Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
108/16.0T8FAR-A.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: ARTICULADO SUPERVENIENTE
FACTOS NOVOS
Data do Acordão: 03/23/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Os factos novos não podem corresponder a uma situação de alteração da causa de pedir fora dos condicionalismos dos artigos 264º e 265º do Código de Processo Civil, nem o articulado superveniente pode surgir associado ao aditamento de factos que sejam mero complemento ou concretização dos que hajam anteriormente alegado ou que se apresentem como simplesmente instrumentais da pretensão deduzida, dado que, nesta última hipótese, por força dos poderes de cognição do Tribunal presentes no artigo 5º do Código de Processo Civil, o julgador está vinculado a tomar posição sobre os mesmos.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo nº 108/16.0T8FAR-A.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Instância Central – Juízo Cível – J4

Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório:
Na presente acção declarativa de condenação proposta por “(…), Lda.” contra “(…) – Mediação Imobiliária, Lda.”, a Autora veio interpor recurso do despacho que não admitiu um articulado superveniente apresentado e a correspondente prova de sustentação dessa factualidade. *
A sociedade “(…), Lda.” deduziu os seguintes pedidos principais:
a) Ser declarada com justa causa e por incumprimento contratual imputável à Ré a resolução por parte da Autora do contrato de arrendamento celebrado entre Autora e Ré.
b) Ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de € 361.952,83 (trezentos e sessenta e um mil, novecentos e cinquenta e dois euros e oitenta e três cêntimos), acrescida de juros de mora comerciais até integral pagamento, a título de responsabilidade civil pelos danos causados.
A título subsidiário e relativamente à parte pecuniária, a Autora formula sucessivos pedidos subsidiários de pagamento de indemnização fundados no abuso de direito, no enriquecimento sem causa e em juízos de equidade.
*
A recorrente não se conformou com a referida decisão e as alegações de recurso continham as seguintes conclusões:
A) Alega a Autora, como facto constitutivo do direito de que se arroga (entre outros fundamentos) que a exigência que a R. Senhoria lhe impôs, através de comunicação de 6 de Maio de 2015, de “abertura das referidas passagens” consubstanciava uma violação do contrato e a imposição de algo a que não correspondia nenhum interesse juridicamente atendível da Ré, e se tratava de exigência ilegítima, por realizada em abuso de direito.
b) Em articulado superveniente alegou que havia entretanto tomado então conhecimento que posteriormente à resolução do contrato, tinham ocorrido novos factos que, nos mesmos termos, de acordo com a causa de pedir da acção, relevavam para a consideração do incumprimento contratual da parte da Ré Senhoria e de que a exigência por si formulada de “abertura das referidas passagens” não correspondia sequer a nenhum interesse juridicamente atendível da sua parte.
c) Em boa verdade a Autora alegou na acção (entre outros) que a exigência da Ré Senhoria de manter “a abertura das referidas passagens, sob pena de incumprimento contratual”,
i. não correspondia a nenhum interesse juridicamente atendível da mesma, não havendo qualquer interesse ou essencialidade, para a própria Ré, na interpretação por si feita da mesma cláusula do contrato no sentido que exigia à Autora manter “a abertura das referidas passagens”;
ii. que a cláusula do contrato de arrendamento sobre a matéria não contemplava qualquer exigência deste tipo;
iii. e que, ademais, a sua exigência de manter “a abertura das referidas passagens” constituía um flagrante caso de abuso de direito.
d) Os factos supervenientes alegados permitem fundamentar essa nenhuma essencialidade da Ré e esse seu nenhum interesse juridicamente atendível em exigir à Autora “a abertura das referidas passagens”. Afinal, ao arrendatário subsequente do mesmo espaço, veio a Ré permitir-lhe coisa diferente de “manter a abertura das referidas passagens”. E, assim sendo, “manter a abertura das referidas passagens” não correspondia a nenhum interesse juridicamente essencial ou atendível da mesma.
e) Interessam directamente à acção, tal como a Autora a pré-figurou, tais factos supervenientes.
f) A matéria dos factos supervenientes permite também trazer aos autos não só o contrato de arrendamento estabelecido pela Ré com o novo inquilino e o estabelecimento (ou não) de análoga imposição contratual – o que é realmente directamente relacionado com a causa de pedir – e permite adquirir processualmente que a solução prática que o novo inquilino encontrou para a passagem, em relação à qual a Ré está de acordo, é igual aquela que a Autora executou e que a Ré lhe exigiu destruir e substituir por uma imposição da “abertura das referidas passagens”.
