Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
652/13.1TTFAR.E1
Relator: CHAMBEL MOURISCO
Descritores: TRANSPORTE RODOVIÁRIO
TEMPO DE DISPONIBILIDADE
RETRIBUIÇÃO
SUBSÍDIO DE FÉRIAS
SUBSÍDIO DE NATAL
NULIDADE DA SENTENÇA
JUROS DE MORA
Data do Acordão: 09/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I. As quantias pagas ao trabalhador para compensar o tempo de disponibilidade visam compensar, não o trabalho prestado, mas a especial penosidade que decorre do facto de o trabalhador estar disponível para poder ser chamado em qualquer altura para prestar serviço, não integrando assim a retribuição, embora traduzam uma componente remuneratória.
II. A partir de 1 de dezembro de 2003, data da entrada em vigor do Código do Trabalho, no cálculo do subsídio de Natal, salvo disposição legal, convencional ou contratual em contrário, deve de atender-se apenas à retribuição base e diuturnidades (artigos 254º nº1 e 250º nº1 do CT/2003 e artigos 263º nº1 e 262º nº1 do CT/2009).
III. Tendo o A. pedido a condenação da R. no pagamento de juros de mora, desde a data da apresentação da petição inicial, relativos a créditos laborais vencidos anteriormente, a condenação da R., em primeira instância, no pagamento de juros mora desde as datas dos vencimentos das respetivas prestações, violou o disposto no art. 609º nº1 do Código de Processo Civil, cometendo a nulidade prevista no art. 615º nº 1 al. e) do mesmo diploma legal.
(Sumário do relator)
Decisão Texto Integral: Processo nº 652/13.1TTFAR.E1 (Apelação)

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

I. Relatório
BB (A.) intentou a presente ação declarativa emergente de contrato de trabalho, com processo comum, contra CC, S.A. (R.) pedindo a condenação desta última a pagar-lhe o montante de € 8.018,51 a título de diferenças salariais na retribuição de férias, € 8.018,51 nos subsídios de férias, € 8.018,51 no subsídio de Natal, € 5.640,82 a título de descanso compensatório, tudo acrescido de juros à taxa legal até integral pagamento.
Para o efeito, alegou em síntese:
- Foi contratado e manteve-se ao serviço da R. entre janeiro de 2002 e dezembro de 2012, auferindo, com carácter de regularidade, os montantes que indica relativos a trabalho suplementar, trabalho noturno, tempo de disponibilidade, suplemento de disponibilidade;
- A R. apenas lhe pagou no período referido as retribuições de férias, de subsídio de férias e de Natal, em montantes equivalentes aos da remuneração base e das diuturnidades vigentes em cada momento;
- Defende que deve ser integrado naquelas retribuições de férias, subsídios de férias e de Natal a média das retribuições auferidas a título de trabalho suplementar, trabalho noturno, tempo de disponibilidade, suplemento de disponibilidade;
- No período de 2002 a 2012 prestou trabalho à R. para além do seu horário normal de trabalho, não lhe tendo sido concedido ou pago qualquer quantia a título de descanso compensatório a que teria direito, pelo que requer tal pagamento.

A R. apresentou contestação, tendo alegado em síntese:
- Tendo a ação sido proposta em 2014 os juros mora até ao dia 1 de Março de 2009 prescreveram;
- Enuncia as características da atividade que exerce e a contingência de apenas poder ser intercalado na jornada de trabalho dos motoristas um único intervalo com a duração máxima de duas horas, sendo inevitável o recurso à prestação de trabalho para além da oitava hora contada do início do horário e excluindo o tempo de intervalo;
- Sempre foi sua prática remunerar aos motoristas todas as horas compreendidas entre o início e o termo dos respetivos horários de trabalho, ressalvando o intervalo de refeição;
- Tal não significa, porém, que os motoristas prestem trabalho efetivo durante todo esse tempo, pois encontram-se inativos durante períodos que elenca diariamente;
- Nas horas que pagou a título de trabalho suplementar haverá que distinguir o que foi pago para remunerar o exercício efetivo da atividade contratada para além do período normal de trabalho diário, do que foi pago para compensar o tempo de disponibilidade, este não tem natureza retributiva pelo não deve ser contabilizado nos pagamentos reclamados pelo Autor;
- O acréscimo pago pelo trabalho noturno visa compensar o trabalhador pelas condições mais penosas do desempenho da sua atividade nesse período, não se podendo considerar um correspetivo da prestação da atividade;
- Quanto ao descanso compensatório referiu que no âmbito do CCT aplicável, o regime do descanso compensatório apenas se aplica ao trabalho prestado em dia de descanso semanal ou em dia feriado se passado no estrangeiro, sendo o regime do Código do Trabalho incompatível com a especificidade do sector rodoviário e por isso inaplicável ao caso em apreço;
- A substituição do descanso compensatório por trabalho remunerado só pode efetuar-se se houver acordo nesse sentido entre o trabalhador e o empregador;
- Enquanto subsistir a relação de trabalho, é lícito ao empregador conceder os dias de descanso compensatório, mesmo que já tenham decorrido mais de 90 dias sobre o vencimento, com base no tempo de exercício efetivo da atividade que exceda o período normal de trabalho diário;
Conclui pedindo a procedência da exceção de prescrição de juros e a improcedência da ação.

Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência:
A) Condenou a R. a pagar ao A. a quantia em falta, que se vier a apurar em liquidação posterior, nas remunerações de férias e respetivos subsídios de férias e de Natal pagos nos anos de 2002 a 2012, correspondente à média dos valores pagos a título de subsídio noturno e trabalho suplementar propriamente dito nos 12 meses que antecederam tais pagamentos, acrescida de juros de mora desde as datas dos respetivos vencimentos até integral pagamento;
B) Condenar a R. a pagar ao A. a quantia de € 5.640,82 a título de descanso compensatório, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a data limite de 90 dias, subsequentes ao vencimento de cada período de descanso compensatório.
C) Absolver a R. do restante peticionado.

