda, sempre se dirá que a decisão em crise enferma de erro notório de interpretação na subsunção dos factos ao direito, pela simples razão de que não resulta minimamente dos factos provados qualquer facto que permita integrá-lo na previsão das normas dos artigos 180º do CP.
DD) Com efeito, para ser verificado o preenchimento do crime de difamação é necessário, além do mais, que haja uma imputação de um facto a uma pessoa ou a formulação sobre a mesma de um juízo ofensivo da honra e consideração ou a reprodução de tal imputação ou juízo.
EE) Perscrutada a matéria provada, não se vislumbra, desde logo, quais foram os factos ou juízos que o arguido imputou à Assistente e que poderiam, objectivamente, ser considerados ofensivos da honra e consideração da mesma, pelo que carece em absoluto de matéria fáctica a condenação do arguido pelo crime de Difamação contra a Assistente.
FF) E isso é de tal modo evidente que o tribunal se limita, na fundamentação de direito, praticamente, a avançar com argumentos meramente conclusivos integradores apenas dos pressupostos subjectivos do crime em apreço (“atingiram a assistente na sua integridade psicológica, na sua dignidade e auto estima, consideração e honra”; “com o propósito de denegrir a sua imagem junto daqueles”; “com o intuito de humilhar e envergonhar a assistente e de a ofender na sua honra e consideração, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei”), sem qualquer sustentação factual, para considerar verificada a prática do crime de Difamação pelos arguidos.
GG) Para o tipo objectivo deixou apenas a seguinte afirmação: «na verdade, ao imputar-lhe a autoria de uma mensagem que esta não escreveu e que, no seu conteúdo, põe em causa opções políticas do partido do qual esta é militante, os arguidos tentaram desacreditá-la junto dos restantes militantes do (.....) de (.....). Tal facto só por si é passível de integrar os elementos objectivos do tipo legal em análise»
HH) Salvo o devido respeito, “tal facto”, para utilizar a expressão do tribunal, pode consubstanciar muita coisa, menos o crime de difamação, pois que, para tal, era necessário, desde logo, que fosse imputada à Assistente um facto ou juízo ofensivo da sua honra ou consideração e não da eventual consideração ou honra de terceiros.
II) Acresce, ainda que se entendesse que o facto imputado à Assistente integrador da previsão da norma em apreço fosse “a autoria de uma mensagem que esta não escreveu e cujo conteúdo põe em causa opções políticas do partido”, o que, adiante-se, extravasa em absoluto o âmbito da previsão da norma legal que definitivamente não tem em vista tal tipo de imputações, sempre quedaria por explicar qual é a concreta e objectiva ofensa da honra ou da consideração da Assistente que tal imputação acarretou, tanto mais que o teor da mensagem nem sequer respeita à Assistente.
JJ) Finalmente, não basta que a Assistente se considere difamada ou injuriada para que a ofensa exista pois, como se pode ler no acórdão da Relação de Guimarães, proferido no processo nº 2281/06-1, disponível em www.dgsi.pt, «(…) o direito penal não se destina a tutelar o eventual excesso de sensibilidade de determinadas pessoas perante afirmações que lhes sejam dirigidas. Antes pretende punir factos que sejam objectivamente graves e geradores de ofensas a bens juridicamente protegidos. A vivência em sociedade traz contrariedades, normais, por todos sentidas, sem que isso seja, todavia, bastante para fundamentar a prática de ilícitos criminais.»
KK) Impõe-se, por conseguinte, a absolvição dos arguidos quanto ao crime de difamação contra a Assistente.
LL) Quanto ao crime de difamação contra o Assistente, sustentou o tribunal a condenação dos arguidos no seguinte trecho da mensagem do artigo 18º da matéria provada (“Ou ainda continuar o amigo FS e acabar com a própria mulher, que andou a saltar no tachinho, chefe de gabinete/secretaria, até ninguém a poder aturar mais e lhe terem arranjado um tachinho na CIMMA pelo Amigo AAA?!”), uma vez que, segundo o tribunal, «os arguidos dão a entender que o Assistente terá de forma menos lícita, ou mesmo irregular e eticamente censurável, colocado a sua mulher a exercer funções na CIMMA», pondo em causa a «retidão, o carácter e o bom nome da Assistente e que não deixa indiferente a sociedade, reclamando uma tutela penal de dissuasão e repressão desse comportamento».
MM) Adianta também o tribunal que a mensagem não pode ser analisada no âmbito do contexto político, avaliando se a mesma é admissível nesse contexto, porque os arguidos não assumiram a paternidade da mensagem, sendo que, no entender do tribunal, a ordem jurídica não pode tutelar, fazendo apelo à liberdade de expressão, escritos de autoria desconhecida ou falseada.
NN) Ora, antes de mais, o escrito dos autos não é de origem desconhecida ou falseada, conforme ficou demonstrado, tendo o escrito sido elaborado pelo arguido MAT, com o conhecimento do arguido GMCM, que conforme combinado com aquele arguido, o reencaminhou via e-mail para os demais militantes do (.....).
OO) Depois, o direito à liberdade de expressão, constitucionalmente consagrado no artigo 37º da CRP não é restringido em caso de anonimato, conforme se pode constatar da simples leitura do referido artigo, pelo que o tribunal ao restringir a liberdade de expressão aos casos em que a mesma é exercida em nome próprio, está a violar de forma gritante o referido preceito constitucional, o que importa a inconstitucionalidade da decisão nesta parte, o que aqui desde já se invoca.
PP) Sem esquecer que o anonimato (muitas das vezes sob a veste de pseudónimos) é, por vezes, a única forma de se proteger a opinião dos indivíduos em face de sociedades intolerantes, é, para empregar a expressão usada pelo Supreme Court of Justice Americano, «um escudo contra a da tirania da maioria» (“Anonymity is a shield from the tyranny of the majority. It thus exemplifies the purpose behind the Bill of Rights, and of the First Amendment in particular: to protect unpopular individuals from retaliation—and their ideas from suppression—at the hand of an intolerant society”).
QQ) Ora, o tribunal, ao não considerar o contexto político em que a mensagem foi criada e dada a conhecer a terceiros, violou o referido preceito constitucional, assim como o artigo 19º da DeCCção Universal dos Direitos do Homem, como é jurisprudência pacífica do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (vide acórdão da Relação do Porto de 05/02/2009, disponível em www.dgci.pt)
RR) Impõe-se, atento o exposto, analisar o teor da mensagem em causa à luz da liberdade de expressão e do contexto político em que a mesma foi elaborada e emitida e verificar se as frases delas constantes são objectivamente ofensivas do bom nome e consideração do Assistente, quer enquanto cidadão, quer enquanto homem político.
SS) O Assistente, à data dos factos, era presidente da comissão política do (.....) de (.....) (Facto Provado nº 2º).
TT) O texto da mensagem em questão, como resulta, aliás, do seu teor, surge como resposta ao Assistente pelos ataques que o mesmo proferiu aos ora arguidos, no decorrer da campanha eleitoral para os órgão da concelhia do (.....), apelidando-os de “mamões do partido”, quando afinal, no entender dos arguidos, quem sempre tinha sido beneficiado pelo partido e com cargos de nomeação política - o que comumente se apelida de “jobs for the boys” -, tinha sido o Assistente FS e a sua família chegada (pai e mulher).
UU) Da leitura do texto em questão, facilmente se percebe que o mesmo teve como único objectivo apresentar a opinião e crítica política dos arguidos à actuação do Assistente no âmbito da sua actividade política e aos “jobs for the boys”, aos “tachos e tachinhos”, uma triste realidade política dos nossos dias e que nos entra pelos olhos dentro todos os dias de forma escandalosa.
VV) Como observou o vice-presidente da Transparência e Integridade, Associação Cívica, Paulo Morais, em declarações ao PÚBLICO, a influência dos partidos nas nomeações na administração pública é “uma realidade conhecida e um dos maiores problemas do país, com um impacto económico tremendo (artigo do Público disponível em http://www.publico.pt/politica/noticia/afinal-houve-mesmo-jobs-for-the-boys-nos-ultimos-20-anos-1623298).
WW) Ora, se ao nível da administração central é o que se vê, o que se dirá ao nível da administração regional e local, onde as nomeações e os concursos públicos têm tudo menos transparência, tanto mais que, como é do conhecimento público, quando se abre um concurso de pessoal já se sabe quem o vai ganhar.
XX) Não se percebe, por conseguinte, como é que o tribunal contextualizou todas as frases do mail, considerando-as crítica política e admissível dos arguidos à actuação política do Assistente e descontextualizou o trecho em que os arguidos fazem referência aos “tachinhos” de que a mulher do Assistente beneficiou, na opinião dos arguidos, na Câmara de (.....) e na CIMMA.
YY) Sendo certo que as ilações que o julgador retirou – “os arguidos dão a entender que que o Assistente terá de forma menos lícita, ou mesmo irregular e eticamente censurável, colocado a sua mulher a exercer funções na CIMMA” - não têm qualquer suporte na matéria provada (nem sequer, diga-se, na acusação particular do Assistente), pelo que não podem fundamentar a decisão a que o tribunal chegou, como é óbvio.
ZZ) Com efeito, quem leia o que consta do texto do mail não pode concluir que haja qualquer ofensa à honra e consideração do Assistente FS, uma vez que o que se escreveu não é objectivamente ofensivo, não tendo conteúdo difamatório.
AAA) Ainda recentemente, como foi noticiado no jornal Público de 2 de Maio de 2014, a Alemanha foi no dia 17 de Abril condenada pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) por violação da liberdade de expressão a que os seus cidadãos têm direito, num caso que se prende com uma questão que, muitas vezes, os nossos tribunais têm dificuldade em apreciar: "a diferença entre a afirmação de factos ou de opiniões. Quanto aos primeiros, quem os afirma e com eles ofende alguém terá de provar a sua veracidade ou, pelo menos, que os afirmou na convicção séria da sua veracidade. Quanto às opiniões ou juízos de valor, as mesmas não são verdadeiras ou falsas, como é evidente, pelo que quem as afirma só terá de provar que tem algum fundamento factual para ter criado essa opinião ou exprimir esse juízo de valor. No nosso país, por vezes, os tribunais entendem que as opiniões são falsas por não provadas e, daí, condenarem quem as emitiu." (...)
BBB) Assim, mesmo que improceda a impugnação da matéria de facto, é «indiferente que subjectivamente o arguido quisesse atingir a honra e consideração do ofendido e que pensasse que a sua conduta era proibida e punida por lei.»
CCC) Ou seja, são inócuas as conclusões que se fizeram constar dos pontos 24º, 25º, 30º, 31º, 32º e 33º da matéria provada.
DDD) Acresce que, à semelhança do que se disse quanto à Assistente, não basta que alguém se considere difamado ou injuriado para que a ofensa exista pois, como se escreve no acórdão da Relação de Guimarães, proferido no processo nº 2281/06-1, disponível em www.dgsi.pt, «(…) o direito penal não se destina a tutelar o eventual excesso de sensibilidade de determinadas pessoas perante afirmações que lhes sejam dirigidas. Antes pretende punir factos que sejam objectivamente graves e geradores de ofensas a bens juridicamente protegidos. A vivência em sociedade traz contrariedades, normais, por todos sentidas, sem que isso seja, todavia, bastante para fundamentar a prática de ilícitos criminais »
EEE) Assim, não se extraindo dos factos dados como provados que o arguido tivesse adoptado conduta ilícita com o reencamihamento do texto em questão, impõe-se a sua absolvição relativamente à acção penal (quer quanto ao crime de crime de difamação, quer quanto ao crime de injúria contra o assistente).
FFF) Sendo certo que, mesmo que assim não fosse, sempre a conduta do arguido não seria punível, nos termos do disposto no artigo 180º/2, a) do CP.
GGG) Absolvendo-se os arguidos dos crimes de difamação e falsidade informática, tal impõe a consequente absolvição dos mesmos quanto aos pedidos cíveis, uma vez que, faltando o pressuposto da ilicitude dos factos (um dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual contidos no artigo 483º do CC), cai por terra a obrigação de indemnizar, sabendo-se que a competência do tribunal penal para conhecer do pedido cível conexo com a acção penal, decorre apenas de responsabilidade civil extracontratual do agente que pratique facto ilícito e culposo (ver arts. 129 do CP e 483 nº 1 do CC).
HHH) Por mera cautela de patrocínio, entende o arguido que, para o caso de assim não suceder, deverão ser reduzidas as penas parcelares aplicadas, para o mínimo legal, tendo em conta todo o contexto (político) em que os crimes foram praticados, e as francamente baixas necessidades de prevenção geral e especial, tendo em conta, desde logo, a inserção familiar, social e profissional do arguido, fixando-se a pena única em não mais que 150 dias de multa.
III) Sendo certo que, mesmo que o tribunal considere não alterar as medidas parcelares das penas de multa aplicadas, sempre terá de alterar a pena única resultante do concurso de crimes, uma vez que, na Sentença, o tribunal parte de um pressuposto errado que o limite mínimo e máximo da moldura a aplicar ao co-arguido GMCM, na operação de cúmulo jurídico, é a mesma do arguido MAT (180dias/limite mínimo e 410 dias/limite máximo).
JJJ) Com efeito, no caso do co-arguido GMCM, o limite mínimo da moldura é 150 dias e o limite máximo é 330 dias, pelo que se afigura mais justo fixar-se a pena única em 165 dias de multa.
KKK) Quanto ao quantitativo diário, atenta a situação económica do arguido, constante dos factos provados, considera-se ser mais equitativo a fixação do quantitativo diário da pena de multa em 6,00€.
LLL) Decidindo, como decidiu, violou o Ex.mo Juiz, designadamente, o disposto nos artigos 47º/2, 70º, 71º, 77º, 180º/1 e 2, 182º, 183º todos do Código Penal, artigo 3º, nº1 e 3, da Lei 109/2009, 15 de Setembro, artigos 127º, 374º/2 e 379/1, al. a) do Código Processo Penal, artigo 37º da CRP e artigo 19º da Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Nestes termos, e porque só assim se fará justiça, deve ser dado provimento ao recurso e, em consequência, ser revogado o douto acórdão recorrido substituindo-se por outro que decida em conformidade com o exposto, absolvendo os arguidos de todos os crimes que lhes são imputados e dos respetivos pedidos de indemnização civil.”.


