Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
486/14.6TTSTB.E1
Relator: JOÃO NUNES
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
TENTATIVA DE CONCILIAÇÃO
PROPOSITURA DA ACÇÃO
Data do Acordão: 04/28/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: i. A tentativa de conciliação realizada perante o Ministério Público na acção emergente de acidente de trabalho destina-se a obter um acordo das partes que ponha termo ao processo;
ii. não sendo possível o acordo total, destina-se a delimitar o objecto do litígio, a dirimir na fase contenciosa;
iii. por isso, no auto de não conciliação devem constar os factos elencados no artigo 112.º do Código de Processo do Trabalho sobre os quais tenha havido ou não acordo;
iv. se na tentativa de conciliação ter havido discordância apenas quanto à questão da incapacidade, a fase contenciosa inicia-se através de um requerimento, fundamentado ou acompanhado de quesitos, em que é pedida a realização de junta médica tendo em vista a fixação da incapacidade para o trabalho [n.º 2 do artigo 138.º e n.ºs 1, alínea b) e n.º 2 do artigo 117.º];
v. nas restantes situações, a fase contenciosa inicia-se através da apresentação de petição inicial, em que o sinistrado, doente ou respectivos beneficiários formulam o pedido, expondo os seus fundamentos [n.º 1 do artigo 138.º e alínea a) do n.º 2 do artigo 117.º do CPT];
vi. é de concluir que a discordância do sinistrado na tentativa de conciliação não se limita à questão da incapacidade e, por consequência, que a fase contenciosa do processo se deve iniciar mediante a apresentação de petição inicial, se consta do auto de não conciliação que aquele não se concilia por não aceitar a incapacidade que lhe foi atribuída, e também por discordar do valor proposto para pagamento das diferenças por incapacidades temporárias absolutas e por existirem outras despesas que pretende reclamar na fase contenciosa, tendo, nessa sequência, o Ministério Público determinado que os autos ficassem a aguardar a propositura da acção nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 117.º do CPT.
(Sumário do relator)
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 486/14.6TTSTB.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

I. Relatório
Os presentes autos de acção especial emergente de acidente de trabalho, em que é sinistrado B… (residente na Rua …) e entidade responsável C… – Companhia de Seguros, S.A. (…), tiveram a sua origem no acidente corrido em 07 de Novembro de 2013, quando o sinistrado prestava o seu trabalho de motorista a D…, Lda. (…), a qual tinha a sua responsabilidade infortunística laboral transferida para a identificada Companhia de Seguros.
No âmbito do referido processo procedeu-se em 18 de Novembro de 2014 à tentativa de conciliação a que alude o artigo 108.º do Código de Processo do Trabalho (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 09-11, com as alterações decorrentes do Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13-10) não se tendo logrado obter o acordo dos intervenientes.