Inconformado com esta decisão judicial, o A. interpôs recurso de apelação, tendo formulado as seguintes conclusões:
I – As relações de trabalho entre A. e R. aplica-se o A.E. publicado no B.T.E. 1ª serie nº 38 de 15/10/1991 e suas sucessivas alterações.
II – O A. a solicitação da R. auferiu a título de horas extras, mensalmente, quantias pecuniárias desde Janeiro de 2002 a Dezembro de 2012 (vide recibos de vencimentos junto á p.i. como docs n.ºs 1 a 142 e matéria dada como provada e supra referida).
III – O A. executou ao longo do tempo a que se refere a ação sub judice, trabalho suplementar com regularidade a solicitação da R. e no interesse desta.
IV – O A. para além do trabalho suplementar efetivamente prestado para além do seu horário normal, esteve disponível para, quando a R. o entendesse, ordenar a execução desse trabalho.
V – A atividade diária do A. é organizada pela R., por escalas pelas quais lhe era atribuída uma chapa de serviço. Era,
VI – Pela consulta desta chapa o A. sabia em que períodos do dia, para além do intervalo de descanso, não tinha trabalho distribuído. Mas,
VII – Também sabia que durante tais períodos podia ser chamado para prestar qualquer serviço de motorista ou outro.
VIII – A R., até Fevereiro de 2009, sempre pagou ao A. o período de tempo posterior á 8ª hora do início da jornada de trabalho, na rubrica trabalho suplementar (H.Extr). Mas,
IX – A partir de Maio de 2009 tal período de tempo passou a ser pago sob as rubricas “H.Extra” e “Tempo de Disponibilidade”
X – A douta sentença recorrida acolheu o conceito de tempo de disponibilidade resultante do D.L. nº 237/2007 de 19/6 e por ele introduzido para pessoas que exerçam atividades móveis de transportes rodoviário, embora não tivesse aplicado o dito Decreto-lei.
XI – O A. ora recorrente exerce as atividades referidas no número imediatamente anterior.
XII – Da análise das ditas chapas, a douta sentença recorrida concluiu que o tempo em que o A. não conduzia era tempo de disponibilidade. E,
XIII – Embora pago pela R. como trabalho extraordinário ou ao preço de trabalho extraordinário/suplementar, não pode ser entendido como tempo de trabalho. E,
XIV – Consequentemente, o pagamento deste tempo não tem natureza retributiva.
XV – Insurge-se o A. contra tal conclusão e dela recorre. Na verdade,
XVI – Resulta da matéria dada como provada, que é no interesse da R. que o A. se encontra disponível para além do seu horário normal de trabalho, a fim de realizar trabalho suplementar sempre que lhe seja ordenado dentro da jornada de trabalho.
XVII – Resulta igualmente provado – ponto 2 da fundamentação da douta sentença – que o A., na grande maioria dos casos, não pode ir para casa (durante o período denominado de tempo de disponibilidade), por motivos vários, nomeadamente, distancia da mesma, não pode desenvolver tarefas de que gosta ou necessita, dado, v.g., o facto de estar fardado e não dispor de sitio para mudar de roupa e que só excecionalmente deixa as imediações das paragens ou se ausenta das estações. Contudo, não é obrigado a permanecer no local de trabalho.
XVIII – A douta sentença recorrida não considera que o pagamento dos períodos ditos de inatividade, não revestem a natureza de retribuição á luz dos artigos 249º e 258º dos C.T. de 2003 e 2009, respetivamente. Mas,
XIX – Considera o ora recorrente que tal pagamento deve revestir natureza retributiva. Dado que,
XX – Por um lado, são regulares e periódicas, isto é, são pagas mensalmente e dizem respeito a períodos de tempo quase diários, sendo igualmente parte não despicienda da retribuição mensal do Autor. Pelo que,
XXI – Na esteira por todos do estipulado no Ac. do S.T.J. no processo nº 2065/075 TTL.S.B.L 1.51 disponível em www.dgsi.pt, e do preceituado no disposto nos artigos 82º da LCT e nos artigos 249º e 258º dos C.T. de 2003 e 2009 respetivamente, devem ser tidos como pagamentos de natureza retributiva.
XXII – Por outro lado, tais períodos de tempo devem ser considerados tempo de trabalho e em consequência retribuídos como tal, foi sempre assim que a R. o fez. Pois,
XXIII – Se a R. sempre pagou esse tempo como tempo de trabalho extraordinário, é porque o considerou como tempo de trabalho. Aliás,
XXIV – Este entendimento resulta do preceituado no artigo 2º da Lei nº 73/98 de 10/11 e do artigo 156º nº 1 alínea a) do C.T. de 2003, bem como do disposto no artigo 5º em conjugação com disposto no artigo 197º nº 2 alínea a) do C.T. de 2009, que não são contrariados pelo A.E. aplicável á relação sub judice. Na verdade,
XXV – Tanto a R. como o A. sempre consideraram como tempo de trabalho as interrupções que a douta sentença recorrida apelida de tempo de disponibilidade.
XXVI – A consideração de tais períodos como tempo de trabalho resultam também do que é uso da empresa (matéria dada como provada e docs nºs 1 a 142 junto á p. i.)
XXVII – Estes períodos devem ser remunerados como trabalho extraordinário/suplementar, como, aliás, sempre foram. Dado que,
XXVIII – É tempo de trabalho que se verifica para além do tempo de trabalho normal (8 horas por dia). Assim,
XXIX – Decidindo como o fez, a douta sentença recorrida desrespeitou os normativos legais referidos supra em XXI e XXIV. Pelo que,
XXX – Deve a douta sentença recorrida ser parcialmente revogada, por violação de tais normativos, substituindo-se a mesma por outra que condene a R. como peticionado pelo A. ora recorrente, dado que o pedido de capital é líquido.

A R. interpôs recurso subordinado, tendo também arguido a nulidade da sentença por excesso de pronúncia e por falta de fundamentação.
Excesso de pronúncia, prevista no artigo 615º nº 1 alínea e) do Código de Processo Civil (CPC), porque, no entender da R., a sentença não a poderia ter condenado a pagar ao A. os juros moratórios cuja contagem se iniciasse em momento anterior à citação, pois ao fazê-lo condenou em quantidade superior ao pedido, assim violando o disposto no artigo 609º nº 1 NCPC.
Falta de fundamentação, prevista no artigo 615º nº1 alínea b) do CPC, porque no que respeita à condenação na quantia líquida de € 5.640,82, a título de descanso compensatório, à sentença falta em absoluto a fundamentação de facto, pois não contém qualquer exposição, por muito concisa que seja, que permita a quem a ler descortinar, mesmo ao de leve, quais os motivos de facto que motivaram o tribunal a formar a sua convicção quanto ao facto por si afirmado que o valor peticionado pelo A., e que a final lhe foi reconhecido, a título de descanso compensatório foi calculado apenas com base no trabalho suplementar propriamente dito, não tendo sido incluído nesse cálculo o período intitulado de tempo de disponibilidade.
A final formulou as seguintes conclusões:
A) A composição do subsídio de Natal, quer no âmbito do CT2003, como, depois, no âmbito do CT2029, restringe-se à retribuição base e às diuturnidades;
B) Ao condenar a ora recorrente a pagar ao A. a quantia em falta nos subsídios de natal pagos nos anos de 2004 a 2012 correspondente à média dos valores pagos a título de subsídio noturno e trabalho suplementar propriamente dito nos 12 meses que antecederam o pagamento desses subsídios, a Sentença recorrida interpretou incorretamente e, com isso, violou as disposições dos artigos 250º e 254º CT2003 e 262º e 263º CT2009;
C) O Tribunal recorrido não dispunha de todos os elementos necessários para proferir uma condenação líquida a título de descanso compensatório não gozado, faltando-lhe saber, em especial, quais os dias úteis em que foi prestado o trabalho suplementar que conferiu o direito ao descanso compensatório, qual o número de horas prestadas em cada um dos dias e qual a remuneração que a A. auferia no nonagésimo dia subsequente ao vencimento de cada dia de descanso não gozado, pelo que deveria ter feito uso do disposto no artigo 609º nº 2 NCPC, remetendo o apuramento dos valores devidos pela R. para liquidação posterior;
D) Ao proferir a condenação líquida que proferiu, a Sentença recorrida violou o disposto neste artigo 609º nº 2 NCPC.

Por seu turno, nas suas contra-alegações formulou as seguintes conclusões:
A) O Dec. Lei 237/2007, de 19 de Junho, procedeu à transposição da Diretiva 202/15/CE para o direito interno português e veio “regular determinados aspetos da organização do tempo de trabalho dos trabalhadores móveis em atividades de transporte rodoviário efetuadas em território nacional e abrangidas pelo Regulamento (CE) nº 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março;
B) Tal como a Diretiva transposta, o Dec. Lei nº 237/2007, de 19 de Junho, aplica-se aos trabalhadores móveis como tal se considerando aqueles que fazem parte do pessoal viajante ao serviço de um empregador que exerça a atividade de transportes rodoviários de passageiros ou de mercadorias, abrangida pelo Regulamento (CE) nº561/2006 cit. ou pelo AETR;
C) Ao contrário do sustentado no ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA de 11/03/2010 (FELIZARDO PAIVA), tirado no Processo 608/09.9TTVIS.C1 e conforme se reconheceu nos ACÓRDÃOS do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA de 17/12/2014 (ISABEL TAPADINHAS), tirado no processo nº 715/13.3TTVFX.L1-4, de 15/04/2015 (CELINA NÓBREGA), tirado no processo 717/13.0TTVFX.L1 e de 01/07/2015 (PAULA SANTOS), tirado no processo nº 720/13.0TTVFX.L1, o regime aprovado pelo Dec. Lei nº 237/2007 aplica-se aos contratos de trabalho como o dos autos e, por isso, conforma a organização dos tempos de trabalho do Autor;
D) O tempo de disponibilidade, definido, no artigo 2º alínea c) do Dec. Lei nº 237/2007 não é considerado tempo de trabalho pelo artigo 5º do mesmo diploma;
E) As regras de organização do tempo de trabalho estabelecidas pelo Dec. Lei nº 237/2007 são privativas dos trabalhadores móveis, criadas e delineadas tendo em atenção as especiais características da atividade, nomeadamente, a normal descontinuidade do exercício efetivo das funções dos condutores, características essas que impõem ritmos de trabalho e exigências próprios e, nos termos do disposto no seu artigo 1º nº 3, prevalecem sobre as disposições correspondentes do Código do Trabalho;
F) O que estas regras têm de especial em relação ao regime regra dos demais trabalhadores -- portanto dos trabalhadores não móveis aos quais se aplicam as regras do Código de Trabalho – é, além do mais, que no cômputo do período normal de trabalho diário e consequentemente, tanto no cômputo do período normal de trabalho semanal, como no cômputo do trabalho suplementar, não são contados os períodos de simples disponibilidade; ou seja, os períodos de disponibilidade são períodos neutros, que não contam como tempo de trabalho, mas que também não são tempos de descanso;
G) Assim, os períodos de inatividade do Autor que a Douta Sentença recorrida deu como provados, são verdadeiros tempos de disponibilidade em face da definição fornecida pelo artigo 2º alínea c) do Dec. Lei nº 237/2007, de 19 de Junho, que, por não serem considerados tempos de trabalho, não podem contar para o cômputo do respetivo horário de trabalho e, consequentemente, não podem ser tidos em conta no cálculo do trabalho suplementar constitutivo do direito aos descansos compensatórios;
H) Para o cálculo do descanso compensatório só poderá, pois, ser tomado em conta o tempo de exercício efetivo da atividade contratada que exceda o período normal de trabalho diário que cada trabalhador;
I) Os pagamentos que a R. ora recorrente fez ao A. sob a designação genérica de “H. EXTRA”, até Fevereiro de 2009 e sob a designação de “TEMPO DE DISPONIBILIDADE” e de “SUPLEMENTO DE DISPONIBILIDADE”, a partir de Março de 2009, compreenderam todo o tempo decorrido após a oitava hora contada do início do horário de trabalho, ressalvado apenas o tempo correspondente ao intervalo de descanso e quer se tenha tratado de tempo durante o qual ela exerceu a sua atividade, quer se tenha tratado de períodos durante os quais não houve prestação de qualquer tarefa de condução ou outra;
J) As importâncias que a R. pagou ao A. como compensação pelo tempo de disponibilidade não têm natureza retributiva, porque a retribuição é, desde logo e necessariamente, a contrapartida do trabalho e aquelas não se destinam a retribuir o trabalho, mas a compensar a simples disponibilidade, que não é tempo de trabalho;
K) A esta conclusão não pode objetar o facto da R. até fevereiro de 2009 ter pago tais importâncias sob a designação genérica de “H. EXTRA” (portanto, como se de trabalho suplementar se tratasse), pois, “ … em matéria de o vale também o princípio do realismo e não o do nominalismo. Em suma, o que importa saber para qualificar uma prestação como retribuição não é o nome que as partes lhe dão (…) mas sim se ela reúne as características legais e, designadamente, se é contrapartida do trabalho. Daí que (…) os empregadores possam demonstrar (…) que pagaram como trabalho suplementar, assim mencionado no recibo, não apenas trabalho suplementar genuíno, mas também horas de disponibilidade que não são tempo de trabalho e cuja contrapartida não é, por isso, retribuição”;
L) Em consequência, tais importâncias não são devidas nem na retribuição das férias, nem no subsídio de férias, nem, tão pouco, no subsídio de Natal;
M) Ao decidir que períodos de inatividade do A. não são tempos de trabalho e que, por isso, não podem ser considerados no cômputo do trabalho suplementar constitutivo do direito ao descanso compensatório e que os valores que a R. lhe pagou como compensação desses períodos não têm natureza retributiva, não devendo a média desses pagamentos integrar a remuneração das férias, do subsídio de férias e do subsídio de Natal, a Sentença recorrida não merece qualquer censura, pois procedeu a uma criteriosa aplicação do direito aos factos dados como provados.

