Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2218/21.3T8PTM.E1
Relator: MARIA JOÃO SOUSA E FARO
Descritores: NULIDADE PROCESSUAL
NULIDADE DA SENTENÇA
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
Data do Acordão: 01/25/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
1. Constatando-se que as condutas omissivas de ambos os Réus, do condomínio e do titular doutra fracção autónoma, foram determinantes para a ocorrência dos danos na fracção dos Autores , não faz sentido que apenas um possa ser obrigado ao pagamento de uma indemnização.
2. Conquanto a violação de uma obrigação em sentido técnico, como é o caso da propter rem, no âmbito de uma relação obrigacional preexistente, se enquadre no regime da responsabilidade obrigacional ou contratual por oposição à delitual ou extra-contratual , o certo é que ambos os Réus concorreram na lesão da fracção dos Autores, devendo por isso ser igualmente (co) responsáveis, em regime de solidariedade, pela sua reparação de acordo com o disposto no art.º 490º e no art.º 497º ambos do Cód. Civil.
(Sumário elaborado pela relatora)
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
I.RELATÓRIO
1.AA, e BB, vieram em 28/09/2021 propor contra Condomínio do Prédio constituído em regime de propriedade horizontal, denominado Edifício ..., representado por A..., Lda. e contra B..., SA, acção declarativa sob a forma de processo comum na qual peticionaram a condenação “solidária” dos Réus:
“a) Na reparação da fracção propriedade dos Autores,
b) Na reparação da fracção propriedade da segunda Ré, por forma a assegurar a integridade estrutural e o bom estado da fracção dos Autores;
c) A liquidar aos Autores o montante de € 81.250,00 relativos a lucros cessantes dos Autores, bem como nos lucros cessantes que se vierem a apurar desde outubro de 2021 até à efectiva reparação dos danos verificados;
d) A liquidar aos Autores a quantia de € 20.000,00 a título de danos não patrimoniais, fixados na data da entrada em juízo da presente acção;
e) No pagamento dos danos não patrimoniais que se vierem a apurar em liquidação de sentença relativos ao período entre a data da propositura da presente acção e a eliminação de todos os danos na fracção;
f) No pagamento de juros de mora à taxa legal sobre os montantes descriminados e os que se vierem a apurar em liquidação de sentença.”.
Alegaram, para tanto e em síntese, serem proprietários e legítimos possuidores, em comum e sem determinação de parte ou direito, da fracção autónoma designada pelas letras ... – loja ...4, no Edifício ..., prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, que a administração do condomínio do Edifício ... é feita pela sociedade de administração de condomínios A..., Lda, aqui primeira ré, a qual, perante o estado de degradação e insalubridade do complexo comercial, foi intimada pela Autoridade de Saúde ACES ... a dar conhecimento aos proprietários no sentido de procederem à limpeza dos espaços e ao encerramento das lojas ainda abertas no dito complexo comercial. Nessa sequência, esta endereçou, em 6 de Fevereiro de 2018, uma missiva a todos os condóminos informando-os da notificação da autoridade de saúde e a instá-los para que tomassem com urgência todas as medidas necessárias.
Apesar disso, nada foi feito, mantendo-se a situação, que sofreu agravamentos, até à presente data, apesar das interpelações dos autores junto da 1ª Ré para que procedesse às obras necessárias na sua fracção já que é na mesma que reside a causa de todos os danos e patologias que descrevem na sua fracção.
Julgada a causa, foi proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência decido:
1. Absolver os Réus do pedido de pagamento do montante de 81.250,00 euros relativos a lucros cessantes dos Autores, bem como nos lucros cessantes que se vierem a apurar desde outubro de 2021 até à efectiva reparação dos danos verificados.
2. Absolver os Réus do pedido de pagamento do montante de 20.000,00 euros relativos a danos não patrimoniais, correspondendo a 5.000 euros por cada ano pela privação do uso.
3. Condenar o Réu condomínio na realização das obras necessárias no terraço de cobertura, zona comercial e garagens, incluindo na fracção dos Autores, no prazo de 90 dias, sendo tais despesas da responsabilidade de todos os condóminos na proporção das respectivas quotas.
4. Condenar a Ré B... na realização das obras necessárias na sua fração ..., circunscritas à zona da loja, bar, piscina, ténis, cozinha e duas arrecadações, no prazo de 90 dias.
5. Condenar o Réu condomínio e a Ré B... a indemnizar os Autores pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que vierem a sofrer em virtude do incumprimento do referido em 3 e 4, acrescido de juros legais até integral e efetivo pagamento, a apurar em liquidação de sentença e na proporção das respetivas quotas.”.”.
2. É desta sentença que recorre o Réu Condomínio, formulando, na sua apelação, as seguintes conclusões:
1. O tribunal a quo condenou o Recorrente nos termos do dispositivo que consta da sentença recorrida e cujo teor se dá por reproduzido.
2. O Recorrente não se conformando com a decisão proferida vem impugnar a mesma, nos termos infra:
3. Assim o recorrente alegou as seguintes nulidades de sentença:
4. O recorrente na sequência de junção de documentos, em 23.9.2022, pela R B..., requereu tempestivamente, articulado superveniente nos autos, contendo um conjunto de elementos de facto e direito.
5. Porém, nem no dia 24.10.2022, em audiência de discussão e julgamento, nem sequer em sede de sentença, o tribunal a quo, se pronunciou sobre o teor do articulado superveniente junto pelo Recorrente.
6. Porém, nos termos do disposto no art. 608º nº 2 do CPC, é determinado que o Juiz “deve” resolver todas as questões que as partes hajam submetido à sua apreciação.,
7. Sendo que, in casu, não foi pelo tribunal a quo tomada qualquer decisão no sentido de ser deferido ou rejeitado o articulado superveniente, bem como, sobre o teor e factos no mesmo constantes;
8. Entendendo o Recorrente que naquele são alegadas situações de facto que podem motivar a responsabilidade civil do recorrente em sentido diverso daquele proferido na decisão recorrida e que, cremos, de todo, o tribunal a quo não teve em consideração, nem sequer foi considerada em posição dada a factos decididos na sentença.
9. Motivos pelo quais, entende-se, padecer a sentença recorrida de vicio de nulidade, ao abrigo do disposto no art. 615º, nº 1, al. d) do CPC, por omissão de pronúncia sobre pretensão – articulado superveniente - aduzida nos autos pelo Recorrente.
Ademais,
10. Entende ainda o Recorrente que o tribunal a quo violou o art. 615º nº 1, al. e) do CPC, porquanto, considerando os pedidos dos AA, aqueles peticionaram as obras de reparação da sua fração e cumulativamente, que as RR fossem condenadas a realizar as obras devidas na fração (...) propriedade da 2º R (B...), por forma a assegurar a integridade estrutural e o bom funcionamento da fração dos AA.
11. No entanto, o Tribunal a quo, não obstante os específicos pedidos dos AA, condenou o Recorrente a realizar obras naquilo que invoca ser um terraço de cobertura (parte comum do edifício), numa zona comercial, mas que não identifica adequadamente a que se refere e em que medida, e garagens sem sabermos a quais se refere, dado que, no prédio existem várias.
12. Ademais, sem prescindir, em momento algum nos pedidos dos AA há qualquer pedido destes com vista a serem realizadas obras em quaisquer das partes comuns a que
alude a condenação proferida pelo Tribunal a quo, mormente, de reparação na zona comercial e/ou garagem.
13. Ademais, nem sequer se consegue vislumbrar na causa de pedir qualquer relação com a zona comercial e de garagens e os pedidos dos AA, que até são danos numa extensão em pisos inferiores sem origem nos danos que influenciam a fração dos AA.
14. Ou seja, em momento algum os AA peticionaram a reparação das partes comuns visadas na sentença, ou seja, terraços de cobertura, seja a reparação da zona comercial e muito menos a reparação de garagens.
15. Portanto, a decisão que condenou o Recorrente na reparação da zona comercial (sem sequer se saber em que medida) e garagem (não se sabendo qual delas) é totalmente distinto/diverso do pedido dos AA, detendo, por si só, tal condenação, um objeto totalmente diverso daquele que é o pedido daqueles na reparação de uma fração ... pertencente à segunda R B..., por se tratar da cobertura do piso inferior.
Assim sendo, Venerandos Julgadores,
16. O tribunal a quo, com tal dispositivo condenatório, violou desde logo o «princípio do dispositivo e contraditório» contido no art. 3º nº 1 e 3 do CPC, bem como, os limites da condenação previstos no art. 609º nº 1 do CPC, e que estabelecem que a sentença não pode condenar em quantidade superior ou objeto diverso do que for pedido.
17. E, portanto, padece de vicio de nulidade a condenação do Recorrente na reparação de terraço(s), zona comercial e garagem.
18. Entende ainda o recorrente que o tribunal a quo violou ainda o art. 615º nº 1, al. c) do CPC, porquanto, em sentença, foi o Recorrente condenado a proceder, de per si, à realização das obras necessárias à reparação da fração dos AA.
19. Porém, conforme decorre da fundamentação da sentença recorrida e dos factos
provados nesta nºs 18º, 41º, 45º a 47º que a causa dos danos e patologias associadas referidas de 30 a 40 está no piso superior, fração ... e terraço de cobertura.
20. Os factos provados acima mencionados e a fundamentação factual e jurídica da sentença recorrida, são transversais a apontar a origem dos danos para parte privada –... - e parte comum – Terraço de Cobertura -.
21. Assim, sendo, tendo o tribunal a quo decidido que a origem e causa dos danos,
que a fração ... detém provenientes da fração ... e do dito terraço de cobertura, sem destrinçar maior ou menor grau de responsabilidade, então, de todo não se entende como somente foi o Recorrente condenado exclusivamente ao pagamento dos danos, excluindo o tribunal a quo da necessária responsabilidade e participação da ... no pagamento dos mesmos.
22. Tanto que, prevê o art. 497º nº 1 do CC que se forem várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade, sendo que, o nº 2 estatui ainda que presumem -se iguais as culpas.
23. Logo, sentido algum faz o tribunal a quo considerar na sua fundamentação jurídica que a culpa dos danos que a fração dos AA detém tem origem na fração ... e no terraço de cobertura, mas que somente o Recorrente é o responsável pelo prejuízo indemnizatório.
24. Posto isto, cremos, são os fundamentos constantes na sentença contraditórios com a decisão impugnada, por estarem assentes numa culpa repartida dos RR, tendo somente um destes sido condenado na reparação da fração ..., in casu, o Recorrente.
Motivos pelos quais, se entende, que a sentença padece de vicío de nulidade, por afrontar o disposto no art. 615º nº 1, al. c) do CPC.
25. Impugnou ainda o Recorrente a matéria de facto, nos termos em que ora se conclui: Entende, pois, o recorrente que se encontram incorretamente julgados pelo tribunal a quo, os seguintes pontos da matéria de facto, assente como provada na sentença recorrida, que de seguida se identificam: Os factos provados nºs 41, 45 e 54.
26. O recorrente, entende, pois que, a prova que fundamenta e impõe decisão diversa daquela proferida pelo tribunal são as seguintes: As plantas (desenhos) que constituem prova documental nos autos; o relatório pericial; a escritura de propriedade horizontal; a caderneta predial da fração ... e o registo predial da fração ... (documentos indicados como prova na fundamentação da sentença).
27. No entender do Recorrente deve ser proferida a seguinte decisão sobre as questões de facto impugnadas;
28. Entende o Recorrente que o tribunal a quo mal andou na decisão dos factos impugnados, porquanto, em nosso modesto entender, entendeu que a causa e origem dos danos alegados pelos AA são devidos, em sede de responsabilidade, tanto pela fração ... como pelo terraço de cobertura na mesma área comum.
29. Porém, não existe demonstrada a existência de qualquer terraço de cobertura na área lesante em questão, tratando-se tal área em questão de uma fração autónoma – ... - pertencente à R B....
30. Tanto que, em momento algum conseguiu o Tribunal a quo localizar especificadamente o que entendeu por terraço de cobertura.
Com efeito,
31. O recorrente entende, que, a área lesante em questão nos autos refere-se à zona que consta do relatório pericial e que o tribunal a quo considerou na sua integra.
32. Ou seja, a zona ou “espaço” no piso 1 que provoca danos para os pisos inferiores.
33. Por requerimento de 19.1.2022, como doc. 1 a 3 de tal requerimento (plantas), aceites pelo tribunal na formulação e convicção formada na sentença recorrida, para formulação da decisão a quo, temos que o doc. Nº 1 trata-se da planta de implantação da fração ... obtida junto da edilidade competente aquando do projeto de construção do edifício (para que não restem dúvidas, a planta de implantação da fração ... é idêntica aquela que serviu de base ao relatório pericial e que foi junta em fotograma pelo perito);
Venerandos Julgadores,
34. Analisada tal planta cremos é, pois, de concluir que a fração autónoma designada pela letra ... no prédio em escopo detém de “implantação”, ou seja, a área corresponde na íntegra aquilo que é a «cobertura» da invocada zona comercial, constante no piso 0 do prédio em escopo;
35. Ou seja, a destrinça entre fração ... e terraço de cobertura, na verdade não existe, enquanto terraço, porquanto;
36. Na realidade, conforme pode ser comprovado pela planta de implantação da fração ..., retirada do projeto de construção do edifício junto da Câmara Municipal ..., reiterada no seu conteúdo pelo relatório pericial, é que toda a área que serve de cobertura (com exceção àquela zona comum – escadas – de 17 m2) corresponde em oda a sua extensão à propriedade privada da R B..., SA.;
37. E, vejamos mais, ainda, que se atentarmos na dita planta e nos demais desenhos constantes nos autos temos desde logo que, outra coisa não podia ser: Tanto que, atenta a área em apreço, localiza-se numa extremidade os courts de ténis, ao meio detemos a zona de piscina, ao lado esquerdo a área de esplanada e bar e ao fundo as arrecadações, sendo uma destinada a arrecadação de bar e outra arrecadação de piscina.
