Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
447/18.6T8FAR.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA
COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
PACTO ATRIBUTIVO DE JURISDIÇÃO
Data do Acordão: 11/07/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 – A competência internacional dos Tribunais portugueses é a fracção do poder jurisdicional atribuída aos órgãos jurisdicionais internos, no seu conjunto, relativamente à quota de poder jurisdicional atribuída, por leis nacionais estrangeiras ou tratados ou convenções internacionais, a Tribunais estrangeiros sempre que o litígio apresente elementos de conexão com ordens jurídicas estrangeiras.
2 – Os Tribunais portugueses estão vinculados a regulamentos europeus e outros instrumentos internacionais que, no seu campo específico de aplicação, prevalecem sobre as normais processuais portuguesas, nomeadamente sobre as normas reguladoras da competência internacional constantes do Código de Processo Civil.
3 – Como densificação prática do comando impresso previsto no nº 4 do artigo 8º da Constituição da República Portuguesa, a jurisprudência dos Tribunais Superiores expressa o entendimento que as disposições do Regulamento (UE) n.º 1215, incluindo a do artigo 25º, têm prioridade sobre as disposições do Código de Processo Civil.
4 – O conhecimento imediato do pedido em sede de despacho saneador apenas deve ocorrer se a questão for unicamente de direito, se puder ser já decidida com a necessária segurança e, sendo de direito e de facto, se o processo contiver todos os elementos para uma decisão conscienciosa, segundo as várias hipóteses plausíveis aplicáveis ao caso concreto.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo nº 447/18.6T8FAR.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central de Competência Cível de Faro – J3
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
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I – Relatório:
Na presente acção declarativa proposta por “(…) Berry, Lda.” contra “(…) Portugal – Produção e Comercialização de Frutas, Unipessoal, Lda.” e “(…) Of Europe B.V.” foi ordenada a apensação da acção de condenação intentada por “(…), Lda.” contra as mesmas Rés.
Foi proferido saneador-sentença e as Autoras vieram interpor recurso do mesmo.
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A – Acção fundamento:
A Autora pediu que:
a) seja determinado, em valor que nunca poderá ser inferior aos custos de produção acrescidos da margem de comercialização da Autora, o preço (purchase price) do kg de framboesa referente à colheita 2016/2017 que deverá ser pago à Autora pelo fornecimento de frutos às Rés, devendo o mesmo fixar-se no valor de 8,95 €/kg;
b) sejam as Rés condenadas solidariamente a pagar à Autora o valor correspondente ao preço ainda em falta, o qual se computa na quantia de € 299.847,70;
c) subsidiariamente em relação a b), e caso se venha a entender que o preço deverá ser determinado de acordo com o estabelecido na cláusula 9, desconsiderando os custos de produção da Autora e a sua margem de comercialização, requer-se que seja declarada a nulidade desta cláusula devendo, em consequência, o Tribunal proceder à determinação do preço conforme peticionado em a), devendo as Rés ser condenadas no pagamento à Autora da quantia de € 299.847,70 a título de preço ainda em falta;
d) subsidiariamente em relação a c), e caso se venha a entender que o instituto da redução previsto no artigo 292º do Código Civil não opera em relação à nulidade declarada, devem as Rés ser solidariamente condenadas a pagar à Autora o montante de € 299.847,70, a título de ressarcimento pelos danos sofridos;
e) cumulativamente, sejam as Rés solidariamente condenadas a pagar à Autora a quantia de € 19.724,11 a título de encargos financeiros que teve de suportar em virtude da falta de pagamento do preço devido por parte das Rés, bem como a quantia de € 6.266,11 a título de indemnização por perdas sofridas em virtude da conduta adoptada pelas Rés e ainda os juros legais vencidos e vincendos, contados desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
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Em abono da sua pretensão e de forma sintética, a Autora alega que mantém relações comerciais e contactos com as Rés, actuando a primeira Ré como representante da segunda Ré, que celebrou um contrato de produtor, cumprindo as obrigações de aquisição de plantas e produção de framboesas, as quais entregou a estas para comercialização, propondo o pagamento de um preço que não é adequado, por ser abaixo dos custos de produção. Além disso, não foi assegurada a compra de toda a produção que deveria ser produzida em cada ano de colheita.
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Na contestação apresentada, as Rés invocaram a excepção de incompetência internacional dos Tribunais Portugueses por violação do pacto atributivo de jurisdição constante do contrato celebrado com a Autora, a ineptidão da petição inicial por falta de alegação de factos que fundamentem a condenação da primeira Ré e a ilegitimidade da primeira Ré por não ser parte no contrato em discussão. Complementarmente, foram impugnados na sua globalidade os factos alegados.
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A Autora pronunciou-se pela improcedência das exceções dilatórias invocadas.
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B – Acção Apensa:
Foi determinada a apensação da acção registada sob o nº 450/18.6T8FAR intentada por “(…), Lda.” contra as rés “(…) Portugal – Produção e Comercialização de Frutas, Unipessoal, Lda.” e “(…) Of Europe B.V.”.
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A Autora deduziu os seguintes pedidos:
a) seja determinado, em valor que nunca poderá ser inferior aos custos de produção acrescidos da margem de comercialização da Autora, o preço (purchase price) do kg de framboesa referente à colheita 2016/2017 que deverá ser pago à autora pelo fornecimento de frutos às rés, devendo o mesmo fixar-se no valor de 8,95 €/kg;
b) sejam as Rés condenadas solidariamente a pagar à Autora o valor correspondente ao preço ainda em falta, o qual se computa na quantia de € 76.241,47;
c) subsidiariamente em relação a b), e caso se venha a entender que o preço deverá ser determinado de acordo com o estabelecido na cláusula 9, desconsiderando os custos de produção da Autora e a sua margem de comercialização, requer-se que seja declarada a nulidade desta cláusula devendo, em consequência, o Tribunal proceder à determinação do preço conforme peticionado em a), devendo as Rés ser condenadas no pagamento à Autora da quantia de € 76.241,47 a título de preço ainda em falta;
d) subsidiariamente em relação a c), e caso se venha a entender que o instituto da redução previsto no artigo 292º do Código Civil não opera em relação à nulidade declarada, devem as Rés ser solidariamente condenadas a pagar à Autora o montante de € 76.241,47 a título de ressarcimento pelos danos sofridos;
e) cumulativamente, sejam as Rés solidariamente condenadas a pagar à Autora a quantia de € 5.716,00 a título de encargos financeiros que teve de suportar em virtude da falta de pagamento do preço devido por parte das Rés, bem como a quantia de € 1.639,15 a título de indemnização por perdas sofridas em virtude da conduta adotada pelas Rés e ainda os juros legais vencidos e vincendos, contados desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
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Os fundamentos da pretensão são idênticos aos invocados na outra acção proposta.
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As Rés apresentam contestação, excepcionando nos mesmos termos. E o contraditório por parte da Autora foi exercido essencialmente em sentido idêntico ao dos presentes autos.
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Realizou-se audiência prévia, no âmbito da qual foi discutida a matéria de facto e de direito alegada nos articulados e as partes notificadas para se pronunciarem acerca do mérito da causa.
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Foi proferido saneador sentença que:
a) julgou procedente a excepção dilatória de incompetência absoluta, e, em consequência, absolveu a Ré “(…) Of Europe B.V.” da instância relativa aos pedidos formulados pelas Autoras.
b) julgou improcedente a excepção dilatória de nulidade, por ineptidão da petição inicial.
c) julgou improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade passiva arguida.
d) julgou improcedentes as acções intentadas por “(…) Berrys, Lda.” e “(…), Lda.” contra a Ré “(…) Portugal – Produção e Comercialização de Frutas, Unipessoal, Lda.”, absolvendo-a dos pedidos.
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As recorrentes não se conformaram com a referida decisão e na peça de recurso apresentaram as seguintes conclusões:
«1. Vem o presente recurso de apelação interposto das seguintes duas decisões proferidas pelo Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central Cível de Faro – Juiz 3:
a. Por todo o exposto, ao abrigo das citadas disposições legais, julgo procedente, por provada, a exceção dilatória de incompetência absoluta e, em consequência, absolvo a Ré (…) Of Europe B.V. da instância relativa aos pedidos formuladores pelas autoras.
b. Pelo exposto, ao abrigo dos citados preceitos legais, julgo as ações intentadas por (…) Berrys, Lda. e (…), Lda. contra a Ré (…) Portugal – Produção e Comercialização de Frutas, Unipessoal, Lda. improcedentes, por não provadas e, em consequência, absolvo esta ré dos pedidos.
2. A douta decisão atinente à exceção dilatória de incompetência absoluta merece, em nossa opinião, censura, na medida em que apresenta vícios geradores da respetiva nulidade, assim como não faz uma correta aplicação do Direito, pelo que deverá ser declarada nula ou, caso assim não se entenda, anulada e substituída por outra que declare o Tribunal a quo internacionalmente competente para o julgamento da presente lide, ordenando o prosseguimento dos autos.
3. No que ao saneador-sentença sob recurso diz respeito, salvo melhor opinião, entendem as Recorrentes que o mesmo foi inoportunamente proferido, apresenta vícios geradores da respectiva nulidade e, bem assim, enferma de erros atinentes à sua fundamentação de facto e não faz uma correta aplicação do Direito, pelo que deverá ser declarado nulo, os presentes autos prosseguirem os seus termos ou, caso assim não se entenda, alterado por uma decisão que julgue a presente ação totalmente procedente.
4. Foram propostas duas ações por cada uma das Autoras contra as duas Rés: i) (…) Portugal – Produção e Comercialização de Frutas, Unipessoal, Lda. (“1.ª Ré”); e ii) (…) of Europe B.V. (“2.ª Ré”), não obstante o Tribunal de 1.ª instância julgou verificada a exceção dilatória de incompetência absoluta do mesmo para conhecimento do pedido relativamente à 2.ª Ré, despacho, este, sobre o qual as Autoras vêm interpor o competente recurso de apelação.
5. O Tribunal de 1.ª instância entendeu não dever aguardar pelo trânsito em julgado da decisão sobre a exceção de incompetência internacional em apreço, tendo seguidamente proferido decisão de mérito sobre a matéria ainda em discussão nos autos, a saber, a responsabilidade da 1.ª Ré pelos prejuízos peticionados pelas Autoras.
6. Precisamente por ser convicção das Recorrentes estarmos perante um litisconsórcio necessário passivo por natureza, ambas as decisões referidas são o objeto do presente recurso de apelação.
D.1. Conclusões do recurso de apelação da decisão de incompetência absoluta:
Salvo melhor entendimento, é plena convicção das Recorrentes que a decisão de incompetência absoluta a quo padece de nulidade, nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, alíneas b) e d), do C.P.C., aplicável ex vi art. 613.º, n.º 3 do C.P.C., porquanto a mesma não especifica os fundamentos de facto que justificam a decisão.
8. Percorrido o despacho sob recurso, não obstante o mesmo espraiar uma diversidade de considerandos jurídicos, do mesmo não constam especificados os fundamentos de facto que justificam a decisão proferida.
9. Por outro lado, cada uma das Autoras apresentou uma petição inicial com 252 artigos, com factos essenciais e cujo julgamento era imprescindível para a justeza da resolução da presente lide. Entre eles, os constantes dos artigos 15 a 20 da petição inicial.
10. Do supra alegado na petição inicial (e ao longo de toda a exposição efetuada), as Autoras não distinguiram as Rés, por entender que a relação jurídica que estabeleceram é com ambas e é dessa relação jurídica plural que emerge o direito que vieram reclamar nestes autos.
Tal é refletido coerentemente no pedido de condenação solidária efetuado a final, contra ambas as Rés, conforme se extrai da parte final da Petição Inicial.
11. Nestes termos, salvo melhor opinião, para que se pudesse aferir da competência internacional dos tribunais portugueses, o Tribunal a quo deveria ter julgado (dar como provada ou não provada) a factualidade referida, pois dela resulta a relação jurídica substancial plural que serve de causa de pedir à ação e que é o critério base e essencial para aferição da competência, o que não sucedeu.
12. Não obstante, em ponto algum, analisado o conteúdo da decisão sob recurso é materializado o entendimento do julgador sobre esta questão que lhe foi colocada para apreciação pelas Recorrentes. A decisão é, nesta parte, silenciosa.
13. Isto posto, o despacho sob recurso, por falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão e, bem assim, omissão de pronúncia, enferma de nulidade, nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, alíneas b) e d), do C.P.C.
14. Por outro lado, por se tratar de uma única e una relação contratual, com pluralidade de partes, estamos perante um litisconsórcio passivo.
15. São, pois, cada uma das Autoras e as duas Rés as partes legítimas para a presente lide, nos termos do art. 30.º-3 do CPC.
16. No caso vertente, estamos perante um litisconsórcio necessário passivo, por natureza, na medida em que o efeito jurídico pretendido pelas Autoras não pode ser produzido, a não ser que ambas as Rés estejam na mesma lide, dada a conexão substancial existente.