5. O MP apresentou respostas separadas a ambos os recursos, pugnando pela total improcedência dos mesmos.

6. O assistente FS apresentou a sua resposta ao recurso interposto pelo arguido GMCM, concluindo pela sua improcedência total.

7. Nesta Relação, o MP emitiu o parecer a que se reporta o art. 416º do CPP pronunciando-se pela total improcedência parcial de ambos os recursos.

8. Notificado nos termos do art. 417º nº2 do CPP, os arguidos e recorrentes nada acrescentou.

9. Após convite do relator, o arguido GMCM esclareceu a fls 1088 pretender impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto nos termos do art. 412º nºs 3 e 4 do CPP.

10. A decisão recorrida (transcrição parcial):

«2.1. MATÉRIA DE FACTO PROVADA
Da discussão da causa resultou provada a seguinte matéria de facto:

(………)



Cumpre agora apreciar e decidir ambos os recursos.

II. Fundamentação

1. Delimitação do objeto dos recursos e poderes de cognição do tribunal ad quem.
É pacífico o entendimento de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
1.1. O recurso do arguido MAT.
1.1.1.Não obstante a falta de estruturação e assertividade da sua motivação e respetivas conclusões, resulta suficientemente daquelas que o arguido MAT suscita de forma processualmente relevante, as seguintes questões:
- Nulidade da sentença por violação do artigo 374º nº2, em virtude de não proceder ao exame crítico das provas;
- Erro de qualificação jurídico-penal ao condenar o arguido e recorrente como autor de um crime de Falsidade informática p. e p. pelo artigo 3º nº3 da Lei 109/2009 de 15 de setembro, pois “… como os actos referidos no nº1 do art. 3º não se encontram preenchidos, nunca poderia ser tipificado como falsidade informática”;
- Erro de qualificação jurídico-penal ao condenar-se o arguido e recorrente MAT como autor de dois crimes de difamação.
1.1.2. Embora afirme recorrer em matéria de facto e de direito, o recorrente MAT não indica em passo algum da sua motivação de recurso e respetivas conclusões quais os factos concretos que considera incorretamente julgados (art. 412º nº 3 a) do CPP) ou relativamente aos quais se verificaria algum dos vícios previstos no art. 410º nº2, do CPP. Limita-se a tecer considerações abstratas sobre princípios e regras de direito probatório e a fazer apreciações genéricas sobre os crimes imputados e vicissitudes da produção da prova, incluindo alguns depoimentos prestados, sem concretizar em momento alguns quais os factos - de entre os provados e não provados -, a que se refere.
Por outro lado, dada a diversidade de factos que integram o objeto do processo e a pluralidade de crimes pelos quais o recorrente vem condenado, não está este tribunal de recurso em condições de identificar inequivocamente quais os factos concretos que o arguido pretenderia impugnar no caso concreto, contrariamente ao que sucede com outras situações processuais em que, pela homogeneidade da factualidade provada e a unidade de imputação, é possível concluir com a certeza exigível quais os pontos de facto, de entre os julgados provados e não provados, que o recorrente pretende impugnar.
Ora, a indicação dos factos concretamente impugnados, seja nos termos do art. 412º nº3, seja pela via da invocação dos vícios previstos no artigo 410º nº2, ambos do CPP, é essencial para a delimitação do objeto da impugnação, uma vez que, como é pacificamente considerado na doutrina e jurisprudência, os recursos – tanto em matéria de facto como em matéria de direito - constituem apenas remédios jurídicos para corrigir erros cometidos no julgamento em primeira instância e não meio de lograr um novo julgamento sobre o objeto do processo. – Vd, por todos Damião da Cunha, A Estrutura dos Recursos,..., in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 8, Abril - Junho 98, págs. 259/260.
Assim e uma vez que a apontada omissão da indicação dos factos impugnados se verifica tanto no texto da motivação de recurso como nas conclusões, não pode dirigir-se convite ao recorrente nos termos do art. 417 nº 3 do CPP, dado que, conforme se refere, entre outros, no acórdão do Tribunal Constitucional nº259/2002, de 18/6/2002, publicado no D.R. II Série, de 13/12/2002, quando a falta daquelas especificações reside tanto na fundamentação como nas conclusões, não assiste ao recorrente o direito de apresentar uma segunda motivação, pois a existência de um despacho de aperfeiçoamento quando o vício seja da própria motivação equivaleria à concessão de novo prazo para recorrer[2], que não pode considerar-se compreendido no próprio direito ao recurso.
Particularmente no que concerne aos vícios previstos no art. 410º nº2 do CPP o recorrente limita-se a afirmar em título da motivação de recurso, que Existiu erro notório na apreciação da prova, sem concretizar a factualidade eventualmente em causa, como aludido, e sem fundamentar minimamente de direito (não invoca sequer o art. 410º nº2 do CPP), sendo certo que não se nos afigura verificar-se algum dos vícios ali previstos a conhecer oficiosamente.
Não há, pois, questões de facto que integrem o objeto do recurso do arguido MAT de que se imponha conhecer, pelas razões expostas.
1.1.3. - O arguido e recorrente refere-se ainda nas suas conclusões à medida da pena, mas no texto da motivação omite qualquer referência à medida concreta das penas parcelares ou pena única aplicadas, pelo que por tal motivo a questão da medida da pena (fosse a pena única ou alguma das penas parcelares) não integra o objeto do recurso, pois conforme entendimento que cremos ser pacífico, as conclusões “… têm que refletir a matéria desenvolvida no corpo da motivação, não podendo, pois, servir par alargar o objeto do recurso a matéria estranhas e naquele não tratadas” – cfr o Ac STJ de 4.12.1997 apud Simas Santos, Leal-Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª ed.-2007, Editora Rei dos Livros, p. 104.
Em todo o caso, sempre se diga que não resulta sequer das conclusões que o arguido e recorrente pretendesse impugnar efetivamente a decisão sobre a medida concreta da pena, pois limita-se a afirmar conclusivamente que “… a pena aplicada, neste caso, é desproporcionada, na medida, e mais, na gravidade dos efeitos que ela produz no bom nome e reputação do jovem MAT …” e termina com uma única referência à “…desajustada dosimetria da pena, a qual deverá passar pela absolvição total e integral do arguido”, o que é manifestamente inconsequente, pois a verificação de vício na determinação concreta da pena não conduz à absolvição, mas antes a medida diferente.
O recurso não suscita, pois, qualquer questão concreta relativamente à medida das penas de que possa conhecer-se, a não ser que se pretendesse uma apreciação “ex novo” de toda aquela matéria pelo tribunal de recurso, o que, como vimos, não é próprio da caraterização dos recursos como remédios jurídicos e não como meios de procurar obter melhor justiça através da devolução ao tribunal de recurso de um novo julgamento do objeto do processo.
1.1.4. Deste modo, há que decidir da invocada nulidade de sentença, bem como a questão da qualificação jurídica dos factos relativamente a ambos os tipos penais pelos quais os recorrentes vêm condenados, Falsidade informática e Difamação, questão que é comum aos recursos de ambos os arguido e que, por isso, será apreciada conjuntamente, sem prejuízo de o conhecimento de algumas das questões suscitadas ficar prejudicada pela decisão de outras.