É do seguinte teor, na parte ora relevante, o “Auto de Não Conciliação”:
«- Apura-se dos autos que o sinistrado foi vítima no dia 07-11-2013, em Badajoz, de um acidente de trabalho. Tal acidente verificou-se quando o sinistrado prestava o seu trabalho de motorista a “D…, Lda”, em execução do contrato de trabalho com esta celebrado.
- O acidente consistiu em: quando manuseava uma carga caiu de umas escadas tendo sofrido fractura do punho direito, apresentando como sequelas dores locais, rigidez na flexão palmar e desvio radial.
- À data do acidente o sinistrado auferia a retribuição de € 613,26 x 14 meses o que corresponde à retribuição anual bruta de € 8.585,64.
-A entidade patronal tinha a responsabilidade emergente do acidente de trabalho transferida para a “C…, Companhia de Seguros, S.A”
- Em exame médico realizado no GML, o perito médico reconheceu ao sinistrado a incapacidade de 11,64% de IPP a partir da data da alta da seguradora ocorrida a 27-06-2014.
- O sinistrado declara neste acto não estar pago de todas as indemnizações legais até ao dia 27-06-2014. Mais declara que não se encontra a receber pensão provisória por parte da seguradora».
E logo a seguir consta do mesmo auto que com base nesses pressupostos “de facto e no disposto na legislação em vigor”, o Exmo. Procurador da República propôs às partes o seguinte acordo:
«A seguradora pagará ao sinistrado o capital de remição de uma pensão anual no valor de € 699,56 com início em 28-06-2014, calculada com base no salário atrás referido. Pagará ainda o montante de € 1.226,04 relativo a acertos de indemnizações por incapacidades temporárias absolutas, atenta a proposta do perito médico da incapacidade temporária absoluta no período compreendido entre 08-11-2013 e 28-02-2014.
Dada a palavra ao sinistrado, por ele foi dito que não aceita a conciliação, nos termos propostos pelo Ministério Público, porquanto discorda da incapacidade pretendendo submeter a exame por junta médica. Discorda também da diferença de pagamentos do valor proposto para pagamento das diferenças por incapacidades temporárias absolutas, bem como existem outras despesas a reclamar na fase contenciosa.
- Pela representante da seguradora foi dito que reconhece o acidente dos autos como de trabalho, o nexo causal entre esse acidente e as lesões dele decorrentes, bem como a sua responsabilidade emergente do acidente em função da retribuição atrás auferida.
- Disse não estar de acordo com a avaliação da incapacidade feita pelo perito do GML, por considerar o sinistrado afetado de uma IPP de 8,8%, conforme consta dos autos, discordando também dos períodos de incapacidade temporária, pelo que não aceita a conciliação nos termos do acordo proposto pelo Procurador da República».
E a terminar o auto consta o despacho proferido pelo Exmo. Procurador da República, com o seguinte teor:
«Atenta a posição assumida pelas partes, dão-se as mesmas por não conciliadas, ordenando-se a remessa dos autos à Secção onde deverão aguardar a propositura da acção nos termos do artº 117.º, n.º 1 al. a) do Código de Processo do Trabalho».