17. Ora, a natureza intrincada do negócio jurídico que serve de base à presente lide e que constitui a causa de pedir da mesma torna imperativa a intervenção de ambas as Rés, como partes na mesma lide, não podendo produzir-se o seu efeito útil, se uma Ré for julgada num tribunal de um país e a outra Ré for julgada no tribunal de outro,
18. Resultado que seria inevitável, caso viesse a ser confirmada a incompetência internacional dos Tribunais portugueses, na base de um pacto privativo de jurisdição, ao qual não está submetido uma das Rés.
19. O acordo escrito celebrado entre cada uma das Autoras e a 2.ª Ré, que foi junto sob o Doc. n.º 13 da PI, é apenas uma parte da relação jurídica complexa e unitária que se estabeleceu entre cada uma das Autoras e as duas Rés, integrando a mesma.
20. O seu papel é meramente probatório e indiciador de uma parte das obrigações que as partes entre si estabeleceram, mas está longe de encerrar o conteúdo integral da relação contratual estabelecida entre as partes desta lide, o qual é muito mais abrangente.
21. Ora, a 1.ª Ré (… Portugal) não é parte nesses contratos, mas é parte nesta lide e na relação contratual a que se referem as causas de pedir.
22. A cláusula atributiva de jurisdição invocada não pode prevalecer em qualquer circunstância sobre normas imperativas, nomeadamente sobre o disposto nos arts. 33.º, 2 e 3, do CPC, como aliás decorre do seu teor literal.
23. E, acrescente-se, nem sequer pode uma tal cláusula, furtar-se à aplicação do regime das cláusulas contratuais gerais, dado que – conforme foi alegado oportunamente – a mesma decorreu de um contrato standard, não negociado, entre as Autoras e a 2.ª Ré, sem que o livre consentimento e consciência de sujeição a um tribunal e lei estrangeiros tivessem sido entendidos e compreendidos na sua plenitude pelas Autoras, no momento em que subscreveram os mesmos.
24. Assim, pelo exposto, temos que concluir que o Tribunal a quo não aplicou corretamente os arts. 59.º, 62.º, 63.º, 94.º do C.P.C. e o art. 25.º-1 do Regulamento n.º 1215/2012.
25. Com a decisão proferida, o Tribunal a quo violou o art. 38.º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, os arts. 30.º-3, 33.º-2 e 3 do CPC e a alínea c) do art. 62.º do CPC.
26. Por todo o exposto, resulta que competia concluir pela competência internacional dos tribunais portugueses, ou caso assim não se entendesse, competia relegar essa decisão para momento posterior à produção de prova sobre a factualidade alegada, nomeadamente de 15 a 20 da Petição Inicial (da qual resultasse a aferição dos contornos da relação contratual una e complexa que se estabeleceu entre as Autoras e as Rés).
27. Se assim não fosse, cremos estar perante uma errada interpretação dos normativos invocados na fundamentação da decisão, nomeadamente arts. 59.º, 62.º, 63.º, 94.º do C.P.C. e o art. 25.º-1 do Regulamento n.º 1215/2012, que origina uma inconstitucionalidade das normas aí vertidas, por violação do preceituado nos nºs 1 e 4 do art. 20.º e n.º 2 do art. 18.º da Constituição da República Portuguesa.

D.1. Conclusões do recurso de apelação do saneador-sentença:
28. As Autoras entendem que a sentença sob recurso é nula, porquanto, salvo melhor opinião, é violadora do disposto no art. 615.º, n.º 1, alíneas b), c) e d), do C.P.C., pelo que deverá a mesma ser anulada pelo presente Tribunal.
28.1. No que aos factos não provados diz respeito, o tribunal a quo não se pronunciou, quer declarando quais os factos não provados, quer, subsequentemente, indicando a razão de ser para o seu julgamento como não provados, o que, desde logo, contende com o seu direito de recorrer ao abrigo do disposto no art. 640.º do C.P.C., razão pela qual, nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, alíneas b), c) e d), do C.P.C., o saneador-sentença sob recurso é nulo.
28.2. Na eventualidade de com a referência pelo tribunal de 1.ª instância os demais factos alegados nos articulados não revestem utilidade tendo presente que se reportam a factos que, provados ou não, não iriam alterar a decisão a proferir, este ter pretendido dar cumprimento aos deveres nesta subsecção descritos e a que estava obrigado, sempre se dirá que a mesma é complexa, obscura e não permite compreender os factos que a sentença considerou não provados, contendendo, de igual modo, com direitos adjetivos e constitucionais das Recorrentes, pelo que, também neste cenário, o saneador-sentença padece das nulidades acima referenciadas.
28.3. Sem prescindir, o Tribunal de 1.ª instância inicia a fundamentação do saneador sentença em apreço, dando como provados 5 factos, sendo que as Autoras apresentam, petições iniciais com cerca de 252 artigos, com factos essenciais e cujo julgamento era imprescindível para a justeza da resolução da presente lide, designadamente os atinentes ao tema da natureza e configuração da relação de que procedem os presentes autos, que comportava um subtema prévio e de particular importância para todo este processo – o relativo aos sujeitos que fazem parte da relação jurídica em discussão.
28.4. Quanto a esta matéria – premissa essencial para a formação do silogismo do julgador – o saneador-sentença não se pronuncia, ignorando a relação que lhe foi trazida pelas Autoras para conhecimento do julgador, em ponto algum, analisado o conteúdo da decisão da matéria de facto do saneador-sentença é materializado o entendimento do julgador sobre esta questão que lhe foi colocada para apreciação pelas Recorrentes. O saneador-sentença é, nesta parte, silencioso.
28.5. É precisamente devido a esta ausência de decisão que a decisão sob recurso se afigura uma decisão parcial, desencontrada das causas de pedir formuladas pelas Autoras – o Tribunal não tomou nenhuma decisão quanto às partes da relação subjacente aos presentes autos, a qual constitui questão que devia ter sido apreciada por, desde logo, conflituar com a procedência do próprio pedido de condenação formulado pelas Autoras.
28.6. O Tribunal a quo não se pronuncia sobre a existência de uma relação contratual na forma verbal e que supera o contrato escrito celebrado entre cada uma das Autoras e a 2.ª Ré e – note-se – esta questão não se reporta a uma razão ou argumento, reporta-se, isso sim, ao objeto do processo, definido pelos pedidos deduzidos e respetivas causas de pedir formuladas pelas Autoras – a uma questão que integra matéria decisória e ponto de facto de importância crucial no quadro do litígio, concernente ao pedido e à causa de pedir, razões pelas quais, nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1, alíneas b), c) e d), do C.P.C., o saneador-sentença sob recurso é nulo.
28.7. Sem prescindir, resulta de modo explícito, dos factos jurídicos concretos, de natureza essencial e instrumental, alegados na petição inicial que os direitos de que a Autora é titular assentam numa relação contratual complexa, por existente entre cada uma das Autoras, de um lado, e ambas as Rés, de outro lado.
28.8. As proposições em que o tribunal assenta a sua sentença – em síntese, a de que as Autoras fundamentam a sua pretensão no contrato escrito – revelam-se, portanto, manifestamente incorretas.
28.9. Mas revelam-se, ademais, absolutamente antagónicas a algumas partes da sentença, impedindo um declaratário normal de retirar um sentido unívoco da mesma.
28.10. Acresce que, o Tribunal a quo refere que as autoras não alegam que a Ré (…) Portugal tenha celebrado os contratos donde emerge a obrigação de pagamento do preço (…). Ou seja, nem explícita ou implicitamente, as autoras demandam a Ré (…) Portugal por ser parte nesses contratos, donde emerge a obrigação em discussão. E, bem assim, que (…) não é convocado qualquer outro instituto jurídico do qual resulte a responsabilidade da primeira ré. Por último, o que vale por dizer que as autoras nunca invocam que esta ré tenha negociado ou celebrado, em nome próprio ou por conta de outrem, qualquer contrato (…).
28.11. Todavia, a causa de pedir dos presentes autos assenta nos contratos celebrados entre as Autoras e as Rés e resulta do documento n.º 10 junto com a contestação que a 1.ª Ré recebe parte do preço pago pelas Autoras no âmbito do contrato em apreço.
28.12. Razões pelas quais, é entendimento das Recorrentes que a decisão enferma de nulidade, por violação do preceituado no art. 615.º, n.º 1, alínea c), do C.P.C.
29. Sem prescindir, sem prejuízo da explanação ulterior, salvo melhor entendimento, é plena convicção das Autoras não se verificarem os pressupostos necessários à legitimação do proferimento do saneador-sentença.
29.1. O Tribunal de 1.ª instância, em manifesta violação do dever de pronúncia a que se encontra adstrito, não se pronunciou quanto a quem entende terem sido as contrapartes das Autoras nas relações apresentadas para apreciação, fundamentando a sua decisão apenas no acordo das partes, em três documentos e no contrato escrito, sendo que, transcorrido o conteúdo do saneador-sentença, a verdade é que o Tribunal de 1.ª instância também não refere os concretos meios probatórios que conduziram à não inclusão de determinados factos na matéria de facto provada.
29.2. Considerando o Tribunal de Faro não estar munido dos elementos necessários para o apuramento das efetivas partes da relação comercial em apreço, sempre deveria ter ordenado o prosseguimento dos autos para a fase de instrução. Decisão, esta, de igual pertinência para i) aferição dos pressupostos de responsabilidade civil – instituto invocado pelas Autoras em sede de causa de pedir e que conforma os pedidos deduzidos pelas Autoras; e ii) em caso de aplicação do regime da conjunção, o apuramento do preço em falta ou, subsidiariamente, do quantum indemnizatório devido por cada uma das Rés a cada uma das Autoras.
29.3. Não obstante, não foi dada oportunidade às Recorrentes para demonstrar estes dois factos em sede de audiência de discussão e julgamento.
29.4. Os presentes autos reportam-se a articulados de elevada dimensão e complexidade e que, à data do saneador-sentença, contavam já com cerca de 45 documentos incidentes sobre matéria de facto alegada por ambas as partes. A maioria destes documentos correspondem a documentos elaborados e comunicações subscritas pelas partes, que invariavelmente, em sede de audiência e julgamento, seriam objeto de análise e confronto para apuramento do correto conteúdo e, deste modo, detalhadamente descortinar a configuração e o conteúdo da relação trazida ao tribunal a quo para apreciação e, bem assim, aferição dos correspondentes pressupostos da responsabilidade civil e cálculo da responsabilidade imputável a cada uma das Rés.
29.5. As próprias Rés, após pronúncia das Autoras sobre os documentos juntos com a contestação, sentem a necessidade de ampliar o rol de testemunhas que faz parte do requerimento probatório apresentado no momento da contestação.
29.6. Tivessem os presentes autos prosseguido para a fase de instrução, que esta invariavelmente passaria, nomeadamente, pelos seguintes pontos: i) o apuramento da natureza, da configuração e do conteúdo (isto é, direitos e obrigações assumidos por cada uma das partes) da relação que serve de causa de pedir aos presentes autos; ii) o apuramento de um eventual incumprimento contratual, do eventual valor em dívida para com as Autoras ou, subsidiariamente, dos danos sofridos pelas Autoras e, por último, a aferição do nexo de causalidade entre o incumprimento contratual e estes valores; e iii) o apuramento do conteúdo da relação existente entre a 1.ª Ré e a 2.ª Ré.
29.7. No entendimento das Recorrentes, é precisamente a ausência da realização da audiência de discussão e julgamento que conduz o Tribunal a quo a fazer partir a sentença sob recurso de duas premissas erradas: i) que a representação a que as Recorrentes se referem nas suas petições iniciais se reporta a uma representação em sentido jurídico; e ii) que a 1.ª Ré não era parte da relação contratual em apreço, cingindo-se esta ao contrato escrito celebrado entre cada uma das Autoras e a 2.ª Ré.
29.8. A prematuridade da sentença sob recurso também resulta das conclusões flagrantemente erradas que o Tribunal a quo faz constar do conteúdo da sua decisão, designadamente que as Autoras não tenham alegado que a 1.ª Ré não interveio nos respetivos contratos.
29.9. Tudo sopesado – os factos essenciais que não foram objeto de prova, as contradições, ambiguidades e obscuridades constantes do conteúdo da sentença, a insuficiente matéria dada como provada, as ínfimas provas tidas em consideração para a decisão (não obstante a imensa prova já produzida), a omissão de pronúncia sobre questões fundamentais, a falta de fundamentação, a desconsideração de prova produzida e que atesta em sentido contrário as afirmações feitas pelo tribunal a quo, bem como as erradas e falsas premissas – levam as Recorrentes a crer que o presente saneador sentença não deveria ter sido proferido, pelo que, não se verificando os requisitos a que alude o art. 595.º, n.º 1, alínea b), do C.P.C., deverá ser anulado.
30. Sem prescindir, é entendimento das Recorrentes constarem do processo concretos meios probatórios que impunham decisão diversa relativamente aos fundamentos do saneador sentença sob recurso – arts. 640.º, n.º 1 e 662.º, n.º 1, do C.P.C. – até porque os contratos escritos constantes do ponto 5) não esgota, de facto, toda a relação jurídica vigente entre as partes e, no caso de o tribunal a quo assim ter raciocinado, tomando a parte pelo todo, então estamos perante uma proposição absolutamente errada que condicionou a validade de toda a argumentação.