A Senhora Procuradora-Geral Adjunta, neste tribunal da relação, emitiu parecer no sentido de que os recursos não merecem provimento.
Foi remetido o projeto de acórdão aos Ex.mos Juízes-adjuntos que, atendendo à natureza das questões a decidir, deram o seu acordo para serem dispensados os vistos, nos termos do art. 657º nº4 do Código de Processo Civil.

II. O objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões que os recorrentes retiram das respetivas motivações, tendo sido suscitadas no recurso independente e no recurso subordinado as seguintes questões:
A) Recurso independente (interposto pelo A):
Saber se as quantias que a R. pagou ao A. a título de tempo de disponibilidade integram a retribuição e se devem ser consideradas no cálculo da retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal.
B) Recurso subordinado (interposto pela R.):
Nulidades da sentença:
B1- Excesso de pronúncia pelo facto de a R. ter sido condenada a pagar ao A. juros moratórios para além dos pedidos;
B2-Falta de fundamentação no que respeita à condenação na quantia líquida de € 5.640,82, a título de descanso compensatório.

Recurso:
B3- Saber se no cálculo do subsídio de Natal pago nos anos de 2004 a 2012 deve ser considerada a média dos valores pagos a título de subsídio noturno e trabalho suplementar;
B4- Saber se o tribunal recorrido dispunha de todos os elementos necessários para condenar a R. na quantia líquida de € 5.640,82, a título de descanso compensatório não gozado.