1.2. O recurso do arguido GMCM.
O arguido e recorrente GMCM vem recorrer em matéria de facto e de direito.
O seu recurso em matéria de facto suscita, porém, duas questões prévias de natureza diferente, com relevância para a correta delimitação do objeto do recurso.
1.2.1. Por um lado, não era certo que o arguido pretendesse impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto nos termos do art. 412º nºs 3, 4 e 6, do CPP, apesar de os termos concretos da sua motivação de recurso sugerirem seriamente a hipótese de o recorrente não indicar aquele preceito mas antes o art. 410º nº2 do CPP, por mero lapso.
Depois de convidado a fazê-lo, veio o arguido GMCM esclarecer que pretende efetivamente impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto nos termos do art. 412º nºs 3 e 4 do CPP, pelo que se impõe decidir da impugnação da matéria de facto pertinente para o preenchimento dos tipos legais de Falsificação informática e de Difamação, pelos quais vêm os arguidos condenados.
Na sua impugnação em matéria de facto, o recorrente inclui os factos descritos sob os nºs 39 e 40 que respeitam apenas ao pedido cível deduzido pelo assistente FS, pelo que não se conhecerá da impugnação nessa parte, uma vez que os arguidos foram condenados a pagar-lhe solidariamente a importância de 1 000 euros, que é inferior a metade do valor da alçada dos tribunais de 1ª instância em matéria civil, que é de 5000 euros, conforme estabelecido no artigo 44º da Lei 62/2013 de 26 agosto que aprovou a nova Organização do Sistema Judiciário, pelo que é inadmissível recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil nos termos do artigo 400º nº2 do CPP.
1.2.2. No caso de proceder o recurso em matéria de facto, impõe-se ainda apreciar se daí decorre o não preenchimento dos elementos típicos dos crimes de Falsidade informática e de Difamação (nas pessoas de CF e FS), com a consequente absolvição do arguido recorrente, como pretendido por este, do mesmo modo que se imporá retirar as consequências legalmente impostas em matéria civil, nos termos do art. 403º nº3 do CPP.
1.2.3. Por outro lado, para além de pretender ver alterada a decisão recorrida na parte em que julgou provados os factos que especifica, por entender ser outra a decisão imposta pelos meios de prova por ele indicados, o arguido GMCM pretende ainda, relativamente a factos sobre os quais o tribunal a quo não se pronunciou, julgando-os provados ou não provados, que aqueles mesmos factos sejam julgados provados com base nas provas que indica.
Como diz na sua motivação de recurso, o recorrente pretende (A) a ampliação da matéria de facto, mediante o aditamento de “ …factos essenciais para integrar os restantes factos, nomeadamente as afirmações constantes do mail enviado pelos arguidos, e que não só foram confirmados pelo assistente FS e pelas testemunhas como são, de resto, do conhecimento público, através da sua publicação em Diário da República.
Temos entendido, porém, (cfr Ac R.E. de 15.03.2011, deste mesmo relator), que a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto nos termos do art. 412º do CPP não é meio processual adequado para fazer constar do elenco dos factos provados ou não provados factos relevantes que o tribunal de julgamento não incluiu naquele elenco (ampliação da matéria de facto) .O que o art. 412º nº3 a) prevê é a impugnação da decisão do tribunal de julgamento que julgou provado ou não provado determinado facto e não o suprimento de omissão factual relevante, maxime quando esta fique a dever-se a falta de apuramento do facto em causa por parte do tribunal de julgamento ou outro motivo. Ou seja, o que o art. 412º nº3 do CPP permite é que o tribunal ad quem considere provado ou não provado facto importante para a decisão da questão da culpabilidade ou da determinação da sanção como consequência da reapreciação das provas, incluindo a prova pessoal gravada, à luz das pertinentes normas de direito probatório, regras do conhecimento científico ou da experiência comum e não que julgue provados ou não provados factos que não foram apreciados e julgados pelo tribunal a quo.
Este entendimento foi já sujeito a apreciação pelo Tribunal Constitucional que no seu Acórdão 312/2012 não julgou “… inconstitucionais as normas dos artigos 410º nº 1, 412º n.º 3, e 428º, conjugados com os artigos 339º nº 4, 368º nº 2, e 374º, n.º 2, todos do Código de Processo Penal, na interpretação de que não pode ser objeto da impugnação da matéria de facto, num recurso para a Relação, a factualidade objeto da prova produzida na 1.º instância, que o Recorrente-arguido sustente como relevante para a decisão da causa, quando tal matéria não conste do elenco dos factos provados e não provados da decisão recorrida.”.
Aquela decisão do tribunal constitucional refere a existência, no regime processual penal, de outro mecanismo - arguição de nulidade de sentença - que confere ao arguido meio processual de reação contra a falta de consideração pela sentença recorrida de factos abordados na discussão da causa, não fazendo recair sobre eles um juízo de prova. Para além daquela referência do Tribunal Constitucional, vimos considerando que a omissão de factos alegados pelos sujeitos processuais ou resultantes da discussão da causa, entre os factos provados e não provados, pode consubstanciar o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art. 410º nº2 a), do CPP), quando a referida omissão traduza a falta de apuramento dos factos respetivos.
Significa isto, no caso presente, que apreciaremos oficiosamente da verificação do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art. 410º nº2 a)) ou de nulidade de sentença (igualmente de conhecimento oficioso, conforme entendimento que seguimos), de cuja procedência possa resultar a pretendida “ampliação da matéria de facto”.
1.2.4. Em matéria de direito, o arguido GMCM alega que ” …no pressuposto de que a impugnação da matéria de facto não deixará de proceder, forçoso será concluir que o arguido não poderá ser condenado pelos crimes de difamação e falsidade informática, por total ausência de preenchimento dos tipos legais referidos”. Impõe-se, assim, como sempre sucederia, decidir se em virtude da eventual procedência do recurso em matéria de facto, os factos que resultem provados são suficientes para o preenchimento dos elementos constitutivos dos dois tipos de crime pelos quais o recorrente vem condenado.
Relativamente aos crimes de difamação, sempre se imporá a apreciação da qualificação jurídica dos factos, porquanto o recorrente GMCM entende que mesmo no caso de a impugnação em matéria de facto não proceder, os factos julgados provados na sentença recorrida não são suficientes para integrar os elementos constitutivos do crime de difamação na pessoa da assistente CF, bem como do crime de difamação na pessoa do assistente FS, pelos quais vem condenado, pelo que sempre se impõe apreciar e decidir da qualificação jurídico penal da factualidade pertinente.
1.2.5. Por último, o mesmo arguido e recorrente pretende a redução da medida das penas parcelares e da pena única para o mínimo legal, valendo a pretensão quanto à pena única mesmo na hipótese de o recurso improceder quanto às penas parcelares.
2. Decidindo
I. Quanto à nulidade de sentença arguida pelo recorrente MAT é a mesma manifestamente improcedente, porquanto constata-se da mera leitura da sentença recorrida que esta não omite a apreciação crítica dos factos, nem tão pouco deixa de apreciar as provas relativas a algum facto particularmente relevante. O recorrente parece confundir a satisfação formal do dever processual de apreciar criticamente as provas imposto pelo nº 2 do art. 374º do CPP, com o mérito dessa mesma apreciação que não se confunde com vício formal gerador de nulidade nos termos do art. 379º do CPP.
Assim, improcede o recurso nesta parte.
II. O recurso do arguido GMCM.
Uma vez que este arguido recorre também em matéria de facto respeitante à questão da culpabilidade concernente aos crimes de Falsidade informática e Difamação pelos quais vem condenado em coautoria com o arguido MAT, com eventuais reflexos na condenação de ambos os arguidos, passamos a conhecer do recurso do arguido GMCM, sem prejuízo de decidirmos conjuntamente as questões de qualificação jurídica comuns a ambos os recursos.
1. A pretendida ampliação da matéria de facto.
Conforme deixámos exposto na delimitação do objeto do recurso, a ampliação da matéria de facto pretendida pelo arguido no texto da sua motivação e respetivas conclusões, mediante o aditamento de factos que identifica com os nºs 2-A, 2-B e 2-C, não pode integrar o objeto da impugnação das decisão proferida sobre a matéria de facto, nos termos do artigo 412º do CPP, pelo que apenas pode ser perspetivada como vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto, previsto no artigo 410º nº 2 a) do CPP ou eventual nulidade de sentença nos termos do art. 379º nº1 a) do CPP.
Passemos então a decidir da verificação de algum daqueles vícios que, conforme entendimento jurisprudencial que seguimos, são de conhecimento oficioso.
Os factos que o recorrente pretende ver aditados, são do seguinte teor:
Facto 2-A
O pai do assistente (JJS) exerceu diversos cargos de nomeação política.


Facto 2-B
O assistente FS trabalhou no Pelouro do Desporto da Câmara Municipal de (.....), durante os mandatos de MMCC.