31. Conquanto a impossibilidade de compreensão dos factos que a sentença considerou não provados, por diligência de patrocínio, considerar-se-á que o tribunal julgou não provado o facto relativo à relação contratual em apreço extravasar o contrato escrito, tratando-se de uma relação complexa, no âmbito da qual são partes cada uma das Autoras, por um lado, e as Rés, por outro lado e, bem assim, a responsabilidade da 1.ª Ré nos termos peticionados pelas Autoras, ainda que ao abrigo do regime da conjunção.
32. As Autoras, ao longo de todo o seu petitório, e demais peças processuais, não distinguem as Rés entre si – e as Rés assim o confessam –, pois é sua plena convicção (e os meios probatórios produzidos até à data do proferimento do saneador-sentença precisamente isso atestam) que na relação contratual que vigorou eram suas contrapartes outras duas empresas – as duas Rés. Daí, aliás, terem elaborado um pedido de condenação solidário contra ambas as Rés.
33. É, de facto, entendimento das Recorrentes que o resultado a que o tribunal a quo deveria ter chegado após análise crítica, minuciosa e criteriosa de toda a prova já produzida nos autos, deveria ter sido o de dar por provado que as contrapartes das Recorrentes eram as duas Rés, e, em consequência, condenar a 1.ª Ré nos termos peticionados, tendo em consideração os seguintes elementos probatórios:
33.1. Documento n.º 6 da contestação das Rés;
33.2. Documento n.º 7 da contestação das Rés;
33.3. Confissão das Rés, nos artigos 188 e 189 da contestação;
33.4. Documento n.º 8 da contestação das Rés;
33.5. Documento n.º 9 da contestação das Rés;
33.6. Documento n.º 10 da contestação das Rés;
33.7. Documento n.º 11 da contestação das Rés;
33.8. Confissão das Rés, nos artigos 436 a 438 da contestação.
33.9. Documento n.º 5 junto com a petição inicial;
33.10. Documento n.º 7 junto com a petição inicial;
33.11. Documento n.º 10 junto com a petição inicial;
34. Tudo sopesado – a conjugação da prova já produzida nos presentes autos aquando do proferimento do saneador-sentença, mormente os documentos 7 a 11 juntos com a contestação, as confissões das Rés e os documentos 5, 7 e 10 juntos com a petição inicial, e a respetiva análise crítica e meticulosa – dúvidas não subsistem que a relação contratual efetiva (não escrita) que unia as partes era estabelecida entre as Autoras, por um lado, e as 1.ª e 2.ª Rés por outro, razões pelas quais deveria o tribunal a quo ter dado como provada a existência de uma relação contratual complexa, que envolvia, de um lado, as Autoras, e do outro, ambas as Rés, relação esta, em termos subjetivos e objetivos, apenas parcialmente reduzida a escrito aquando da celebração do acordo escrito entre cada uma das Autoras e a 2.ª Ré e, em consequência, ter condenado a 1.ª Ré nos termos peticionados pelas Autoras ou, subsidiariamente, ao abrigo do regime da conjunção.
35. Não obstante, na eventualidade de o tribunal ad quem considerar que não constam do processo todos os elementos que, nos termos do art. 662.º, n.º 1 do C.P.C., permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto e caso repute deficiente a decisão do tribunal a quo, deverá ao abrigo do disposto no art. 662.º, n.º 2, alínea c) anular a decisão proferida na 1.ª instância, com as consequências legais previstas no n.º 3 do mesmo artigo.
Deverá decidir do mesmo modo caso seja entendimento do tribunal ad quem ser indispensável a ampliação da matéria de facto.
36. Sem prescindir, transcorrido o conteúdo da decisão sob recurso são múltiplas as partes em que o Tribunal de 1.ª instância se ancora no artigo 18 da petição inicial, ademais descontextualizando-o – Muito embora seja a 2.ª Ré a detentora dos direitos de propriedade intelectual das plantas que são vendidas à Autora, todo o processo operacional e negocial respeitante ao território português – onde se integra a Autora – é conduzido e coordenado por ambas as Rés, atuando a 1.ª Ré enquanto verdadeira representante da 2.ª Ré para o território nacional –, não obstante o Tribunal a quo não ter dado como provado que a 1.ª Ré atuava enquanto verdadeira representante ou auxiliar da 2.ª Ré para o território nacional.
37. Sucede que, no âmbito de relação contratual em apreço, cada uma das Rés era titular de uma vontade negocial própria, não se encontrando a 1.ª Ré numa situação de ausência de escolha e circunscrição de funções.
38. Da análise da prova já produzida no momento do proferimento do saneador sentença, é extraível que desde a fase pré-contratual, passando pela vigência e terminando no momento da cessação da relação, a 1.ª Ré, tal qual a 2.ª Ré, foi titular de uma vontade negocial, exprimindo declarações negociais, desde a fase pré-contratual até à cessação da relação comercial, e, consequentemente, também titular de direitos e deveres próprios, não se cingindo a receber ordens da 2.ª Ré.
39. A título exemplificativo, atente-se que: por referência a um tema central num contrato de compra e venda como o em apreço – as comissões –, resulta do documento n.º 10 junto com a contestação que as mesmas, correspondentes a 18%, eram repartidas entre as 1.ª e 2.ª Rés. Isto é, a comissão contratualmente estabelecida entre as partes era paga pelas Autoras a ambas as Rés, o que, por si só, revela um interesse direto da 1.ª Ré inconfundível com uma mera pessoa responsável perante a 2.ª Ré.
40. No presente caso, a 1.ª Ré atua em nome próprio, com vista a produzir efeitos na sua esfera jurídica – até porque recebe um preço pago pelas Autoras. E, em consequência, perante todo o exposto, também não é como auxiliar que a 1.ª Ré atua – a 2.ª Ré não recorreu à 1.ª Ré com vista à execução das prestações a que estava obrigada. A 1.ª Ré pratica os atos inerentes ao seu objeto social, na prossecução dos seus fins, de modo absolutamente independente e autónomo de qualquer outra entidade.
41. Tudo sopesado, é convicção das Recorrentes que o tribunal a quo errou quando determinou o art. 800.º, n.º 1, do Código Civil como norma aplicável à factualidade em apreço, devendo ter sido aplicados os art. 798.º e 799.º com a consequente condenação nos termos peticionados pelas Autoras (art. 639.º, n.º 2, alínea c), do C.P.C.).
42. Sem prescindir, as Autoras não distinguiram as Rés, precisamente por ser seu entendimento que a relação jurídica que estabeleceram foi com ambas e que é de tal relação jurídica plural do lado passivo que emergem os direitos reclamados nestes autos. É, por isto, que, a final, apresentam ao tribunal de Faro um pedido de condenação solidária contra ambas as Rés.
43. Não obstante, o julgador não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – art. 5.º, n.º 3, do C.P.C. É convicção das Recorrentes que o Tribunal a quo errou em sede de aplicação do art. 513.º do C.C., devendo ter atendido à parte de que a solidariedade poderá ter fonte legal e, em consequência, serem aplicados, quer o art. 100.º do Código Comercial, quer o art. 497.º do C.C. ou, caso assim não entendesse, o art. 513.º do C.C. a contrario, aplicando aos presentes autos o regime da conjunção, sem prejuízo de recurso ao art. 609.º, n.º 2, do C.P.C (art. 639.º, n.º 2, alíneas a) a c), do C.P.C.).
Termos em que se requer:
A. Quanto à decisão de incompetência absoluta:
A.1. Seja declarada nula, por violação do disposto no artigo 615º, nº 1, alíneas b) e/ou d), do C.P.C.;
A.2. Caso assim não se entenda, seja anulada em conformidade com o propugnado nos demais fundamentos do recurso e nas conclusões.
B. Quanto ao saneador sentença:
B.1. Seja declarado nulo, por violação do disposto no artigo 615.º, nº 1, alíneas b) e/ou c) e/ou d), do C.P.C.;
B.2. Seja declarado nulo, por prematuro, seguindo os presentes autos os ulteriores termos processuais;
B.3. Caso assim não se entenda, seja revogado e alterado o mesmo em conformidade com o propugnado na alegação e nas conclusões,
Assim fazendo V. Exªs Venerandos Desembargadores Justiça».
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“(…) Portugal – Produção e Comercialização de Frutas, Unipessoal, Lda.” e “(…) of Europe, BV” alegaram, dizendo, em resumo, que os recursos deverão ser julgados totalmente improcedentes, por infundados. *
Admitido o recurso, foram observados os vistos legais.
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II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do mesmo diploma).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação de existência de:
1) nulidades processuais previstas nas alíneas b), c) e d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
2) erro na apreciação da questão da incompetência absoluta do Tribunal.
3) erro na aplicação do direito.
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III – Matéria de facto:
3.1 – Factos provados:
Mostram-se assentes, por acordo das partes e documentos, os seguintes factos:
1 – A Autora “(…) Berry, Lda.” é uma sociedade comercial por quotas, cujo objecto social consiste na produção de pequenos frutos vermelhos e na produção e comercialização agrícola em geral, projectos de desenvolvimento e experimentação em ciências agrárias, nomeadamente em novas tecnologias hortofrutícolas, de controlo climatérico e de nutrição vegetal – cf. doc. de fls. 43/48, cujo teor se dá por reproduzido.
2 – A Autora “(…), Lda.” é uma sociedade comercial por quotas, cujo objecto social consiste na produção de pequenos frutos vermelhos e na produção e comercialização agrícola em geral, projectos de desenvolvimento e experimentação em ciências agrárias, nomeadamente em novas tecnologias hortofrutícolas, de controlo climatérico e de nutrição vegetal – cfr. doc. de fls. 43/48, da acção apensa, cujo teor se dá por reproduzido.
3 – A Ré “(…) Portugal – Produção e Comercialização de Frutas, Unipessoal, Lda.” é uma sociedade comercial, cujo objecto social consiste na produção e comercialização de frutas, com sede social em (…), concelho de Beja, com capital social detido a 100% pela sociedade comercial norte-americana “(…) Internacional Inc.” – cfr. doc. de fls. 114/120, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
4 – A Ré “(…) Of Europe B.V.” é uma sociedade comercial de direito holandês, inscrita no RNPC sob o n.º (…), com sede em (…) 26, 4817 HX (…), Holanda, a qual detém o direito de conceder sublicenças para plantar, colher e comercializar frutos vermelhos, com a marca (…), marca essa que é detida por uma outra sociedade de direito holandês denominada “(…) Global Holdings C.V.”, com domicílio nas Ilhas Cayman, em (…) Cayman Island, 190 (…) Avenue, George Town, Grand Cayman KY1-9005.
5 – A Autora “(…) Berry, Lda.” e a Autora “(…), Lda.” e a “(…) Of Europe B.V.” celebraram, respectivamente, em 01/02/2015 e 01/09/2014, acordos escritos denominados “(…) Agreement 2015” relativo à produção e comercialização de frutos vermelhos, tal como resulta de fls. 173/231 destes autos e de fls. 172/223 dos autos apensos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
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IV – Fundamentação:
4.1 – Nulidade por falta de fundamentação:
As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas (artigo 154º, nº 1, do Código de Processo Civil, como corolário da injunção constitucional precipitada no artigo 205º da Constituição da República Portuguesa).
É nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (artigo 615º, nº 1, al. b), do Código de Processo Civil).
Seguindo em absoluto a lição de Alberto dos Reis, «há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou a mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto»[1]. No mesmo sentido se posicionam Antunes Varela[2] e Lebre de Freitas[3].
A falta de fundamentação só é causa de nulidade quando for absoluta e «o dever de fundamentação da sentença final não se confunde com o dever de motivação previsto no artigo 653º, nº 2, do Código de Processo Civil» (versão anterior do CPC) (a que corresponde actualmente o artigo 607º)[4].
Efectivamente, relativamente aos factos provados, os mesmos mostram-se motivados. Os restantes não foram julgados provados nem não demonstrados, dado que o Tribunal considerou que poderia conhecer imediatamente do mérito da causa, sem necessidade de mais provas. E, neste contexto, por não ter sido produzida prova sobre o restante acervo factual, o Tribunal «a quo» não estava vinculado nem a fundamentar positiva ou negativamente a restante factualidade não considerada nem se encontrava jungido a discriminar os remanescentes factos não apontados como relevantes para o juízo formulado.
Esta operação de integração não corresponde a uma nulidade processual, antes se situa no domínio da verificação dos requisitos para promover uma decisão antecipada em sede de despacho saneador.
No caso em apreço, estão devidamente especificados os fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão recorrida, inexistindo assim, sem cuidar da bondade e validade dos mesmos, uma situação de falta absoluta de fundamentação.
Questão diversa é se aquilo que consta do corpo decisório representa a solução jurídica adequada ao caso concreto. Porém, essa operação de subsunção e de integração jurídica fica reservada para o local próprio. Em face do exposto, julga-se improcedente a invocada nulidade.
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4.2 – Nulidade por ambiguidade, obscuridade ou ininteligibilidade:
É nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível (artigo 615º, nº 1, al. c), do Código de Processo Civil).