38. Logo encontra-se, totalmente delineada pela planta a respetiva área de implantação e sem qualquer relevo ou assinalar de terraço, facto que, se retira igualmente da escritura de propriedade horizontal, certidão de registo predial e caderneta matricial da fração ..., em que, em momento algum é identificado terraço como parte integrante. Remetemos ainda para o fotograma da planta que consta das alegações de recurso e cujo teor se reproduz.
39. Facto é que, até houve o cuidado de, no projeto do edifício em apreço, se ter colocado um acesso e identificar como “parte comum”, mas com uma área sem relevo
para a questão, conforme decorre do relatório pericial. Reiterando-se que, no mais, é fácil verificar que, toda aquela área está devidamente identificada como se tratando da fração ...!!!
40. Sendo ainda que, ainda se pode verificar nos documentos (plantas) que a “piscina” desce, pela sua profundidade, até ao piso 0, ou seja, o respetivo piso inferior, doc. Nº 2 (Requerimento de 19.2.2022).
41. Como resulta provado no facto nº 55 da sentença recorrida, a fração ... no Edifício ..., em ..., é composta por bar, piscina, ténis, cozinha, com duas arrecadações, no piso ....
42. Mas, curiosamente, no entender do Tribunal a quo, a fração ..., somente é composta em singelo por bar, piscina, ténis, cozinha, com duas arrecadações;
43. Sendo que, para o tribunal a quo, não haverá a respetiva zona de passagem para as diferentes áreas, quiçá os utilizadores “voam” para piscina, entretanto voam para o bar, e do bar para o ténis e por aí em diante???!!!
44. Aliás, o próprio perito quando lhe foi pedido para delimitar a área da fração ... respondeu o seguinte:
45. Ora, atendendo à estrutura construtiva da área em questão, visível nos vários fotogramas constantes nos autos, o próprio “perito” entendeu no seu relatório pericial que existia um terraço de uso exclusivo (traduzido naquela área plana que liga os demais elementos construtivos), mas em tudo pertencente e integrado na fracção ....
46. Porém, a interpretação jurídica sempre assistirá às partes e, a final, ao tribunal que é o aplicador da lei!!!
47. Esse terraço de uso exclusivo não existe documentalmente retratado, pois, trata-se em concreto, da zona de passagem entre os vários itens da área pertencente e integrante da fricção ....
48. Vejamos, como aliás consta da escritura de propriedade horizontal, da caderneta predial e do registo predial, referentes à fração ..., em momento algum a mesma detém a utilização de um terraço de uso exclusivo associado ou integrado ou em regime de utilização algum.
49. Porém, resulta da implantação da fração ... que toda a área que serve de cobertura à dita zona comercial e melhor identificada no relatório pericial é correspondente à fração ... da Ré B....
50. Ademais, o tribunal a quo na decisão em apreço escuda-se ainda na caderneta predial da fração ..., para determinar a área, no entanto, esta que pode ser alterada em vários fatores da sua vida, tem que ser dirimida em conformidade com o art. 12º do CIMI que estabelece que:“1 -As matrizes prediais são registos de que constam, designadamente, a caracterização dos prédios, a localização e o seu valor patrimonial tributário, a identidade dos proprietários e, sendo caso disso, dos usufrutuários e superficiários. 2 - Existem duas matrizes, uma para a propriedade rústica e outra para a propriedade urbana. 3 - Cada andar ou parte de prédio suscetível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respetivo valor patrimonial tributário. 4 - As matrizes são atualizadas anualmente com referência a 31 de Dezembro.5 - As inscrições matriciais só para efeitos tributários constituem presunção de propriedade.”
51. Entende o Recorrente que, relativamente aos pontos da matéria de facto impugnada, donde consta a menção a terraço de cobertura deve ser removido dos factos provados, passando somente a constar fração ... como área lesante e removido qualquer terraço da zona em apreço.
52. O Recorrente impugnou, também a matéria de direito, nos termos que infra conclui:
Vejamos, Venerandos Julgadores,
53. Considerando-se procedente a impugnação da matéria de facto, mormente, que a área lesante nos autos corresponde integralmente à fracção ..., temos então que, o Tribunal a quo, com a sua decisão final, violou o disposto no art. 493º nº 1 do CC, porquanto, quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar (…) responde pelos danos que a coisa (…) causar (…).
54. Ora, in casu, o tribunal a quo condenou o Recorrente no pagamento da indemnização que for devida pelas obras a realizar na fração ..., pertencente aos AA e ainda em proceder a obras em variadas partes comuns.
55. Assim sendo, entende o recorrente que, conforme resulta do relatório pericial, os danos na fração ... e nos pisos inferiores resultam das infiltrações que ocorrem do piso da fração ..., por falta do necessário isolamento e manutenção!!!
56. Havendo, assim, uma presunção legal de culpa de que o proprietário da fração ... responde pelos danos causados, alegados e demonstrados pelos AA.
57. Sendo que, por tal motivo, deve, pois, o recorrente ser absolvido integralmente do dispositivo/sentença em que foi condenado nos autos, por violação do disposto no art. 493º nº 1 do CC.
58. Ademais, o tribunal a quo violou também o disposto no art. 497º nº 1 e 2 do CC, porquanto, foi o Recorrente condenado a proceder, de per si, à realização das obras necessárias à reparação da fração dos AA; Bem como a realizar obras na zona comercial e garagens.
59. Posto isto, considerando o teor da fundamentação de facto proferida pelo tribunal a quo, bem como, os factos provados na sentença recorrida nºs 18, 41º, 45º a 47º, temos que, os danos que a fração ..., pertencente aos AA padece, provém, integralmente da fração ... e da zona que o tribunal a quo classifica como sendo terraço de cobertura, ou seja, reitera-se, pelo menos, os danos ocorridos na fração ... terão pois origem seja tanto no terraço de cobertura seja na fração ..., fruto da falta de isolamento do piso que provoca infiltrações para a zona inferior, mormente, o imóvel pertença dos AA (factos provados e relatório pericial).
60. Logo, os factos provados acima mencionados e a fundamentação factual e jurídica da sentença recorrida, são transversais a apontar a origem dos danos para parte privada – ... - e parte comum – Terraço de Cobertura -, sem destrinçar maior ou menor grau de responsabilidade, relativamente às RR;
61. Prevendo o art. 497º nº 1 do CC que se forem várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade, sendo que, o nº 2 estatui ainda que se presumem iguais as culpas, quando não haja sido realizado o apuramento e destrinça das respetivas culpas.
62. Posto isto, sentido algum faz o tribunal a quo considerar na sua fundamentação jurídica que a culpa dos danos que a fração dos AA detém tem origem na fração ... e no terraço de cobertura, mas que somente o Recorrente é o responsável pelo prejuízo indemnizatório.
63. Sem prejuízo, sempre se dirá, quanto às respetivas culpas, que, tratando-se o facto ilícito de uma atuação danosa do proprietário da fração ... e do recorrente, então, atento o disposto no art. 493º nº 1 e 497º nº 2 do CC, serão igualmente responsáveis com culpa repartida.
64. Em face do exposto, mal andou o tribunal a quo, a condenar o Recorrente, em exclusivo, no dispositivo ora impugnado, quando, pelo menos, assiste em regime solidário, com culpa repartida, a responsabilidade da R B... e do Recorrente (A propósito veja-se a resposta do Senhor Perito à questão da origem dos danos conforme a imagem infra (quesito nº 3 do relatório pericial));
65. Ademais, entende o recorrente que o tribunal a quo, violou ainda o disposto no art. 564º nº do CC, porquanto, condenou ainda os RR no seguinte: “5. Condenar o Réu condomínio e a Ré B... a indemnizar os Autores pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que vierem a sofrer em virtude do incumprimento do referido em 3 e 4, acrescido de juros legais até integral e efetivo pagamento, a apurar em liquidação de sentença e na proporção das respetivas quotas.”;
66. Trata-se, pois, de indemnização por danos futuros, previsto no art. 564º nº 2 do CC.
67. Ora, Venerandos Julgadores, a condenação pelo tribunal em danos futuros não causa qualquer repulsa, senão pelo seguinte: Não resultam dos factos provados na sentença recorrida quaisquer danos previsíveis ou eventuais que suportem a condenação dos RR em indemnizar os AA por danos futuros.
68. A propósito veja-se o entendimento proferido no D. Aresto do TRP, no proc. nº 248/19.4T8PNF.P1, em que foi relator a Dra. EUGÉNIA CUNHA, datado de 8/9/2020, em www.dgsi.pt ;
69. Por conseguinte, é entendimento do Recorrente, que o tribunal a quo violou o disposto no art. 564º nº 2 do CC, pois condenou os RR a indemnizar os AA no futuro sem quaisquer danos previsíveis ou os futuros eventuais estabelecidos na sentença recorrida.
70. Pelo que tem o Recorrente que ser absolvido deste dispositivo
Nestes termos e nos melhores de Direito, com o D. Suprimento de V. Exas., deve o presente recurso proceder, por provado, e, em consequência:
A) Serem declaradas procedentes as nulidades de sentença invocadas nas conclusões de recurso, cujo teor se dá por reproduzido;
B) Ser alterada a matéria de facto impugnada em conformidade com as conclusões de recurso apresentadas;
C) Ser declarada totalmente procedente a impugnação da matéria de direito invocada nas conclusões de recurso, concluindo-se;
D) Com a absolvição, in totum, do Recorrente quanto aos pedidos e dispositivos contidos na sentença recorrida;
E) Condenar-se os AA em custas.
- Com o que se fará a tão Costumada Justiça!”.
3. Contra-alegou a Ré B... defendendo a improcedência da apelação e a manutenção do decidido.
4. Os Autores interpuseram recurso subordinado mediante o qual pretendem ser indemnizados pela privação do uso da fracção e pelos lucros cessantes.
5. OBJECTO DO RECURSO
Ponderando que o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso - arts. 608º, nº2, 609º, 635º nº4, 639º e 663º nº2, todos do Código de Processo Civil, as questões cuja apreciação aquelas convocam são as seguintes:
4.1. Se ocorre o vício de nulidade da sentença;
4.2. Impugnação da matéria de facto;
4.3. Reapreciação jurídica da causa: da responsabilidade solidária pela reparação da fracção dos Autores, da (i) legalidade da condenação expressa no ponto 5 do dispositivo e se os Autores devem ser indemnizados nos termos peticionados.
II. FUNDAMENTAÇÃO
6. É o seguinte o teor da decisão de facto inserta na sentença recorrida:
A – Com relevância para a decisão da causa, consideram-se demonstrados os seguintes factos:
1. Encontra-se averbada em nome dos Autores pelas AP ...63 de 2017/08/08 e AP...64 de 2017/08/08, respetivamente, a fração autónoma designada pela letra ... – loja ...4, do Edifício ..., sito em Rua ..., ..., Blocos ..., ..., ... e ..., Lugar ..., ..., ..., com o artigo matricial ...97, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...10, constituído em regime de propriedade horizontal, formado por complexo habitacional e comercial.
2. A fração referida em 1, foi adquirida pelos Autores, por sucessão hereditária, no seguimento do falecimento do filho da Autora e tio do Autor, e de doação do quinhão hereditário do pai do falecido em .../.../2017.
3. O filho dos Autores, CC, faleceu a .../.../2017, e só no fim de 2017/2018 é que os Autores perceberam e reportaram ao condomínio os problemas existentes na fração ....
4. O Edifício ... é composto por quatro blocos, designados por A, B, C e D, em forma de ferradura e constituído por 314 frações autónomas.
5. A licença de utilização do edifício data de 31.10.1996.
6. A fração ... está afeta a armazém e atividade industrial, tendo uma área bruta de 306,5 m².
7. Desde o momento em que os Autores passaram a ser donos da fração identificada em 1, tiveram a intenção de lá instalar um supermercado.
8. Contudo, verificaram a existência de danos na fração, que se mantêm até hoje e se têm vindo a agravar de forma contínua, para além do estado de degradação e insalubridade de todo o complexo comercial, o que impede os Autores de desenvolver a atividade que pretendem instalar na fração.
9. A administração do condomínio do Edifício ... é feita pela sociedade de administração de condomínios A..., Lda.
10. A situação descrita em 8, foi denunciada à Autoridade de Saúde ACES ..., o que motivou a deslocação de membros desta entidade ao local em 26 de Janeiro de 2018, tendo constatado que o mesmo se encontrava ao abandono, tinha sinais avançados de degradação e que se encontravam depositados no interior de várias lojas dejetos perigosos para a saúde pública.
11. Na comunicação feita por aquela autoridade de saúde à A...2, refere-se que esta sociedade administradora tinha um mês a contar da notificação dessa comunicação para dar conhecimento aos proprietários no sentido de procederem à limpeza dos espaços e ao encerramento das lojas ainda abertas.
12. A A...2 endereçou, em 6 de Fevereiro de 2018, uma missiva a todos os condóminos informando-os da notificação da autoridade de saúde e a instá-los para que tomassem com urgência todas as medidas necessárias.
13. Apesar do referido em 12, nada foi feito, mantendo-se a situação, que sofreu agravamentos, até à presente data, apesar das solicitações dos Autores junto do condomínio para que procedesse às obras necessárias.
14. O passar dos anos sem que o terraço superior fosse reparado nem tivesse qualquer tipo de manutenção ou cuidado comprometeu a utilização e a segurança da fração dos Autores.
15. A Autora contratou a Senhora Engenheira DD para fazer um levantamento dos danos existentes na sua fração e medidas a propor para reparação dos mesmos.