Facto 2-C

A esposa do assistente FS foi secretária do presidente da Câmara de (.....), durante os mandatos de MMCC, e desempenha actualmente funções na CIMAA - Comunidade Intermunicipal do (.....).
O arguido e recorrente alega que estes factos são essenciais para integrar os restantes factos, nomeadamente as afirmações do mail enviado pelos arguidos, mas a verdade é que o recorrente não concretiza qual seja essa relevância nem a mesma resulta do mero confronto entre o respetivo enunciado e os factos provados, pelo que não se verifica o primeiro dos requisitos para qualquer aditamento à factualidade provada, que é, precisamente, a relevância dos factos em causa.
Por outro lado, tanto o vício de insuficiência previsto no art. 410º nº2 a) do CPP como a nulidade de sentença por falta de enumeração de facto entre os factos provados e não provados, resultante das disposições conjugadas do art. 379º al. a) e 374º nº2, do CPP, apenas se verificam relativamente a factos, relevantes para decisão da causa, que constem entre os factos descritos na acusação ou em articulado da defesa, ou resultem da discussão da causa, o que não se confunde com a mera referência que lhes seja feita por algum dos sujeitos ou intervenientes processuais na audiência de julgamento.
Assim, dado que nenhum daqueles factos integra qualquer daquelas categorias, pois não consta da acusação pública ou particular, de articulado de defesa ou da discussão da causa, nem tal é alegado, também por esse motivo, a acrescer à falta de relevância para decisão da causa, concluímos não se verificar qualquer daqueles vícios.
2. A impugnação da matéria de facto nos termos do artigo 412º CPP.
Como é sabido, os recursos configuram-se no Código de Processo Penal como um remédio e não como um novo julgamento sobre o objeto do processo, o que vale plenamente para o recurso em matéria de facto nos termos do art. 412º nº3 do CPP. Este não visa, assim, a realização de um novo julgamento do facto por parte do tribunal de recurso, mas antes a reapreciação da prova indicada pelo recorrente – acrescida da que oficiosamente entender dever apreciar - com vista a decidir se ao julgar provados ou não provados os factos igualmente especificados pelo recorrente, tribunal de julgamento incorreu em erro julgamento, nomeadamente por violação de normas e princípios legais de direito probatório, regras do conhecimento técnico ou científico ou regras da experiência comum.
Isto mesmo se diz, por todos, no Ac STJ de 10.03.2010 CJ nº 222 Tomo I/2010 acedido em www. colectaneajurisprudencia.com, de onde se extrai o seguinte trecho :
- “Como o Supremo Tribunal de Justiça tem reafirmado o recurso da matéria de facto perante a Relação não é um novo julgamento em que a 2ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1ª instância, como se o julgamento não existisse, tratando-se de um remédio jurídico destinado a colmatar erros de julgamento, (…)
O objeto do 2º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto não é a pura e simples repetição das audiências perante a Relação, mas, mais singelamente, a deteção e correção de concretos, pontuais e Claramente apontados e fundamentados erros de julgamento (…)
A intromissão da Relação no domínio factual cingir-se-á a uma intervenção "cirúrgica", no sentido de delimitada, restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correção, se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação. (…)
A juzante impor-se-á um último limite que tem a ver com o facto de a reapreciação só poder determinar alteração à matéria de facto assente se o Tribunal da Relação concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitam uma outra decisão
Vejamos, então, se da reapreciação da prova indicada pelo arguido GMCM resulta a verificação de algum dos aludidos erros de julgamento, relativamente ao conjunto de factos relevantes para o preenchimento dos elementos típicos do crime de falsidade informática e dos dois crimes de difamação pelos quais vem condenado.
Apreciemos, pois, cada um dos factos impugnados.
No entender do recorrente, resulta da reapreciação das provas especificadas que os factos descritos sob os nºs 3, 4 e 15, da factualidade provada, devem ser alterados, e os factos provados sob os nºs 16, 17, 20, 30, 32º, 39º e 40º, 31º e 33º, devem ser julgados não provados. Os factos descritos sob os nºs 21 a 29 da factualidade provada devem ser igualmente julgados não provados, na medida em que estão dependentes dos factos nºs 3, 4, 15, 16, 17 e 20.
Vejamos.
2.1. O facto provado nº 3 é do seguinte teor:
«3. Por ocasião das eleições para a referida Comissão Politica Concelhia do (.....) de (.....), ocorridas em Outubro de 2012, os arguidos, movidos por divergências politicas que os opunham aos assistentes CF e FS, engendraram entre si um plano com vista a denegrir a imagem e reputação dos mesmos junto dos demais militantes do (.....) de (.....)».
O arguido e recorrente entende que aquele mesmo ponto de facto deve passar a ter a seguinte redação:
Os arguidos, movidos por divergências políticas com o assistente FS e em resposta ao slogan «vamos acabar com os mamões do partido», por reste utilizado contra ambos durante a campanha interna para as eleições da concelhia do (.....) de (.....), conceberam um plano com vista a responder a esta acusação do assistente FS.”.
Entende, pois, o arguido que o tribunal de julgamento incorreu em erro notório ao julgar provado que agiu movido por divergências políticas com a assistente CF, com vista a denegrir a imagem e reputação daqueles e do assistente FS junto dos demais militantes do (.....). Entende que apenas resultou provado ter agido relativamente ao assistente FS e ainda assim com vista a responder à acusação contida no slogan referenciado na resposta alternativa que apresenta.
Vejamos.
Antes de mais, apenas apreciaremos, por ora, o segmento da matéria de facto em causa em que se refere que os arguidos agiram movidos por divergências politicas que os opunham aos assistentes CF e FS, deixando para apreciação conjunta com a impugnação relativa aos factos nº 24, parte final, 27, 28 e 29, no que concerne à assistente, e com os factos nºs 30, 31 e 32, no que se reporta ao assistente, o último segmento do facto nº3, ou seja, que os arguidos “… engendraram entre si um plano com vista a denegrir a imagem e reputação dos mesmos junto dos demais militantes do (.....) de (.....)».
Quanto à questão das divergências políticas com os assistentes, resulta claro da motivação do recorrente que este apenas põe em causa que se verifique essa divergência relativamente à assistente, embora sem razão, pelas razões que se deixam expostas.
Em primeiro lugar, mesmo a considerar-se que o arguido GMCM não conhecia a assistente CF, isso não significa que não pudesse ter agido contra ela movido por divergências políticas, sendo certo que a sua afirmação, em audiência, de que não sabia qual o campo político onde aquela se colocaria, não implica que o tribunal a quo tome tal afirmação por verídica. Do mesmo modo a circunstância de a assistente CF não ter participado sequer nas eleições concelhias do partido, não obsta a que os arguidos tivessem divergências políticas com ela e que tivessem agido motivados por essas mesmas divergências. Os trechos dos depoimentos testemunhais de JPP e ATT apenas se referem ao tipo de linguagem usada e outros aspetos laterais que em nada desmentem existência de divergências políticas que envolvessem a assistente, pelo que são irrelevantes para a prova do ponto de facto provado com o nº 3.
Por último, também do teor do mail reproduzido sob o nº 18 dos factos provados, invocado pelo recorrente GMCM, nada resulta em contrário do descrito sob o nº3 dos factos provados, sendo certo que o recorrente não explica a sua afirmação de que da simples leitura do mail [transcrito sob o nº18 dos factos provados] resulta claramente que o que motivou o seu envio foi precisamente a expressão usada (“Vamos acabar com os mamões do partido”).
Assim e tendo presente o teor das conversas via chat, nomeadamente as referências que envolvem a assistente, cujo nome é mesmo indicado pelo arguido MAT ao arguido GMCM, e as declarações de ambos os assistentes, bem como as declarações circunstanciais deste último arguido, não resulta minimamente da sentença recorrida e dos meios de prova reapreciados que o tribunal de julgamento tenha violado norma ou princípio legal de direito probatório, regra do conhecimento técnico ou científico ou regras da experiência comum, pelo que improcede a impugnação nesta parte.
2.2. O facto provado nº 4 é do seguinte teor:
“4.Os arguidos decidiram, então, criar uma conta de correio eletrónico utilizando o nome e demais dados de identidade da assistente CF, como se da própria se tratasse, e, através da referida conta, enviar mensagens aos militantes e filiados do (.....) de (.....), levando-os a crer que tais mensagens eram escritas e enviadas pela assistente”.
O arguido e recorrente entende que aquele mesmo ponto de facto deve passar a ter a seguinte redação:
Os arguidos decidiram, então, criar uma conta de correio eletrónico com o endereço "(.....)" e, através da referida conta, enviar o mail descrito no Facto Provado nº14 aos militantes e filiados do (.....)”
Começa o arguido GMCM por alegar que dos elementos de prova invocados pelo tribunal recorrido para julgar provado o facto descrito sob o nº4 não pode concluir-se que tenha utilizado o nome e demais dados da assistente, antes se conclui que não usou quaisquer dados de identidade na criação da conta, pois não usou o seu nome, nem foto, nem profissão, idade, data de nascimento, localidade morada, etc.. Limitou-se a usar o pseudónimo (.....), como utilizador da conta, e o endereço (.....) que, porém, não corresponde ao nome da assistente CF, sendo certo que nada os impedia de usar o endereço (.....) se fosse sua intenção usar o nome da assistente.
Alega ainda o arguido e recorrente que “…o tribunal não pode dar como provado, invocando as regras da experiência comum, que a intenção dos arguidos era levar os militantes do (.....) de (.....) a crer que tais mensagens eram escritas e enviadas pela Assistente CF, quando das regras da experiência resulta precisamente o contrário.
Como efeito, se a intenção fosse essa:
(I) o texto do mail teria terminado com a assinatura "CF" (o que não aconteceu: o texto não está assinado);
(II) o endereço criado seria "(.....)" e não "(.....)s";
(III) o texto não teria sido enviado para o mail da Assistente CF ((.....)(.....)) e com todos os endereços de mail dos destinatários visíveis, permitindo que: por um lado, os destinatários vissem que o texto foi enviado para o mail da Assistente CF, o que só podia significar que não tinha sido enviado por esta; e por outro, a Assistente pudesse esclarecer qualquer dúvida, de imediato, como o fez, reenviando para todos os mails a informação de que o mail em questão não tinha nada a ver com ela, nem com o mail dela.”
Vejamos agora cada um dos segmentos da impugnação, decidindo-se ainda da impugnação relativa aos pontos nºs 15, 16 e 17 da factualidade provada.
2.2.1. Não obstante mencionar-se sob o nº4 dos factos provados que os arguidos decidiram criar uma conta de correio eletrónico utilizando o nome e demais dados de identidade da assistente CF, é nos nº 12, 13 e 14 (não impugnados), que se descreve os termos em que os arguidos procederam à criação da conta com o nome de utilizador (.....) e o endereço de e:mail (.....)..
Ora, constata-se da mera leitura daqueles pontos de facto que não se menciona aí que os arguidos utilizaram [o nome e] quaisquer outros dados de identidade da assistente CF na criação da dita conta, nem tal resulta de outros meios de prova que, aliás, a sentença recorrida não refere, sendo certo que a criação de contas daquela natureza dispensa a menção de dados pessoais verídicos de qualquer pessoa em concreto, bastando-se o preenchimento dos campos obrigatórios com a indicação do número e espécie dos carateres exigidos, independentemente de corresponderem a qualquer pessoa.
No que respeita à utilização do nome da assistente que se menciona genericamente sob o nº4 dos factos provados, apenas se encontra provado sob o respetivo nº13 que o arguido GMCM, tal como anteriormente acordara com o arguido MAT, abriu a conta com o nome de utilizador (.....) e o endereço (.....).., sem que se encontre provado por qualquer meio que os arguidos tenham utilizado ou pretenderam utilizar o nome da assistente , [ou quaisquer outros dados pessoais, como referimos] em qualquer outro momento do processo de criação da conta.
Assim sendo, apenas pode considerar-se provado o propósito de utilização do nome da assistente – total ou parcial – pela forma descrita sob o nº13 dos factos provados, cabendo discutir em sede de enquadramento jurídico-penal dos factos se ao usarem aqueles nome de utilizador e endereço os arguidos utilizaram o nome da assistente de forma penalmente relevante.
2.2.2. Quanto à alegada violação das regras da experiência comum pelo tribunal a quo, ao dar como provado que a intenção dos arguidos era levar os militantes do (.....) de (.....) a crer que tais mensagens eram escritas e enviadas pela Assistente CF, nenhuma das razões invocadas pelo recorrente permite pôr em causa aquele julgamento de facto, pois tanto a omissão do nome da assistente no texto do mail enviado, como a utilização de Fs em vez de F no endereço eletrónico, como, ainda, a circunstância de o texto ser enviado para a própria assistente juntamente com os demais, não significam necessariamente que o mail não podia ter sido enviado pela assistente, contrariamente ao que pretende o recorrente, pois aquelas circunstâncias podem ser explicadas por um conjunto de razões plausíveis, pelo que não pode retirar-se delas a conclusão exposta pelo recorrente.
Em face do teor das conversas mantidas em GTalk entre os arguidos e transcritas sob os nºs 7. e 8. dos factos provados, o teor do mail reproduzido em 18, a escolha do endereço de mail e nome de utilizador da conta de correio eletrónico, com referências incontornáveis a partes do nome da assistente, conforme se descreve sob os nºs 13 e 14º , da factualidade provada, e as regras da experiência comum, todo o processo de criação da conta, redação e envio do mail, apenas faz sentido como forma de concretizar o propósito de fazer crer aos destinatários do mail que o mesmo era escrito pela assistente.
2.2.3. Por estas mesmas razões, não pode deixar de improceder a impugnação relativamente aos factos descritos sob os nºs 15, 16 e 17, da factualidade provada, que se reportam àquele mesmo propósito de fazer crer que era a assistente quem remetia o mail em causa e à atuação conjunta e concordante de ambos os arguidos, independentemente dos passos ou tarefas desempenhadas por cada um deles.
2.2.4.Concluímos, pois, pela procedência parcial da impugnação da decisão que julgou provado o ponto nº4 da factualidade provada, eliminando-se do mesmo a menção, ”demais dados de identidade”, e especificando que a utilização do nome da assistente é a que se descreve sob o nº13 dos factos provados, pelo que se procede à modificação da decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto (art. 431º do CPP), passando o nº4 dos factos provados a ter a seguinte redação:

- « 4.Os arguidos decidiram, então, criar uma conta de correio eletrónico utilizando o nome da assistente CF no respetivo nome de utilizador e endereço eletrónico, conforme infra descrito em 13., como se da própria se tratasse, e, através da referida conta, enviar mensagens aos militantes e filiados do (.....) de (.....), levando-os a crer que tais mensagens eram escritas e enviadas pela assistente».
Dos factos não provados passa a constar uma alínea d), do seguinte teor:
“ Os arguidos decidiram criar uma conta de correio utilizando dados de identidade da assistente, para além do que consta dos nº4 e 13. dos factos provados”.

Por outro lado, conforme exposto supra, julga-se improcedente a impugnação quanto ao mais respeitante ao nº4 dos factos provados e, totalmente, quanto aos factos descritos sob os nºs 15, 16 e 17, da factualidade provada.
2.2.5. Relativamente ao facto descrito sob o nº 20 dos factos provados, ou seja, que “A assistente CF utiliza a conta de correio eletrónico (.....), que é conhecida dos arguidos” é manifesta a razão do recorrente, pois só por lapso pode explicar-se a referência feita na apreciação crítica da prova de que o mesmo foi considerado provado com base nas declarações da assistente e na circunstância de o e:mail em análise ter sido enviado para o seu correio eletrónico. Tanto das declarações da assistente, como da lista de e:mails constante do nº 14 dos factos provados, o que se constata é que a assistente utiliza a conta de correio eletrónico (.....)(.....) e não uma conta (.....).
Assim, procede a impugnação nesta parte, passando aquela factualidade a constar integralmente entre os factos não provados como al. e).
2.2.6. Impugnação relativa aos factos descritos sob os nºs 21 a 29.
Os pontos de facto nºs 21 a 24º (1ª metade) respeitam aos elementos subjetivos do crime de Falsidade informática p. e p. p. e p. pelo artigo 3º, n.ºs 1 e 3, da Lei nº 109/2009, de 15 de Setembro, pelo qual ambos os arguidos vêm condenados, pelo que passamos a tecer as necessárias considerações a este respeito, tanto mais que o recorrente impugna igualmente o enquadramento jurídico-penal dos factos pertinentes à prática daquele crime.
Relativamente aos pontos nºs 21 a 26 da factualidade provada, o recorrente alega que não foram introduzidos no sistema informático da PT (SAPO) os dados pessoais da assistente, sendo certo que o nome aposto no endereço de correio eletrónico (“CFs”) e o nome de utilizador ((.....)) não são sequer o nome abreviado da assistente. Assim, conclui, na falta de mais elementos identificativos na conta de correio eletrónico (morada, localidade, idade, profissão, telefone, fotografia, etc) é impossível alguém identificar aquele endereço eletrónico como sendo o da assistente, pois há milhares de contas de correio eletrónico com endereço contendo as palavras “CC” e “Fs”.
2.2.6.1. Antes de prosseguir com a apreciação das concretas questões de facto colocadas, importa tecer algumas considerações sobre o tipo legal de Falsidade informática que possam enquadrar aquelas mesmas questões de facto.
Em primeiro lugar, no caso presente apenas releva o preenchimento do tipo legal previsto no nº1 do art. 3º da Lei 109/2009, pois o uso de documento produzido a partir de dados informáticos previsto no nº3 daquele mesmo art. 3º, apenas é punido no caso de se tratar de uso de documento por pessoa distinta da que praticou os atos referidos no nº1, nos mesmos termos em que se considera, pacificamente, que o uso de documento falso previsto na al. c) do nº1 do artigo 256º do C. Penal apenas é punido quando é levado a cabo por pessoa diferente de quem falsificou o documento, falando - vd, por todos, Helena Moniz, Comentário Conimbricense do C. Penal, T.II, p. 684 e Pinto de Albuquerque, Comentário do C. Penal, 2008, p. 673, mencionando a primeira autora o entendimento de Eduardo Correia de que se trataria de um caso de concurso aparente ou de normas.
Assim sendo, apesar de a sentença declarar a condenação dos arguidos pela prática do crime de falsidade informática previsto e punível pelos nºs 1 e 3 do art. 3º da Lei 109/2009, a condenação dos arguidos apenas tem lugar pela incriminação constante do art. 3º nº1, sem prejuízo de o uso dos dados ou documentos poder relevar em sede de determinação concreta da pena, pelo que nos referiremos apenas ao tipo legal previsto no nº1 do artigo 3º da Lei do Cibercrime ao apreciar a qualificação jurídica dos factos e as questões de facto pertinentes.
2.2.6.2. Quanto ao tipo penal previsto no nº1 do artigo 3º da Lei 109/2009 (Lei do cibercrime) que prevê o crime de Falsidade informática, este preceito é do seguinte teor:
- “1. Quem com intenção de provocar engano nas relações jurídicas, introduzir, modificar, apagar ou suprimir dados informáticos ou por qualquer outra forma interferir num tratamento informático de dados, produzindo dados ou documentos não genuínos, com a intenção de que estes sejam considerados ou utilizados para finalidades juridicamente relevantes como se o fossem, é punido com pena de prisão até 5 anos ou multa de 120 a 600 dias.”.
O tipo objetivo do crime de falsidade informática previsto no nº1 do artigo 3º da Lei 109/2009 de 15 de setembro, que aqui importa, é, assim, integrado, no plano objetivo, pela introdução, modificação, apagamento ou supressão de dados informáticos ou por qualquer outra forma de interferência num tratamento informático de dados, de que resulte a produção de dados ou documentos não genuínos, consumando-se o crime apenas com a produção deste resultado.
Do ponto de vista subjetivo, o tipo legal supõe o dolo, sob qualquer das formas previstas no art. 14º do C.Penal, exigindo, enquanto elemento subjetivo especial do tipo, a intenção de provocar engano nas relações jurídicas, bem como, relativamente à produção de dados ou documentos não genuínos, a particular intenção do agente de que tais dados ou documentos sejam considerados ou utilizados para finalidades juridicamente relevantes como se fossem genuínos.
No que respeita aos bens jurídicos protegidos, podemos dizer com Pedro Dias Venâncio, Crime de Falsidade Informática in JusNet 120/2010, acedido em abril de 2015 que, apesar de os seus diversos números corresponderem a diferentes tipos de crime, o crime de falsidade informática previsto no artigo 3º da Lei 109/2009 visa proteger a segurança das relações jurídicas enquanto interesse público essencial que ao próprio Estado de Direito compete assegurar e não, acrescentamos nós, a confidencialidade, integridade e disponibilidade de sistemas informáticos, de redes e de dados informáticos, que corresponde ao bem jurídico protegido pelos restantes tipos legais que, juntamente com a Falsidade informática, se encontram agrupados no capítulo que a Lei 109/2009 dedica, indistintamente, às disposições penais materiais.
Na verdade, a Convenção sobre Cibercrime do Conselho da Europa, de 2001, conhecida por Convenção Budapeste - adaptada ao direito interno português pela Lei 109/2009 -, prevê a Falsificação informática (art. 7º) no titulo II da secção de Direito penal material, sob a designação, Infracções relacionadas com computadores, enquanto no primeiro título da mesma secção se agrupam as Infrações contra a confidencialidade, integridade e disponibilidade de dados e sistemas informáticos (Acesso ilícito, Intercepção ilícita, Dano provocado nos dados, Sabotagem informática e Utilização indevida de dispositivos).
Diferentemente destes últimos tipos penais (que correspondem, grosso modo, aos previstos no segundo capítulo da Lei 109/2009) os bens jurídicos protegidos pelo crime de Falsidade informática previsto no artigo 3º da Lei 109/2009 , que se aproxima do crime de falsificação comum (art. 256º do C.Penal), são antes a segurança e credibilidade dos dados e documentos produzidos em computador mediante o tratamento informático de dados, sendo a esta luz que deve interpretar-se aquele tipo legal.