A este propósito, Alberto dos Reis refere «dois tipos de sentença viciada: a sentença injusta e a sentença nula. A primeira enferma de erro de julgamento; a segunda enferma de erro de actividade (erro de construção ou formação»[5].
Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica: se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora de ineptidão da petição inicial[6].
Na concepção de Antunes Varela «não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro de construção do silogismo judiciário»[7].
Está sedimentada na doutrina e na jurisprudência a ideia de que esta nulidade se verifica quando existe um vício real no raciocínio do julgador, na medida em que a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue direcção distinta.
A nossa lei impõe que o silogismo da decisão se ache correctamente estruturado por forma a que a conclusão extraída corresponda às premissas de que ele emerge e a desconformidade não está no conteúdo destas, mas no processo lógico desenvolvido. E essa oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta, pois quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento. Se, ao invés, ocorrer a assinalada desconformidade, a decisão é nula por contradição entre a fundamentação lavrada e o segmento decisório[8] [9].
Em síntese, a nulidade da sentença, por oposição entre os fundamentos e a decisão, só acontece quando aqueles conduzirem a uma decisão diferente. Analisada a estrutura da decisão e as conexões existentes entre os motivos de facto e de direito a que faz apelo e o veredicto final verifica-se que existe uma lógica na arquitectura da sentença e, dessa forma, a invocada nulidade não se verifica.
Aliás, no conjunto de factos, considerações e conclusões tiradas pelos recorrentes parece incontroverso que os mesmos não colocam em causa o erro de construção do silogismo judiciário mas antes se dirigem claramente à injustiça do decidido, embora tenham invocado a aludida nulidade.
Se a interpretação e a relevância que a sentença deu a certos factos e se a conclusão que deles se extraiu foram, ou não, as mais correctas, é questão que tem a ver com o mérito da decisão e com um eventual erro de julgamento, mas que não está associada à construção lógica da sentença, a qual se mostra correctamente formulada.
Assim sendo, também carece de fundamento a arguição efectuada ao abrigo do disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
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4.3 – Nulidade relativa à omissão ou excesso de pronúncia:
De acordo com a primeira parte da alínea d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, a sentença é nula, quando «o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».
Entende o recorrente que o Tribunal «a quo» violou a sobredita norma. Porém, a nulidade da decisão por omissão de pronúncia só acontece quando o acto decisório deixa de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra questão submetida à apreciação do Tribunal.
Questões submetidas à apreciação do Tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as excepções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio.
É a violação daquele dever que torna nula a decisão e tal consequência justifica-se plenamente, uma vez que a omissão de pronúncia se traduz, ao fim e ao cabo, em denegação de justiça e o excesso de pronúncia na violação do princípio dispositivo que contende com a liberdade e autonomia das partes.
Coisa diferente são as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, as quais correspondem a simples argumentos e não constituem questões na dimensão valorativa estipulada no artigo 615º, nº 1, al. d), do Código de Processo Civil.
Na esteira do preconizado por Alberto dos Reis há que não confundir questões suscitadas pelas partes com motivos ou argumentos por elas invocados para fazerem valer as suas pretensões. Na realidade, «são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o Tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão»[10].
Amâncio Ferreira evidencia que se trata da nulidade mais invocada nos Tribunais, «originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda»[11].
Deste modo, o julgador não tem que analisar e a apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições. Apenas tem que resolver as questões que por aquelas lhe tenham sido postas[12] [13].
É jurisprudência consolidada e absolutamente pacífica que não pode falar-se em omissão de pronúncia quando o Tribunal, ao apreciar a questão que lhe foi colocada, não toma em consideração qualquer argumento alegado pelas partes no sentido de procedência ou improcedência da acção. O que importa é que o julgador conheça de todas as questões que lhe foram colocadas, excepto aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras[14].
E na hipótese vertente existe uma identidade absoluta entre as pretensões deduzidas pelas partes e a matéria solucionada pelo Tribunal. E, por conseguinte, aquilo que se acabou de expressar é suficiente para concluir que não existe omissão ou excesso de pronúncia.
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4.4 – Das demais nulidades avulsas convocadas relativamente à omissão de factos e de fundamentação na decisão recorrida:
É entendimento doutrinal e jurisprudencial pacífico que, no preenchimento da esfera de abrangência do artigo 615º do Código de Processo Civil, na categoria de nulidades da sentença encontram-se tão só aspectos atinentes à estrutura ou aos limites da sentença e não ao respectivo conteúdo decisório.
Esta posição doutrinal está sustentada na lição Alberto dos Reis que parte da distinção entre erros de actividade e erros de juízo. Na perspectiva do Catedrático de Coimbra «o magistrado comete erro de juízo ou de julgamento quando decide mal a questão que lhe é submetida, ou porque interpreta e aplica erradamente a lei, ou porque aprecia erradamente os factos; comete erro de actividade quando, na elaboração da sentença, infringe as regras que disciplinam o exercício do seu poder jurisdicional. Os erros da primeira categoria da decisão, os da segunda categoria são de carácter formal: respeitam à forma ou ao modo como o juiz exerceu a sua actividade de julgador.
Assentemos, pois nisto: por vícios da sentença entende a lei os erros materiais e os erros formais, que se corrigem pelos meios facultados pelos artigos 667º e 669º[15]. Contrapõem-se aos erros substanciais, contra os quais se há-de reagir por via de recursos»[16]. Esta posição é partilhada por Antunes Varela[17] e encontra eco ainda na jurisprudência recente dos Tribunais Superiores.
Analisadas as referidas alegações de recurso e na respectiva concatenação com o enunciado do saneador-sentença recorrido não existe qualquer vício quanto à estrutura e limites do decidido ou qualquer contradição lógica na fundamentação da decisão agora impugnada por via recursal ou outro vício procedimental na elaboração do acórdão sub judice.
Aquilo que perpassa é que o recorrente confunde erros de actividade com eventuais erros de julgamento, lançando indevidamente mão da figura das causas de nulidade de sentença provisionadas no artigo 615º do Código de Processo Civil.
E tudo isto é suficiente para concluir que não existem as nulidades convocadas nos termos em que as mesmas figuras são passíveis de integrar a categoria suscitada.
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4.5 – Da incompetência absoluta:
4.5.1 – Da competência internacional dos Tribunais portugueses e dos pactos atributivos de jurisdição:
Os casos de incompetência absoluta estão provisionados no artigo 96º do Código de Processo Civil e o regime de arguição é previsto no artigo 97º do mesmo diploma e a Primeira Instância conclui pela procedência da invocada excepção dilatória de incompetência absoluta e, consequentemente, absolveu a ré “(…) Of Europe B.V.” da instância relativa aos pedidos formulados pelas Autoras.
A questão judicanda faz o cruzamento entre os pactos atributivos de jurisdição[18], a competência internacional dos Tribunais portugueses[19] [20] [21] – aferida por critérios de coincidência, casualidade ou necessidade –, a infracção das regras de competência em razão das regras de competência internacional e a existência de regulamentos europeus[22] e outros instrumentos internacionais subscritos pelo Estado nacional.
A competência internacional (dos Tribunais portugueses) é a fracção do poder jurisdicional atribuída a estes Tribunais portugueses, no seu conjunto, relativamente à fracção de poder jurisdicional atribuída, por leis nacionais estrangeiras ou tratados ou convenções internacionais, a Tribunais estrangeiros sempre que o litígio seja transfronteiriço, isto é, quando apresente elementos de conexão com ordens jurídicas estrangeiras[23].
Na realidade, a par das normas processuais internas, coexistem na ordem jurídica nacional normas de competência internacional directa emanadas de fontes normativas supranacionais ou de direito comunitário – os regulamentos comunitários –, as quais podem determinar a competência directa dos diferentes órgãos jurisdicionais dos Estados membros.
Para além das regras de competência estabelecidas nos artigos 62º, 63º e 94º do Código de Processo Civil, de acordo com José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, «os Tribunais portugueses recebem-na também de regulamentos europeus e outros instrumentos internacionais que, no seu campo específico de aplicação, prevalecem sobre as normais processuais portuguesas, nomeadamente sobre as normas reguladoras da competência internacional constantes do Código»[24].
Consabidamente, como está patenteado na decisão recorrida, ao abrigo do princípio da liberdade contratual, as partes podem convencionar, em matéria de competência internacional, mediante pacto ou convenção, a jurisdição com competência para dirimir um conflito que surja no âmbito da relação contratual que estabeleceram, seja numa perspectiva de atribuição[25] ou numa lógica de privação[26].
A designação convencional de jurisdição estrangeira, quando são legalmente os Tribunais portugueses, pode envolver a atribuição àquela de competência exclusiva, caso em que passará a ser a única competente para o conhecimento da causa, ou de mera competência alternativa (ou “concorrente” …), passando então a ser competente para a respectiva apreciação, além da jurisdição portuguesa, a jurisdição estrangeira designada[27].
Relativamente ao convocado Regulamento (UE) n.º1215/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, o mesmo tem aplicação no presente caso, atenta a matéria em causa e o momento da instauração da presente acção, tal resulta do enunciado normativo precipitado no artigo 25º[28] e no nº 1 do artigo 66.º[29]
Como densificação prática do comando impresso previsto no nº4 do artigo 8.º[30] da Constituição da República Portuguesa, a jurisprudência dos Tribunais Superiores[31] expressa o entendimento que as disposições do Regulamento (UE) n.º 1215, incluindo a do art.º 25.º, têm prioridade sobre as disposições do Código de Processo Civil.
Na situação judicanda, identificados os pedidos e a causa de pedir, face à natureza da relação comercial estabelecida e à localização das sedes das partes, pode observar-se que o litígio tem relação com várias ordens jurídicas, mormente a portuguesa e a holandesa.
Tendo em atenção a natureza plurilocalizada e transnacional dos sujeitos da relação jurídica, na leitura do acervo contratual junto aos autos, pode-se concluir que o denominado “(…) Agreement” convenciona que, ao abrigo da cláusula 21.4, os litígios decorrentes dos mesmos têm de ser dirimidos pelos Tribunais de (…), que corresponde ao local onde está instalada a sede da segunda Ré.
Com efeito, na estipulação contratual sub judice, pode ler-se que: «na medida em que seja permitido por normas imperativas, este Contrato deve ser regido e interpretado de acordo com a lei holandesa e as Partes atribuem jurisdição exclusiva aos tribunais holandeses competentes de (…). Sem prejuízo e em adição ao referido, as Partes acordam que a Doe terá o direito, a seu exclusivo critério, de solicitar aos tribunais do país do lugar do Imóvel a adoção das medidas e soluções que se afiguram adequadas ou necessárias para defender os seus direitos ao abrigo do presente e preparar ações judiciais, incluindo para pedir e obter o decretamento de providências cautelares, inspeções e averiguações, na medida em que se revele necessário para aferir da existência, extensão e âmbito de qualquer incumprimento contratual ou violação de direitos e segredos (incluindo, designadamente, com o fim de obter ou promover a apreensão física de bens ou materiais, aceder às Instalações e verificar as plantações do Produtor, os processos de crescimento, colheita, empacotamento, expedição e consumo, bem como a prestação de informações e documentação relevantes aos fornecedores, e a cadeias de venda, clientes ou distribuição), assim como providências cautelares ou medidas preventivas permitidas pelas leis do país do lugar do imóvel com vista a obter a imediata cessação da conduta lesiva».
Sem margem para qualquer reparo, o Julgador «a quo» entendeu que a cláusula 21.4 que faz parte integrante dos contratos celebrados entre as Autoras e a Ré “(…) Of Europe B.V.” e que o mesmo era válido por não estar afectado por qualquer vício e por respeitar a direitos disponíveis.
No desenvolvimento do itinerário discursivo, a Meritíssima Juíza de Direito certificou que a cláusula que atribui competência exclusiva aos Tribunais de (…) consta de um contrato escrito e adianta que «não resulta das normas de direito holandês juntas aos autos que tal pacto seja substantivamente nulo, pelo que se mostram cumpridos os requisitos exigidos pelo citado art.º 25.º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012». Por isso, manifestou posição que os litígios surgidos entre as Autoras e a ré “(…) Of Europe” e todas as questões relacionadas com os mesmos deveriam ser apreciadas nos Tribunais holandeses.
Neste enquadramento, as situações jurídicas plurilocalizadas, desde que transnacionais, podem ser objecto de pactos atributivos de jurisdição, nos termos do artigo 25.º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012[32] e na situação vertente estamos perante um pacto de competência exclusiva que retira a possibilidade decisória aos Tribunais nacionais relativamente às partes outorgante do pacto privativo de jurisdição.
Vejamos se essa decisão é acertada à luz do objecto do recurso, atendendo à argumentação apresentada pelas partes.
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Na concepção das recorrentes estamos perante «um litisconsórcio necessário passivo, por natureza, na medida em que o efeito jurídico pretendido pelas Autoras não pode ser produzido, a não ser que ambas as Rés estejam na mesma lide, dada a conexão substancial existente».
E, como tal, por força da disciplina estatuída nos nºs 2 e 3 do artigo 33º[33] do Código de Processo Civil, com referência ao artigo 35º[34] do mesmo diploma, na argumentação recursiva, as partes vencidas entendem que a invocada cláusula atributiva de jurisdição não pode prevalecer em qualquer circunstância sobre aquelas normas imperativas.