g) A aquisição processual dos factos supervenientes jus-fundamentará igualmente, tal como a Autora desenhou a acção, que a imposição da abertura da passagem à Autora não está contemplada no contrato de arrendamento, tal como o nº3 da cláusula primeira foi interpretado, interpretação decorrente da situação actualmente existente de um novo inquilino, em que uma mesma cláusula (que constará do novo arrendamento) é interpretada pela Ré de modo diferente à interpretação que fez quando resolveu exigir à Autora a “abertura da passagem”.
h) O comportamento da Ré descrito nos factos supervenientes, ainda que ocorrido temporalmente depois da resolução do contrato de arrendamento, permite verificar o sentido que Ré tem sobre uma mesma questão fundamental de interpretação e de uma mesma cláusula contratual, inserida em dois diferentes contratos que ela assinou, e uma cláusula igual, o que é facto superveniente directamente relacionado com a questão em discussão e, portanto, facto essencial em que se baseia a causa de pedir. E não meramente instrumental.
i) A Autora alegou também na p.i. que a exigência de “manter a abertura das referidas passagens” que a Ré lhe fez, sempre seria era um caso de abuso de direito.
j) Se a Ré – como a Autora quer sindicar através da aquisição processual dos factos supervenientes – tem um direito absolutamente análogo perante um outro inquilino, e se com esse outro inquilino se porta de forma flagrantemente dissemelhante, não lhe exigindo “abertura de passagens” e permitindo-lhe, no mesmíssimo contexto contratual, manter as passagens encerradas, este outro comportamento releva como integrador da causa de pedir no que ao abuso de direito diz respeito. E, portanto, trata-se de factos essenciais em que se fundamenta a causa de pedir.
k) É certo que o despacho recorrido afirma que indeferiu o articulado superveniente mas que os factos podem enquadrar-se no âmbito dos factos instrumentais. Contudo, tal consideração viola a lei processual, justamente na vertente do direito de acção.
l) O que o Tribunal não pode fazer, e fê-lo, é julgar inadmissível que uma parte adite matéria de facto aos autos com base num juízo de inadequação processual, aliás, inexistente. Negar esse direito à parte, quando previsto na lei processual, nega o próprio direito de acção e não serve os interesses da justiça material.
m) Não se pode, cremos bem, fazer o que fez o tribunal recorrido: rejeitar, por inadmissibilidade, a introdução em juízo de um facto novo superveniente, e rejeitar o oferecimento da prova respectiva, e ao mesmo tempo decidir que ponderará o mesmo, ou não, a final, como instrumental.
n) Primeiro, porque impede uma parte de discutir a questão em julgamento. Não só o facto não foi admitido, como a prova que foi oferecida e requerida para a sua demonstração foi julgada inadmissível.
o) Segundo, porque ao recusar a prova junta e requerida para provar o facto superveniente, o Tribunal deixa ao sabor das referências porventura existentes na prova pré-existente dos autos o resultado da prova do mesmo. O que não faz sentido, justamente porque os temas de prova (ou o antigo questionário) têm exactamente por função enquadrar a matéria de facto a provar na prova a fornecer. p) Basta atentar no resultado do despacho recorrido. Esta metodologia processual impede a produção de prova requerida com o articulado superveniente – que não é produzida por o mesmo articulado ter sido rejeitado e, com ele, rejeitada também foi a prova oferecida. Esta mesma metodologia impede o recurso verdadeiro e próprio sobre a matéria de facto superveniente, pois ao não ter sido admitido o facto superveniente, naturalmente o mesmo não será susceptível de reconsideração de prova em sede de recurso.
q) Por outro lado, a lei processual impõe ao julgador que a sentença deva atender aos factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que se produzam até ao encerramento da discussão, quando tais factos, segundo o direito substantivo aplicável, tenham influência sobre a existência ou conteúdo da relação controvertida. Isto por forma a que a sua decisão corresponda à situação existente no momento do encerramento da discussão. É o regime do artº 611º do CPC.
r) Atento o princípio da economia processual, desde que existam factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que forem supervenientes – ocorram ou o seu conhecimento tem lugar após a apresentação dos articulados - qualquer das partes tem o direito de os alegar em articulado superveniente, até ao encerramento da discussão. Foi o que a Recorrente fez.
