Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
447/21.9T8SLV-B.E1
Relator: JOSÉ LÚCIO
Descritores: CONSTITUIÇÃO OBRIGATÓRIA DE ADVOGADO
ADVOGADO ESTAGIÁRIO
PROCURAÇÃO FORENSE
RATIFICAÇÃO
Data do Acordão: 04/07/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
1 – O disposto no art. 12º nº 1 da Portaria nº 280/2013 de 26 de Agosto aplica-se às situações em que a peça processual deva ser assinada por mais do que um mandatário, por força das leis de processo, e não às situações em que pode sê-lo.
2 – Mesmo nos casos em que é obrigatória a constituição de advogado, um advogado-estagiário pode assinar requerimentos em que não sejam suscitadas questões de Direito.
3 – Não tendo sido junta procuração com a petição inicial pode a parte ao apresentá-la ratificar logo o processado anterior.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA:

I – Nos autos de embargos de executado instaurados pela executada “Concretangle - Unipessoal, Lda.” contra a exequente “Paulo Nascimento Consulting - Mediação Imobiliária, Lda.” foi proferida decisão com o seguinte teor:
“Na presente oposição à execução e à penhora, veio a Embargante alegar justo impedimento, por dificuldades técnicas com o programa informático, por forma a justificar a apresentação do requerimento inicial dia 1-10 e, assim também, que a peça processual tivesse sido apresentada por Advogada - estagiária.
A Embargada argui nulidade, com fundamento nesta última circunstância.
Este requerimento, apresentado em nome do Ex.mo requerente, foi remetido ao processo pela Ex.ma Advogada – estagiária (40007725), com subscrição múltipla, tendo aquele apresentado, na execução, declaração electrónica de adesão (40038085).
Na presente é obrigatório o patrocínio judiciário (art.º 58.º, n.º1, do Código de Processo Civil). Se a parte não constituir advogado, sendo obrigatória a sua constituição, o juiz, oficiosamente, determina a sua notificação para o constituir, em prazo (artigos 6.º e 41.º, do mesmo Código).
No caso, veio o Ex.mo Advogado, antes mesmo de ser feito tal convite, que sempre teria lugar, a juntar procuração conjunta – requerimento de 8-12 –, e com ratificação do processado pela parte.
Encontra-se regularizada, por conseguinte, a falta de constituição de mandatário, não se verificando qualquer nulidade.”
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II – Contra tal decisão insurgiu-se a exequente/embargada através do presente recurso, concluindo assim as suas alegações:
“a. No despacho recorrido [datado de 30.12.2021], ao decidir no sentido da admissibilidade dos embargos de executado, o Tribunal a quo ignorou a questão atinente à ausência de poderes da Advogada Estagiária para a prática do ato processual;
b. O Tribunal a quo não se pronunciou sobre questões suscitadas pelo Recorrente, que foram submetidas ao escrutínio do Tribunal e relativamente às quais se impunha a prolação de uma decisão, em concreto, sobre o facto de (i) o requerimento de embargos não ter sido objeto de subscrição múltipla por parte do Dr. A.T., e de (ii) o requerimento para a junção da procuração forense ter sido assinado exclusivamente pela Colega Advogada Estagiária;
c. Tal omissão de pronúncia fere de nulidade a decisão do Tribunal a quo, nos termos previstos no art.º 613.º n.º 3 e 615.º n.º 1 al. d) do CPC, a arguir em sede de recurso (art.º 615.º n.º 4 e 644.º n.º 2 al. d) do CPC);
d. O requerimento de embargos equivale a uma petição inicial para a acção declarativa, peça processual que não admite a coexistência de diferentes partes, pelo que a sua submissão conjunta encontra-se sujeita ao regime legal previsto no art.º 12.º da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto, na sua redação em vigor;
e. Face ao valor do processo (o da ação executiva), a Advogada Estagiária não tem poderes suficientes para o exercício regular do mandato, exigindo-se, para tanto, o efetivo acompanhamento do patrono [ou patrono-formador], cfr. art.º 196.º n.º 1 e 2 do Estatuto da Ordem dos Advogados e arts. 40.º e 42.º do CPC pelo que a peça processual teria necessariamente que ser apresentada por ambos;
f. A prática tutelada do exercício profissional do advogado estagiário só é efectiva quando o patrono [ou patrono formador] o acompanhe, sendo que tal acompanhamento implica a prática conjunta de todos os atos no processo;
g. Os articulados e demais peças processuais, nomeadamente, aquelas em que sejam suscitadas questões de direito, têm que ser subscritas por ambos, sob pena de ficarem sem efeito e de se considerarem como não apresentadas.