No prosseguimento dos autos, e não tendo entretanto havido lugar a quaisquer outros actos ou diligências processuais, foi em 25 de Março de 2015 proferida sentença, cuja parte decisória é do seguinte teor:
«Desta forma, condena-se:
a) a Ré C…, Companhia de Seguros, S.A, a pagar ao sinistrado B…, com efeitos a partir de 28.06.2014, o capital de remição correspondente à pensão anual de € 699,56, acrescida de juros de mora, à taxa legal do art. 559.º n.º 1 do CCivil, contados desde a referida data e até integral pagamento;
b) a pagar ao sinistrado o montante de € 1226,04 relativa a acertos de indemnizações por ITA ocorrida entre 08.11.2013 e 28.02.2014.
Fixa-se à acção o valor de € 10.295,11.
No relatório da referida sentença afirmou-se, além do mais, que na tentativa de conciliação as partes discordaram do resultado do exame médico do tribunal e da diferença de pagamentos por incapacidade temporária absoluta, mas (…) no prazo de 20 dias, nenhuma das partes requereu exame por junta médica, pelo que cumpre proferir decisão de mérito, fixando a natureza e o grau de desvalorização e o valor da causa – art. 138.º n.º 2 do CPTrabalho».

Inconformada com a sentença a seguradora C… – Companhia de Seguros, S.A., dela veio interpor recurso para este tribunal, tendo, a terminar as alegações, apresentado a seguinte síntese conclusiva:
«1. A decisão de mérito prevista no art.º 139º, n.º 2 do CPT apenas pode ter lugar quando as partes, em sede conciliatória, tenham discordado apenas do grau de incapacidade para o trabalho.
2. No caso dos autos, para além de discordarem do grau de incapacidade para o trabalho arbitrado em perícia médica, as partes discordavam ainda dos montantes das indemnizações por incapacidades temporárias, pretendendo ainda o sinistrado reclamar outras despesas.
3. Assim, estando os autos a aguardar a propositura da acção, por determinação do Ministério Público, e não tendo sido proposta a acção nos termos e prazo do art.º119º, n.º 1 e 2, cabia ordenar-se a suspensão da instância, conforme dispõe o n.º 4 do mesmo artigos e não proferir decisão de mérito.
4. Em face da determinação do Ministério Público, a R. não tinham outra expectativa que não fosse aguardar a propositura da acção, o que a inibiu de tomar a iniciativa de requer junta médica
5. A aliás douta sentença é nula, nos termos conjugados dos art.ºs 119º, 138º, n.º 2 do CPT e 193º e 195º, n.º 1 do NCPC, devendo como tal ser declarada e ordenada a baixa dos autos à 1ª instância, ficando a aguardar a propositura da acção, nos termos do art.º 117º, n.º 1 alínea a) do CPT, com o que se fará a costumada Justiça!»