s) Parece, assim, à Recorrente que os factos por si supervenientemente articulados são co-constitutivos do direito que a Autora se arroga na acção e, por força do regime do artigo 588º do CPC, podem ser deduzidos em articulado posterior, e concretamente, nos termos do nº 3, até ao termo da audiência final. Pelo que apenas com violação deste regime do artigo 588º do CPC, os mesmos puderam não ser admitidos.
t) O acima referido aplica-se mutatis mutandis ao requerimento de meio de prova, também ele indeferido. Devendo o Tribunal ponderar a situação não faz nenhum sentido processual que o Tribunal ignore acolher a prova que lhe é requerida para provar o facto. Para que o tribunal pondere o que a Recorrida permite contratualmente ao seu novo inquilino num mesmo quadro contratual, é direito processual da Autora que o Tribunal conheça o novo contrato da nova inquilina e visualize as fotografias do estabelecimento gelataria ali implantado, verificando se à nova inquilina foi exigido “manter a abertura das referidas passagens”.
u) Mesmo que os factos supervenientes não fossem essenciais, e fossem meramente instrumentais, ainda assim o despacho recorrido deveria ter admitido a prova requerida, justamente em decorrência de ter aceite que os factos são relevantes (como acessórios) para a causa. Ainda que como acessórios. É que se são acessórios, sobre eles há-de ser feita prova, a fim de confirmar/infirmar os mesmos, cabendo depois ao tribunal ajuizar da sua pertinência. Mas admitindo a prova, necessariamente.
v) Estando assente que os meios probatórios indeferidos (documentos juntos e entrega de documento pela Ré que tem em seu poder) dizem respeito aos factos, atento o pedido e a causa de pedir, parece então evidente a pertinência dos mesmos elementos documentais; a relevância dos mesmos; a disponibilidade de um deles pela Ré; e a indisponibilidade do mesmo pela A.
w) Assim, a ponderação que o Tribunal deve fazer relativamente à admissão dos meios de prova requeridos passa pela ponderação, por um lado, da necessidade/conveniência dos mesmos para a parte requerente em função as regras do ónus da prova, e pela ponderação do sacrifício que constitui para a contra-parte a sua admissão/decretação.
x) Os documentos juntos que foram indeferidos como meio de prova são eles próprios evidentes. As fotografias mostram as paredes da gelataria (actual estabelecimento instalado no locado) e mostram que o novo inquilino não manteve a abertura das passagens. Mostram paredes, prateleiras, balcões…. a tapar as passagens que a Recorrida exigiu à Autora que fossem abertas.
y) A junção aos autos do contrato de arrendamento – que se trata de documento a que a Recorrente não tem acesso, nem tem à sua disposição – mostrará que análoga cláusula aquela que consta do contrato com a Recorrente constará desse outro contrato. A sua junção não constitui qualquer sacrifício processual relevante da parte onerada com a sua junção. É só tirar uma cópia…
z) A utilidade processual dos documentos é evidente. E resulta evidente do requerido. A pertinência é inquestionável quanto à descoberta da verdade. Ao alcance de um mero despacho de deferimento da junção de documentos, pode o tribunal tomar conhecimento de matéria relevantíssima, quiçá decisiva para a causa.
aa) Ou pelo menos com efeito de inversão de ónus de prova ou ainda como início de prova dos factos alegados pela Recorrente.
bb) Nos pratos da balança da justiça, tendo em conta a regra da colaboração processual, mal andamos se estando alguma verdade processual ao alcance da mera junção de uns documentos, e ainda que se tratasse de prova de factos instrumentais, se se nega a uma parte essa possibilidade.
cc) Conduzindo a decisão recorrida a um sacrifício enorme da Autora que se vê impossibilitada de provar por fotografias factos e de deitar mão de documento que, existindo, sabe relevante para a causa, e que a Ré por sua iniciativa não juntou aos autos, e não tendo outros meios processuais para os obter, ela é, em si mesmo, injusta e injustificada, e como tal inadmissível, porque violadora do regime do artigo 417º do CPC.
dd) Se, como no caso, se trata de documentar factos essenciais, ou meramente instrumentais que seja, e se por recurso a esses mesmos documentos é possível fazer luz processual sobre os factos sem qualquer sacrifício enorme ou desproporcionado sobre a Ré, só com violação do regime dos artigos 417º e 436º do CPC se pode determinar o indeferimento deste tipo de prova.
ee) Mais, tratando-se também de um documento em poder da contra-parte, identificado enquanto tal, nos termos dos artigos 417º, 432º, 436º e 7º do CPC, competira ao Tribunal deferir a pretensão da Autora requerer à Ré que o apresentasse.
ff) Assim, por violação do princípio da cooperação processual, e dos regimes dos artigos 417º, 432º, 436º e 7º do CPC, deve o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que defira o requerido.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, e provado, com a consequente anulação do despacho recorrido e a sua substituição por outro que defira o requerido. Assim se fazendo justiça».