h. O requerimento de embargos apresentado apenas por Advogado Estagiário, sem que tenha sido subscrito por Advogado [patrono ou patrono formador] não produz quaisquer efeitos, pelo que, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, por provado, considerando-se a referida peça processual como “não apresentada” e anulada a respetiva distribuição, com as necessárias consequências legais.”
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III – Pela executada/embargante/recorrida não foram apresentadas contra-alegações.
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IV – Ao admitir o recurso o juiz recorrido declarou que:
“Para efeito do disposto no art.º 617.º do Código de Processo Civil, consigna-se não se vislumbrar a invocada nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia, visto que as questões que a recorrente alega que não foram apreciadas estão contidas na apreciação da validade dos termos de apresentação dos embargos, incluindo no que ao patrocínio judiciário respeita, que foi considerado regularizado.”
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V – Tendo presente que o objecto dos recursos se delimita pelas conclusões das alegações (arts. 635º, 3 e 639º, 1 e 2 CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as questões levantadas pelo recorrente são por um lado a eventual nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia, e por outro lado o próprio acerto dessa decisão ao admitir a petição de embargos, por considerar regularizado o patrocínio judicial.
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VI – Vistos os autos, e para além do que já consta do despacho recorrido e das conclusões, supra transcritas, verifica-se o seguinte:
1 – Por via electrónica, deu entrada em tribunal a 01 de Outubro de 2021 (hora 1.47) um requerimento para início de processo, dele constando que se tratava de embargos de executado, a apensar a processo existente.
2 – Figura como executado/embargante a “Concretangle, Unipessoal, Lda.” e como exequente/embargado “Paulo Nascimento Consulting - Mediação Imobiliária Lda.”
3 – No formulário consta como mandatário subscritor O.C., advogada-estagiária, identificada pela sua cédula profissional da Ordem dos Advogados.
4 – Do mesmo formulário consta ainda que “O Mandatário subscritor declara nos termos do Artº 12º nº 1 da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto, que esta Peça Processual será também subscrita por: A.T., Advogado(a), com a cédula profissional nº 14204L”.
5 - Na mesma data, mas cinco minutos depois (1.53) deu entrada novo requerimento, para “outras questões”, também assinado da mesma forma por O.C., com indicação de juntar a processo existente, referindo como finalidade “Invocação justo impedimento. Problemas informáticos, peça enviada anteriormente por mail”, e anexando uma declaração.
6 - Nesta declaração pode ler-se:
“A.T., mandatário do Embargante CONCRETANGLE, Unipessoal, Lda., executada, vem mui respeitosamente, nos termos do disposto no artigo 140.º 1 do CPC, invocar justo impedimento para a prática atempada do acto, nos termos e com os seguintes fundamentos:
O ora mandatário, terminou a peça apresentada, tendo iniciado o envio via citius, no dia 30 de Setembro de 2021.
Quando estava a proceder ao envio da peça, a plataforma citius bloqueou, tendo o mandatário, contatado com a sua colega estagiária, Dr.ª O.C., dando-lhe conta do sucedido e solicitando à mesma que enviasse por mail e pela sua plataforma Citius, colocando o signatário a subscrever a peça.