Não consta dos autos que tenham sido apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido na 1.ª instância, como de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito suspensivo, atenta a caução prestada.

Remetidos os autos a este tribunal, e aqui recebidos em 09-03-2016, neles o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, que não foi objecto de resposta, no qual se pronunciou pela procedência do recurso.

Cumprido o disposto no artigo 657.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, com remessa de projecto de acórdão aos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

II. Objecto do recurso e Factos
Sabido como é que o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, que aqui não se colocam (cfr. artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, ex vi do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho), a única questão a apreciar consiste em saber se face ao conteúdo do “auto de não conciliação” e sem que o sinistrado/Autor tivesse apresentado petição inicial, podia o tribunal a quo proferir a decisão ora em apreciação
A matéria de facto a atender é a que consta do relatório supra, sendo de realçar o conteúdo do “auto de não conciliação” supra transcrito.

III. Fundamentação
Importa, antes de mais, fazer uma referência, necessariamente breve, à tramitação do processo de acidente de trabalho.
Como decorre do disposto no artigo 99.º, n.º 1, do Código de Processo de Trabalho, o processo especial emergente de acidente de trabalho inicia-se por uma fase conciliatória dirigida pelo Ministério Público e tem por base a participação do acidente.
Encontrando-se o sinistrado afectado de incapacidade permanente, o Ministério Público designa data para exame médico, seguido de tentativa de conciliação (n.º 1, do artigo 101.º).
Subsequentemente realiza-se a tentativa de conciliação, da qual deve constar, em caso de acordo, além da identificação completa dos intervenientes, a indicação precisa dos direitos e obrigações que lhes são atribuídos e ainda a «descrição pormenorizada do acidente e dos factos que servem de fundamento aos referidos direitos e obrigações» (artigo 111.º).
Já em caso de falta de acordo, deve constar do respectivo auto «os factos sobre os quais tenha havido acordo, referindo-se expressamente se houve ou não acordo acerca da existência e caracterização do acidente, do nexo causal entre a lesão e o acidente, da retribuição do sinistrado, da entidade responsável e da natureza e grau da incapacidade atribuída» (n.º 1 do artigo 112.); caso o interessado se recuse a tomar posição sobre cada um dos factos, estando habilitado a fazê-lo, é, a final, condenado como litigante de má fé (n.º 2 do mesmo artigo).
Deste preceito decorre que na falta de acordo, consignam-se no respectivo auto:
a) os factos sobre os quais tenha havido acordo;
b) os factos sobre os quais não tenha havido acordo.
Nos factos a consignar sobre se houve ou não acordo encontram-se (i) a existência e caracterização do acidente, (ii) o nexo causal entre a lesão e o acidente, (iii) a retribuição do sinistrado, (iv) a entidade responsável e (v) a natureza e grau de incapacidade atribuída.
As partes ao tomarem posição concreta e definida sobre cada um destes factos circunscrevem o litígio na fase contenciosa às questões acerca das quais não foi possível obter acordo, o mesmo é dizer que é essa posição assumida sobre cada um dos factos que delimita o princípio da vinculação temática.
Como se observou no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29-10-2003 (Recurso n.º 2055/03, com sumário disponível em www.stj.pt), a tentativa de conciliação realizada perante o Ministério Público na acção emergente de acidente de trabalho destina-se, em primeira linha, a obter um acordo das partes que ponha termo ao processo; não sendo possível o acordo total, destina-se, numa segunda linha, a circunscrever o litígio por forma a que na fase contenciosa só se discutam as questões acerca das quais não houve acordo na fase conciliatória.
Importa notar que, como resulta expressamente da lei e tem sido afirmado pela jurisprudência, o acordo ou desacordo dos interessados que deve constar do auto na tentativa de conciliação realizada pelo Ministério Público na fase conciliatória do processo é o que incide sobre factos, e não sobre juízos de valor, conclusões ou qualificações jurídicas (cfr. artigos 111.º e 112.º do CPT e acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 14-12-2006 e de 02-07-2008, Recursos n.º 2880/07 e n.º 1327/08, respectivamente, encontrando-se aquele publicado em www.dgsi.pt e este com sumário disponível em www.stj.pt).
Não tendo havido acordo na tentativa de conciliação, a fase contenciosa iniciar-se-á por uma de duas formas, a determinar em função das matérias sobre que não houve acordo:
a) no caso de na tentativa de conciliação ter havido discordância apenas quanto à questão da incapacidade, através de um requerimento, fundamentado ou acompanhado de quesitos, em que é pedida a realização de junta médica tendo em vista a fixação da incapacidade para o trabalho (n.º 2 do artigo 138.º e n.ºs 1, alínea b) e n.º 2 do artigo 117.º);
b) nas restantes situações, através da apresentação de petição inicial, em que o sinistrado, doente ou respectivos beneficiários formulam o pedido, expondo os seus fundamentos (n.º 1, alínea a) do artigo 117.º).
Isto é, e em síntese:
- a fase contenciosa do processo inicia-se mediante a apresentação de requerimento, com pedido de junta médica, apenas nos casos em que a única questão controvertida que resultou da tentativa de conciliação diz respeito à fixação da incapacidade para o trabalho; porém, nesta situação, se não for apresentado o pedido de junta médica no prazo de 20 dias, o juiz profere decisão sobre o mérito, fixando a natureza e o grau de incapacidade e o valor da causa (n.º 2 do artigo 138.º);
- em todos os demais casos, a fase contenciosa inicia-se mediante a apresentação de petição inicial, e caso esta não seja apresentada no prazo de 20 dias, que poderá ser prorrogado, suspende-se a instância (n.º 1 e 4 do artigo 119.º).