16. Nesse relatório pericial, apontam-se os seguintes danos na fração ..., decorrentes da existência de humidades por infiltração de água provenientes da laje de cobertura superior: a) A parede junto à porta de entrada tem um escorrimento significativo; b) Humidades acumuladas na laje do teto; c) Teto com humidades bem visíveis e a presença de eflorescências; d) Pavimento com humidade significativa; e) Uma das vigas com presença de humidade e existência de eflorescências; f) Abobadilhas da laje do teto com presença de várias infiltrações bem como eflorescências evidentes; g) Uma viga junto à caixilharia com a presença de humidades; h) O pátio, pertencente à autora, apresenta uma viga danificada devido à presença de humidades, provenientes, mais uma vez, do piso superior; i) O pavimento desse pátio encontra-se muito danificado devido a infiltrações; j) A parede junto à casa-de-banho apresenta infiltrações, assim como a parede do fundo em todo o paramento; k) Existem, ainda, por toda a fração outros danos generalizados típicos do problema em apreço.
17. Em vários pontos da fração existe a presença de fortes eflorescências, assim como queda contínua de água proveniente do teto, o que faz com que a Autora tenha de colocar baldes e recipientes nessas zonas para que a água não se acumule no pavimento, que já se encontra bastante danificado.
18. A causa de todos esses danos e patologias associadas está no piso superior, concretamente no seu sistema de impermeabilização ou inexistência do mesmo, verificando a necessidade de uma rápida intervenção ao nível da impermeabilização do pavimento superior e a correção das pendentes e sistemas de drenagem pluvial existentes, de modo a assegurar a adequada salubridade dos espaços localizados abaixo dessa laje, cuja degradação se evidencia de dia para dia, assim como o interior de toda a fração.
19. A zona comercial onde se insere a fração dos Autores se encontra em situações degradadas, de falta de cuidado e manutenção, resultante do descuido da administração.
20. Os corredores encontram-se sujos, cheios de excrementos, humidade e lixo, as paredes demonstram decadência, com fissuras e danos estruturais, que tornam a utilização difícil ou mesmo impossível, dando um mau ambiente e aspeto de abandono e desleixo em todo o bloco.
21. Nessa zona encontram-se pertences e velharias ali depositadas por um sem abrigo, contribuindo para o lixo, desleixo e putrefação que se verificam.
22. A administração tem-se mostrado incapaz de resolver este problema, desconhecendo quem permite e autoriza a permanência daquele indivíduo e dos seus pertences no local.
23. No dia 18.05.2019 foi realizada Assembleia de condomínio, que deu origem à Ata ...4, constando no ponto 7, como ordem de trabalhos “(…) 7. Análise, discussão e deliberação sobre medidas a tomar relativamente a fracção ... – “Piscina/Court Ténis” devido às infiltrações provocadas para os pisos inferiores (…)”, tendo sido decidido quanto a este ponto “(…) O edifício está na eminência de entrar em colapso, ou seja, a garagem iniciou um processo de colapso, estando já interdita a sua utilização. (…) Foi apresentada uma proposta para um orçamento estrutural para a garagem incluindo as fundações, a ser pago numa única prestação, no valor total de: 14.513,91 euros. Colocada à votação, foi aprovada por maioria com um voto contra do apartamento ...16.(…)”
24. Foi agendada uma reunião entre os Autores e o representante legal da administração do condomínio para o dia 28 de Fevereiro de 2020.
25. Nessa reunião, os Autores expuseram novamente toda a situação ao condomínio que rejeitou a sua responsabilidade, pois os danos têm origem na fração superior à sua, pugnando pela necessidade de realização de uma assembleia de condóminos extraordinária, em cuja ordem de trabalhos constasse como ponto de discussão a situação da fração ..., nomeadamente os danos nela existentes e os custos da reparação dos mesmos.
26. Encontra-se averbada pela AP. ...36 de 2011/12/28 a aquisição da fração ... pela B..., SA.
27. Os Autores, no dia 26 de Novembro de 2020, dirigiram à B... carta registada com aviso de receção, explanando toda a situação existente na sua fração, bem como a posição assumida pelo condomínio.
28. A Autora obteve resposta da Ré B... no dia 26 de Fevereiro de 2021, na qual esta refere que a fração ... serve de cobertura em forma de terraço à área comercial, sendo por isso parte comum do prédio, refutando qualquer responsabilidade.
29. Os Autores voltaram a enviar comunicação ao Réu condomínio exigindo o agendamento de uma Assembleia de Condóminos em que o assunto dos danos na sua fração fosse abordado, sem obtenção de qualquer resposta.
30. A fração ... encontra-se no estado de insalubridade e sem condições de funcionamento com os índices de conforto e uso adequados ao fim a que se destina.
31. Na fração dos Autores, identificada em 1, verificam os seguintes danos decorrentes da existência de humidades por infiltração da água proveniente da laje de cobertura superior.
32. A parede junto à porta de entrada tem um escorrimento significativo - a parede junto à porta de entrada coincide com a prumada da parede lateral da piscina. É visível, apesar do tempo seco, os indícios de corrimentos na referida parede.
33. Existem humidades acumuladas na laje do teto, sendo o teto composto por laje fungiforme e em toda a sua extensão apresenta indícios de infiltrações e humidades.
34. Teto com humidades bem visíveis e a presença de eflorescências.
35. Parte substancial do pavimento apresenta sinais e marcas de escorrências provindas da laje do teto.
36. As vigas perpendiculares à parede da piscina sita no piso superior, apresentam sinais evidentes de humidades provindas do terraço da bordadura da própria piscina.
37. Existem abobadilhas da laje do teto com presença de várias infiltrações bem como eflorescências evidentes.
38. O pátio, pertencente aos Autores apresenta uma viga danificada devido à presença de humidades, provenientes, do piso superior, apresenta-se num estado de desligamento ou partida necessitando de uma melhor análise via processo destrutivo, a fim de ser estudado a sua eventual reparação.
39. O pavimento do pátio dos Autores encontra-se muito danificado devido a infiltrações, faltando algumas extensões de rodapé e em grande parte apresenta-se marcado pela queda livre das águas pluviais e oriundas dos tubos de queda, pelo decorrer do tempo e pela falta de manutenção.
40. Na fração dos Autores, identificada em 1, verificam-se outros danos generalizados, nomeadamente, a fragilização por corrosão da esteira para suporte dos cabos elétricos, das armaduras inferior e superior da laje fungiforme, vigas circundantes fissuradas ou eventualmente partidas, tubos de queda sem guia ou destino encaminhado e cogumelos da laje fungiforme furados ou corroídos.
41. A causa dos danos e patologias associadas referidas de 30 a 40 está no piso superior, fração ... e terraço de cobertura.
42. A fração ... sempre foi utilizada em exclusivo pela Ré B....
43. A descrição da Matriz Predial Urbana define a fração ... como loja ...5 —composta por Bar, Piscina, 2 arrecadações e ténis, com uma área bruta privativa de 482 m2 e uma permilagem de 1,3000.
44. Na constituição da propriedade horizontal a fração ... possui uma permilagem de 69,367.
45. O estado geral de toda a fração designada como ... e terraço de cobertura encontram-se num estado catastrófico, ao abandono, e a inexistência de isolamento ou o seu deficiente estado, estão na origem das infiltrações e danos causados no piso inferior, estando tudo degradado ao nível da zona comercial e garagens, pelo menos desde 2012, verificando-se ainda problemas ao nível estrutural que se verificam desde a construção tendo sido agravado pela falta de manutenção, existindo assim problemas estruturais e problemas de impermeabilização, pois há problemas estruturais nas vigas de bordadura da piscina e problemas de isolamento gerais ao nível da fração ... e terraço de cobertura que vai contaminar o piso inferior, existindo fissuras na piscina e no terraço de cobertura, assim como vegetação que indicia a existência de água, assim como existem problemas estruturais ao nível do teto, vigas e pilares da zona comercial e garagens bem visíveis que foram evidenciados pelas infiltrações provenientes do terraço de cobertura, existindo esses problemas desde sempre, mas agravaram-se com o abandono da fração ... e terraço de cobertura.
46. A piscina está completamente inoperante e fissurada em vários pontos.
47. Existem buracos na parede vertical da piscina e desconhece-se a sua verdadeira situação uma vez que as patologias são muitas.
48. Desconhece-se a verdadeira fixação dos candeeiros na área do pátio.
49. Também os sumidouros não oferecem uma leitura da sua funcionalidade e das ligações ao escoamento parcial ou total das águas pluviais.
50. A causa dos danos verificados na fração ... provem da cobertura do teto de toda a zona comercial a nível do rés-do-chão.
51. A solução do problema implica: 1. Levantamento de todo o revestimento acima da laje, incluindo a retirada de todos os candeeiros; 2. Remover todo o revestimento da piscina; 3. Verificar todo o sistema de captação e escoamento das águas pluviais do pátio; 4. Retirada de todo o equipamento da piscina; 5. Verificação do estado de todo equipamento da piscina, filtros, bombas, skimmers e sistema de adição e esgoto das águas da piscina, incluindo acessórios complementares; 6. Análise e verificação do estado estrutural da laje fungiforme e da área maciça periférica aos pilares, face às evidências verificadas ao nível do piso inferior; 7. Só depois de analisada e reparada a situação estrutural, deverá ser recolocado todo o equipamento da piscina e reposto todo o sistema de captação e escoamento das águas da piscina. 8. Verificação de todas as juntas de dilatação e eventual correção ou reparação; 9. Criação de bases amaciçadas para receber os candeeiros de iluminação do terraço (para maior economia poderão ser alimentados por energia solar); 10. Corrigir toda a laje com betonilha auto-nivelaste; 11. Impermeabilização com tela dupla cruzada e bem rematada nos pontos terminais; 12. Colocação e distribuição de uma betonilha pobre constituída com cimento e misturada com areia muito fina nas proporções 1/10 sobre a tela; 13. Aplicação da betonilha de cobertura e para revestimento final com tijoleira; 14. Acabamento da piscina com revestimento a ervinel ou outro qualquer revestimento final. 15. Assegurado o isolamento no piso superior, as intervenções na loja ...4- fração ..., serão constituídas pela reparação das vigas e laje fungiforme, incluindo a decapagem e tratamento das armações em aço nervurado e correspondente revestimento com argamassas apropriadas; 16. Revisão de todo o traçado de esgotos provenientes do piso superior e correspondente ligação às caixas de esgotos no rés-do-chão; 17. Revisão de todo o traçado de escoamento das águas pluviais e ligação às caixas localizadas no piso inferior; 18. Substituição das esteiras e armaduras de eletricidade; 19. Reparação de todas as paredes verticais e revestimento final com tinta plástica água; 20. Reparação de todo pavimento e uniformização do revestimento final.
52. Por cima do piso dos Autores, existe uma pequena área coberta com a designação de zona comum com uma área de cerca de 17,50 m2.
53. As frações habitacionais possuem varandas cuja água escoa diretamente para a fração ... e terraço de cobertura.
54. Caso os proprietários tivessem feito obras no edifício assim que os problemas derivados das infiltrações começaram a surgir na fração ... e terraço de cobertura, zona comercial e garagens não estariam no estado de degradação em que se encontram.
55. Na escritura de constituição da propriedade horizontal, documento complementar, consta a seguinte composição da fração ...(…) ... – LOJA (Bar/Piscina/Ténis/Cozinha) NÚMERO CINQUENTA E CINCO NO PISO UM; com duas arrecadações.”
B - Factos não provados
Com relevância para a decisão da causa não resultou demonstrado:
1) Quais os lucros que os Autores deixaram de auferir pelo facto da sua fração ..., possuir infiltrações e más condições de salubridade, nomeadamente: Mês Custos Fixos Compras Vendas Lucro: Janeiro 200,00 € 7 500,00 € 9 000,00 € 1 300,00 €; Fevereiro 200,00 € 7 000,00 € 8 500,00 € 1 300,00 €; Março 200,00 € 8 000,00 € 9 000,00 € 800,00 €; Abril 250,00 € 9 000,00 € 11 000,00 € 1 750,00 €; Maio 250,00 € 10 000,00 € 11 000,00 € 750,00 €; Junho 225,00 € 11 000,00 € 13 000,00 € 1 775,00 €; Julho 225,00 € 11 000,00 € 15 000,00 € 3 775,00 €; Agosto 300,00 € 12 000,00 € 16 000,00 € 3 700,00 €; Setembro 250,00 € 11 000,00 € 14 000,00 € 2 750,00 €; Outubro 200,00 € 9 000,00 € 11 000,00 € 1 800,00 €; Novembro 200,00 € 8 500,00 € 10 000,00 € 1 300,00 € Dezembro 200,00 € 10 000,00 € 11 500,00 € 1 300,00 € - Total 2 700,00 € 114 000,00 € 139 000,00 € 22 300,00 € - Ano 2019, Mês Custos Fixos Compras Vendas Lucro: Janeiro 200,00 € 9 750,00 € 11 000,00 € 1 050,00 €; Fevereiro 200,00 € 9 000,00 € 12 000,00 € 2 800,00 €; Março 200,00 € 11 000,00 € 14 000,00 € 2 800,00 €; Abril 250,00 € 15 000,00 € 17 000,00 € 1 750,00 €; Maio 250,00 € 14 000,00 € 16 000,00 € 1 750,00 €; Junho 225,00 € 16000,00 € 17 000,00 € 775,00 €; Julho 225,00 € 15 000,00 € 20 000,00 € 4 775,00 €; Agosto 300,00 € 16 000,00 € 21 000,00 € 4 700,00 €; Setembro 250,00 € 17 000,00 € 19 000,00 € 1 750,00 €; Outubro 200,00 € 14 000,00 € 18 000,00 € 3 800,00 €; Novembro 200,00 € 15 000,00 € 16 000,00 € 800,00 €; Dezembro 200,00 € 15 000,00 € 17 500,00 € 2 300,00 € - Total 2 700,00 € 166 750,00 € 198 500,00 € 29 050,00 € - Ano 2020.
2) Que a fração ... pode funcionar como supermercado.
3) Que valor terão os Autores que suportar para reparar os danos que se verificam na sua fração e com as obras enumeradas em 51 dos factos provados, pontos 15, 16, 17, 18, 19 e 20.
4) Que desde a data da emissão da licença de utilização, a 31.10.1996, foram efetuadas algumas obras no edifício para resolver os problemas existentes e de forma a evitar a continuação da degradação dos espaços.
5) Que os proprietários das frações acionaram a garantia da obra.
6) Qual a data, em concreto, em que se começaram a verificar os problemas derivados dos problemas de estrutura e falta de impermeabilização.
7) Que existe regulamento do condomínio.
8) Que os Autores sofreram revolta, angústia e frustração devido ao estado de degradação em que a sua fração se encontra.
7. Do mérito do recurso
7.1. Da nulidade da sentença.
São vários os vícios que o apelante suscita, todos tendentes a ver declarada a nulidade da sentença recorrida.
a) O primeiro deles reporta-se à omissão de pronúncia acerca do articulado superveniente por si apresentado em 3.10.2022.

