Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
289/16.3T8FTR-A.E1
Relator: MÁRIO COELHO
Descritores: REQUERIMENTOS PROBATÓRIOS
ROL DE TESTEMUNHAS
Data do Acordão: 06/28/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: O art. 598.º, n.º 1, do Código de Processo Civil permite a alteração do requerimento probatório na audiência prévia, em termos tais que não impedem a apresentação de meios de prova diversos dos apresentados inicialmente.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Sumário:
1. O art. 598.º n.º 1 do Código de Processo Civil permite a alteração do requerimento probatório na audiência prévia, em termos tais que não impedem a apresentação de meios de prova diversos dos apresentados inicialmente.
2. As exigências de contraditório impõem que as partes organizem a sua prova em pleno conhecimento dos articulados da parte contrária e do enunciado dos temas de prova.



Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

No Juízo de Competência Genérica de Fronteira, (…) propôs acção declarativa de processo comum contra (…) e (…), pedindo a resolução de determinado contrato de arrendamento rural, devendo os RR. ser condenados a despejar o prédio rústico identificado nos autos e a entregá-lo livre e devoluto de pessoas e bens, assim como a pagar as rendas vencidas e não pagas.
Com a petição inicial, a A. juntou cinco documentos e não arrolou qualquer testemunha.
Contestada a acção, realizou-se audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova. Ainda na mesma audiência, a A. apresentou um rol de testemunhas, o qual foi admitido.

Deste despacho os RR. recorreram, concluindo:
1. O presente recurso vem interposto do despacho judicial proferido na audiência prévia realizada em 17 de Março de 2017, despacho judicial que admitiu o rol de testemunhas apresentado pela autora, nos termos do artigo 598.º do C.PC.
2. Na audiência prévia realizada no dia 17 de Março de 2017, a autora, através do seu mandatário, no uso da palavra, apresentou o seguinte rol de testemunhas (segue-se a respectiva identificação).
3. Por despacho judicial agora recorrido, foi o referido rol de testemunhas de imediato admitido pela Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, justificando a sua admissão nos termos do artigo 598.º, n.º 1 e 2, do C.P.C, o que os recorrentes não concordam, por violação expressa das disposições legais constantes nos artigos 552.º, n.º 2 e 591.º e 598.º do CPC.
4. A autora não juntou com a sua petição inicial, apresentada em 08 de Novembro de 2016, prova testemunhal, mas apenas 5 (cinco) documentos.
5. Também em 3 de Janeiro de 2017, a autora, apresentou requerimento de reposta às excepções invocadas pelos réus, aqui recorrente, e não apresentou prova testemunhal, mas apenas juntou 2 (dois) documentos.
6. Com o Novo Código de Processo Civil (Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho), a apresentação do requerimento probatório com a petição inicial, passou a ser obrigatória, ressalvando-se a possibilidade de ajustamento do rol à factualidade ulteriormente alegada pelo réu, ou à alteração ou aditamento em momento próprio.
7. O rol de testemunhas deverá ser indicado na petição inicial, sendo que após esse momento apenas poderá ser alterado e nunca entregue ex novo, nos termos do artigo 552.º, n.º 2, do C.P.Civil.
8. A possibilidade de alteração ou aditamento do rol de testemunhas pressupõe a apresentação de um rol dentro do prazo previsto no artigo 552º, nº 1, C.P.C., o que não aconteceu,
9. Pelo que a sua apresentação em sede de audiência prévia é manifestamente extemporâneo, não podendo ser aceite.
10. Tendo sido admitido, o despacho recorrido violou assim o disposto nos artigos 552.º, n.º 2 e 591.º e 598.º do CPC, devendo ser substituído por outro que não admita o rol de testemunhas apresentado pela autora em sede de audiência prévia, com as legais consequências processuais, daí resultantes.