III. Factos dados como provados pela primeira instância:
A) O A. foi admitido ao serviço da R. em 27/04/2001, para prestar serviço de motorista de veículos pesados de passageiros;
B) No exercício das suas funções o A. ocupava-se da condução de veículos automóveis pesados de passageiros, prestava serviço de agente único, zelava pela boa conservação e limpeza da viatura, verificava os níveis de óleo, água, combustível;
C) Sempre o A. desempenhou tais funções sob a ordem, direção e fiscalização permanentes da R.;
D) O horário de trabalho do A. era de oito horas por dia e quarenta horas semanais;
E) Às relações de trabalho existentes entre A. e R. aplicava-se o AE publicado no B.T.E. 1ª serie nº 38, de 15/10/1991 e a suas sucessivas alterações;
F) O A. tinha os seus dias de folga ao Domingo e Segunda-feira;
G) O local de trabalho do A. era em Faro;
H) O A. auferia mensalmente quantias pecuniárias a título de retribuição de base, diuturnidades, subsídio de agente único, trabalho suplementar, subsídio noturno, refeições, tempo de disponibilidade;
I) No ano de 2002, a R. pagou ao A. a título de horas extra as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 605,09;
- Fevereiro, a quantia de € 402,78;
- Março, a quantia de € 239,43;
- Abril, a quantia de € 265,03;
- Maio, a quantia de € 342,28;
- Junho, a quantia de € 388,76;
- Julho, a quantia de € 513,17;
- Agosto, a quantia de € 456,80;
- Setembro, a quantia de € 313,90;
- Outubro, a quantia de € 332,54;
- Novembro, a quantia de € 356,65;
- Dezembro, a quantia de € 231,63;
J) No ano de 2003, a R. pagou ao A. a título de horas extra as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 583,94;
- Fevereiro, a quantia de € 485,21;
- Março, a quantia de € 361,55;
- Abril, a quantia de € 449,03;
- Maio, a quantia de € 290,55;
- Junho, a quantia de € 373,85;
- Julho, a quantia de € 543,00;
- Agosto, a quantia de € 409,75;
- Setembro, a quantia de € 449,12;
- Outubro, a quantia de € 383,02;
- Novembro, a quantia de € 283,09;
- Dezembro, a quantia de € 385,85;
K) No ano de 2004, a solicitação da R., o A. auferiu a título de horas extra as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 457,45;
- Fevereiro, a quantia de € 390,03;
- Março, a quantia de € 505,72;
- Abril, a quantia de € 464,38;
- Maio, a quantia de € 514,85;
- Junho, a quantia de € 531,52;
- Julho, a quantia de € 490,91;
- Agosto, a quantia de € 396,10;
- Outubro, a quantia de € 512,54;
- Novembro, a quantia de € 456,34;
- Dezembro, a quantia de € 593,87;
L) No ano de 2005, a solicitação da R., o A. auferiu a título de horas extra as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 559,71;
- Fevereiro, a quantia de € 675,38;
- Março, a quantia de € 826,42;
- Abril, a quantia de € 936,36;
- Maio, a quantia de €866,06;
- Junho, a quantia de € 953,31;
- Julho, a quantia de € 592,58;
- Agosto, a quantia de € 1.006,24;
- Setembro, a quantia de € 1.151,25;
- Outubro, a quantia de 8.026,36;
- Novembro, a quantia de € 486,50;
- Dezembro, a quantia de € 815,62;
M) No ano de 2006, a solicitação da R., o A. auferiu a título de horas extra as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 1.151,13;
- Fevereiro, a quantia de € 737,02;
- Março, a quantia de € 741,60;
- Abril, a quantia de € 621,47;
- Maio, a quantia de € 933,20;
- Junho, a quantia de € 832,30;
- Julho, a quantia de € 934,69;
- Agosto, a quantia de € 1.178,33;
- Setembro, a quantia de € 959,43;
- Outubro, a quantia de € 1.038,48;
- Novembro, a quantia de € 780,79;
- Dezembro, a quantia de € 1.035,79;
N) No ano de 2007, a solicitação da R., o A. auferiu a título de horas extra as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 599,20;
- Fevereiro, a quantia de € 490,99;
- Março, a quantia de € 617,63;
- Abril, a quantia de € 711,41;
- Maio, a quantia de € 822,97;
- Junho, a quantia de € 949,94;
- Julho, a quantia de € 774,09;
- Agosto, a quantia de € 960,84;
- Setembro, a quantia de € 1.022,54;
- Outubro, a quantia de € 989,44;
- Novembro, a quantia de € 752,61;
- Dezembro, a quantia de € 852,90;
O) No ano de 2008, a solicitação da R., o A. auferiu a título de horas extra as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 729,91;
- Fevereiro, a quantia de € 596,01;
- Março, a quantia de € 582,38;
- Abril, a quantia de € 595,51;
- Maio, a quantia de € 333,49;
- Junho, a quantia de € 687,58;
- Julho, a quantia de € 614,05;
- Agosto, a quantia de € 520,96;
- Setembro, a quantia de € 676,69;
- Outubro, a quantia de € 494,74;
- Novembro, a quantia de € 550,71;
- Dezembro, a quantia de € 566,77;
P) No ano de 2009, a solicitação da R., o A. auferiu a título de horas extra, tempo de disponibilidade e suplemento de disponibilidade as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 620,82;
- Fevereiro, a quantia de € 708,15;
- Março, a quantia de € 551,95;
- Abril, a quantia de € 500,14;
- Maio, a quantia de € 662,25;
- Junho, a quantia de € 715,13;
- Julho, a quantia de € 659,96;
- Agosto, a quantia de € 613,82;
- Setembro, a quantia de € 683,43;
- Outubro, a quantia de € 760,35;
- Novembro, a quantia de € 664,31;
- Dezembro, a quantia de € 530,70;
Q) No ano de 2010, a solicitação da R., o A. auferiu a título de horas extra, tempo de disponibilidade e suplemento de disponibilidade as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 780,37;
- Fevereiro, a quantia de € 617,48;
- Março, a quantia de € 564,82;
- Abril, a quantia de € 496,37;
- Maio, a quantia de € 637,29;
- Junho, a quantia de € 422,76;
- Julho, a quantia de € 563,21;
- Agosto, a quantia de € 510,56;
- Setembro, a quantia de € 591,04;
- Outubro, a quantia de € 799,95;
- Novembro, a quantia de € 629,03;
- Dezembro, a quantia de € 502,20;
R) No ano de 2011, a solicitação da R., o A. auferiu a título de Horas extra, tempo de disponibilidade e suplemento de disponibilidade as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 807,28;
- Fevereiro, a quantia de € 566,33;
- Março, a quantia de € 453,40;
- Abril, a quantia de € 672,05;
- Maio, a quantia de € 601,29;
- Junho, a quantia de € 518,08;
- Julho, a quantia de € 725,69;
- Agosto, a quantia de € 524,82;
- Setembro, a quantia de € 540,68;
- Outubro, a quantia de € 614,42;
- Novembro, a quantia de € 610,75;
- Dezembro, a quantia de € 600,81;
S) No ano de 2012, a solicitação da R., o A. auferiu a título de Horas extra, tempo de disponibilidade e suplemento de disponibilidade as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 745,56;
- Fevereiro, a quantia de € 428,95;
- Março, a quantia de € 601,05;
- Abril, a quantia de € 473,22;
- Maio, a quantia de € 647,09;
- Junho, a quantia de € 626,03;
- Julho, a quantia de € 555,13;
- Agosto, a quantia de € 466,94;
- Setembro, a quantia de € 520,45;
- Outubro, a quantia de € 457,11;
- Novembro, a quantia de € 478,36;
- Dezembro, a quantia de € 460,20;
T) No ano 2002, a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1.590,03;
U) No ano de 2003 a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1 629,78;
V) No ano 2004, a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1 670,52;
X) No ano 2005, a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1 703,94;
Y) No ano 2006, a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1.787,01;
Z) No ano 2007, a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1.823,70;
AA) No ano 2008, a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1.868,28;
BB) No ano 2009, a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1.904,85;
CC) No ano 2010, a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1.904,85;
DD) No ano 2011, a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1.969,56;
EE) No ano 2012, a R. pagou ao A. a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, a quantia de € 1.969,56;
FF) No ano de 2002, por solicitação da R., o A. efetuou trabalho noturno, tendo auferido a este título, neste ano, as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 9,21;
- Fevereiro, a quantia de € 12,39;
- Março, a quantia de € 2,48;
- Abril, a quantia de € 20,07;
- Maio, a quantia de € 66,51;
- Junho, a quantia de € 39,37;
- Julho, a quantia de € 6,12;
- Agosto, a quantia de € 17,77;
- Setembro, a quantia de € 41,28;
- Outubro, a quantia de € 17,96;
- Novembro, a quantia de € 15,48;
- Dezembro, a quantia de € 17,58;
GG) No ano de 2003, por solicitação da R., o A. efetuou trabalho noturno, tendo auferido a este título, neste ano, as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 18,54;
- Fevereiro, a quantia de € 28,21;
- Março, a quantia de € 27,82;
- Abril, a quantia de € 18,41;
- Maio, a quantia de € 18,41;
- Junho, a quantia de € 15,28;
- Julho, a quantia de € 6,27;
- Agosto, a quantia de € 0,20;
- Setembro, a quantia de € 13,32;
- Outubro, a quantia de € 5,48;
- Novembro, a quantia de € 3,33;
- Dezembro, a quantia de € 1,96;
HH) No ano de 2004, por solicitação da R., o A. efetuou trabalho noturno, tendo auferido a este título, neste ano, as seguintes quantias mensais:
- Fevereiro, a quantia de € 1,00;
- Março, a quantia de € 5,62;
- Abril, a quantia de € 4,62;
- Maio, a quantia de € 4,42;
- Junho, a quantia de € 2,81;
- Julho, a quantia de € 21,89;
- Agosto, a quantia de € 4,42;
- Outubro, a quantia de € 2,61;
- Dezembro, a quantia de € 1,61;
II) No ano de 2006, por solicitação da R., o A. efetuou trabalho noturno, tendo auferido a este título, neste ano, as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 3,48;
- Fevereiro, a quantia de € 2,87;
- Abril, a quantia de € 0,42;
- Maio, a quantia de € 3,44;
- Julho, a quantia de € 0,86;
- Agosto, a quantia de € 4,94;
- Setembro, a quantia de € 10,31;
- Outubro, a quantia de € 2,79;
- Novembro, a quantia de € 5,58;
- Dezembro, a quantia de € 2,36;
JJ) No ano de 2007, por solicitação da R., o A. efetuou trabalho noturno, tendo auferido a este título, neste ano, as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 1,93;
- Fevereiro, a quantia de € 2,19;
- Março, a quantia de € 3,51;
- Abril, a quantia de € 7,89;
- Maio, a quantia de € 7,01;
- Agosto, a quantia de € 1,75;
- Setembro, a quantia de € 1,10;
- Outubro, a quantia de € 1,32;
- Novembro, a quantia de € 2,19;
- Dezembro, a quantia de € 0,44;
LL) No ano de 2009, por solicitação da R., o A. efetuou trabalho noturno, tendo auferido a este título, neste ano, as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 0,90;
- Março, a quantia de € 0,69;
- Abril, a quantia de € 1,14;
- Maio, a quantia de € 0,92;
- Junho, a quantia de € 0,69;
- Julho, a quantia de € 0,46;
- Agosto, a quantia de € 2,75;
- Setembro, a quantia de € 1,83;
- Outubro, a quantia de € 1,37;
- Novembro, a quantia de € 0,46;
MM) No ano de 2010, por solicitação da R., o A. efetuou trabalho noturno, tendo auferido a este título, neste ano, as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 0,46;
- Fevereiro, a quantia de € 2,29;
- Março, a quantia de € 2,06;
- Abril, a quantia de € 2,06;
- Maio, a quantia de € 2,29;
- Junho, a quantia de € 2,06;
- Julho, a quantia de € 1,83;
- Agosto, a quantia de € 2,29;
- Setembro, a quantia de € 1,83;
- Outubro, a quantia de € 2,29;
- Novembro, a quantia de € 2,75;
- Dezembro, a quantia de € 2,29;
NN) No ano de 2011, por solicitação da R., o A. efetuou trabalho noturno, tendo auferido a este título, neste ano, as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 2,06;