Tendo efetivamente a mesma conseguido, com dificuldade, atendendo à sua inexperiência, proceder ao envio da peça de modo correto via Citius, ou seja via citius e devidamente assinada no signus, apenas no dia 01.10.2021.
Só podendo o signatário subscrever a peça após intervenção do técnico informático, o que apenas poderá suceder no decurso do dia 01 de Outubro, na hora de expediente.
Devendo os embargos apresentados, ser recebidos.
Face ao exposto, vem mui respeitosamente requer a V. Exa. considere o justo impedimento, devendo os embargos, agora apresentados, serem admitidos.”
7 – Efectivamente, na mesma data de 01-10-2021 pelas 0.08 horas, tinha sido enviado via mail, do endereço profissional de O.C., para o Tribunal Judicial, uma mensagem em que vinha anexada a petição de embargos e a comprovação do pagamento da taxa de justiça, e os dizeres “Boa Noite!Venho por esse meio dar conhecimento que tivemos um problema com a plataforma Sitius. Segue em anexo a peça processual. Em conhecimento do Dr. Antonio Taveira com cédula profissional 14204L”.
8 – No dia 11-10-2021 o advogado Dr. A.T. expressou a sua declaração electrónica de adesão ao que tinha sido apresentado em seu nome:
Nos termos do Artº 12º nº 1 da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto o mandatário subscritor declara a sua adesão ao conteúdo material da Peça Processual nº 40007725.
9 – Por seu turno, a embargada veio aos autos, a 8 de Novembro de 2021, requerer o seguinte:
“Paulo Nascimento Consulting - Mediação Imobiliária, Lda., tendo constatado, através de consulta eletrónica do processo, que a oposição apresentada pela Executada Concretangle, Unipessoal, Lda. foi subscrita, apenas, por Advogado Estagiário sem procuração e que, não obstante a indicação constante do formulário, de que a peça processual seria subscrita pelo Sr. Dr. A.T., Advogado, com a cédula profissional n.º 14204L, tal não sucedeu, deve a referida peça processual considerar-se não apresentada e anulada a distribuição, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 12.º n.º 1 e n.º 3 da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto, na sua redação em vigor, o que se requer para os devidos e legais efeitos.”
10 – A 8 de Dezembro de 2021, por novo requerimento assinado por O.C., foram juntos dois documentos:
No primeiro pode ler-se que:
“CONCRETANGLE-UNIPESSOAL LDA., executada nos autos à margem melhor identificados, vem respeitosamente requerer a V. Exa., a junção aos mesmos de procuração a favor do Sr. Dr. A.T. Advogado com a cédula profissional n.º 14204L e Drª O.C., Advogada-Estagiária com a cédula profissional n.º 44469L, o qual por lapso não acompanhou o Embargo de executado.”
E o segundo tem o seguinte teor:
CONCRETANGLE-UNIPESSOAL LDA., com sede social na Rua Engenheiro Moniz da Maia, n.º 22, 3B, Urbanização Malvarosa, Alverca do Ribatejo, 2615-044, Alverca do Ribatejo, aqui representada pelo gerente o Senhor (…), portador do CC n.º (…) com poderes para o ato, constitui seus bastantes procuradores o Dr. A.T. e a Dra. O.C., Advogada-Estagiária, ambos com escritório na Av. Barbosa du Bocage n. 87, n.3º 1050-030 Lisboa, a quem confere poderes gerais, bem como os especiais para desistir, conferir e transigir, ratificando ainda todo o processado até à presente data.”
11 – Esta procuração tem a data de 15 de Novembro de 2021 e a assinatura manuscrita de (…).
12 – Na sequência deste expediente deu entrada novo requerimento da embargada expondo o seguinte:
1. A Embargante veio requerer a junção aos autos de procuração forense outorgada a favor dos mandatários, incluindo da Sra. Dra. O.C., Advogada Estagiária.
2. A Sra. Dra. O.C., enquanto Advogada Estagiária não tem competência para praticar, por si, atos processuais nos presentes autos.