Vejamos.
Deduzido articulado superveniente, “o juiz profere despacho liminar sobre a admissão do articulado superveniente, rejeitando-o quando, por culpa da parte, for apresentado fora de tempo, ou quando for manifesto que os factos não interessam à boa decisão da causa; ou ordenando a notificação da parte contrária para responder em 10 dias, observando-se, quanto à resposta, o disposto no artigo anterior” ( art.º588º, nº4 do CPC).
O articulado em apreço foi apresentado quando a audiência final já se havia iniciado, sendo que a última sessão da mesma teve lugar no dia 24.10.2022.
Dos autos não consta que tal despacho tenha sido efectivamente proferido.
E devia tê-lo sido antes do encerramento da audiência, como se colhe do disposto no art.º 589º do mesmo Código.
Ora, esta omissão, logo aí detectável pelo apelante, carecia de ter sido suscitada junto do Tribunal da 1ª instância.
Na verdade, as nulidades (processuais) têm de ser arguidas no prazo legal junto do tribunal de 1.ª instância onde, a verificarem-se, terão sido cometidas, até para facultar àquele tribunal o seu eventual suprimento, como decorre designadamente do art.199ºdo CPC, excepto na hipótese prevista no n.º 3 deste normativo, que no caso se não verifica.
É para este tipo de situações que se aplica a velha máxima “dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se."
Em terceiro lugar, não tendo a ora recorrente suscitado tempestivamente a ocorrência da nulidade processual e por consequência não tendo o tribunal de 1ª instância chegado a pronunciar-se sobre a mesma, o problema está ultrapassado pois os recursos visam a reapreciação das decisões tomadas na 1ª instância e não o conhecimento de questões novas.