Em contraponto, na motivação dos recorridos, estes fazem a apologia da solução encontrada, sintetizando o raciocínio do julgador nas seguintes premissas:
«(i) Os Tribunais portugueses só podem conhecer de litígio emergente de uma relação transnacional quando forem internacionalmente competentes;
(ii) Os Tribunais portugueses podem perder ou receber competência internacional por efeito da aplicação de normas de regulamentos europeus, sendo que estas prevalecem sobre as normas processuais portuguesas (cfr. artigo 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa «CRP»).
(iii) O pacto atributivo de jurisdição constante da Cláusula 21.4. do Contrato cumpre com os requisitos exigidos pelo artigo 25.º do Regulamento (EU) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro (de ora em diante, “Regulamento Bruxelas I bis”);
(iv) Não tem que se aferir da validade do pacto atributivo de jurisdição à luz do direito interno português, ou seja, é irrelevante para decidir sobre a competência dos Tribunais portugueses uma eventual nulidade da referida cláusula ao abrigo do direito interno, maxime à luz do regime das cláusulas contratuais gerais (“RCCG”)».
Ao sublinharem que a primeira Ré não se vinculou a qualquer cumprimento relacionado com as obrigações decorrentes do Contrato, as recorridas defendem que não se está perante uma obrigação plural e que não é necessária a intervenção de ambas as Rés em juízo. Nesta medida, os pressupostos fácticos e jurídicos em que assenta a decisão são correctos e, por via disso, não existe motivo para revogar a decisão incidente sobre a competência absoluta.
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Com base nestas premissas fácticas e jurídicas, o Tribunal recorrido proferiu a decisão aqui em causa, julgando verificada a excepção dilatória da incompetência absoluta para conhecer do pedido relativamente à 2.ª Ré e, em consequência, absolveu-a da presente instância.
Na decomposição do recurso importa assim apurar duas realidades: (i) se estamos perante um litisconsórcio necessário, caso em que o pacto atributivo de jurisdição deve ceder em face da impossibilidade de decompor subjectivamente a situação jurídica em análise e (ii) se a norma aplicada é inconstitucional.
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4.5.2 – Do litisconsórcio necessário:
4.5.2.1 – Da distinção entre litisconsórcio necessário e voluntário:
A ilegitimidade constitui uma excepção dilatória, obstando a que o Tribunal conheça do mérito da causa e conduz à absolvição do réu da instância.
No presente espectro lógico-jurídico, não existe regra contratual que imponha o litisconsórcio necessário, restando assim avaliar se a lei ou a natureza da relação jurídica permitem legitimar o juízo conclusivo firmado no acto postulativo recorrido.
Aquando da Reforma de 1995, o legislador tomou posição expressa sobre a polémica ancestral relacionada com definição do critério de determinação da legitimidade das partes, solucionando, de vez, a disputa axiológica mantida entre Barbosa de Magalhães[35] e Alberto dos Reis[36] e os seguidores deste[37] [38].
Na exposição de motivos da legislação então editada ficou consignado que «enquanto o problema da titularidade ou pertinência da relação material controvertida se entrelaça estreitamente com a apreciação do mérito da causa, os pressupostos em que se baseia, quer a legitimidade plural – o litisconsórcio necessário – quer a legitimação indirecta (traduzida nos institutos da representação ou substituição processual), aparecem em regra claramente destacados do objecto do processo, funcionando logicamente como questões prévias ou preliminares relativamente à admissibilidade da discussão das partes da relação material controvertida, dessa forma condicionando a possibilidade de prolação da decisão sobre o mérito da causa».
Ficou assim consagrada a tese sustentada por Barbosa de Magalhães no sentido de que, quando a legitimidade deva ser determinada apenas em função da titularidade da relação material controvertida, esta deve ser considerada com a configuração dada unilateralmente na petição inicial[39].
É assim indiscutível que existe uma distinção entre a legitimidade processual e a legitimação substantiva. A primeira configura um pressuposto processual relativo às partes, que se afere, na falta de indicação da lei em contrário, na forma como a relação material controvertida é desenhada pelo Autor em sede de petição inicial e cuja falta corresponde a uma excepção dilatória que dá lugar à absolvição do Réu da instância. A legitimidade substancial ou substantiva está associada à efectividade da referida relação material e interessa ao mérito da causa – ao sucesso ou insucesso da pretensão ao nível das condições subjectivas da titularidade do direito[40].
Enquanto o problema da titularidade ou da pertinência da relação material controvertida se entrelaça estreitamente com a apreciação do mérito da causa, os pressupostos em que se baseia a legitimidade plural ou a legitimidade indirecta aparecem claramente destacados do objecto do processo; e funcionando claramente como «questões prévias» relativamente à admissibilidade da discussão entre as partes acerca da relação material controvertida, dessa forma condicionando a possibilidade de prolação de decisão sobre o mérito da causa.
A legislação actualmente vigente não introduziu qualquer mudança axiológica-normativa no conceito de legitimidade e, à luz da regra precipitada no nº 1 do artigo 30º do Código de Processo Civil, o autor é parte legítima quando tem interesse directo em demandar e o réu é parte legítima quando tem interesse directo em contradizer.
O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da acção e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha (artigo 30º, nº 2, do Código de Processo Civil).
Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor (artigo 30º, nº 3, do Código de Processo Civil).
A legitimidade plural tem o seu assento nos artigos 32º[41] e 33º[42] do Código de Processo Civil, consoante se trate de um litisconsórcio voluntário ou necessário.
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O litisconsórcio configura-se quando a relação material controvertida respeita a uma pluralidade de partes principais que se unem no mesmo processo para discutirem uma só relação jurídica material. Ele apresenta-se como voluntário nas situações em que é permitido que só uma das partes intervenha, embora possam participar as restantes e diz-se necessário naquelas situações em que é exigida a intervenção de todas em conjunto.
A regra é a do litisconsórcio voluntário em que os sujeitos da relação podem intervir ou não em conjunto, mas neste último caso, o Tribunal apenas pode e deve conhecer da quota-parte que o sujeito tenha na relação em litígio, a menos que a este seja permitido exigir tudo (casos de obrigações solidárias, indivisíveis, entrega da coisa por terceiros a pedido de comproprietário, compossuidor ou herdeiro)[43].
Também Anselmo de Castro sublinha o carácter excepcional do litisconsórcio necessário, «dados os graves embaraços que para a parte representa a sua imposição e assim existirá apenas nos contados casos em que a lei pôs acima dos interesses das partes e dos respectivos custos, a unidade da decisão»[44].
A figura do litisconsórcio necessário natural, decorrente da previsão normativa há muito contida nos nºs 2 e 3 do artigo 33º, tem na sua génese a necessidade da pluralidade de partes como condição indispensável para que a sentença a proferir possa produzir o seu efeito útil normal, regulando definitivamente o interesse das partes no processo acerca da relação material controvertida: embora tal situação de necessária pluralidade de partes não decorra explicitamente de uma norma legal ou de estipulação dos interessados, ela decorre da natureza – da incindibilidade e da indivisibilidade – de relação litigiosa plural, cujo mérito só pode ser efectiva e definitivamente apreciado quando estiverem em juízo todos os interessados, a todos sendo facultado o exercício do direito de acção ou de defesa, de modo a alcançar-se uma simultânea composição do pleito, vinculativa de todos os interessados[45].
Dito isto, como primeira conclusão intercalar, deve realçar-se que o chamado litisconsórcio necessário se caracteriza pela pluralidade de partes e pela natureza da relação jurídica material invocada como fundamento da acção, da qual resulta ser necessária a intervenção de todos os interessados para que a decisão declare o direito de modo definitivo, que é o efeito útil normal da mesma.
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4.5.2.2 – Do efeito útil normal, à luz dos critérios legais e da interpretação doutrinal mais autorizada:
Impõem-se as regras do litisconsórcio necessário quando a lei, o negócio jurídico ou a natureza da relação controvertida exigem a intervenção dos vários interessados na controvérsia jurisdicional.
Sobre o significado da expressão “efeito útil normal” podem ser consultados, entre outros, Lebre de Freitas[46] [47], Antunes Varela[48] [49], Anselmo de Castro[50] e João Pedro Pinto-Ferreira[51].
Na Revista de Legislação e Jurisprudência, Antunes Varela clarifica os limites de intervenção do litisconsórcio voluntário e do necessário. E inclui no âmbito da esfera de protecção deste último as relações indivisíveis por natureza, que têm de ser resolvidas de modo unitário para todos os interessados, sem a presença dos quais, a decisão não conduziria a nenhum efeito útil. E, para dar solidez ao raciocínio, exemplifica que nas acções constitutivas a falta de alguns dos interessados é susceptível de colocar em causa a globalidade da própria relação jurídica e adianta também que nos casos de limitação de indemnização por responsabilidade objectiva a definição concreta da situação jurídica só ocorre se a mesma não puder vir a ser inutilizada por outros interessados a quem a decisão não seja oponível.
Também Anselmo de Castro sublinha que aquilo que o pressuposto processual pretende cuidar é que «não sejam proferidas decisões que praticamente venham a ser inutilizadas por outras proferidas em face dos restantes interessados, por virtude de a relação jurídica ser de tal ordem que não possam regular-se inatacavelmente as posições de alguns sem se regularem as dos outros. Por maior, portanto, que possa eventualmente, vir a ser a contrariedade lógica entre as decisões, desde que sejam susceptíveis de aplicação sem inconciliabilidade prática, a decisão produz o seu efeito útil normal e o litisconsórcio não se impõe pela natureza da relação jurídica»[52].
Na acepção de Lebre de Freitas a pedra de toque do litisconsórcio necessário é, pois, a impossibilidade de, tido em conta o pedido formulado, compor definitivamente o litígio, declarando o direito ou realizando-o, ou ainda, nas acções de simples apreciação de facto, apreciando a existência deste, sem a presença de todos os interessados, por o interesse em causa não comportar uma definição ou realização parcelar[53].
Os exemplos paradigmáticos de litisconsórcio necessário são os de acção de prestação de contas, acção de constituição de servidão legal de passagem, acção de anulação e de declaração de nulidade de negócios jurídicos e acção de defesa do direito de compropriedade sobre as partes comuns do prédio.
A doutrina e a jurisprudência têm, porém, desde há muito, operado una interpretação mais ampla do conceito de efeito útil normal, admitindo o litisconsórcio necessário natural nas situações em que, por ser o objecto do processo um interesse indivisível e incindível dos vários interessados ou contitulares, se impõe o litisconsórcio por prementes razões de coerência jurídica, que ficaria relevantemente afectada pela possibilidade de serem proferidas, em causas separadas, decisões divergentes acerca desse mesmo objecto unitário e indivisível[54].
O elemento problematizante da iniciativa é tratado por Lopes do Rego, que invoca que a exigência de litisconsórcio necessário «nunca depende das meras afirmações do autor, expressas na petição inicial, mas da efectiva configuração da situação em que assenta a legitimidade, designadamente da real inexistência de outros interessados que devam ser considerados litisconsortes necessários; ou da efectiva demonstração do interesse ou da titularidade da relação legitimante que justifica a atribuição de legitimidade indirecta.
Sempre foi pacífico que, nas situações de litisconsórcio necessário, não será a mera circunstância de o autor omitir na petição a existência de outros interessados, litisconsortes necessários de alguma das partes, que lhe permitirá obter decisão sobre o mérito da causa, se o juiz, por qualquer forma, conseguir aperceber-se da efectiva existência daqueles»[55].
Assim, como segunda conclusão intercalar sublinha-se que, apesar dos pressupostos em que se baseia a legitimidade plural ou a legitimidade indirecta aparecerem claramente destacadas do objecto do processo, a resposta sobre a necessidade do litisconsórcio deve ser encontrada na fonte da relação controvertida e na questão do efeito útil da decisão e não está dependente de um juízo prudencial impulsionado pelo ónus de alegação das partes.
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4.5.2.3 – Do afastamento da tese que a lei e a relação jurídica estabelecida impõem o litisconsórcio necessário:
Complementarmente, num enfoque objectivo, como proclama Anselmo de Castro, as acções de dívida de natureza solidária estão «excluídas do âmbito de aplicação»[56] do preceito em discussão.
Não somos aqui confrontados com uma dívida conjunta ou com a existência de obrigações parciárias relativas a prestações indivisíveis, hipótese em que o credor só de todos os obrigados pode exigir a prestação (artigo 535º, nº 1) e o devedor só perante todos os credores se pode desonerar (artigo 538º, nº 1)[57] [58] [59].
A obrigação divisível e indivisível é uma das modalidades das obrigações quanto ao objecto e não relativamente ao sujeito como parece transparecer da alegação das recorrentes. Efectivamente, a obrigação classifica-se de divisível quando a prestação comporte fraccionamento sem prejuízo da sua substância ou do seu valor económico, isto é, se pode realizar-se por partes cujo conteúdo se mantém qualitativamente idêntico ao todo. Na hipótese inversa, a obrigação diz-se indivisível[60] [61]. A expressão mostra-se alocada ao conceito presente no artigo 209º[62] do Código Civil e, como afirma Almeida e Costa, na medida em que não se pode fraccionar a prestação, «as obrigações indivisíveis, como tais, não são solidárias[63]».