- Fevereiro, a quantia de € 1,85;
- Março, a quantia de € 2,09;
- Abril, a quantia de € 2,78;
- Maio, a quantia de € 1,89;
- Junho, a quantia de € 1,42;
- Julho, a quantia de € 2,84;
- Agosto, a quantia de € 3,79;
- Setembro, a quantia de € 1,89;
- Outubro, a quantia de € 2,37;
- Novembro, a quantia de € 2,84;
- Dezembro, a quantia de € 2,37;
OO) No ano de 2012, por solicitação da R., o A. efetuou trabalho noturno, tendo auferido a este título, neste ano, as seguintes quantias mensais:
- Janeiro, a quantia de € 2,37;
- Fevereiro, a quantia de € 1,42;
- Março, a quantia de € 2.13;
- Abril, a quantia de € 2,60;
- Maio, a quantia de € 1,89;
- Junho, a quantia de € 1,89;
- Julho, a quantia de € 1,89;
- Agosto, a quantia de € 2,84;
- Setembro, a quantia de € 1,89;
- Outubro, a quantia de € 3,08;
- Novembro, a quantia de € 2,13;
- Dezembro, a quantia de € 1,89;
PP) No ano de 2002 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 800 horas;
QQ) No ano de 2003 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 832 horas;
RR) No ano de 2004 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 832 horas;
SS) No ano de 2005 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 1376 horas;
TT) No ano de 2006 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 1536 horas;
UU) No ano de 2007 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 1344 horas;
VV) No ano de 2008 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 1024 horas;
XX) No ano de 2009 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 704 horas;
YY) No ano de 2010 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 256 horas;
ZZ) No ano de 2011 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 256 horas;
AAA) No ano de 2012 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 224 horas;
BBB) A R. não concedeu ao A. descanso compensatório nem lhe pagou qualquer quantia a título de descanso compensatório;
CCC) A R. é uma organização empresarial com mais de 300 trabalhadores;
DDD) A R. exerce a atividade de transporte público rodoviário de passageiros em todo o território nacional e no estrangeiro, realizando serviços regulares, serviços regulares especializados e serviços ocasionais;
EEE) No que concerne ao serviço de carreiras, e sem incluir as carreiras Expresso cujo percurso se desenvolve em todo o território continental, a R. exerce a sua atividade com predominância na região do Algarve;
FFF) A atividade da R. é marcada por uma forte pendularidade, existindo uma forte concentração de meios humanos e materiais em dois períodos distintos do dia: o primeiro na ponta da manhã (06h30m/10h) e que correspondente às deslocações casa/emprego e o segundo na ponta da tarde (16h30m/20h/30m) que corresponde às deslocações emprego/casa;
GGG) Em cada um desses períodos a R. é obrigada a afetar a totalidade dos meios humanos e materiais disponíveis para poder satisfazer as necessidades de transporte das populações;
HHH) Por tal facto, nesses períodos, a R. tem de empregar todos os motoristas e todos os autocarros disponíveis;
III) Fora desses períodos de ponta, a R. apenas necessita de afetar entre 40% a 60% dos seus motoristas e autocarros, dependendo da hora e da zona de tráfego;
JJJ) Por isso, salvo raras exceções, a hora de termo do trabalho diário fixada nos horários de trabalho dos motoristas ocorre sempre mais de dez horas depois da hora do início, sendo normal a fixação de horários com amplitudes de doze horas;
LLL) É, por isso, a R. que, no seu interesse, necessita que o A. execute trabalho noturno e para além do seu período normal de trabalho e esteja disponível para, quando o entenda, ordene a execução desse trabalho;
MMM) Os motoristas entre o início e o termo da jornada de trabalho têm períodos de inatividade;
NNN) Não obstante, a R. remunera aos seus motoristas todas as horas compreendidas entre o início e o termo dos respetivos horários de trabalho, ressalvado o intervalo de refeição e quer se trate de tempo durante o qual eles exercem efetivamente a atividade de motorista, quer se trate de tempo durante o qual nenhum trabalho de condução ou de outra natureza lhes é solicitado;
OOO) A R. remunera as primeiras oito horas ao valor da hora normal, sem qualquer acréscimo e as horas seguintes ao valor da hora normal com os acréscimos previstos para a remuneração do trabalho suplementar;
PPP) A R. organiza a atividade diária do A. e dos demais motoristas por escalas, pelas quais atribui a cada um uma chapa de serviço;
QQQ) As chapas de serviço mencionam, além do mais, as horas de início e do termo da jornada de trabalho, os intervalos de descanso e os serviços de transporte que o trabalhador deve assegurar, com indicação dos respetivos horários;
RRR) A descrição dos serviços de transporte constante da chapa é feita cronologicamente, com indicação do horário de partida e do horário de chegada de cada serviço;
SSS) As escalas de serviço são comunicadas aos motoristas pelo menos no dia anterior;
TTT) E as chapas de serviço estão afixadas nos vários locais de trabalho para consulta dos motoristas;
UUU) Pela consulta da chapa o A. e os demais motoristas da R. também ficam logo a saber em que períodos do dia, para além do intervalo de descanso, não terão qualquer tarefa atribuída, de condução ou outra exceto a de abertura e preparação do veículo com vista ao início do trajeto;
VVV) Mas, porque não são intervalos de descanso, durante tais períodos os motoristas sabem que podem ser chamados para ocorrer à realização qualquer serviço que não esteja previsto na chapa mas que seja necessário assegurar;
XXX) A partir de Março de 2009 cada chapa de serviço passou a mencionar separadamente os ditos períodos de inatividade, com a duração de cada um e a duração acumulada diária, designando-os expressamente como “Tempo de disponibilidade”;
YYY) No período de 01/01/2008 a 31.12.2012, a R. fixou ao A. as horas de início e de termo do horário de trabalho diário, bem como os intervalos para refeição, correspondentes à chapa de serviço nº 1119, 1120, 1158, 1166, 3165;
ZZZ) O horário de trabalho correspondente à chapa nº. 1199 tinha início às 07.00 e termo às 21.00 horas, com intervalo para refeição das 12.00 às 14.00 horas;
AAAA) O horário de trabalho correspondente à chapa nº. 1120 era à segunda, terça, quarta, quinta e sexta com início às 07.00 e termo às 20.30 horas, com intervalo de refeição das 12.30 às 14.30 horas, ao sábado com início às 07.00 horas e termo às 20.30, com intervalo para refeição das 11.00 às 12.00 horas, e ao domingo e em dias feriados com início às 06.00 e termo às 20.30 horas, com intervalo para refeição das 10.00 às 12.00 horas;
BBBB) O horário de trabalho correspondente à chapa nº. 1158 tinha início às 12.00 e termo às 00.30 horas, com intervalo para refeição das 17.15 às 19.15 horas;
CCCC) O horário de trabalho correspondente à chapa nº. 1166 tinha início às 14.00 e termo às 02.45 horas do dia seguinte, com intervalo para refeição das 19.00 às 21.00 horas;
DDDD) O horário de trabalho correspondente à chapa nº. 3165 tinha início às 06.30 e termo às 18.45 horas, com intervalo para refeição das 11.30 às 13.30 horas;
EEEE) Quando realizou o horário correspondente à chapa nº 1119 o A. realizou os serviços de transporte constantes do escrito de fls. 276 cujo teor se dá por reproduzido;
FFFF) Quando realizou o horário correspondente à chapa nº 1120 o A. realizou os serviços de transporte constantes dos escritos de fls. 270 a 272 cujo teor se dá por reproduzido;
GGGG) Quando praticou o horário de trabalho correspondente à chapa nº 1158 o A. realizou os serviços de transporte constante de fls. 273 cujo teor se dá por reproduzido;
HHHH) Quando praticou o horário de trabalho correspondente à chapa nº 1166 o A. realizou os serviços de transporte constante de fls. 274 e cujo teor se dá por reproduzido;
IIII) Quando praticou o horário de trabalho correspondente à chapa nº 3165 o A. realizou os serviços de transporte constante de fls. 275 cujo teor se dá por reproduzido;
JJJJ) Quando praticou o horário de trabalho correspondente à chapa nº 1119 o A. não prestou nem lhe foi solicitado qualquer trabalho de condução ou outro a não ser a abertura do veículo e preparação do mesmo para início do trajeto, das 10.00 às 10.15 horas, das 11.40 às 12.00, das 14.00 às 14.15 e das 15.40 às 18.00 horas;
LLLL) Quando praticou o horário de trabalho correspondente à chapa nº 1120 e realizou os serviços de transporte na mesma previstos, o A. não prestou, nem lhe foi solicitado, qualquer trabalho, a não ser a abertura do veículo e preparação do mesmo, para início do trajeto das 8.55 às 10.00, das 14.30 às 14.50, das 15.20 às 16.35, das 18.15 às 18.30 de segunda a sexta, ao domingo e em dia feriado das 07.00 às 07.15, das 08.55 às 10.00, das 12.00 às 12.15, das 13.55 às 15.15, das 16.55 às 17.30, das 17.37 às 18.08 e das 18.15 às 18.30, e aos sábados das 08.55 à 11.00, das 12.00 às 12.15, das 13.55 às 1515, das 16.55 às 17.30, das 17.37 às 18.08 e das 18.15 às 18.30 horas;
MMMM) Quando praticou o horário de trabalho correspondente à chapa nº 1158 e realizou os serviços de transporte na mesma previstos, o A. não prestou, nem lhe foi solicitado, qualquer trabalho de condução ou outro, a não ser a abertura do veículo e preparação do mesmo para início do trajeto, das 16.30 às 17.15 das 19.15 às 19.30 horas;
NNNN) Quando praticou o horário de trabalho correspondente à chapa nº 1166 e realizou os serviços de transporte na mesma previstos, o A. não prestou, nem lhe foi solicitado, qualquer trabalho de condução ou outro, a não ser a abertura do veículo e preparação do mesmo para início do trajeto, das 14.15 às 14.30 horas, das 18.30 às 19.00 e das 21.00 às 22.30 horas;
OOOO) Quando praticou o horário de trabalho correspondente à chapa nº 3165 e realizou os serviços de transporte na mesma previstos, o A. não prestou, nem lhe foi solicitado, qualquer trabalho de condução ou outro, a não ser a abertura do veículo e preparação do mesmo para início do trajeto, das 06.45 às 7.00, das 11.00 às 11.30 horas, das 13.30 às 14.15 e das 18.05 às 18.20 horas;
PPPP) Até Fevereiro de 2009, e independentemente da realização de alguma atividade pelo A., a R. pagou-lhe o período de tempo posterior á 8ª hora do início da jornada de trabalho na rubrica respeitante ao trabalho suplementar, que vinha designada no recibo de vencimento pela expressão abreviada “H. EXTRA”;
QQQQ) A partir de Maio de 2009 o pagamento dos ditos períodos passou a ser feita sob a designação de “T. Disp.”, que é a forma abreviada de designar “Tempo de Disponibilidade”:
RRRR) Tal alteração foi comunicada previamente a todos os trabalhadores e foi agrafada aos recibos de vencimento do mês de Fevereiro de 2 009;
SSSS) O A. e a R. nunca acordaram substituir descanso compensatório por trabalho suplementar prestado em dia útil por remuneração;
TTTT) No mês em que a R. remunera o mês de férias, subsídio de férias e de natal paga, também, ao A. o valor médio anual que auferiu a título de subsídio de agente único;
UUUU) Os motoristas não estão obrigados a permanecer no local de trabalho durante os períodos dentro da jornada de trabalho em que não prestam nem lhes é solicitado que prestem serviço de transporte ou outro, embora possam ser chamados para o fazer.