Em suma, como proficientemente se sintetiza no Acórdão do STJ de 8.11.2001 prolatado à luz do CPC de 61 mas que mantém perfeita actualidade:
“I - Não há que confundir "nulidades da sentença" com "nulidades processuais".
II - Aquelas só ocorrerão, como causa invalidante típica, nas diversas hipóteses taxativamente contempladas no n. 1 do art. 668º do CPC, possuindo um regime próprio de arguição plasmado nos arts. 668º, n. 3, 716º e 721º n.3 do mesmo diploma.
III - Já quanto às nulidades processuais propriamente ditas e respectivos regimes, efeitos e prazos de arguição, encontram-se as mesmas elencadas e reguladas nos arts. 193º e ss 201º e ss do mesmo corpo normativo.
IV - O regime de arguição das nulidades processuais principais, típicas ou nominadas vem contemplado nos arts. 193º a 200º a 202º a 204º do CPC, sendo que as nulidades secundárias, atípicas ou inominadas -, genericamente contempladas no nº 1 do art. 201º -, só produzem nulidade quanto a lei expressamente o declare ou quando a irregularidade possa influir no exame e discussão da causa, possuindo o respectivo regime de arguição regulado pelo art. 205º do mesmo diploma.

Portanto, só era de equacionar o conhecimento de tal nulidade nesta fase caso a mesma só se evidenciasse ao apelante através da notificação da sentença, o que como vimos não é o caso.
Termos em que improcede a suscitada nulidade da sentença com tal fundamento.