3. Pelo que, a sua intervenção no processo apenas poderá ser admitida quando se encontre efetivamente acompanhada por Advogado ou pelo seu patrono, o que não sucede com o requerimento em referência, que foi apresentado com a mera notificação eletrónica do Dr. A.T. e do advogado ora subscritor.
4. Pelo que, deve o requerimento em causa ser rejeitado e ordenada o seu desentranhamento dos autos, o que se requer para os devidos e legais efeitos.”
13 – Finalmente, a 30 de Dezembro de 2021, foi proferido o despacho recorrido, e que foi transcrito no nosso relatório inicial, julgando regularizado o patrocínio judiciário da embargante, com a ratificação do processado pela parte.
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VII - Passemos então a decidir do objecto do recurso.
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A) Em primeiro lugar, suscita-se a questão da nulidade por omissão de pronúncia, nos termos previstos nos arts. 613.º n.º 3 e 615.º n.º 1 al. d) do CPC, que segundo a recorrente afectaria a validade da decisão recorrida.
Como é sabido, e a apelante vem recordar, de acordo com o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil (CPC) é nula a sentença quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”.
Tal disposição aplica-se com as necessárias adaptações também aos despachos, tal como estatui o art. 613º, n.º 3, do CPC.
Não está em dúvida, portanto, que a decisão impugnada esteja dentro do campo de aplicação da norma invocada.
Porém, como constitui entendimento unânime da jurisprudência, a omissão de pronúncia é um vício que apenas ocorre quando o tribunal não se pronuncia sobre as questões que tem para decidir e não se confunde com a simples falta de referência expressa a todo e qualquer argumento aduzido pelos interessados nessas questões.
O termo legal “questões” não abrange todos os argumentos invocados pelas partes em apoio das suas posições.
Desde logo por o juiz não estar sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (cfr. art. 5º, nº 3, do CPC).
“A nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes” (Ac. STJ de 10-12-2020, processo n.º 12131/18.6T8LSB.L1.S1, relator Maria do Rosário Morgado, in www.dgsi.pt).
Como sublinha ainda o Supremo Tribunal de Justiça:
A expressão «questões» prende-se com as pretensões que os litigantes submetem à apreciação do tribunal e as respectivas causas de pedir e não se confunde com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os fundamentos, os motivos, os juízos de valor ou os pressupostos em que as partes fundam a sua posição na controvérsia” (Acórdão de 03-10-2017, na Revista n.º 2200/10.6TVLSB.P1.S1 - 1.ª Secção, Relator Alexandre Reis, disponível online in Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça).
No caso em apreço o tribunal foi chamado a pronunciar-se sobre a questão do patrocínio judicial obrigatório que impendia sobre a embargante, concluindo que este estava regularizado com a ratificação efectuada pela própria parte.
O despacho impugnado decidiu assim a questão que tinha para decidir, e mal ou bem cumpriu também a obrigação de fundamentação a que estava vinculado. O tribunal não estava obrigado a pronunciar-se especificadamente sobre todos os argumentos concretos em que a recorrente apoiava a sua pretensão quanto à falta do patrocínio judicial obrigatório.
Não se vislumbra, portanto, qualquer omissão de pronúncia.
Poderá ou não estar certo o julgamento, mas o erro de julgamento não é identificável com omissão de pronúncia.
A decisão proferida e ora impugnada não padece de qualquer nulidade, como bem se refere no despacho que admitiu o recurso.
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B) Resta indagar se estará efectivamente suprida a questão do patrocínio judicial da embargante, que tinha sido levantada.
O valor da causa, na execução e nos embargos, é de € 764 215,83.
Consequentemente, e tendo presente a alçada das relações, muito inferior, as partes têm obrigatoriamente que ser patrocinadas por advogado, como resulta tanto do art. 40º como do art. 58º do Código de Processo Civil.