IV. Fundamentação
A) Recurso interposto pelo A. (independente).
No recurso interposto pelo A. coloca-se a questão de saber se as quantias que a R. lhe pagou a título de tempo de disponibilidade integram a retribuição e se devem ser consideradas no cálculo da retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal.
O art. 258º do Código do Trabalho (CT), sob a epígrafe “Princípios gerais sobre a retribuição” estabelece o seguinte:
1 - Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho.
2 - A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie.
3 - Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.
4 - À prestação qualificada como retribuição é aplicável o correspondente regime de garantias previsto neste Código.
Acentua-se o carácter regular e periódico da prestação como contrapartida do trabalho prestado, sendo certo que a prestação poderá não constituir retribuição se constituir uma contrapartida de uma causa específica e individualizável, ainda que inerente ao trabalho prestado, como resulta do art. 260º do CT.
Por seu turno, o art. 197º nº1 do CT dispõe: considera-se tempo de trabalho qualquer período durante o qual o trabalhador exerce a atividade ou permanece adstrito à realização da prestação, bem como as interrupções e os intervalos previstos no número seguinte.
No nº2 da disposição legal citada enumera-se diversas situações que ainda assim são consideradas compreendidas no tempo de trabalho.
O Decreto-Lei nº 237/2007, de 19 de junho, no seu artigo 2º al.c) define “ Tempo de disponibilidade”: como qualquer período, que não seja intervalo de descanso, descanso diário ou descanso semanal, cuja duração previsível seja previamente conhecida pelo trabalhador, nos termos previstos em convenção coletiva ou, na sua falta, antes da partida ou imediatamente antes do início efetivo do período em questão, em que este não esteja obrigado a permanecer no local de trabalho, embora se mantenha adstrito à realização da atividade em caso de necessidade, bem como, no caso de trabalhador que conduza em equipa, qualquer período que passe ao lado do condutor ou num beliche durante a marcha do veículo.
O art. 5º do referido diploma legal, sob a epígrafe “ Tempo de disponibilidade” refere: O tempo de disponibilidade previsto na alínea c) do art. 2º não é considerado tempo de trabalho.
No caso concreto, ficou provado que a R. remunera aos seus motoristas todas as horas compreendidas entre o início e o termo dos respetivos horários de trabalho, ressalvado o intervalo de refeição e quer se trate de tempo durante o qual eles exercem efetivamente a atividade de motorista, quer se trate de tempo durante o qual nenhum trabalho de condução ou de outra natureza lhes é solicitado (alínea NNN dos factos provados).
Também ficou provado que os motoristas não estão obrigados a permanecer no local de trabalho durante os períodos dentro da jornada de trabalho em que não prestam nem lhes é solicitado que prestem serviço de transporte ou outro, embora possam ser chamados para o fazer (alínea UUUU).
A jurisprudência tem entendido que as quantias pagas para compensar este tempo de disponibilidade, embora traduzam uma componente remuneratória a que o trabalhador tem direito, não integram a retribuição do trabalhador nem gozam da proteção legal que a esta é conferida, pois visam compensar, não o trabalho prestado, mas a especial penosidade que decorre do facto de o trabalhador estar disponível para poder ser chamado em qualquer altura para prestar serviço.[1]
Esta posição estriba-se no entendimento de que o tempo de disponibilidade apenas se considera tempo de trabalho se o trabalhador tiver de se manter fisicamente presente no local de trabalho.
Parece-nos que esta posição é a que mais se adequa ao disposto no art. 197º do CT quando procura definir tempo de trabalho, pois resulta do mesmo a exigência de que o trabalhador mesmo quando não está a exercer a atividade deve permanecer adstrito à realização da prestação, o que inculca uma disponibilidade total, não compatível com a realização de quaisquer outras atividades de carácter pessoal que tenham de ser desenvolvidas fora da órbita da empresa.
Nesta linha, julga-se improcedente o recurso independente, interposto pelo A., no qual se pretendia que o tempo de disponibilidade fosse considerado tempo de trabalho, não sendo pois de considerar as quantias que a R. pagou ao A. a título de tempo de disponibilidade no cálculo da retribuição das férias e no subsídio de férias e de Natal.