Feito o enquadramento legal, é o momento de regressarmos ao caso em apreço.
Transcreveu-se supra o conteúdo do “auto de não conciliação”.
Também já se deixaram consignados os factos que, em conformidade com o disposto no artigo 112.º do Código de Processo do Trabalho, na falta de acordo devem constar do auto de não conciliação.
Impõe-se então, no confronto entre o que consta do auto e o que estipula a lei, apurar os factos em relação aos quais houve ou não acordo.
i. Quanto à existência e caracterização do acidente
Consta do auto que o sinistrado foi vítima de um acidente de trabalho em 07-11-2013, quando se encontrava ao serviço de D…, Lda., cuja responsabilidade infortunística-laboral se encontrava transferida para a seguradora, aqui recorrente
Em relação a tal facto a representante da seguradora declarou aceitar o acidente dos autos como de trabalho.
ii. Quanto ao nexo causal entre a lesão e o acidente
A representante da seguradora declarou expressamente aceitar o nexo causal entre o acidente e as lesões dele decorrentes.
iii. Quanto à retribuição do sinistrado
Este declarou auferir a retribuição mensal de € 613,26 x 14 meses, o que corresponde à retribuição anual de € 8.585,64.
Também quanto a esta matéria o legal representante da seguradora declarar aceitar a sua responsabilidade em função da retribuição atrás referida”.
iv. Quanto à entidade responsável
Encontrando a responsabilidade infortunística-laboral transferida para a aqui recorrente, esta, como se viu, através da sua legal representante, declarou aceitar a sua responsabilidade pela referida retribuição.
v. Quanto à natureza e grau de incapacidade atribuída
Na tentativa de conciliação o sinistrado declarou discordar da incapacidade, afirmando ainda que discorda “da diferença de pagamentos do valor proposto para pagamento das diferenças por incapacidade temporárias absolutas».
E a seguradora declarou também não estar de acordo com a avaliação da incapacidade, incluindo quanto aos períodos de incapacidade absoluta.
Ou seja, na referida tentativa de conciliação ambas as partes discordaram quanto à natureza e grau de incapacidade, incluindo a temporária.
Mas o sinistrado foi mais além: afirmou também discordar da diferença de pagamentos do valor proposto em relação aos períodos de incapacidade temporária, sem que no referido auto se precise essa discordância.
Poder-se-á sustentar que tal discordância se reporta, ainda aí, ao grau e natureza da incapacidade.
Mas é legítimo também configurar que com tal alegação o sinistrado pretende – devida ou indevidamente, não importa agora – um diferente enquadramento jurídico, a levar a cabo na acção, desde logo mediante a apresentação da petição inicial.
E a reforçar este entendimento, consta ainda do auto que o sinistrado também não aceita conciliar-se porque “existem outras despesas a reclamar na fase contenciosa”.
Assim, se é certo que a discordância da seguradora no auto de não conciliação se cingiu à natureza e grau de incapacidade, já em relação ao sinistrado ela abrange outras matérias, atinentes a importâncias que ele pretendia (pretende?) reclamar em consequência do acidente, porventura respeitantes a prestações em espécie (cfr. artigo 23.º, alínea a) da Lei n.º 98/2009, 04 de Setembro – LAT).
Assinale-se, aliás, que o sinistrado se encontrava na referida tentativa de conciliação acompanhado pela sua mandatária, o que indicia que estava ciente do que declarou nesta matéria, e que não se cingia a diferença quanto ao grau e natureza incapacidade que lhe havia sido atribuída em exame médico no tribunal.
Certamente por isso, e nessa conformidade, o Exmo. Procurador que presidiu à tentativa de conciliação, deixou consignado que os autos ficavam a aguardar a propositura da acção nos termos do artigo 117.º, n.º 1, alínea a) do CPT, a significar que a fase contenciosa do processo, por haver discordância na diligência para além do grau e da natureza da incapacidade, se iniciaria com a apresentação da petição inicial.
Nesta sequência, somos a entender que não podia ser proferida sentença nos termos em que o foi, devendo os autos ficar a aguardar a propositura da acção (cfr. artigos 193.º e 196.º do CPC).
De resto, ainda que se entendesse que a divergência das partes na tentativa de conciliação se cingia à natureza e grau de incapacidade, face ao despacho do Exmo. Procurador – no sentido dos autos ficarem a aguardar a propositura da acção – não pode deixar de considerar-se a decisão proferida como uma decisão surpresa (cfr. artigo 3.º, n.º 3, do CPC): antes de proferir decisão final, sem a realização de quaisquer actos ou diligências processuais, deveria o tribunal dar a possibilidade às partes de se pronunciarem sobre a eventualidade de vir desde logo a ser proferida a referida decisão.
Aqui chegados, impõe-se concluir pela procedência das conclusões das alegações de recurso, e, por consequência, pela revogação da sentença recorrida, devendo ser declarada a suspensão da instância, ficando os autos a aguardar a apresentação da petição inicial pelo sinistrado, ou que o mesmo algo requeira tendo em vista a desnecessidade dessa apresentação e, assim, o prosseguimento dos autos nos termos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 117.º do CPT.

IV. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em conceder provimento ao recurso interposto por C… – Companhia de Seguros, S.A., e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida, devendo ser declarada a suspensão da instância, ficando os autos a aguardar a apresentação da petição inicial pelo sinistrado, ou que o mesmo algo requeira tendo em vista a desnecessidade dessa apresentação e, assim, o prosseguimento dos autos nos termos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 117.º do CPT.
Custas pelo recorrido.

Évora, 28 de Abril de 2016
João Luís Nunes (relator)
Alexandre Ferreira Baptista Coelho (adjunto)
Joaquim António Chambel Mourisco (adjunto)