Na resposta pugnou-se pela manutenção da decisão recorrida.
Já nesta Relação, o relator proferiu decisão singular negando provimento ao recurso.
Mais uma vez inconformados, os RR. requerem que sobre a matéria recaia Acórdão, nos termos do art. 652.º, n.º 3, do Código de Processo Civil. Renovam os mesmos argumentos que já haviam apresentado no recurso.
A parte contrária sustentou a manutenção do decidido.
O relevo factual a ponderar é o supra retratado.

Aplicando o Direito.
Sabido que é pelas conclusões do recurso que se delimita o respectivo objecto, a questão colocada pelos recorrentes limita-se a aferir se a alteração na audiência prévia do requerimento probatório pode envolver a apresentação de outros meios de prova não indicados inicialmente. Mais especificamente, pretende-se saber se, tendo na petição inicial sido indicada prova meramente documental, poderá a A. arrolar testemunhas na audiência prévia, recorrendo ao disposto no art. 598.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Adiante-se desde já que a nossa resposta é positiva.
O art. 598.º, n.º 1, do Código de Processo Civil permite a alteração na audiência prévia do requerimento probatório, em termos tais que não impedem a apresentação de meios de prova diversos dos apresentados inicialmente. Como notam Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro[1], “se na lei antiga se admitia a indicação dos meios de prova na audiência preliminar, agora só se admite a alteração do requerimento probatório na audiência prévia, sem possibilidade de a relegar para momento ulterior. A alteração do requerimento probatório pressupõe que já tenha sido apresentado um requerimento que então se altera. Esta modificação pode, todavia, ser da mais diversa ordem, desde a ampliação do rol de testemunhas – dentro dos limites fixados por lei –, até à apresentação de diferente meio de prova, passando pelo requerimento de notificação de testemunhas já arroladas” – o sublinhado é da nossa responsabilidade.
Em igual sentido, se pronuncia, ainda, Paulo Pimenta[2], afirmando que a alteração prevista no referido normativo “não parece conhecer restrições, apenas se exigindo que a parte tenha apresentado inicialmente requerimento probatório, condição para se falar em alteração”, acrescentando, na nota 679, que ali “inclui-se, naturalmente, a hipótese de requerer meios de prova não indicados inicialmente. E também constitui alteração de requerimento probatório (permitida, pois) a circunstância de a parte vir agora arrolar testemunhas ou requerer perícia, quando (apenas) juntou à petição ou à contestação documentos para prova dos fundamentos da acção ou da defesa.”
Esta interpretação parece-nos a única compatível com o texto do art. 598.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, ao não estabelecer qualquer restrição ao modo de alteração do requerimento probatório, assim permitindo a apresentação de diferente meio de prova, como as exigências de contraditório impõem que as partes organizem a sua prova em pleno conhecimento dos articulados da parte contrária e do enunciado dos temas de prova.
Logo, apesar da A. apenas ter apresentado prova documental com a sua petição inicial, não estava impedida de, face à contestação apresentada e ao modo como os temas de prova foram enunciados, apresentar outros meios de prova no momento processual previsto no art. 598.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, como a confissão, a perícia, a inspecção judicial ou, como foi o caso, a testemunhal.
Ponderando que esta é a linha jurisprudencial[3] que reputamos mais conforme aos princípios processuais civis supra mencionados, o recurso merece ser desatendido.

Decisão.
Destarte, nega-se provimento ao recurso.
Custas pelos recorrentes.

Évora, 28 de Junho de 2017
Mário Branco Coelho (relator)
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
Maria da Conceição Ferreira
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[1] In Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil – Os Artigos da Reforma, vol. I, 2014, 2.ª ed., pág. 561.
[2] In Processo Civil Declarativo, 2016, pág. 296 e nota 679.
[3] No mesmo sentido da decisão, vejam-se os Acórdãos da Relação de Lisboa de 15.09.2016 e de 23.03.2017, proferidos, respectivamente, nos Procs. 1130-14.7TVLSB-A.L1-8 e 425-16.0YIPRT-A.L1-6, ambos publicados em www.dgsi.pt.