Apesar da referida indivisibilidade da prestação, que aqui não se verifica (o fornecimento de fruta pode ser segmentado, dividido, feito em momentos diversos, etc.), Menezes Leitão explica que «o facto de ela se extinguir em relação a algum ou a alguns dos devedores não acarreta necessariamente a sua extinção integral, sendo admitido um acréscimo da responsabilidade dos restantes obrigados, desde que seja previamente compensado por uma contra-prestação de entrega do valor da parte do devedor ou devedores exonerados»[64]. E se a obrigação for indivisível com pluralidade de credores, a lei refere que qualquer deles tem o direito de exigir a prestação por inteiro, donde decorre que não se torna necessário accionar todos os sujeitos da relação obrigacional.
A identidade da prestação, a pluralidade de vínculos e a comunhão de fim são comummente apresentados como os traços característicos da obrigação solidária, mormente no âmbito da solidariedade passiva.
Neste debate sobre a solidariedade obrigacional podem também ser examinadas as obras de Manuel Gomes da Silva[65], Antunes Varela[66], Almeida Costa[67] e Ribeiro Faria[68].
Parece-nos claro que, tal como preconiza Rodrigues Basto, sempre que, por não intervirem certas pessoas, seja abalada essa estabilidade que se procura e se deseja, deixando a porta aberta à possibilidade de outros interessados na mesma relação jurídica suscitar nova demanda, em que poderão obter decisão diferente, o litisconsórcio impõe-se como obrigação[69]. Porém, não é isso que se verifica nas obrigações solidárias.
A obrigação é solidária, quando cada um dos devedores responde pela prestação integral e esta a todos libera, ou quando cada um dos credores tem a faculdade de exigir, por si só, a prestação integral e esta libera o devedor para com todos eles (artigo 512º, nº 1, do Código Civil).
Estipula o artigo 519º[70] do Código Civil que o credor tem o direito de exigir de qualquer dos devedores toda a prestação e a lei provisiona ainda a solução para o caso de insolvência ou impossibilidade de cumprimento de um dos devedores no artigo 526º[71] do mesmo diploma.
Por outro lado, a solidariedade passiva não permite ao devedor, nem opor o benefício da divisão, nem escudar-se a cumprir por inteiro, quando o credor lhe exija que cumpra (artigos 512º e 518º do Código Civil)
E para finalizar, a fim de completar o circuito de responsabilidade, no artigo 523º do Código Civil[72], também se encontra previsto que a satisfação do direito do credor produz a extinção das obrigações de todos os devedores.
Jurisprudencialmente a questão também é pacífica e não origina dissensões interpretativas[73]. Com efeito, o regime das obrigações solidárias não se adequa à lógica da intervenção plural fundada na natureza da relação jurídica, pois por via do critério da responsabilidade substantiva está sempre acautelado o efeito útil normal da decisão.
Estamos num domínio axiológico normativo em que, como refere Lebre de Freitas, não se trata de impor o litisconsórcio para evitar decisões contraditórias nos seus fundamentos, mas de evitar sentenças – ou outras providências – inúteis por, por um lado, não vincularem os terceiros interessados e, por outro, não poderem produzir o seu efeito típico em face apenas das partes processuais[74].
Aqui não estamos perante um quadro de interesse indivisível e incindível de vários contitulares do interesse subjectivo passivo e a discussão em causa separadas poderá não conduzir a decisões divergentes acerca do objecto. E mesmo que uma das partes fosse condenada e a outra absolvida os interesses substantivos dos Autores não resultariam atingidos de forma insustentável.
Existe uma diferença entre a composição definitiva do objecto da causa e a identificação do leque de eventuais responsáveis pelo pagamento da indemnização contratual reclamada. Se é certo que a presença da sociedade mãe e da sua representante em território nacional pode aumentar as possibilidades de sucesso da acção e, concomitantemente, favorecer as operações de cobrança, a mesma não se situa na esfera de protecção do mecanismo da legitimidade processual plural.
Assim, em suma, como conclusão final, nas obrigações solidárias não é necessária a intervenção em juízo de todos os devedores devido à circunstância do regime substantivo consagrar direitos do credor e mecanismos de satisfação dos interesses deste que não são impeditivos da decisão de produzir o seu efeito útil normal.
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4.5.2.4 – Síntese conclusiva sobre a incompetência dos Tribunais Portugueses relativamente à Ré no domínio da situação de facto na respectiva conjugação com a legislação ordinária:
De acordo com mais avalizada jurisprudência a noção de pacto atributivo de jurisdição [artigo 25º do Regulamento (UE) 1215/2012 do Parlamento e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012] é autónoma, relativamente ao direito interno de cada Estado-Membro – a validade do pacto de jurisdição deve ser, exclusivamente aferida (preenchida) à luz da própria disposição do Regulamento, ficando excluída a convocação, no caso e designadamente, do artigo 94º do Código de Processo Civil e do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais (DL nº 446/85, de 25 de Outubro)[75].
Na situação concreta somos confrontados com a existência de um documento escrito, de teor constitutivo ou confirmativo, que consagra o acordo de vontades na celebração de um pacto atributivo de jurisdição, nos precisos termos constantes da al. a) do nº 1 do artigo 25º.
Tendo sido cumprida esta formalidade ad substantiam, não se existindo um quadro de litisconsórcio necessário que implique a derrogação do ajustado entre as partes para o estabelecimento de foro judicial nem subsistindo qualquer razão de ordem pública ou de interesse nacional deve prevalecer o entendimento expresso pela Primeira Instância, salvo se a questão venha a ser configurada como de inconstitucionalidade normativa.
Assim sendo, tal como proclama a Meritíssima Juíza «a quo» «tendo as partes (autoras e 2ª ré) acordado que a decisão dos conflitos decorrentes da violação daqueles contratos seria da competência de outros Tribunais, pertencente a ordem jurídica estrangeira, este Tribunal é absolutamente incompetente para apreciação desta causa», sublinhando-se, no entanto, que a decisão apenas abrange a «segunda ré, na medida em que apenas esta subscreveu o pacto de jurisdição».
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4.5.6 – Do juízo de não conformidade constitucional:
Nas suas conclusões as recorrentes avançam que se está «perante uma errada interpretação dos normativos invocados na fundamentação da decisão, nomeadamente nos artigos 59º, 62º, 63º, 94º do Código de Processo Civil, 25º, nº 1, do Regulamento n.º 1215/2012, que origina uma inconstitucionalidade das normas aí vertidas, por violação do preceituado nos nºs 1 e 4 do artigo 20º e n.º 2 do artigo 18º da Constituição da República Portuguesa».
Os tratados institutivos das comunidades europeias e as disposições comunitárias dotadas de aplicabilidade prática (self executing) constituem, com a adesão ade Portugal à ordem jurídica comunitária, uma nova fonte normativa da ordem jurídico constitucional portuguesa, em posição análoga mas separada em relação aos actos legislativos internos, podendo impor-se relativamente a estes com base no princípio da especialidade ou da competência prevalente, isto é, a normativa comunitária tem preferência relativamente a legislação estatal. Quando o princípio da especialidade não é suficiente a doutrina mais recente afirma a superioridade do direito comunitário, traduzida na força activa dos regulamentos comunitários (podem revogar e modificar leis) e na resistência passiva dos mesmos relativamente a leis posteriores internas (não podem ser revogados os modificados)[76].
Relativamente ao problema do controlo das normas comunitárias, Gomes Canotilho pronuncia-se no sentido que «os juízes portugueses conhecem e julgam inaplicáveis as normas comunitárias eventualmente desconformes com as normas e princípios constitucionais. No entanto, os juízes devem também valorar a compatibilidade entre as leis comunitárias e as leis portuguesas, fazendo prevalecer as primeiras sobre as segundas, independentemente da relação da sucessão de leis no tempo. Aqui os juízes portugueses julgarão inaplicáveis as normas internas conflituantes com as normas comunitárias (cfr. LTC, art. 70/1/c e 71/2). Neste sentido, o Tribunal de Justiça da Comunidade tem sistematicamente repetido que o juiz nacional encarregado de aplicar, no âmbito da sua competência, as disposições de direito comunitário, tem a obrigação de garantir a plena eficácia dessas normas, desaplicando qualquer disposição contratante da legislação nacional, mesmo posterior»[77].
Sem olvidar o postulado da unidade do Direito da União, têm, pois, de se procurar soluções de equilíbrio com as Constituições nacionais, soluções de harmonização e concordância prática[78] [79].
Em primeiro lugar, não se está perante um cenário de aplicação de leis restritivas de direitos, liberdades e garantias no modelo preconizado no artigo 18º[80] da Constituição da República Portuguesa.
Num segundo socalco interpretativo, carece igualmente de razoamento o recurso à disciplina contida no artigo 20º[81] da Lei Fundamental. Efectivamente, para além de se estar perante um acto contratual ajustado num contexto de liberdade negocial, o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva não são beliscados. Na verdade, não existe qualquer sinal que, caso sejam convocados para o efeito, os Tribunais holandeses actuarão em desacordo com o critério universalmente aceite no espaço da União Europeia de decidir em prazo razoável e mediante processo equitativo e que a propositura do procedimento no estrangeiro crie um obstáculo sério e intransponível à efectivação dos direitos reclamados.
Inversamente àquilo que é alegado, aquilo que o artigo 25.º do Regulamento (UE) nº 1215/2012 do Parlamento e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, faz é dar sustentação prática a uma obrigação soberana no domínio das relações internacionais e na afirmação da sua política externa, através da associação com outros Estados e da concertação multilateral entre os Países da União Europeia. Esta é uma forma de densificar os mecanismos de desenvolvimento da coesão económica e social no espaço comunitário e de valorizar o postulado da criação de um espaço único de liberdade, segurança e justiça.
O direito de acesso à justiça e o direito à jurisdição estão abstractamente perfectibilizados e as recorrentes dispõem de todas as condições necessárias ao atendimento das pretensões em jogo, inexistindo, como tal, qualquer entrave de natureza orgânica, funcional, processual ou substantiva à procedência da respectiva pretensão. E apenas, por compromisso próprio, esse recurso aos Tribunais será executado em foro estrangeiro relativamente a uma das Rés.
Adicionalmente, na dimensão teórico-prática, a aferição da compatibilidade constitucional é dirigida a normas e não a decisões judiciais, por o sistema jurídico não comportar o recurso de amparo. Efectivamente, o modelo de fiscalização da constitucionalidade adoptado internamente é de cariz meramente normativo, só aferindo a conformidade constitucional de actos normativos gerais e abstractos, ficando fora do controlo da justiça constitucional os actos não normativos, onde incluem, em primeira linha, as decisões judiciais.
Em virtude da caracterização material das normas como padrões e regras, excluem-se do conceito de actos normativos os actos concretos de aplicação dos mesmos (actos administrativos e sentenças judiciais, etc.)[82]. Nesta dimensão interpretativa, Carlos Lopes do Rego assinala que «é, aliás, perceptível que, em numerosos casos – embora sob a capa formal da invocação da inconstitucionalidade de certo preceito legal tal como foi aplicado pela decisão recorrida – o que realmente se pretende controverter é a concreta e casuística valoração pelo julgador das múltiplas e específicas circunstâncias do caso sub judicio […]; a adequação e correcção do juízo de valoração das provas e de fixação da matéria de facto provada na sentença (…) ou a estrita qualificação jurídica dos factos relevantes para a aplicação do direito […]»[83]. Sobre estes requisitos pode ser consultado Cardoso da Costa[84].
É prática constante do Tribunal Constitucional asseverar que o objecto do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade é constituído por normas jurídicas, que violem preceitos ou princípios constitucionais. Por isso, nesse enquadramento avaliativo, o Tribunal Constitucional afirma que «não pode sindicar-se, no recurso de constitucionalidade, a decisão judicial em si própria, mesmo quando esta faça aplicação directa de preceitos ou princípios constitucionais, quer no que importa à correcção, no plano do direito infraconstitucional, da interpretação normativa a que a mesma chegou, quer no que tange à forma como o critério normativo previamente determinado foi aplicado às circunstâncias específicas do caso concreto (correcção do juízo subsuntivo)»[85].
Na realidade, não estamos verdadeiramente no âmbito de uma fiscalização concreta de uma decisão adoptada pelo Juízo Central de Competência Cível de Faro sobre a constitucionalidade de normas jurídicas. E, no seu reduto velado e secreto, aquilo que, a final, se pretende é a avaliação da decisão judicial como se de um recurso de amparo se tratasse e não propriamente a conformidade entre a norma e a Constituição da República Portuguesa.
Em suma, a norma emanada das instituições comunitária dá força ao comando impresso no nº 4 do artigo 8º da Constituição no domínio do relacionamento entre as normas constantes de instrumento legislativo internacional e normas legislativas da Constituição da República Portuguesa.
Assim, por via desta invocação, não existe qualquer fundamento para validar a tese do recorrente, dado que não ocorre a alegada desconformidade à Lei Fundamental.