2.2.6.3.Vejamos, então, o crime de Falsidade informática no que importa ao caso concreto, começando por deixar claro que tendo resultado da procedência parcial da impugnação em matéria de facto a eliminação da referência a outros dados de identidade da assistente, que constava do nº4 da factualidade provada em 1ª instância, apenas está em causa a questão de saber se a criação e utilização de uma conta de correio eletrónico, com utilização do nome e/ou parte do nome de alguém no endereço eletrónico e no nome de utilizador que lhes estão associados, traduz, no plano objetivo, a produção de dados ou documentos não genuínos, mediante a introdução de dados informáticos, que a al. b) do nº2 da Lei 109/2009 define como, “…qualquer representação de factos, informações ou conceitos numa forma adequada para o processamento informático, incluindo um programa que permita a um sistema informático executar uma função”.
Esta questão merece-nos resposta positiva, pois apesar de o nome de utilizador e o endereço eletrónico não identificarem necessariamente quem criou e utiliza uma conta de correio eletrónico, é da experiência corrente que muitos dos utilizadores da Internet compõem o nome de utilizador e o endereço de correio eletrónico com elementos do seu nome, de modo a poderem serem facilmente identificados entre o respetivo círculo de destinatários. Assim, a utilização do nome ou de parte do nome de outrem no nome de utilizador e/ou endereço eletrónico, por parte de quem criou conta de correio eletrónico, é idóneo a fazer crer que foi a pessoa a quem respeita o nome ou parte de nome quem efetivamente abriu e utilizou a conta de correio eletrónico em causa, pelo que, quando tal não corresponda à verdade, configura-se uma situação de fraude na identificação em termos similares ao que sucede quando alguém assina com o nome de outrem documento por si elaborado (vd P. Albuquerque, Comentário do C.Penal, 2008, anotação ao art. 256º, p. 673.), dando origem a dados ou documentos não genuínos para efeitos da previsão do nº1 do art. 3º da citada Lei do Cibercrime.
A situação de facto descrita sob os nºs 4 (modificado), 13, 14, 18 e 15, da factualidade provada configura, assim, uma falsa representação da realidade quanto à identificação do criador e utilizador da conta eletrónica que, deste modo, constitui dado ou documento não genuíno para efeitos do preenchimento dos elementos típicos do crime de Falsidade informática, sendo certo que, contrariamente ao que parece entender o recorrente, não é determinante que o nome ou parte do nome usado possam ser relativamente comuns. Desde que no contexto em que foi criada e utilizada a conta de correio eletrónico em causa, o nome de utilizador e o endereço eletrónico sejam adequados, em concreto, a fazer crer que aquela conta pertence a pessoa determinada diferente daquele que, dolosamente, a criou e utilizou com o intenção de provocar, desse modo, engano nas relações jurídicas, o tipo legal pode ser preenchido.
2.2.6.4. Nesta sede impõe-se ainda uma referência à motivação de recurso do arguido MAT, que impugnou igualmente a qualificação jurídica dos factos no que concerne à condenação pelo crime de Falsidade informática, apenas para deixar claro ser a mesma manifestamente improcedente, porquanto assenta num pressuposto de facto que independentemente de saber que relevância poderia assumir no plano do direito, não se encontra demonstrado, ou seja, que nenhum dos militantes do (.....) recetores do email acreditou ser o mesmo enviado pela assistente CF.
Improcedem, pois, os recursos de ambos os arguidos quanto ao crime de Falsidade informática pelo qual vêm condenados, tanto em matéria de facto como de direito, sem prejuízo de a condenação respetiva apenas ter lugar nos termos do nº1 do art. 3º da Lei 109/2009, como vimos.
2.2.6.5. Retomando agora a apreciação da impugnação em matéria de facto do arguido GMCM, estamos em condições de concluir pela parcial procedência da mesma no que respeita aos factos descritos sob os nºs 21 a 26 da factualidade provada.
Por um lado, a circunstância de as iniciais MC e do apelido F, no nome de utilizador (.....), bem como o nome próprio CC, seguido da referência Fs, que corresponde ao apelido F no plural, serem relativamente comuns, como referido, não impede que os mesmos respeitem efetivamente à assistente e que como tal sejam tomados pelos militantes do (.....) de (.....) destinatários do mail em causa. Precisa-se, porém, que na conta de correio eletrónico criada pelos arguidos não se reproduziam dados de perfil da identidade do utilizador, tal como não estava em causa um perfil não genuíno da assistente, contrariamente ao que se menciona sob o nº 21, do mesmo modo que no ponto 22 dos factos provados apenas deve referir-se a utilização do nome, pois não foram usados quaisquer outros dados conforme vimos na decisão do nº4 dos factos provados.
Relativamente à factualidade descrita sob o nº24 dos factos provada, igualmente impugnada, não resulta efetivamente da prova produzida e da restante factualidade definitivamente assente, que os arguidos tenham colocado em causa a integridade dos sistemas informáticos, pois não estamos perante atuação não autorizada que ponha em causa o funcionamento ou inteireza do sistema informático, tomado este com o significado factual definido na alínea a) do artigo 2º da Lei 109/2009, ou seja, enquanto equipamento ou conjunto de equipamentos interligados ou relacionados entre si que asseguram, isoladamente ou em conjunto, pela execução de um programa, o tratamento automatizado de dados.
Como referido, a conduta dos arguidos colocou, antes, em causa a genuinidade ou verdade da conta de correio eletrónico que criaram, mediante a utilização de dados informáticos, ou seja, in casu, a inserção de partes do nome da assistente nos campos próprios de modo a que tais dados pudessem ser processados no equipamento informático que usaram, sem afetar, de qualquer outro modo, o regular tratamento automatizado dos dados.
A parte final do ponto 24 dos factos provados respeita já ao crime de difamação pelo qual os arguidos vêm igualmente condenados, pelo que abaixo se apreciará a mesma, juntamente com a impugnação dos factos nºs 3 (parte), 27º, 28º e 29º.
No que concerne aos factos descritos sob os nºs 23 e 26 da factualidade provada, não tem fundamento a argumentação do recorrente, pois não resulta de nenhum dos meios de prova ou das regras da experiência, que os arguidos não atuaram conjuntamente fingindo ser a assistente e que não tenham pretendido fazer crer aos seus destinatários que a conta de correio eletrónico e a mensagem enviada, eram da autoria da assistente, conforme vimos já ao decidir a impugnação relativa o nº4 dos factos provados.
Já quanto ao facto nº 25 - “25. Em qualquer caso, sempre os arguidos atuaram de modo conjunto e concertado, e de forma deliberada, livre e consciente, sabendo as suas condutas proibidas e punidas por lei.”- apenas se conhecerá da impugnação respetiva ao apreciar os demais factos pertinentes, pois é destes que depende se o nº 25 deve manter-se.
Deste modo, embora não esteja em causa o conteúdo essencial dos factos descritos sob os nºs 21 a 26, da factualidade provada, pertinentes ao preenchimento dos elementos típicos do crime de Falsidade informática p. e p. pelo nº1 do artigo 3º da Lei 109/2009, as imprecisões referidas impõem que se modifique a redação dos seguintes pontos da factualidade provada, que passa a ser a seguinte: - “21. Agindo do modo descrito tinham os arguidos consciência de que estavam a criar informaticamente uma conta na qual utilizaram partes do nome da assistente, CF, que sabiam não ter sido criada por ela, agindo sem o conhecimento desta;
“22. Assim como sabiam que mediante a utilização de partes do nome daquela, simulando ser a própria, introduziam e criavam, via internet, no sistema informático da PT comunicações (“Sapo”) uma conta de correio eletrónico com dados da identificação da assistente que não foram utilizados por ela;”
Consequentemente, a factualidade não provada passará a integrar os seguintes factos:
-« Não provado que ao agirem como descrito em 21, os arguidos estavam a criar uma conta na qual produziram dados de perfil do utilizador e que sabiam não se tratar de um perfil não genuíno da assistente»;