b) A outra nulidade suscitada conexiona-se com a decisão de condenação na reparação pelo condomínio da zona comercial e garagem que não havia sido peticionada pelos Autores, o que, no entender do recorrente, viola o disposto no art.º 609º, nº1 do CPC.

Parece-nos que neste conspecto assiste razão ao apelante.
Com efeito, na petição os autores referindo que todos os problemas de infiltração existentes no seu imóvel radicam na fracção que constitui o piso superior ( art.º 18) e que a sanação do problema passará pela impermeabilização do pavimento superior e a correcção das pendentes e sistemas de drenagem pluvial existentes , de modo a assegurar a adequada salubridade dos espaços localizados abaixo dessa laje, concluem que “as rés deverão proceder: à reparação dos danos na fracção dos autores que se mostram directamente causados pela falta de manutenção e reparação da fracção que lhe serve de terraço; à reparação de todos os danos verificados na fracção propriedade da segunda ré ( artigo 63º).
E, nessa conformidade, pedem a condenação “solidária” dos Réus :“a) Na reparação da fracção propriedade dos Autores; b) Na reparação da fracção propriedade da segunda Ré, por forma a assegurar a integridade estrutural e o bom estado da fracção dos Autores (…)”.
Depreende-se que pedem a condenação de ambos os Réus na sobreditas reparações porque há dúvidas acerca da titularidade do local (ou locais) onde se situa a exacta origem das infiltrações.
É certo que “quando perante o alegado na petição inicial há dúvidas quanto aos concretos e efectivos pedidos pretendidos pelo Autor ou ao real conteúdo da pretensão, e, recorrendo às regras interpretativas da declaração judicial, se extrai implícita uma outra pretensão petitória não expressamente ali formulada, pode o tribunal levá-la em conta, extraindo os efeitos jurídicos correspondentes, sem dessa forma violar o princípio do pedido.[1]
Porém, não descortinamos no articulado dos autores fundamento para a condenação se alastrar à zona comercial e garagens.
Como também não vemos na sentença qualquer justificação para tal decisão que a nosso ver extravasa o pedido, excedendo-o.
A nulidade por excesso de pronúncia prevista na alínea e) do nº1 do art.º 615º do CPC está directamente relacionada com a regra inserta no nº1 do art.º 609º da qual decorre que a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir.
“Trata-se de uma clara manifestação do princípio dispositivo quanto ao thema decidendum: a decisão deve ter por objeto o mesmo objeto que as partes deduziram– nem mais, nem menos, nem outro”.[2]
Constatada tal nulidade, nada mais resta no caso do que, julgando-a procedente, revogar a sentença na parte em que estendeu a condenação de reparação à zona comercial e garagens.
c) A última nulidade apontada à sentença radica, no entendimento do apelante, na circunstância de os fundamentos invocados deverem conduzir a uma decisão diferente da que a sentença alcança, o que se subsume ao disposto no art.º 615º, nº1, c) do CPC.

A contradição exigida pelo normativo em análise é a contradição lógica entre os fundamentos de facto e o direito: quando aqueles apontam para um determinado sentido e a decisão para outro, oposto.