A petição de embargos, com que a embargante veio opor-se à execução, foi apresentada apenas por uma advogada estagiária, consignando-se porém que a mesma peça também seria subscrita por advogado aí identificado, que se encontrava de momento impedido de o fazer por razões informáticas.
O mesmo advogado informou logo os autos, em declaração junta também através da sua colega advogada-estagiária, que após terminar essa peça processual tinha tentado concretizar a sua submissão via citius mas não o tinha conseguido fazer por esta aplicação ter bloqueado, pelo que tinha solicitado à sua colega advogada-estagiária que o fizesse por si, tal como aconteceu.
Afigura-se, portanto, indubitável que desde o primeiro momento o advogado referido se assumiu como mandatário da embargante e assumiu a responsabilidade pelo requerimento inicial apresentado.
Fê-lo seu, substantivamente, embora não o tivesse nesse momento assinado por via electrónica, nos termos regulamentares.
E posteriormente manifestou por essa via electrónica a sua adesão “ao conteúdo material” da peça processual em referência, declarando fazê-lo nos termos do Artº 12º nº 1 da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto (embora o tenha feito para além do prazo de dois dias aludido na norma citada).
Na verdade, com essa adesão “ao conteúdo material” da peça processual apresentada o advogado em causa estava a dar satisfação às obrigações decorrentes dos n.ºs 3 e 4 do art. 6º da mesma Portaria, que lhe impunham a assinatura “no momento da apresentação da peça processual”, o que não tinha podido fazer.
Fê-lo tardiamente, é certo, mas como se disse justificou o seu impedimento na altura própria, e a lei não estabelece neste ponto qualquer cominação para a assinatura tardia.
Verificamos que persiste na argumentação da recorrente, e diga-se que também do lado da recorrida, como se viu, um equívoco quanto ao âmbito de aplicação do art. 12º da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto.
Esta norma reporta-se aos “casos em que a peça processual deva ser assinada por mais do que um mandatário” e determina que então um dos mandatários procede à entrega da peça processual, assinando-a digitalmente através do sistema informático de suporte à actividade dos tribunais, indicando, no formulário, os mandatários que igualmente a devem assinar, e estes no prazo máximo de dois dias após a distribuição do processo colocarão a sua assinatura.
Mas o preceito abrange os casos em que a peça processual deve ser assinada por mais do que um mandatário (por ex. as situações de transacção, pedidos de alteração de datas de diligência ou de suspensão da instância, em que os requerimentos têm necessariamente que ser subscritos por mandatários de diferentes partes) e não abrange os casos em que o requerimento pode ser assinado por mais do que um mandatário (que são potencialmente todos).
Consequentemente, não havia que aplicar as cominações previstas no citado art. 12º, ao contrário do que pretende a apelante (nos casos de não adesão por parte dos mandatários indicados no formulário no prazo fixado na alínea b) do n.º 1, considera-se que a peça processual não foi apresentada e anula-se a respetiva distribuição nos casos de requerimento, petição inicial ou petição inicial conjunta).
Sobre este ponto veja-se por todos o Acórdão da Relação de Guimarães de 09-11-2017, no processo n.º 4671/15.5T8VCT-C.G1, relatado por Margarida Almeida Fernandes, publicado em www.dgsi.pt:
“I – Atento o disposto no art. 12º nº 1 da Portaria nº 280/2013 de 26 de Agosto este preceito aplica-se às situações em que a peça processual deva ser assinada por mais do que um mandatário e não às situações em que pode sê-lo.
II - A ratio do preceito em causa prende-se com a apresentação de requerimentos conjuntos por parte de mandatários das diferentes partes.”
Não estamos, portanto, no campo de aplicação da regra em análise, que não inclui as situações de pluralidade de mandatários da mesma parte, responsável pela peça processual.
O que subsistia, na situação em apreço, para além da falada assinatura, era a falta de procuração que comprovasse o mandato, uma vez que não foi junta qualquer procuração.