Mantém-se a redação dos pontos nºs 23 e 26 da factualidade provada.
Após decidir sobre a parte final do nº 24 dos factos provados determinar-se-á qual a redação daquele ponto de facto, sem prejuízo de ficar desde já assente que as referências à integridade dos sistemas informáticos deixam de o integrar.
2.2.6.7. Os factos descritos sob os nºs 3, (parte final), 24 (parte final), 25, 27, 28 e 29, respeitam ao crime de difamação agravado p. e p. pelos artigos 180º, 182º e 183 nº 1 a), todos do C. Penal. Neles se descreve factualidade atinente à conduta dos arguidos em termos que ditam a necessidade de tecermos algumas considerações sobre aquele tipo de crime que se mostram igualmente relevantes para decidir do recurso contra a decisão que julgou preenchido aquele tipo legal. Vejamos então.
Considerações sobre o tipo legal de Difamação, pertinentes à decisão do caso concreto.
O recorrente começa por alegar que, mesmo em face da factualidade provada, não se mostram preenchidos os elementos objetivos do crime de Difamação relativamente à assistente, CF, pois, como diz, não resulta minimamente dos factos provados qualquer facto que permita integrá-lo na previsão das normas do artigo 180º do CP, pois perscrutada a matéria provada, não se vislumbra, desde logo, quais foram os factos ou juízos que o arguido imputou à Assistente e que poderiam, objetivamente, ser considerados ofensivos da honra e consideração da mesma.
Vejamos.
a) Na verdade, constata-se da mera leitura do e:mail reproduzido sob o nº 18 dos factos provados que os arguidos não fazem aí qualquer referência, direta ou indireta, à assistente CF, o que, aliás, é coerente com o propósito de fazerem crer aos destinatários que o mail havia sido escrito e enviado pela própria.
Todavia, conforme pode ler-se na sentença recorrida, o tribunal a quo considerou que a conduta difamante dos arguidos consistiu em terem estes pretendido fazer crer aos militantes do (.....) da concelhia de (.....) e ao assistente, FS, que foi a assistente quem escreveu e enviou o e:mail referido, cujo conteúdo põe em causa opções políticas do partido de que a assistente é militante, tentando deste modo desacreditá-la junto daqueles mesmos militantes.
No entender do recorrente, a conduta dos arguidos extravasa em absoluto o âmbito da previsão da norma legal que definitivamente não tem em vista tal tipo de imputações, sendo certo que a concreta imputação da autoria do e:mail não é objectivamente grave e geradora de ofensas a bens juridicamente protegidos, ou seja, in casu, a honra e consideração da assistente.
Ora, com interesse para a primeira questão colocada pelo recurso, ou seja, a de saber se a atribuição à assistente do mail enviado através da conta eletrónica fraudulentamente identificada como pertencendo à assistente, é meio idóneo de lhe imputar a autoria daquele mail, o artigo 180º nº1 do C. Penal refere-se expressamente à imputação sob a forma de suspeita, com o que abrange a insinuação sobre o facto imputado.
Por outro lado, o 182º do C. Penal equipara à difamação ou injúria expressa oralmente, a que é feita por escrito ou por formas não verbais de comunicação, i.e. gestos, imagens ou qualquer outro meio de expressão, com o que se afirma a construção da difamação e injúria como crimes de realização livre, pois reduzi-los a meros comportamentos verbalizáveis era diminuir o âmbito de aplicação das respetivas normas incriminadoras – vd. Faria Costa, Comentário Conimbricense do C.Penal, Tomo I, 2ª ed. p. 939.
Deste modo, o envio do mail através de conta eletrónica fraudulentamente identificada como pertencendo à assistente, é meio idóneo de lhe imputar a autoria daquele mesmo mail, como se os arguidos o tivessem afirmado expressa e diretamente de forma oral ou escrita, encontrando-se provado (máxime sob os nºs 4, 16 e 17) que foi esse o propósito dos arguidos.
b) Deixando claro que a falsa atribuição da autoria de um qualquer mail, independentemente do seu conteúdo, não é suscetível de ofender a honra ou consideração de alguém por não constituir, em si, ato desonroso, importa, apreciar agora se o concreto mail enviado pelos arguidos põe em causa opções políticas do partido de que a assistente é militante, em termos objetivamente adequados a desacreditar a assistente junto daqueles mesmos militantes, e se, por isso, a atribuição daquele mail à assistente é ofensivo da sua honra ou consideração, conforme se concluiu na sentença recorrida.
Em primeiro lugar, os termos do mail transcrito sob o nº18 dos factos espelham, efetivamente, uma posição crítica sobre opções político-partidárias de dirigentes do partido a que pertencem a assistente e os destinatários do mail ((.....)), máxime o assistente FS, bem como procedimentos deste enquanto dirigente partidário.
Por outro lado, encontra-se provado que os assistentes, tal como os arguidos e os destinatários do mail em causa, são militantes do (.....), havendo divergências políticas entre os arguidos, por um lado, e os assistentes por outro, (nº3 dos factos provados), sendo certo que, de acordo com as regras da experiência, a atribuição da autoria do mail à assistente seria adequada para levar o assistente FS e demais militantes do (.....) a crer que aquela o criticava enquanto dirigente partidário, demarcando-se das suas opções e procedimentos, com o que poderia criar divisões ou ruturas entre eles, para além de poderem influenciar desse modo a opinião de outros militantes sobre o desempenho do assistente FS.
Não se compreende, porém, em que medida - ainda no plano objetivo - a atribuição da autoria do mail punha em causa a imagem e credibilidade pessoal e política da assistente (vd parte final do nº24 tal como foi julgado provado pelo tribunal a quo), bem como a sua integridade psicológica, dignidade, auto estima, consideração e honra - nº 28 .
A imputação da autoria do mail à assistente poderia atentar contra a sua honra ou consideração num outro contexto factual hipotético, mas a verdade é que não resulta do teor do mail nem da sua conjugação com outros factos concretos ou com meios de prova determinados, que as referências críticas do mail atribuído à assistente pusessem em causa a sua imagem e credibilidade pessoal e política, bem como a sua dignidade, auto estima, consideração e honra junto dos militantes do (.....).
Em face dos elementos presentes na sentença recorrida bem podia ter sucedido que as posições críticas indirectamente atribuídas à assistente fizessem, até, melhorar a sua imagem e credibilidade pessoal e política junto dos seus correligionários de partido, ou pelo menos de muitos deles.
Diferentemente, resulta da experiência comum que a que seria a sua posição perante o assistente espelhada no mail, dificilmente deixaria de ser afetada, a título pessoal e político-partidário, pois era ele o dirigente expressa e diretamente criticado no mail que os arguidos indiretamente atribuíram à assistente. Não se afirma, porém, em passo da sentença, seja nos pontos de facto elencados, nas considerações de direito ou na apreciação crítica da prova, que ao atribuírem indiretamente a autoria do mail à assistente os arguidos pretenderam afetar a posição daquela perante o assistente ou que foi esse o efeito produzido pelo mail, tendo mesmo o tribunal a quo julgado não provado que com a sua conduta, os Arguidos quiseram fazer crer ao destinatário da mensagem, o Assistente FS, que a Assistente o afrontava perante os outros militantes, pelo que não está em causa nos autos esta vertente da questão.
c) Não pode, pois, considerar-se resultar das regras da experiência, da prova produzida e da apreciação crítica da prova, que os arguidos tenham incluído a assistente no plano de denegrir a imagem e reputação do assistente a que se refere o ponto nº3 dos factos provados, e que a concreta atribuição da autoria do mail à assistente tenha posto em causa a imagem e credibilidade pessoal e política da assistente (vd parte final do nº24 tal como foi julgado provado pelo tribunal a quo), bem como a sua integridade psicológica, dignidade, auto estima, consideração e honra - nº 28 ). Do mesmo modo não resulta efetivamente provado que os arguidos tenham agido com o propósito de denegrir a imagem da assistente junto dos militantes da concelhia do (....) da Concelhia de (.....) (nº 27 dos factos provados) e que os arguidos agiram livre, deliberada e conscientemente, com o intuito de humilhar e envergonhar a assistente e de ofender na sua honra e consideração, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas por lei (nº 29 dos factos provados), tal como não pode aceitar-se o teor do nº 25 relativamente à assistente, decidindo-se aquando da apreciação dos factos nºs 30 a 33 relativos ao assistente se aquele nº 25 deve permanecer entre os factos provados ou ser totalmente transferido para os factos não provados.
Procede, assim, nesta medida, a impugnação em matéria de facto, impondo-se a modificação da decisão proferida sobre a matéria de facto em conformidade com o ora exposto.
Deste modo, julga-se não provado o descrito sob os nºs 27, 28 e 29, da factualidade provada, que transita, assim, para a factualidade não provada, transitando igualmente para a factualidade não provada a parte dos nºs 3 e 24 que se refere à assistente CF, fixando-se a redação final respetiva depois de decidida a impugnação relativa aos factos pertinentes ao crime de difamação relativo ao assistente, FS.
2.2.6.8. Os pontos de facto nº 30, 31, 32 e 33 e a parte final dos nºs 3 e 24, no que concerne ao assistente FS.
À imagem do que vimos anteriormente quanto aos factos pertinentes ao preenchimento dos elementos objetivos do crime de Falsidade informática, pelo qual os arguidos vêm condenados, também no que concerne aos factos nºs 3, (parte), 24 (parte) e 30 a 34, que respeitam ao crime de difamação relativo ao assistente FS, a apreciação da impugnação nesta parte impõe que teçamos algumas considerações prévias sobre este tipo legal, ainda que na estrita medida do necessário para enquadrar aquela mesma impugnação e a relevância jurídico-penal dos factos tal como foram vertidos na sentença, a partir da acusação pública e particular.
a) No que respeita ao tipo objetivo, o tipo legal de difamação ou de injúria exigem a imputação de um facto ou a formulação de um juízo ofensivos da honra ou consideração de outrem, o que, independentemente das diversas questões suscitadas pela definição do seu sentido e alcance, implica a comprovação da imputação ou formulação de juízo que possam reputar-se idóneos para lesar a honra ou consideração do visado.
Na apreciação crítica da prova, o tribunal a quo refere que nos primeiros parágrafos do mail em causa, os arguidos “limitam-se a fazer críticas à atuação do assistente FS no âmbito da sua atividade política”, considerando que o teor desonroso daquele mail encontrava-se antes no seguinte trecho do mesmo mail:
- - “Ou ainda continuar o Amigo FS e acabar com[o?] a própria mulher, que andou a saltar no tachinho, chefe de gabinete/secretaria, até ninguém a poder aturar mais e lhe terem arranjado um tachinho na CIMMA pelo Amigo AA?!”, concluindo-se na sentença que foi ao escrever aquele trecho que “ … os Arguidos imputaram ao Assistente factos ofensivos da sua honra e consideração, uma vez que colocaram em causa a retidão, o caráter e o bom nome do Assistente e que não deixa indiferente a sociedade, reclamando uma tutela penal de dissuasão e repressão desse comportamento.”.
Ora, a este respeito, a sentença recorrida começa por suscitar-nos dúvidas no plano factual, relativamente ao preenchimento objetivo do tipo, ao considerar que na mensagem que enviaram (facto provado n.º 18º), os Arguidos dão a entender que o Assistente terá, de forma menos lícita, ou mesmo irregular e eticamente censurável, colocado a sua mulher a exercer funções na CIMMA.
Na verdade, do respetivo teor literal não se retira que no mail se impute ao assistente FS ter sido ele quem colocou a sua mulher a exercer funções no CIMMA (o que quer que seja que signifique esta sigla), mas apenas que tal colocação terá sido arranjada por alguém, provavelmente o amigo AAA.
Assim, não pode acompanhar-se o tribunal a quo quando afirma que o trecho transcrito supra pôs em causa a retidão, o caráter e o bom nome do Assistente, pois do mesmo mail não resulta desde logo, independentemente de outras considerações, que os arguidos imputem ao assistente FS ter sido ele quem colocou a sua mulher a exercer funções no CIMMA, como vimos.
Carece, pois, de suporte probatório o facto de ordem objetiva julgado provado sob os nºs 3, parte final, e 32, bem como os factos de cariz subjetivo constantes dos nºs 31, 33 e 24, parte final, daquela mesma factualidade, na medida em que pressupõem necessariamente o facto objetivo antes constante dos nºs 3, parte final, e 32, bem como a conclusão normativa expressa sob o nº 30.
Na verdade, do nº 30 consta, efetivamente, matéria conclusiva, de direito, pois a afirmação de que os arguidos imputaram ao assistente FS factos ofensivos da sua honra e consideração, não representa, em si, um juízo de facto, mas a afirmação de que se mostraria preenchido o elemento objetivo do tipo de difamação, que, nessa parte, lhe corresponde literalmente, o que implica considerarmos não escrito aquele mesmo nº 30.
Em todo o caso, a entender-se que sob o nº30 da factualidade provada se encontraria ainda um dado de facto, sempre ao mesmo faltaria suporte probatório nos termos já referidos a propósito do facto nº32.
De igual modo, o descrito sob o nº 25 dos factos provados será integralmente eliminado dos factos provados passando a integrar a factualidade não provada.
Procede, assim, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto descrita sob os nºs 30º a 34, passando os factos vertidos nos nºs 31 a 33 para a matéria de facto não provada. Do mesmo modo porcede a impugnação relativamente à parte final do nº3 relativa ao assistente, tal como já procedera relativamente à assistente, pois apenas se demonstra que o plano dos arguidos aí referido visava combater politicamente o assistente FS, o que ficará a constar daquele ponto de facto (nº3).
2.2.6.9. - Concluímos, pois, em síntese, pela procedência parcial da impugnação em matéria de facto, com a consequente modificação da decisão proferida sobre a matéria de facto (cfr art. 431º b) do CPP), nos seguintes termos:
A. - Julga-se integralmente não provada a factualidade antes descrita sob os nºs 20 e 25 da factualidade provada, que passa a integrar o elenco dos factos não provados, com a mesma redação:
- “20. A assistente CF utiliza a conta de correio eletrónico (.....), que é conhecida dos arguidos”
- “25. Em qualquer caso, sempre os arguidos atuaram de modo conjunto e concertado, e de forma deliberada, livre e consciente, sabendo as suas condutas proibidas e punidas por lei.”