Trata-se, porém, de uma contradição que ocorre “estritamente no plano lógico da construção da decisão. Coisa diversa é o próprio silogismo estar errado no seu mérito, por conter uma contradição com os factos ou com o Direito: trata-se de erro do julgamento de facto decorrente de o juiz “decid[ir] contrariamente aos factos apurados”(…) ou de o julgamento de direito decorrente de o juiz decidir “contra lei que lhe impõe uma solução jurídica diferente” (…) seja por erro de subsunção dos factos à norma jurídica aplicável, seja por erro na determinação de tal norma ou por erro na sua interpretação. Em ambas as eventualidades não ocorre nulidade do artigo 615.º, n.º 1 al. e), mas, sim, um erro de julgamento da matéria de facto ou matéria de direito, respectivamente”[3].

Temos de convir que não se mostra convenientemente justificada a condenação exclusiva do Réu condomínio na reparação dos danos e patologias existentes na fracção dos Autores cuja causa, conforme a sentença deu como provado ( cfr. ponto 41.) está no piso superior, fração ... ( da B...) e terraço de cobertura ( parte comum).
Porém, tal não é suficiente para se concluir ocorrer um erro de construção no silogismo judiciário pressuposto da nulidade ora arguida que, por esse motivo, se julga improcedente.
7.2. Impugnação da matéria de facto
Insurge-se o apelante contra a resposta dada nos pontos 41(A causa dos danos e patologias associadas referidas de 30 a 40 está no piso superior, fração ... e terraço de cobertura), 45 (O estado geral de toda a fração designada como ... e terraço de cobertura encontram-se num estado catastrófico, ao abandono, e a inexistência de isolamento ou o seu deficiente estado, estão na origem das infiltrações e danos causados no piso inferior, estando tudo degradado ao nível da zona comercial e garagens, pelo menos desde 2012, verificando-se ainda problemas ao nível estrutural que se verificam desde a construção tendo sido agravado pela falta de manutenção, existindo assim problemas estruturais e problemas de impermeabilização, pois há problemas estruturais nas vigas de bordadura da piscina e problemas de isolamento gerais ao nível da fração ... e terraço de cobertura que vai contaminar o piso inferior, existindo fissuras na piscina e no terraço de cobertura, assim como vegetação que indicia a existência de água, assim como existem problemas estruturais ao nível do teto, vigas e pilares da zona comercial e garagens bem visíveis que foram evidenciados pelas infiltrações provenientes do terraço de cobertura, existindo esses problemas desde sempre, mas agravaram-se com o abandono da fração ... e terraço de cobertura) e 54 ( dos “factos provados”.
Considera o apelante que não está demonstrada a existência de qualquer terraço de cobertura na área lesante em questão, tratando-se de uma área pertencente à Ré B..., invocando, em abono do seu entendimento, a planta de implantação da fracção desta ré ( ...) e da qual se serviu o perito no seu relatório pericial.
Vejamos se assim é.
Comecemos pelo relatório pericial ( fls. 113 e segs dos autos).
Nele se afirma perentoriamente que “todas as infiltrações e situações anómalas provém do piso superior”. E que: “A propriedade da fracção ... não se circunscreve à piscina, court de ténis, bar e arrecadação conforme descrição na matriz predial urbana.
Existe uma desconformidade entre as áreas manifestadas em sede de matriz predial e a constituição da propriedade horizontal.
A descrição na matriz predial urbana define a fracção ... como loja ...5 – composta por bar, piscina, 2 arrecadações e ténis, com uma área bruta privativa de 482m2 e uma permilagem de 1.3000.
Na constituição da propriedade horizontal o bar possui uma área de 428m2, a piscina de 192m2, o court de ténis 624m2 e o terraço de uso exclusivo 683,25 m2, totalizando 1927,25m2 e uma permilagem de 69,367.”.
Importa igualmente considerar que a área bruta privativa da fracção dos Autores ascende, de acordo com o relatório pericial, a 306,50 m2 e que a proveniência das infiltrações que a mesma apresenta radica exclusivamente na sua cobertura que, na sua opinião, integra totalmente a fracção ....
Por seu turno, a escritura de constituição da propriedade horizontal ( que se encontra no início do vol. II) faz menção de que foi exibido o processo de obras ...7 que atesta que o prédio se destina a ser sujeito ao regime da propriedade horizontal, sendo que desse projecto consta, dentre outras, a fracção ... como sendo loja ...5 do piso 1 destinada a lazer composto por bar, piscina, cozinha, duas arrecadações, ténis, dois vestiários, e três WC com área coberta de 428m2 , piscina com 192m2, ténis com área de 624,75m2 e um terraço de uso exclusivo de 683,25m2.
No documento complementar elaborado nos termos do nº2 do art.º 78ºdo Cód. Notariado que constitui parte integrante da escritura, a referida fracção é identificada como loja nela se integrando bar, piscina, ténis, cozinha e duas arrecadações.
Pode-se, assim, concluir que a menção que naquele processo de obras é feita a um terraço com a área de 683,25 m2 de uso exclusivo não consta na definição da composição fracção do documento complementar , o que nos permite afirmar que efectivamente que o terraço é um “mais” (uma área adjacente) relativamente aos elementos que integram a fracção em apreço.
Por conseguinte, a pretensão do apelante no sentido de suprimir a menção ao “terraço” não merece provimento, mantendo-se, portanto, na íntegra a resposta dada aos factos em apreço .
7.3. Reapreciação jurídica da causa
7.3.1. No pressuposto de que se manteria incólume a decisão da matéria de facto, entende o apelante que, nesse caso, a responsabilidade pela reparação da fracção dos Autores deve ser solidária (e não exclusiva do condomínio) de acordo com o disposto no art.º 497º, nº1 do Cód. Civil.
Assente que a causa dos danos e patologias que a fracção dos apelados apresenta e que vem descritas nos pontos 30 a 40) está no piso superior, fracção ... ( da Ré C...) e terraço de cobertura, parte comum do prédio, a primeira questão que se coloca é quem é o responsável pela inevitável ( e urgente ) reparação que a situação demanda.
Como já dissemos, não se mostra fundamentada a razão pela qual se decidiu na sentença recorrida atribuí-la exclusivamente ao condomínio sobretudo quando ficou igualmente assente que “o estado geral de toda a fração designada como ... e terraço de cobertura encontram-se num estado catastrófico, ao abandono, e a inexistência de isolamento ou o seu deficiente estado, estão na origem das infiltrações e danos causados no piso inferior” ( ponto 45).
Ora, os condóminos, quanto às suas fracções, estão sujeitos não só às restrições e limitações ao exercício do direito de propriedade, legalmente impostas em termos gerais, mas também às que decorrem da relação de proximidade ou comunhão em que vivem os condóminos, procurando-se salvaguardar interesses de ordem pública, ou seja, interesses públicos e coletivos, relacionados com condições de salubridade e segurança dos edifícios, assim como das condições estéticas, urbanísticas e ambientais[4] - cfr. artº 1422ºnº2 a) do Cód. Civil
E assim sendo, os condóminos estão sujeitos às limitações e às obrigações (reais) que decorram da necessidade de salvaguardar tais interesses.
As obrigações reais são definidas como vínculos jurídicos por virtude dos quais uma pessoa titular de um direito real fica adstrita para com outra à realização de uma determinada prestação.; são obrigações que dimanam do estatuto de um jus in re, que “compreendem os casos em que ao titular de um ‘ius in re’ sejam exigíveis comportamentos de conteúdo positivo (prestações de ‘dare’ ou de ‘facere’) que se integrem numa relação obrigacional; ou comportamentos de abstenção que correspondem a meras restrições ao conteúdo de soberania”[5].
A qualificação da obrigação que recai sobre a B... como dona da fracção ... de, designadamente, proceder à manutenção da sua fracção, como obrigação propter rem que inegavelmente é, tem inúmeras consequências ao nível do seu regime jurídico.
Sujeito passivo da obrigação propter rem só pode ser o titular do domínio, já que como vimos tais obrigações relacionam-se quase sempre com certo conteúdo do domínio, de que constituem na óptica do legislador , como que o lado passivo ou a face negativa .
Por conseguinte, incumprindo tal obrigação fica adstrito a indemnizar o condómino dos danos que este sofreu na sua fracção como consequência directa dessa omissão ilícita e (presumivelmente) culposa – art.º798º e 799º do Cód. Civil.
Mas provou-se igualmente que na origem dos danos e patologias verificados na fracção dos Autores estão também infiltrações provenientes do terraço de cobertura determinadas pelo abandono, i.e. ausência de manutenção, e inexistência de isolamento ou o seu deficiente estado ( cfr. ponto 45).
Ora, no que tange às partes comuns, as obrigações dos condóminos podem reconduzir-se às seguintes categorias: encargos de conservação, uso e fruição, reparações, inovações e encargos fiscais”[6].