Só mais tarde a parte representada veio ao processo juntar a procuração, na qual através do seu representante legal declarou constituir mandatários o referido advogado e a mesma advogada estagiária, “ratificando ainda todo o processado até à presente data.”
A este propósito, dispõe o art. 41º do CPC, para a falta de constituição de advogado, que “se a parte não constituir advogado, sendo obrigatória a constituição, o juiz, oficiosamente ou a requerimento da parte contrária, determina a sua notificação para o constituir dentro de prazo certo, sob pena de o réu ser absolvido da instância”.
E dispõe o art. 48º, para a falta, insuficiência e irregularidade do mandato, que se houver falta de procuração a questão pode em qualquer altura ser arguida pela parte contrária e suscitada oficiosamente pelo tribunal, fixando-se então prazo dentro do qual deve ser suprida a falta ou corrigido o vício e ratificado o processado.
Cremos que era esta última a situação até à junção da procuração mencionada, entrada a 8 de Dezembro de 2021, com a data de 15 de Novembro anterior.
Na verdade, desde o momento inicial, ao dar entrada a petição de embargos, o advogado Dr. A.T. apresentou-se como mandatário da embargante e foi como tal apresentado pela sua colega advogada-estagiária, como se verifica da factualidade que foi exposta.
Não estava, portanto, indiciada a falta de constituição de mandatário, mas sim falta de procuração que comprovasse o mandato.
Com a entrada da procuração, ficou prejudicado o disposto no art. 48º, n.º 2, do CPC, quanto ao convite para ratificação do processado, uma vez que a parte ao juntar esta procuração, e uma vez que havia processado anterior à data que dela consta, dela fez constar expressamente que, além de conferir poderes forenses gerais e especiais, também ratificava todo o processado.
Restava, pois, ao julgador apreciar se a procuração junta bastava para ultrapassar a questão da falta inicial e considerar regularizado o patrocínio judicial da embargante.
Ora julgamos que não subsistem quaisquer dúvidas de que a petição de embargos enviada via citius e via mail pela advogada-estagiária, alegando o impedimento momentâneo para assinar electronicamente do advogado mandatário, representa efectivamente o exercício por este do mandato que lhe foi conferido pela parte, e que esse exercício se encontra devidamente ratificado pela sua representada.
A ratificação foi feita pela própria parte, como podia ter sido feito pelo advogado a quem fossem conferidos poderes para tanto.
A apelante alega neste ponto que o requerimento para junção da procuração forense, com a ratificação, foi assinado apenas pela advogada-estagiária, e não pelo advogado.
Entendemos que tal circunstância não pode conduzir ao resultado pretendido pela recorrente (o desentranhamento do requerimento e do documento referido).
Com efeito, mesmo nas causas sujeitas a patrocínio judiciário obrigatório por advogado é preciso ter em conta o disposto no art. 41º, n.º 2, do CPC:
Ainda que seja obrigatória a constituição de advogado, os advogados estagiários, os solicitadores e as próprias partes podem fazer requerimentos em que se não levantem questões de direito”.
A advogada-estagiária podia assim ela própria fazer esse requerimento, em que apenas solicitava a junção aos autos da procuração, como poderia requerer que se juntasse certo documento. São requerimentos em que não é suscitada qualquer questão de direito.
Nessas situações pode dizer-se que a advogada-estagiária se limitou a desempenhar a função técnica de remeter via citius o expediente destinado ao processo.
Em suma, a comprovação do mandato judicial do advogado e da advogada-estagiária que intervieram nos autos, com a apresentação da respectiva procuração, e a ratificação pela própria parte do já processado nos autos, vieram ultrapassar e sanar as faltas apontadas pela apelante.
Concluímos, pois, que a douta decisão recorrida não merece qualquer censura e deve ser confirmada.
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DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela apelante (cfr. art. 527º, n.º 1, do CPC).
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Évora, 7 de Abril de 2022
José Lúcio
Manuel Bargado
Francisco Xavier