B. Julga-se parcialmente não provada a factualidade antes descrita sob:
1. Os nºs 21 e 22, que passam a ter a seguinte redação:
- “21. Agindo do modo descrito tinham os arguidos consciência de que estavam a criar informaticamente uma conta na qual utilizaram partes do nome da assistente, CF, que sabiam não ter sido criada por ela, agindo sem o conhecimento desta;
- “22. Assim como sabiam que mediante a utilização de partes do nome daquela, simulando ser a própria, introduziam e criavam, via internet, no sistema informático da PT comunicações (“Sapo”) uma conta de correio eletrónico com dados da identificação da assistente que não foram utilizados por ela;”

2. Os nºs 3, parte final, e 24, parte final, que passam a ter a seguinte redação:
- “3. Por ocasião das eleições para a referida Comissão Politica Concelhia do (.....) de (.....), ocorridas em Outubro de 2012, os arguidos, movidos por divergências politicas que os opunham aos assistentes CF e FS, engendraram entre si um plano para combater politicamente o assistente junto dos demais militantes do (.....) de (.....);”
- “24. Com a descrita atuação, que desenvolveram em comunhão de esforços e intentos, lograram os arguidos, ocultando as suas verdadeiras identidades, divulgarem a mensagem que elaboraram, reproduzida sob o nº18 dos factos provados.”
Consequentemente, parte dos anteriores ponto de facto passam a integrar o elenco dos factos não provados, com a seguinte redação:
- « 21. Não provado que ao agirem como descrito em 21, os arguidos estavam a criar uma conta na qual produziram dados de perfil do utilizador e que sabiam não se tratar de um perfil não genuíno da assistente»;
- « 3- Não provado que ao atuarem como descritos sob o nº3 da factualidade provada, os arguidos pretenderam denegrir a imagem dos assistentes junto dos demais militantes do (.....) de (.....)»;
- «24- Não provado que com a atuação referida sob o nº 24 da factualidade provada, os arguidos, através da divulgação da mensagem que elaboraram, colocaram em causa a imagem e credibilidade pessoal e politica dos assistentes, CF e FS».
- «27.Tudo com o propósito de a denegrir na sua imagem junto daqueles e pôr em causa as funções que desempenha junto do (.....)»
- «28.Com a referida conduta, atingiram a Assistente na sua integridade psicológica, na sua dignidade, auto-estima, consideração e honra»;
- «29.Os Arguidos agiram livre, deliberada e conscientemente, com o intuito de humilhar e envergonhar a Assistente e de a ofender na sua honra e consideração, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei»;

C. Elimina-se ponto nº 30 da factualidade provada que por constituir n matéria conclusiva ou de direito não é transferida para o elenco dos factos não provados.
2.3. Conclusões a retirar, em matéria criminal e civil, da procedência parcial da impugnação em matéria de facto.
2.3.1. Quanto aos dois crimes de Difamação praticados na pessoa de ambos os assistentes, a procedência parcial da impugnação em matéria de facto dita não se encontrarem provados factos integradores dos elementos objetivos e subjetivos dos tipos legais de Difamação agravada p. e p. , p. e p. pelos arts. 180º, 182º e 183º, n.º 1, al. a) do CP, pois, como vimos, não resulta provado que os arguidos, ao atribuírem à assistente CF a autoria do mail reproduzido sob o nº 18 dos factos provados, lhe imputaram facto ofensivo da sua honra ou consideração, do mesmo modo que não se encontram provados factos de que resulte terem os arguidos imputado ao assistente FS factos que pusessem em causa a retidão, o caráter e o bom nome do assistente, desse modo o ofendendo na sua honra e consideração.
Impõe-se, assim, absolver ambos os arguidos daqueles mesmos crimes, pois aproveita ao recorrente MAT o recurso interposto pelo arguido GMCM, nos termos do artigo 402º nº2 a) do CPP, tanto em matéria de facto como de direito.
2.3.2. A absolvição dos arguidos em matéria criminal dita igualmente a sua absolvição relativamente aos pedidos civis deduzidos pelos assistentes, nos termos do nº 3 do art. 403º do CPP, uma vez que os mesmos respeitavam às indemnizações peticionadas pelos danos emergentes daqueles crimes de Difamação, sem que da factualidade provada resulte serem os arguidos responsáveis a qualquer outro título.
2.4. Em face do ora decidido relativamente à absolvição de ambos os arguidos pela autoria dos crimes de Difamação pelos quais vinham condenados e, bem assim, da condenação a pagar solidariamente aos assistentes as quantias arbitradas em primeira instância a título de indemnização pelos danos emergentes daqueles crimes, fica naturalmente prejudicado o conhecimento do recurso do arguido MAT relativamente àqueles mesmos crimes, que visava a sua absolvição da prática daqueles crimes, sendo certo que o seu recurso relativamente ao crime de Falsidade informática improcede, nos termos supra expostos.
2.5.A Pena concreta aplicada ao arguido GMCM pela prática do crime de falsidade informática.
O arguido GMCM vem condenado na pena de 150 dias de multa à razão de €7,50 por dia, pela autoria de um crime de falsidade informática, sendo certo que este tipo de crime é punível com prisão até 5 anos ou multa entre 10 e 600 dias.
O recorrente alega que a pena de 150 dias multa deve ser reduzida para o mínimo legal, tendo em conta todo o contexto (político) em que o crime foi praticado e as baixas necessidades de prevenção geral e especial, tendo em conta desde logo a inserção familiar, social e profissional do arguido. Quanto ao quantitativo diário, invoca a situação económica do arguido e os seus encargos pessoais, constante dos factos provados, considerando mais equitativo a fixação do quantitativo diário da pena de multa em 6,00€ (artigo 47º/2 do CP).
Por sua vez, o tribunal a quo considerou contra o arguido a intensidade da culpa, atenta a modalidade do dolo, o modo de execução do ilícito que revela premeditação e, a seu favor, não ter antecedentes criminais, estar socialmente inserido e ter confessado, com relevância para a descoberta da verdade, bem como o arrependimento implícito em tal confissão.
Ponderou, ainda, as necessidades de prevenção geral elevadas embora por referência ao número de crimes contra a honra que vêm sendo cometidos nesta comarca.
Tendo em conta o mínimo e máximo legal da pena de multa principal pela qual o tribunal a quo optou, não só entendemos não se justificar de modo algum a fixação da pena no mínimo de 10 dias de multa, como consideramos não haver que alterar a medida concreta dos dias de multa fixados, em atenção sobretudo à culpa do arguido revelada no facto, patente no empenho demonstrado na preparação do crime, na atuação conjunta com o outro arguido, no envolvimento de um grande número de pessoas com a consequente perturbação provocada pela criação e utilização fraudulenta da conta de correio eletrónico em causa, a exigir resposta contrafática com algum relevo atentas as razões de prevenção geral positiva ou de integração, tanto mais relevantes quanto é importante que o conjunto da comunidade tome consciência clara do caráter penalmente ilícito de condutas desta natureza e das consequências que podem acarretar. Assim e não esquecendo que a pena concreta se situa bem longe do máximo legal, mostra-se a mesma adequada a preencher as finalidades de prevenção geral e especial a prosseguir com as penas.
Quanto ao quantitativo diário, mostra-se o mesmo igualmente ajustado, tendo em conta que a lei estabelece dever o mesmo ser fixado entre um mínimo de 5 e um máximo de 500, euros, e que o arguido aufere cerca de 850 euros mensais, pagando de despesas fixas apenas renda de casa no montante de 600 euros que, porém, constituirá um encargo partilhado com a companheira com quem vive e que exerce atividade remunerada.
Assim, mantém-se integralmente a pena concreta aplicada ao arguido GMCM pela prática do crime de Falsidade informática.

Dispositivo

Nesta conformidade, acordam os juízes da secção criminal do Tribunal da Relação de Évora em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido GMCM, que aproveita ao arguido MAT em matéria de culpabilidade relativamente ao crime de Difamação pelo qual vinha condenado e em negar, parcial, provimento ao recurso interposto pelo arguido MAT, na parte não prejudicada pela decisão, que lhe é favorável, do recurso do arguido GMCM.
Assim sendo, decide-se modificar a factualidade provada nos termos supra discriminados no ponto 2.2.6.9 da fundamentação do presente acórdão, bem como revogar a sentença recorrida, na parte em que condenou cada um dos arguidos:
- Em matéria criminal, como autores de dois crimes de Difamação agravada p. e p. pelos artigos 180, 182º e 183, nas pessoas dos assistentes CF e, pelos quais o arguido GMCM vinha condenado nas penas de 80 dias e 100 dias, de multa, respetivamente, à razão diária de € 7,50, e o arguido MAT vinha condenado nas penas de 100 dias e 130 dias, de multa, respetivamente, à razão de € 9,00;
- Em matéria civil, na parte em que a sentença recorrida condenou cada um dos arguidos a pagar solidariamente à assistente CF a quantia de 1 500 euros e ao assistente FS a quantia de 1 000 euros, a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Consequentemente, decide-se, em substituição, absolver os arguidos da prática daqueles mesmos crimes de Difamação e ainda dos pedidos civis contra eles deduzidos pelos assistentes CF e .
Mantem-se no mais a sentença condenatória recorrida, com a precisão, em estrita matéria de qualificação jurídica (vd supra), que a condenação dos arguidos que se mantem é pela autoria de um crime de Falsidade informática p. e p. pelo artigo 3º, n.º 1 da Lei nº 109/2009, de 15 de Setembro.
Taxa de justiça pelo assistente FS, nos termos da al. b) do nº1 do art. 515º do CPP, que se fixa em 3 UC - cfr art 8º nº5 do Regulamento das Custas Processuais (RCP) aprovado pelo citado Dec. lei 34/2008, conjugado com a tabela III a que se refere este último preceito.

Évora, 19 de maio de 2015

António João Latas

Carlos Jorge Berguete

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[1] Disponível em www.dgsi.pt.
[2] Vd sobre a insanabilidade da omissão do texto da motivação (limite absoluto ao aperfeiçoamento), entre outros, também o Ac STJ de 15.12.2005 (relator Simas Santos), acesível em www.dgsi.pt e o Ac TC nº 140/2004 (relator Paulo Mota Pinto), acessível em tribunalconstitucional.pt