O condomínio apresenta-se como um centro de imputação de relações jurídicas autónomas , enquanto portador de uma vontade própria, sujeito de direitos e obrigações relativos às partes comuns.[7]

O telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso de qualquer fracção, são uma parte comum (cfr. artº 1421º, nº 1, al. b), do Código Civil).

Evidenciando-se igualmente uma deficiente impermeabilização do terraço, era mister que o condomínio – através dos seus órgãos - tivesse providenciado, como se lhe impunha, por força da lei (art.º 1430º e art.º 1436º f) do Cód. Civil) por manter e reparar aquela parte comum do edifício.

Tal obrigação do condomínio de manter, conservar e reparar as zonas comuns do edifício é igualmente uma obrigação real ou “propter rem” que tem origem no estatuto da propriedade horizontal.

Por conseguinte, incumprindo o condomínio essa obrigação de conservação e reparação de uma parte comum, fica igualmente adstrito a indemnizar o condómino dos danos que este sofreu na sua fracção em consequência desse inadimplemento.

Constata-se que as condutas omissivas de ambos os Réus foram determinantes para a ocorrência dos danos na fracção dos Autores , pelo que não faz sentido que apenas um possa ser obrigado ao pagamento de uma indemnização.

O apelante entende que deve ser aplicado o disposto no art.º 497º, nº1 do Cód. Civil que assim dispõe, sob a epígrafe, “responsabilidade solidária”: “Se forem várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade”.

Conquanto a violação de uma obrigação em sentido técnico, como é o caso da propter rem, no âmbito de uma relação obrigacional preexistente, se enquadre no regime da responsabilidade obrigacional ou contratual por oposição à delitual ou extra-contratual[8], o certo é que ambos os Réus concorreram na lesão da fracção dos Autores, devendo por isso ser igualmente (co) responsáveis pela sua reparação.

O art.º 490º do Cód. Civil estabelece que sendo vários os autores, instigadores, auxiliares ou encobridores do acto ilícito todos eles respondem pelos danos que hajam causado”; impondo, por isso, a conclusão que ambos os Réus são solidariamente responsáveis perante os Autores ( cfr. artº 497º do Código Civil ).

Assim, procede a pretensão do apelante de ver alastrada à Ré B..., em regime de solidariedade, a obrigação de reparação da fracção dos apelados.
7.3.2 Insurge-se igualmente o apelante contra a condenação expressa no ponto 5 do dispositivo da sentença recorrida ( “Condenar o Réu condomínio e a Ré B... a indemnizar os Autores pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que vierem a sofrer em virtude do incumprimento do referido em 3 e 4, acrescido de juros legais até integral e efetivo pagamento, a apurar em liquidação de sentença e na proporção das respetivas quotas.”) considerando que não se descortina a existência de quaisquer danos futuros susceptíveis de serem ressarcidos.
Mais uma vez com toda a razão.
A indemnização a apurar em liquidação de sentença, ora atribuída, parte do pressuposto de que os Réus irão incumprir as condenações antecedentes (facto incerto e imprevisível).
De acordo com o disposto no nº2 do art.º564 : “ Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior”.
O dano futuro é previsível desde que o homem médio o possa conjecturar. A sua previsão pode, adicionalmente, ser certa, sempre que a sua ocorrência se apresente, no momento em que se forma um juízo sobre o mesmo, infalível, ou eventual sempre que a sua produção, seja possível, previsível.
Não sendo previsível o inadimplemento da obrigação, não pode haver condenação na indemnização pelo dano que dela decorreria.
E, por isso, a condenação constante do ponto 5 do dispositivo não se pode manter.
7.3.3. Por último, cuidaremos de apreciar o recurso subsidiário interposto pelos Autores mediante o qual pretendem ser indemnizados pela privação do uso da fracção.[9]
Ora, percorrendo os pedidos formulados pelos Autores na petição inicial, o certo é que não de vê que tenham formulado pedido indemnizatório atinente à privação do uso da fracção.
Na verdade, os pedidos indemnizatórios dizem respeito a “lucros cessantes” e “danos não patrimoniais” dos Autores.
De todo o modo sempre se diga que para que a privação do uso fosse susceptível de ser indemnizada necessário seria que tivesse sido alegada e provada a frustração de um propósito real, concreto e efectivo de proceder à sua utilização, os termos em que o faria e o que auferiria não fora os danos que lhe haviam sido causados no imóvel.[10]
Ainda que se tivesse provado que desde o momento em que os Autores passaram a ser donos da fracção em causa ( 2017) tiveram a intenção de lá instalar um supermercado, tal não seria só por si suficiente para lhes ser atribuída uma indemnização para privação do uso porquanto naquele momento temporal a fracção já se encontrava danificada ( cfr. ponto 8) e, por consequência, seria inviável o propósito de instalação naquele espaço de um estabelecimento comercial e muito menos de um supermercado, condicionado a um exigente licenciamento.
De todo o modo, repete-se, tal pedido indemnizatório não foi formulado e, por consequência, estava vedado ao Tribunal atribuí-lo em qualquer circunstância: como já dissemos, na sentença, o juiz tem de respeitar o objecto do processo definido pelas partes, não podendo condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pediu (art. 609.º, n.º 1, do CPC), sob pena de nulidade da mesma (art. 665.º, n.º 1, e), do CPC).
Improcede, pois, o recurso subsidiário interposto pelos Autores.

III. DECISÃO
Por todo o exposto, acorda-se em:
A) Julgar procedente a apelação do Réu Condomínio e em consequência:

i) Revoga-se a condenação do Réu Condomínio na realização das obras necessárias na zona comercial e garagens (constante do ponto 3 do dispositivo da sentença);

ii) Revoga-se a condenação exclusiva (constante do ponto 3 do dispositivo da sentença) do Réu condomínio a realizar as obras necessárias na fracção dos Autores e, em substituição, condenam-se ambos os Réus (Condomínio e B...), solidariamente, a realizar tais obras no prazo de 90 dias.

iii) Revoga-se a condenação expressa no ponto 5 do dispositivo da sentença recorrida.

iv) Mantêm-se o demais decidido.

B) Julgar improcedente o recurso subsidiário dos Autores.

Custas do recurso principal pelos autores e Ré B... na proporção de 2/3 e 1/3 respectivamente.

Custas do recurso subordinado pelos autores.

Évora, 25 de Janeiro de 2024

Maria João Sousa e Faro (relatora)

Ana Isabel Pessoa

Maria Amélia Ameixoeira

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[1] Assim, Ac.STJ de 29.9.2022 ( Fernando Batista)

[2] In “Os meios reclamatórios comuns da decisão civil (artigos 613.º a 617.º CPC)” de Rui Pinto, na Revista Julgar online, Maio 2020.

[3] Idem , Rui Pinto.

[4] Cfr. Ac. do STJ de 29.11.2022 ( .

[5] Manuel Henrique Mesquita, Obrigações Reais e Ónus Reais, Coleção teses, Almedina, 1990, pág. 265.

[6] Luís Carvalho Fernandes, Lições de Direitos Reais, 4ª ed., pag.373.

[7] Sandra Passinhas, “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, pag. 172 e ss.

[8] Vide entre outros, Pessoa Jorge in Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil , pag.37, Manuel de Andrade in Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. I, pag.127.; Antunes Varela in Das Obrigações em Geral, vol.I, 6ª ed,pag.490 e nota 1;

[9] O que lhes terá sido negado na sentença.

[10] Neste sentido, Ac. STJ de 26.1.2021 ( José Rainho).