B) Recurso subordinado
Nulidades da sentença:
A R. de forma expressa e separadamente, no requerimento de interposição de recurso subordinado, veio arguir nulidades da sentença.
No processo laboral, resulta do art. 77º do CPT um regime particular de arguição de nulidades de sentença, que se traduz no facto de a arguição ter de ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso e quando da sentença não caiba recurso ou não se pretenda recorrer, a arguição das nulidades da sentença é feita em requerimento dirigido ao juiz que a proferiu.
A competência para decidir sobre a arguição pertence ao tribunal superior ou ao juiz, conforme o caso, mas o juiz pode sempre suprir a nulidade antes da subida do recurso.
No caso concreto dos autos, a R. arguiu as nulidades logo no requerimento de interposição de recurso, dirigido ao Sr. Juiz do Tribunal recorrido, pelo que cumpriu a disposição legal referida.
As nulidades da sentença resultam da violação da lei processual por parte do juiz ao proferir a decisão, situando-se assim no âmbito restrito da elaboração de decisões judiciais, desde que essa violação preencha um dos casos contemplados no nº1 do art. 615º do CPC.
Como refere o Prof. Antunes Varela não se incluiu entre as nulidades de sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário.
B1- A R. veio arguir a nulidade da sentença prevista no artigo 615º nº 1 alínea e) do CPC porque, no seu entender, a sentença não a poderia ter condenado a pagar ao A. os juros moratórios cuja contagem se iniciasse em momento anterior à citação, pois ao fazê-lo condenou em quantidade superior ao pedido, violando assim o disposto no artigo 609º nº 1 NCPC.
Na petição inicial o A. formulou o seu pedido no montante global de €29.696,35, pedindo juros de mora, à taxa legal, a contar da data em que apresentou a petição inicial até integral pagamento.
Na sentença, a R. foi condenada a pagar ao A. juros de mora desde as datas dos respetivos vencimentos até integral pagamento, quanto às quantias em falta, referentes às remunerações de férias, subsídios de férias e Natal, e em juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a data limite de noventa dias, subsequentes ao vencimento de cada período de descanso compensatório, no que diz respeito à quantia de € 5.640,82 devida a esse título.
Vejamos se assiste razão à R.
Nos termos do nº1 art.º 805.º do C.C., o devedor fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.
Segundo o nº2 da mesma disposição legal se a obrigação tiver prazo certo ou se provier de facto ilícito, haverá mora independentemente de interpelação, o mesmo acontecendo se o próprio devedor impedir a interpelação, caso em que se considera interpelado na data em que normalmente o teria sido.
Finalmente o n.º 3 do preceito citado refere que se o crédito for ilíquido, não haverá mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que já haja mora, nos termos da primeira parte deste número.
No caso que nos ocupa estamos perante responsabilidade de natureza contratual, pois a obrigação de pagamento dos créditos reconhecidas ao A. emergem de contrato de trabalho que mantém com a R.
Os créditos retributivos são obrigações de prazo certo, nos termos do art. 278º do Código do Trabalho, pelo que o empregador fica constituída em mora se o trabalhador, por facto que não lhe seja imputável, não puder dispor do montante da retribuição na data do vencimento.
No entanto, há que ter em conta o disposto no citado n.º 3 do art.º 805.º do C.C, pois se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor.
No caso concreto dos autos, atenta a natureza dos créditos reconhecidos ao A. na sentença, não há dúvida de que a recorrida dispunha de todos os elementos necessários para proceder à liquidação dos mesmos.
Pelo que fica dito, os juros são devidos desde a data em que foram pedidos pelo A., data da apresentação da petição inicial, e não como consta da sentença, desde a data do vencimento das remunerações, ou como pretende a R., desde a citação.
Na verdade, embora tratando-se de obrigações de prazo certo, há que ter em conta o pedido formulado, uma vez que não estamos perante direitos irrenunciáveis.[2]
Assim, tendo o A. pedido a condenação da R. no pagamento de juros de mora, desde a data da apresentação da petição inicial, relativos a créditos laborais vencidos anteriormente, a condenação da R., em primeira instância, no pagamento de juros mora desde as datas dos vencimentos das respetivas prestações, violou o disposto no art. 609º nº1 do Código de Processo Civil, e cometeu a nulidade prevista no art. 615º nº 1 al. e) do mesmo diploma legal.
B2 e B4 - A R. veio, ainda, arguir a nulidade da sentença por falta de fundamentação, prevista no artigo 615º nº1 alínea b) do CPC, porque no que respeita à condenação na quantia líquida de € 5.640,82, a título de descanso compensatório, a sentença não contém qualquer exposição, por muito concisa que seja, que permita a quem a ler descortinar, mesmo ao de leve, quais os motivos de facto que motivaram o tribunal a formar a sua convicção quanto ao facto por si afirmado que o valor peticionado pelo A., e que a final lhe foi reconhecido, a título de descanso compensatório foi calculado apenas com base no trabalho suplementar propriamente dito, não tendo sido incluído nesse cálculo o período intitulado de tempo de disponibilidade.
Esta mesma questão é também fundamento do recurso subordinado, interposto pela R. (sob a alínea B4 das questões a decidir), tendo sido questionado se o tribunal recorrido dispunha de todos os elementos necessários para condenar a R. na quantia líquida de € 5.640,82, a título de descanso compensatório não gozado.
Tratando-se, substancialmente, da mesma questão iremos apreciá-la nas duas vertentes em que foi equacionada, para determinar se a pretensão da R. merece ou não provimento.
Para sustentar a sua posição a R. invoca o disposto na alínea b) do nº1 do art. 615º do Código de Processo Civil (CPC), que dispõe que a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direitos que justificam a decisão.
Como observa J.O. Cardona Ferreira[3] a hipótese da alínea b) do nº1 do art. 615º conjuga-se com o dever de fundamentar as decisões que impende sobre o Juiz, acrescentando que omissão dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, não é o mesmo que fundamentação insuficiente, inadequada ou, até errada.
Também Fernando Amâncio Ferreira[4] sustenta que a falta de motivação suscetível de integrar a nulidade de sentença é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos quer estes respeitem aos factos quer ao direito.
Adianta que a motivação incompleta, deficiente, ou errada não produz nulidade afetando somente o valor doutrinal da sentença e sujeitando-a consequentemente ao risco de ser revogada ou alterada quando apreciada em recurso.
Esclarece ainda que para que haja falta de fundamentos de facto, como causa da nulidade de sentença, torna-se necessário que o juiz omita totalmente a especificação dos factos que considere provados, de harmonia com o que se estabelece no nº3 do art. 607º do CPC, e que suportam a decisão.
Quanto aos fundamentos de direito adverte que o julgador não tem que apreciar todas as razões jurídicas produzidas pelas partes, se bem que não se encontre dispensado de resolver todas as questões por elas suscitadas, não sendo forçoso que indique as disposições legais em que baseia a sua decisão, bastando que mencione as regras e os princípios que a apoiam.
No caso concreto dos autos a R. foi condenada a pagar ao A. a quantia de € 5.640,82, a título de descanso compensatório.
Na sentença recorrida, ao que importa, refere-se o seguinte:
Resultou provado que o ano de 2002 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 800 horas (alínea PP da matéria de facto provada).
No ano de 2003 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 832 horas (alínea QQ da matéria de facto provada).
No ano de 2004 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 832 horas (alínea RR da matéria de facto provada).
No ano de 2005 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 1376 horas (alínea SS da matéria de facto provada).
No ano de 2006 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 1536 horas (alínea TT da matéria de facto provada).
No ano de 2007 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 1344 horas (alínea UU da matéria de facto provada).
No ano de 2008 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 1024 horas (alínea VV da matéria de facto provada).
No ano de 2009 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 704 horas (alínea XX da matéria de facto provada).
No ano de 2010 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 256 horas (alínea YY da matéria de facto provada).
No ano de 2011 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 256 horas (alínea ZZ da matéria de facto provada).
No ano de 2012 o A. esteve ao dispor da R., para além do horário de 8 horas diárias, 224 horas (alínea AAA da matéria de facto provada).
A R. não concedeu ao A. descanso compensatório nem lhe pagou qualquer quantia a título de descanso compensatório (alínea BBB da matéria de facto provada).
Outra questão que se coloca consiste em saber se o descanso compensatório se deve circunscrever ao tempo em que ocorreu efetiva prestação de trabalho, obstando, assim, aquela inatividade ao gozo do descanso compensatório.
Tudo o que ficou dito permite concluir que há lugar à concessão de descanso compensatório, reservado para a realização de trabalho suplementar propriamente dito.
Sucede que no cálculo do montante peticionado a título de descanso compensatório não foi incluído o período intitulado de tempo de disponibilidade.
Tem o A. direito a receber o montante peticionado a título de descanso compensatório, ou seja, a quantia de € 5.640,82.
Constata-se que a primeira instância deu como provado nas alíneas PP) a AAA) dos factos provados, que constam da sentença recorrida, a matéria alegada pelo A. nos artigos 113º a 127º da petição inicial, referente ao descanso compensatório.
Tal matéria foi impugnada pela R. nos artigos 58º a 71º da contestação, tendo referido, nomeadamente, o seguinte:
O A. vem peticionar uma compensação pecuniária correspondente aos descansos compensatórios não gozados a que alegadamente teria direito pela prestação de trabalho suplementar.
Antes do mais, cumpre referir que o A. não discrimina os dias em que o alegado trabalho suplementar foi prestado e quantas horas prestou em cada dia, limitando-se a indicar as quantidades de horas mensais que a R. lhe remunerou como trabalho suplementar.
Porém, a mera indicação genérica das quantidades de horas ou de dias pagos em cada mês ou ano não é suficiente para apurar se e quantos dias de descanso compensatórios seriam devidos ao A., sendo absolutamente essencial a discriminação das horas prestadas em cada dia.
Tanto mais que, como se alegou e demonstrará, o facto de a R., ter remunerado horas com o acréscimo devido para as horas de trabalho suplementar não significa que nessas horas o A. tenha executado a atividade contratada, ou sequer estado adstrito a realização da mesma.
O pomo da discórdia está precisamente em saber se as horas que o A. alegou que esteve ao dispor da R., para além do horário de oito horas diárias, e que foi dado como provado, foram todas elas horas de trabalho efetivo ou também tempo de disponibilidade.
Como já se referiu a jurisprudência tem entendido que as quantias pagas para compensar este tempo de disponibilidade, embora traduzam uma componente remuneratória a que o trabalhador tem direito, não integram a retribuição do trabalhador nem gozam da proteção legal que a esta é conferida, pois visam compensar, não o trabalho prestado, mas a especial penosidade que decorre do facto de o trabalhador estar disponível para poder ser chamado em qualquer altura para prestar serviço.
O pedido formulado pelo A. a título de descanso compensatório estriba-se no trabalho suplementar efetivamente prestado, pelo menos é o que retiramos do alegado no art. 114º da petição inicial quando refere que “nos termos do disposto no art. 9º do Decreto-Lei nº421/83, de 2/12 e no art. 229º do Código do Trabalho, a R. estava obrigada a conceder ao A. descanso compensatório remunerado, correspondente a 255 das horas de trabalho suplementar realizado por este.”
Posto isto, constatamos que da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida e da ata de 16/04/2015, onde está consignada a fundamentação da decisão proferida sobre a matéria de facto, não se vislumbra a possibilidade de efetuar qualquer demonstração que permita a conclusão que consta da sentença recorrida no sentido de que no cálculo do montante peticionado a título de descanso compensatório não foi incluído o período intitulado de tempo de disponibilidade.
Esta afirmação de que o montante de € 5.640,82, peticionado a título de descanso compensatório, não incluiu no seu cálculo o tempo de disponibilidade, contemplando apenas o trabalho efetivamente prestado, não está devidamente demonstrada.
Estamos perante uma questão que, a nosso ver, não é enquadrável em sede de nulidade de sentença por falta de fundamentação, pois a decisão recorrida não enferma de falta absoluta de fundamentação.
Trata-se antes de um erro na construção do silogismo judiciário, inserido no processo de avaliação factual em sede de julgamento, pois considerou-se que no cálculo do referido montante não foi incluído o tempo de disponibilidade, sem haver suporte para tal conclusão.
Este estado de dúvida que paira sobre a solução dada a esta questão teve a sua origem no facto de o A., na petição inicial, não ter discriminado os dias em que o alegado trabalho suplementar foi prestado e quantas horas prestou em cada dia, limitando-se a indicar as quantidades de horas mensais que a R. lhe remunerou como trabalho suplementar.
De qualquer forma, tendo o A. logrado provar que prestou trabalho suplementar, esta questão poderá ser solucionada em sede de liquidação de sentença.
Nesta linha é de considerar procedente a argumentação da R. no sentido de que o tribunal recorrido não dispunha de todos os elementos necessários para a condenar na quantia líquida de € 5.640,82, a título de descanso compensatório não gozado.
B3- Finalmente a R. questiona se no cálculo do subsídio de Natal pago nos anos de 2004 a 2012 deve ser considerada a média dos valores pagos a título de subsídio noturno e trabalho suplementar.
Na sentença recorrida considerou-se que no cálculo do subsídio de Natal referente aos anos de 2002 a 2012 devia ter sido considerada a média dos valores pagos ao A. a título de subsídio noturno e trabalho suplementar, e assim condenou a R.
Já no que diz respeito às quantias pagas ao A. a título de tempo de disponibilidade, considerou-se na sentença que as mesmas não revestem a natureza de retribuição, e por essa razão não devem ser consideradas no cálculo do subsídio de Natal, tendo a R. sido absolvida quanto a essa parte do pedido.
A questão suscitada pela R., a propósito do cálculo do subsídio de Natal tem a ver com a entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, aprovado pela Lei nº99/2003, de 27 de agosto, que entrou em vigor em 1 de dezembro de 2003.
No regime anterior ao Código do Trabalho de 2003 (CT/2003), designado por Lei do Contrato de Trabalho (LCT), o subsídio de Natal estava previsto no DL nº 88/96, de 3/7, que no seu artigo 2º referia que os trabalhadores tinham direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, que deveria ser pago até 15 de dezembro de cada ano.
Entendia-se então que as componentes variáveis da retribuição deviam ser levadas em conta no cálculo da retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal, atendendo-se aos respetivos valores médios recebidos, nos termos previsto no art.º 84.º, n.º 2, da LCT, que dispunha que a retribuição compreendia a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indiretamente, em dinheiro ou em espécie.
No entanto, nessa altura, já se entendia que deveriam ser excluídas da retribuição de férias e respetivo subsídio e do subsídio de Natal as prestações que eram atribuídas ao trabalhador, não para retribuir o trabalho no condicionalismo em que era prestado, mas para o compensar de despesas que se presumia terem sido feitas por não se encontrar no seu domicílio, ou por ter que se deslocar deste e para este para executar o contrato de trabalho.[5]
O CT/2003, aprovado pela Lei nº99/2003, de 27 de agosto, que entrou em vigor em 1 de dezembro de 2003, no seu art. 254º nº1 dispõe que o trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, que deve ser pago até 15 de dezembro de cada ano.
A novidade está no disposto no art. 250º nº1 do mesmo diploma legal, que sob a epígrafe de “Cálculo de prestações complementares e acessórias” estabelece que “ quando as disposições legais, convencionais ou contratuais não disponham em contrário, entende-se que a base de cálculo das prestações complementares e acessórias nelas estabelecidas é constituída apenas pela retribuição base e diuturnidades.”
Este regime legal foi transposto para o Código do Trabalho de 2009 (CT/2009), aprovado pela Lei nº7/2009, de 12 de fevereiro, que entrou em vigor em 17/02/2009, sendo os artigos 263º nº1 e 262º nº1 as normas correspondentes.
Temos assim, que a partir de 1 de dezembro de 2003 no cálculo do subsídio de Natal, salvo disposição legal, convencional ou contratual em contrário, deve de atender-se apenas à retribuição base e diuturnidades.
No caso concreto dos autos o Acordo de Empresa aplicável[6] não contraria o regime previsto nos CT/2003 e CT/2009, pois na sua Cláusula 52ª estatui que os trabalhadores abrangidos têm direito a um subsídio correspondente a um mês de retribuição, o qual será pago ou posto à sua disposição até 15 de dezembro de cada ano.
Sendo assim, no cálculo do subsídio de Natal referente aos anos de 2004 a 2012 devido ao A. deve apenas ser considerada a retribuição base e as diuturnidades.
Julga-se pois procedente o recurso subordinado, interposto pela R., na parte em que pretende que não seja considerada a média dos valores pagos ao A. a título de subsídio noturno e trabalho suplementar no cálculo do subsídio de Natal referente aos anos de 2004 a 2012.