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4.6 – Do erro de direito – Da conformidade legal do conhecimento imediato do mérito da causa:
No acto postulativo recorrido é dito que «é indubitável que a pretensão das Autoras tem como fonte as obrigações assumidas nos referidos contratos, mormente de pagamento de determinado preço, por parte da ré (…) Of Europe, pelo kg de framboesas que as autoras produzissem».
No desenvolvimento do seu raciocínio, o julgador «a quo» assenta em duas premissas: i) que a representação a que as Recorrentes se referem nas suas petições iniciais se reporta a uma representação em sentido jurídico e ii) que a primeira Ré não era parte da relação contratual em apreço, cingindo-se esta ao contrato escrito celebrado entre cada uma das Autoras e a segunda Ré.
Na análise dos factos coligidos na petição inicial, o Juízo Central de Competência Cível de Faro conclui que «perante a factualidade alegada, a pretensão das autoras soçobra na totalidade quanto à primeira ré, pelo que não resta senão julgar a ação totalmente improcedente».
No entendimento das Recorrentes, é precisamente a ausência da realização da audiência de discussão e julgamento que conduz o Tribunal «a quo» a incorrer em erro de avaliação, por os autos não disporem de elementos que permitam conhecer de imediato os pedidos formulados.
Em contraste com esta posição, os recorridos defendem que a putativa responsabilidade da primeira Ré pelo incumprimento do contrato poderia ser desde logo ser julgada no despacho saneador, porquanto do processo constavam já todos os elementos indispensáveis para esse efeito e, bem assim, não se afigurava necessária a produção de mais provas.
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A alínea b) do nº 1 do artigo 595º do Código de Processo Civil habilita o Tribunal a conhecer em sede de saneador do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos ou de alguma excepção peremptória.
O juiz conhece do mérito da causa no despacho saneador, total ou parcialmente, quando para tal, isto é, para dar resposta ao pedido ou à parte do pedido correspondente, não haja necessidade de mais provas do que aquelas que já estão adquiridas no processo[86].
Na leitura de Anselmo de Castro este conhecimento deve ocorrer se a questão for unicamente de direito, se puder ser já decidida com a necessária segurança e, sendo de direito e de facto, se o processo contiver todos os elementos para uma decisão conscienciosa[87].
Se os elementos fornecidos nos autos não justificarem esta antecipação do julgamento acerca do mérito do litígio (v. g., permitirem a condenação ou absolvição total ou parcial do réu do pedido; ou permitirem a absolvição do réu do pedido do autor e a condenação do autor no pedido reconvencional), como será a regra, então a apreciação do mérito realizar-se-á na sentença final, para o que tem de ser feita a instrução da causa e a realização da audiência final de discussão e julgamento (da matéria de facto)[88].
Perscrutado o objecto da causa, em associação com a factualidade trazida aos autos pelas partes, verifica-se que existem questões problemáticas essenciais sobre o enunciado contratual – parte delas que se reportam ao âmbito de delimitação objectiva e subjectiva da responsabilidade – de carácter duvidoso e que não se encontram totalmente cristalizadas na fase de gestão inicial do processo.
Por isso, a nosso ver, ainda que a final até pudesse ser pré-visionada uma solução idêntica caso estivessem preenchidos os pressupostos fácticos de suporte, no plano jurídico a matéria em apreço não poderia ter sido decidida de imediato com a segurança exigida por lei. Na verdade, inexistem elementos factuais para promover uma decisão conscienciosa e completa relativamente a todas as questões suscitadas. E, deste modo, relativamente a esta componente do pedido, não podia o Tribunal «a quo» ter proferido saneador-sentença nos exactos termos exarados.
Existem matérias não decifradas factualmente a propósito do apuramento da natureza, da configuração e do conteúdo negocial que podem eventualmente alterar o sentido decisório tomado. Além do contexto negocial, sobejam ainda dúvidas sobre a existência (ou não) de um eventual incumprimento contratual nos parâmetros dos danos sofridos e na aferição do nexo de causalidade entre o incumprimento contratual e no aferimento desses valores, bem como no apuramento do conteúdo da relação existente entre as pessoas colectivas aqui presentes.
Sem que tal constitua uma nulidade processual, toda a decisão se encontra estruturada apenas em 5 (cinco) factos – parte substancial relacionados com a situação registral comercial dos diversos envolvidos e um deles emitido a propósito do contrato sub judice – mas estes factos não suficientes para justificar a decisão tomada.
Na arquitectura da acção, a parte activa salienta que a Autora e as Rés mantêm relações comerciais relacionadas com a atividade de produção e comercialização de frutos vermelhos. Mais avança que todo o processo operacional e negocial respeitante ao território português foi conduzido e coordenado por ambas as Rés, actuando a primeira Ré enquanto verdadeira representante da segunda Ré para o território nacional, passando indistintamente por ambas a generalidade dos contactos e acordos acerca da atividade de produção da Autora. Mais ressalta da leitura da petição inicial que, para além do acordo escrito estabelecido com a sociedade holandesas, existiram estipulações acessórias não escritas que vincularam a pessoa colectiva sediada em território nacional, designadamente ao nível da fixação de objectivos de produção para o período. E, ultrapassando esta fase de descrição do trato negocial estabelecido, uma das causas de pedir está estribada na interpretação de uma cláusula contratual.
Como é natural desconhece-se se são veridictas ou falsas estas alusões fácticas. Porém, as mesmas não foram escrutinadas pelo Tribunal. Complementarmente, as conclusões jurídicas tomadas não assentam em qualquer fundamento fáctico de suporte e a decisão jurídica corresponde apenas a um juízo abstracto-hipotético sobre matérias que se encontram controvertidas e que não viabilizam a construção de um silogismo judiciário com um grau de certeza adequado aos fins do processo civil.
Gabriel Catarino afiança que «toda a decisão judicial deflui ou é gerada numa causa que tem na sua origem uma situação factual a que, conceptualmente, corresponderá uma hipótese suposta numa norma»[89].
Nesta equação, a sentença comporta um silogismo em que a premissa maior é a lei, a premissa menor corresponde aos factos apurados no caso concreto e a conclusão é a decisão. Num silogismo, as premissas são os juízos que precedem a conclusão e dos quais ela decorre como consequente necessário. No silogismo judiciário as premissas – ou juízos – são os fundamentos e a conclusão é a decisão propriamente dita, devendo esta inferir-se daqueles como seu corolário lógico.
A decisão tomada não está escorada em factos que viabilizem a construção jurídica realizada, pois o referido juízo prudencial – em especial na fase de gestão inicial do processo – tem de ser obtido a partir dos factos assentes e tem de fornecer resposta positiva ao preenchimento dos requisitos necessários para tal atribuição.
E isso não sucede, não obstante o inequívoco mérito da construção jurídica efectuada no Tribunal recorrido. As questões de facto que foram utilizadas na construção jurídica são controvertidas e não estão abrangidas pela força probatória de qualquer meio de prova. E, assim, como já se antecipou, o Tribunal não poderia decidir de imediato com a segurança exigida por lei, devendo os autos prosseguir para a fase de julgamento[90].
E isto significa que, quanto à segunda questão em análise, o saneador-sentença deve ser revogado, devendo os autos regressar à Primeira Instância para providenciar pela regularização do processado, nomeadamente para cumprimento do disposto no artigo 596º[91] do Código de Processo Civil, seguindo-se os ulteriores termos do processo.
*
V – Sumário:
(…)
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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se revogar parcialmente a decisão recorrida, devendo ser reaberta a fase de saneamento para definição dos temas da prova e posterior julgamento, mantendo-se, na parte restante, o decidido no Tribunal «a quo».
Custas a cargo dos apelantes e dos apelados, na proporção de metade, atento o disposto no artigo 527º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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(acto processado e revisto pelo signatário nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 138º, nº 5, do Código de Processo Civil).
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Évora, 07/11/2019
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Mário Branco Coelho
Isabel Matos Peixoto Imaginário
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[1] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil (Anotado), Vol. V, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, pág. 140.
[2] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª Edição – Revista e Actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 687.
[3] Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, pág. 670.
[4] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/05/2007, in www.dgsi.pt.
[5] Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, pág. 122.
[6] Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 2001, pág. 670.
[7] Antunes Varela, Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, página 686.
[8] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/02/2005, in www.dgsi.pt.
[9] No mesmo sentido, Acórdão da Relação de Lisboa de 09/07/2014, in www.dgsi.pt.
[10] Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, Coimbra, 1981 (reimpressão), pág. 143.
[11] Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª Edição, pág. 57.
[12] Alberto dos Reis, ob. cit., pág. 141.
[13] A. Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 688.
[14] Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23/06/2004 e 02/12/2013, in www.dgsi.pt.
[15] A que actualmente correspondem os artigos 614º e 617º do novo Código de Processo Civil.
[16] Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, págs. 124-125.
[17] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, 687-689.
[18] Artigo 94.º (Pactos privativo e atributivo de jurisdição).
1 - As partes podem convencionar qual a jurisdição competente para dirimir um litígio determinado, ou os litígios eventualmente decorrentes de certa relação jurídica, contanto que a relação controvertida tenha conexão com mais de uma ordem jurídica.
2 - A designação convencional pode envolver a atribuição de competência exclusiva ou meramente alternativa com a dos tribunais portugueses, quando esta exista, presumindo-se que seja exclusiva em caso de dúvida.
3 - A eleição do foro só é válida quando se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:
a) Dizer respeito a um litígio sobre direitos disponíveis;
b) Ser aceite pela lei do tribunal designado;
c) Ser justificada por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas, desde que não envolva inconveniente grave para a outra;
d) Não recair sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais portugueses;
e) Resultar de acordo escrito ou confirmado por escrito, devendo nele fazer-se menção expressa da jurisdição competente.
4 - Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se reduzido a escrito o acordo constante de documento assinado pelas partes, ou o emergente de troca de cartas, telex, telegramas ou outros meios de comunicação de que fique prova escrita, quer tais instrumentos contenham diretamente o acordo quer deles conste cláusula de remissão para algum documento em que ele esteja contido.
[19] Artigo 59.º (Competência internacional):
Sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62.º e 63.º ou quando as partes lhes tenham atribuído competência nos termos do artigo 94.º.
[20] Artigo 62.º (Fatores de atribuição da competência internacional):
Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes:
a) Quando a ação possa ser proposta em tribunal português segundo as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa;
b) Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação, ou algum dos factos que a integram;
c) Quando o direito invocado não possa tornar-se efetivo senão por meio de ação proposta em território português ou se verifique para o autor dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro, desde que entre o objeto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real.
[21] Artigo 63.º (Competência exclusiva dos tribunais portugueses):
Os tribunais portugueses são exclusivamente competentes:
a) Em matéria de direitos reais sobre imóveis e de arrendamento de imóveis situados em território português; todavia, em matéria de contratos de arrendamento de imóveis celebrados para uso pessoal temporário por um período máximo de seis meses consecutivos, são igualmente competentes os tribunais do Estado membro da União Europeia onde o requerido tiver domicílio, desde que o arrendatário seja uma pessoa singular e o proprietário e o arrendatário tenham domicílio no mesmo Estado membro;
b) Em matéria de validade da constituição ou de dissolução de sociedades ou de outras pessoas coletivas que tenham a sua sede em Portugal, bem como em matéria de validade das decisões dos seus órgãos; para determinar essa sede, o tribunal português aplica as suas regras de direito internacional privado;
c) Em matéria de validade de inscrições em registos públicos conservados em Portugal;
d) Em matéria de execuções sobre imóveis situados em território português;
e) Em matéria de insolvência ou de revitalização de pessoas domiciliadas em Portugal ou de pessoas coletivas ou sociedades cuja sede esteja situada em território português.
[22] In casu, é chamado à colação o Regulamento (UE) n.º 1215/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial o qual, à semelhança do que o antecedeu, “Aplica-se em matéria civil e comercial, independentemente da natureza da jurisdição” (art.º 1.º, n.º 1).
[23] J. P. Remédio Marques, A Acção Declarativa à luz do código revisto (pelo Decreto-lei nº 303/2007, de 24 de Agosto), Coimbra Editora, Coimbra, 2007, pág. 173.
[24] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil anotado, vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, pág. 124.
[25] Os chamados pactos atributivos de competência são aqueles que concedem competência a determinados tribunais portugueses para apreciação de um pedido referente a uma situação jurídica plurilocalizada, para o que não eram por lei competentes.
[26] Os pactos privativos são aqueles que lhes retiram a competência que para tanto tinham por lei, atribuindo-a a um ou vários Tribunais estrangeiros.
[27] José Lebre de Freiras e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil anotado, vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, pág. 192.
[28] Estabelece o art.º 25.º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, que:
“1- Se as partes, independentemente do seu domicílio, tiverem convencionado que um Tribunal ou os Tribunais de um Estado-Membro têm competência para decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou que possam surgir de uma determinada relação jurídica, esse Tribunal ou esses Tribunais terão competência, a menos que o pacto seja, nos termos da lei desse Estado-Membro, substantivamente nulo. Essa competência é exclusiva, salvo acordo das partes em contrário. O pacto atributivo de jurisdição deve ser celebrado:
a) Por escrito ou verbalmente com confirmação escrita;
b) De acordo com os usos que as partes tenham estabelecido entre si; ou
c) No comércio internacional, de acordo com os usos que as partes conheçam ou devam conhecer e que, em tal comércio, sejam amplamente conhecidos e regularmente observados pelas partes em contratos do mesmo tipo, no ramo comercial concreto em questão.