V. Decisão
Em face do exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
a) Julgar improcedente o recurso interposto pelo A., no qual pretendia que no cálculo da retribuição das férias e dos subsídios de férias e de Natal, referente aos anos de 2004 a 2012, deveria ser considerada a média das quantias que a R. lhe pagou a título de tempo de disponibilidade;
b) Julgar procedente a arguição de nulidade da sentença, deduzida pela R., quanto à condenação em juros, revogando-se esse segmento, e consequentemente condenando-se a R. a pagar ao A., sobre todas as quantias que lhe são devidas e que se vierem a liquidar, juros de mora desde a data em que foram pedidos, que foi a data da apresentação da petição inicial;
c) Julgar procedente o recurso subordinado, interposto pela R., na parte em que pretende que não seja considerada a média dos valores pagos ao A. a título de subsídio noturno e trabalho suplementar no cálculo do subsídio de Natal referente aos anos de 2004 a 2012, revogando-se consequentemente esse segmento da decisão recorrida;
d) Julgar improcedente a arguição de nulidade de sentença, deduzida pela R., por falta de fundamentação, pois a decisão recorrida não enferma de falta absoluta de fundamentação;
e) Julgar procedente o recurso subordinado interposto pela R., na parte em que a condenou a pagar ao A. a quantia líquida de € 5.640,82, a título de descanso compensatório não gozado, revogando-se nessa parte a sentença recorrida, devendo apurar-se a quantia devida a esse título, em sede de liquidação de sentença;
f) Quanto a custas:
Sem custas quanto ao recurso do A., pois está isenta nos termos do disposto no art. 4º nº1, al. h) do Regulamento das Custas Processuais (RCP), sem prejuízo da sua responsabilidade pelos encargos a que tenha dado origem, uma vez que a sua pretensão foi totalmente vencida, nem pelos reembolsos, tudo nos termos do art.4º nº6 e nº7 do mesmo diploma legal.
No que diz respeito ao recurso da R. as custas são devidas na proporção do decaimento, fixando-se a mesma em 1/10 para a R. e em 9/10 para o A., não sendo devidas por este face à isenção de que goza.

Anexa-se sumário do acórdão.
Évora, 07/09/2016
Joaquim António Chambel Mourisco (Relator)
Moisés Pereira da Silva
João Luís Nunes

__________________________________________________
[1] Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 27/03/2014- Proc. nº 408/07.0TTEVR.E2.S1, de 23/06/2010-Proc. nº 607/07.5STJLB.L1.S1, de 30/05/2013- Proc. nº 1259/08.0TTLSB.L1.S1 e 15/05/2005- Proc. nº 2428/09.1TTLSB.L1.S1, publicados em www.dgsi.pt.
[2] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25/03/2010- Processo nº 1052/05.2TTMTS.S1, publicado em www.dgsi.pt.
[3] Guia de Recursos em Processo Civil, 6ª Edição, Coimbra Editora, pág.69.
[4] Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, pág. 39.
[5] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 17/01/2007- 06S2188, publicado em www.dgsi.pt.
[6] Acordo de Empresa entre a Rodoviária do Algarve, S.A., e o Sindicato dos Transportes Rodoviários do Distrito de Faro, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, nº 38 de 15/10/1991.