2- Qualquer comunicação por via eletrónica que permita um registo duradouro do pacto equivale à «forma escrita».
3- O Tribunal ou os Tribunais de um Estado-Membro a que o ato constitutivo de um trust atribuir competência têm competência exclusiva para conhecer da ação contra um fundador, um trustee ou um beneficiário do trust, se se tratar de relações entre essas pessoas ou dos seus direitos ou obrigações no âmbito do trust.
4- Os pactos atributivos de jurisdição bem como as estipulações similares de atos constitutivos de trusts não produzem efeitos se forem contrários ao disposto nos artigos 15º, 19.º ou 23.º, ou se os Tribunais cuja competência pretendam afastar tiverem competência exclusiva por força do artigo 24º.
5- Os pactos atributivos de jurisdição que façam parte de um contrato são tratados como acordo independente dos outros termos do contrato. A validade dos pactos atributivos de jurisdição não pode ser contestada apenas com o fundamento de que o contrato não é válido”.
[29] Este instrumento revogou o Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000.
[30] Artigo 8.º (Direito internacional):
1. As normas e os princípios de direito internacional geral ou comum fazem parte integrante do direito português.
2. As normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação oficial e enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português.
3. As normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais de que Portugal seja parte vigoram directamente na ordem interna, desde que tal se encontre estabelecido nos respectivos tratados constitutivos.
4. As disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, são aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático.
[31] Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 11/02/2015, 19/11/2015, de 26/01/2016, 04/02/2016, 21/04/2016, 19/12/2018 e 09/05/2019, disponíveis em www.dgsi.pt.
[32] Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19/12/2018, 07/03/2019 e 09/05/2019, publicados em www.dgsi.pt.
[33] Artigo 33.º (Litisconsórcio necessário):
1 - Se, porém, a lei ou o negócio exigir a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade.
2 - É igualmente necessária a intervenção de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal.
3 - A decisão produz o seu efeito útil normal sempre que, não vinculando embora os restantes interessados, possa regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado.
[34] Artigo 35.º (O litisconsórcio e a ação):
No caso de litisconsórcio necessário, há uma única ação com pluralidade de sujeitos; no litisconsórcio voluntário, há uma simples acumulação de ações, conservando cada litigante uma posição de independência em relação aos seus compartes.
[35] Barbosa de Magalhães, Legitimidade das Partes, Gazeta Relação Lisboa, 32º, 1919, págs. 274 e 275.
[36] Segundo Alberto dos Reis, Legitimidade das partes, in Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, Vol. VIII, pág. 64, para a determinação da legitimidade processual o que importava era a relação material tal como se apresenta real e objectivamente ao Tribunal, ao juiz, depois de ouvidas as partes e de serem examinadas as provas relevantes.
[37] Manuel de Andrade, Noções elementares de processo civil, vol. I, Coimbra, 1963, págs. 85 e 73, aproxima-se da posição expressa por Alberto dos Reis. Embora este autor reconheça que a lei processual qualifica a legitimidade como pressuposto processual inclina-se claramente para a sua qualificação no plano do rigor dogmático, como ‘condição da acção’, ou seja, como requisito indispensável para ser julgada procedente a acção.
[38] Antunes Varela, Manual de Processo Civil, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1985.
[39] Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Volume I, 2ª edição, 2004, pág. 59.
[40] Castro Mendes, Direito Processual Civil, vol. II, AAFDL, Lisboa ,1974, págs. 176-177.
[41] Artigo 32º (Litisconsórcio voluntário)
1 - Se a relação material controvertida respeitar a várias pessoas, a acção respectiva pode ser proposta por todos ou contra todos os interessados; mas, se a lei ou o negócio for omisso, a acção pode também ser proposta por um só ou contra um só dos interessados, devendo o tribunal, nesse caso, conhecer apenas da respectiva quota-parte do interesse ou da responsabilidade, ainda que o pedido abranja a totalidade.
2 - Se a lei ou o negócio permitir que o direito seja exercido por um só ou que a obrigação comum seja exigida de um só dos interessados, basta que um deles intervenha para assegurar a legitimidade.
[42] Artigo 33º (Litisconsórcio necessário):
1 - Se, porém, a lei ou o negócio exigir a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade.
2 - É igualmente necessária a intervenção de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal.
3 - A decisão produz o seu efeito útil normal sempre que, não vinculando embora os restantes interessados, possa regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado.
[43] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15/03/2006, in www.dgsi.pt.
[44] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 1982, pág. 199.
[45] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22/10/2015, in www.dgsi.pt.
[46] Em parceria com Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, págs. 77-78.
[47] José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Coimbra Editora, Coimbra, 1996, págs. 164-167.
[48] Em obra colectiva com Miguel Bezerra e Sampaio e Nota, Manual de Processo Civil, 2ª edição, Coimbra Editora, 1985, págs. 163 a 169
[49] Antunes Varela, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 117º, págs. 380 e seguintes.
[50] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. II, Almedina, Coimbra, 1982, págs. 198-217.
[51] João Pedro Pinto-Ferreira, Litisconsórcio Necessário Legal e Litisconsórcio Necessário Natural. A Necessidade ou não da Distinção, publicada na Themis, ano X, nº 19, 2010.
[52] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. II, Almedina, Coimbra, 1982, pág. 205.
[53] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, pág. 78.
[54] Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa, págs. 162-163.
[55] Comentário ao Código de Processo Civil, vol. I, 2ª edição, Coimbra, 2004, pág. 56.
[56] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. II, Almedina, Coimbra, 1982, pág. 212.
[57] Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, Vol. I, 1ª edição (reimpressão), Associação Académica da Faculdade de Direito, Lisboa, 1986, pág. 378.
[58] Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, II, Tomo 1, Almedina, Coimbra, pág. 713.
[59] No mesmo sentido, pode ser consultado Menezes leitão, Direito das Obrigações, vol. I, 5ª edição, Almedina, Coimbra, 2006, págs. 173-174.
[60] Mário Júlio de almeida Costa, Direito das Obrigações, 5ª edição, Almedina, Coimbra, pág. 587.
[61] Vaz Serra, pluralidade de devedores ou de credores, Boletim do Ministério da Justiça, nº 69, págs. 55 e seguintes e nº 70, págs. 107 e seguintes.
[62] Artigo 209.º (Coisas divisíveis):
São divisíveis as coisas que podem ser fraccionadas sem alteração da sua substância, diminuição de valor ou prejuízo para o uso a que se destinam.
[63] Mário Júlio de almeida Costa, Direito das Obrigações, 5ª edição, Almedina, Coimbra, pág. 589.
[64] Luís Manuel Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. I, 5ª edição, Almedina, Coimbra, 2006, pág. 174.
[65] Manuel Gomes da Silva, Obrigações Solidárias, BFDUL, ano IV, 1947, págs. 165 e seguintes.
[66] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 10ª Edição, Almedina, Coimbra, págs. 790-791.
[67] Almeida Costa, Direito das Obrigações, 5ª edição, Almedina, Coimbra, 1991, págs. 587 e seguintes.
[68] Ribeiro de faria, Direito das Obrigações, vol. II, Almedina, Coimbra, 1990, págs. 166-167.
[69] Rodrigues Basto, Notas ao Código de Processo Civil, vol. I, Almedina, Coimbra 1999, pág. 118.
[70] Artigo 519º (Direitos do credor):
1. O credor tem o direito de exigir de qualquer dos devedores toda a prestação, ou parte dela, proporcional ou não à quota do interpelado; mas, se exigir judicialmente a um deles a totalidade ou parte da prestação, fica inibido de proceder judicialmente contra os outros pelo que ao primeiro tenha exigido, salvo se houver razão atendível, como a insolvência ou risco de insolvência do demandado, ou dificuldade, por outra causa, em obter dele a prestação. 2. Se um dos devedores tiver qualquer meio de defesa pessoal contra o credor, não fica este inibido de reclamar dos outros a prestação integral, ainda que esse meio já lhe tenha sido oposto.
[71] Artigo 526.º (Insolvência dos devedores ou impossibilidade de cumprimento):
1. Se um dos devedores estiver insolvente ou não puder por outro motivo cumprir a prestação a que está adstrito, é a sua quota-parte repartida proporcionalmente entre todos os demais, incluindo o credor de regresso e os devedores que pelo credor hajam sido exonerados da obrigação ou apenas do vínculo da solidariedade.
2. Ao credor de regresso não aproveita o benefício da repartição na medida em que só por negligência sua lhe não tenha sido possível cobrar a parte do seu condevedor na obrigação solidária.
[72] Artigo 523º (Satisfação do direito do credor):
A satisfação do direito do credor, por cumprimento, dação em cumprimento, novação, consignação em depósito ou compensação, produz a extinção, relativamente a ele, das obrigações de todos os devedores.
[73] O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 20/05/2008, in www.dgsi.pt., advoga que «a identidade da prestação e a comunhão de fim explicariam o regime legal das obrigações solidárias no plano externo, em particular, o direito do credor exigir de qualquer devedor solidário a prestação integral, podendo este defender-se com os meios de defesa comuns a todos os condevedores, e a liberação de todos eles em consequência da realização dessa prestação. Já a pluralidade de vínculos justificaria o regime no domínio das relações internas, em especial, o direito de regresso do devedor que tenha satisfeito a prestação integral contra os demais co-obrigados».
[74] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2014, pág. 78.
[75] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13/11/2018, in www.dgsi.pt.
[76] J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 5ª edição, totalmente refundida e aumentada, 2ª reimpressão, Almedina, Coimbra, 1992, págs. 915 e 916.
[77] J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 5ª edição, totalmente refundida e aumentada, 2ª reimpressão, Almedina, Coimbra, 1992, págs. 917.
[78] Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra Editora, Coimbra2005, pág. 93.
[79] Está consolidado o entendimento na jurisprudência constitucional que, quando existam questões prévias de direito da União Europeia, se justifica um reenvio prejudicial nos termos previstos no artigo 267.º, 2.º parágrafo, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia –, caso o próprio direito da União Europeia, designadamente por via de disposições do Tratado da União Europeia ou do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, antes de ser formulado o juízo de compatibilidade constitucional de alguma norma em sede de fiscalização concreta. Este posicionamento pode ser encontrado nos acórdãos registados sob os números 391/12, 141/15 e 596/16, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.
[80] Artigo 18.º (Força jurídica):
1. Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas.
2. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
3. As leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo, nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.
[81] Artigo 20.º (Acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva):
1. A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
2. Todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade.
3. A lei define e assegura a adequada protecção do segredo de justiça.
4. Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo.
5. Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.
[82] J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 5ª edição, totalmente refundida e aumentada, 2ª reimpressão, Almedina, Coimbra, 1992, págs. 1009.
[83] Carlos Lopes do Rego, O objecto idóneo dos recursos de fiscalização concreta de constitucionalidade: as interpretações normativas sindicáveis pelo Tribunal Constitucional, in Jurisprudência Constitucional, 3, pág. 8.
[84] José Manuel M. Cardoso da Costa, A jurisdição constitucional em Portugal, 3.ª edição, revista e actualizada, págs. 40 e 72.
[85] Acórdão do Tribunal Constitucional nº633/2008, publicado em www.dgsi.pt.
[86] José Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, Coimbra 2001, pág. 373.
[87] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Almedina, Coimbra 1982, pág. 254.
[88] Remédio Marques, Acção Declarativa à Luz do Código Revisto (Pelo Decreto-Lei nº303/2007, de 24 de Agosto), Coimbra Editora, Coimbra, 2007, pág. 349.
[89] Gabriel Catarino, Decisões judiciais/Sentença. Aspectos da sua formação, A Reforma do Processo Civil, Revista do Ministério Público, Cadernos II, 2012, pág. 104.
[90] Cada uma das Autoras apresentou uma petição inicial com cerca de 252 artigos, com factos que reputou como essenciais, instrumentais e concretizadores da sua pretensão, os quais foram contraditados pela parte contrária. A prova documental é constituída por mais de 40 suportes materiais. E é incontestável que os 5 (cinco) factos apurados não esgotam a matéria com relevo para a prolação da decisão final e que existem outros que são necessários a construir o silogismo judiciário seja numa perspectiva procedência ou de indeferimentos dos pedidos formulados.
[91] Artigo 596.º (Identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova):
1 - Proferido despacho saneador, quando a ação houver de prosseguir, o juiz profere despacho destinado a identificar o objeto do litígio e a enunciar os temas da prova.
2 - As partes podem reclamar do despacho previsto no número anterior.
3 - O despacho proferido sobre as reclamações apenas pode ser impugnado no recurso interposto da decisão final.
4 - Quando ocorram na audiência prévia e esta seja gravada, os despachos e as reclamações previstas nos números anteriores podem ter lugar oralmente.