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Não houve lugar a resposta da contraparte.
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Admitido o recurso, foram observados os vistos legais.
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II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do NCPC), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do NCPC). Acresce que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação da questão da rejeição da admissão do articulado superveniente e, consequentemente, dos meios probatórios de suporte da referida peça processual.
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III – Fundamentação:
Os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que forem supervenientes podem ser deduzidos em articulado posterior ou em novo articulado, pela parte a quem aproveitem, até ao encerramento da discussão (artigo 588º, nº 1, do Código de Processo Civil).
Dizem-se supervenientes tanto os factos ocorridos posteriormente ao termo dos prazos marcados nos artigos precedentes como os factos anteriores de que a parte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos, devendo neste caso produzir-se a prova da superveniência (artigo 588º, nº 2, do Código de Processo Civil).
O juiz profere despacho liminar sobre a admissão do articulado superveniente, rejeitando-o quando, por culpa da parte, for apresentado fora de tempo, ou quando for manifesto que os factos não interessam à boa decisão da causa; ou ordenando a notificação da parte contrária para responder em 10 dias, observando-se, quanto à resposta, o disposto no artigo anterior (artigo 588º, nº 4, do Código de Processo Civil).
A admissibilidade dos articulados supervenientes depende, além do mais, da relevância ou irrelevância do facto respectivo quanto à pretensão deduzida[1]. Refere Lebre de Freitas que «podem, depois de terminado o prazo para o último articulado da parte, ocorrer novos factos – ou elementos de facto – constitutivos da situação jurídica do autor (ou do facto objecto da acção de simples apreciação) ou factos modificativos ou extintivos dessa situação (superveniência objectiva)»[2].
A lei impõe ao julgador uma intervenção de controlo no sentido de apurar da tempestividade e, bem assim, da utilidade dos factos supervenientes para a justa decisão do litígio, expressa esta última na alocução «quando for manifesto que os factos não interessam à boa decisão da causa».
Os factos supervenientes atendíveis terão de ser relevantes – ainda que instrumentais – com aptidão para modificarem ou extinguirem o direito peticionado, quer por via principal, quer reconvencional. O juízo decisor terá de ponderar se o facto que se apresenta importa para a decisão nos precisos termos em que a bosquejou, sendo que, nesse primeiro esboço do silogismo judiciário, a alteração da premissa menor por um facto recém-aparecido pode conduzir a uma diferente conclusão. Mas desconsiderá-lo-á se o sentido da decisão se mantiver mau grado aquele surgimento[3].
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Em sede de petição inicial, a Autora dedica um capítulo à questão da abertura do restaurante e à resolução do contrato de arrendamento por justa causa, fundamentando, entre outra argumentação, o seu direito na circunstância do senhorio ter exigido a abertura de paredes no espaço comercial em causa (artigos 161 a 205).
Posteriormente, em sede de articulado superveniente, com fundamento no instituto do abuso de direito, no domínio do princípio da confiança, pretende alargar a discussão a 5 (cinco) novos factos relacionados com a cedência do espaço a uma outra empresa, a quem não foi exigido que as passagens do corredor se encontrassem abertas.
O Tribunal entendeu não admitir o articulado superveniente por duas razões.
A primeira estriba-se na circunstância do facto alegado não ser constitutivo do direito invocado. Na perspectiva do Tribunal «a quo» «importa discutir a actuação da Ré relativamente à Autora, no âmbito das alegadas soluções técnicas para as passagens e depois no âmbito da alegada oposição da Ré à manutenção dessas soluções. Daí que a conduta da Ré no momento actual, designadamente no que respeita à permissão ou oposição ao encerramento da passagem, podendo interessar à demonstração de factos essenciais e que respeitam à conduta da Ré (quanto à permissão do encerramento da passagem) não se integra nos factos constitutivos do direito da Autora, podendo sim, enquadrar-se no âmbito dos factos instrumentais (servindo, portanto, à demonstração dos factos essenciais, e que aqui são os relativos à alegada permissão da Ré para a realização das obras de passagem, ou seja, servindo á descoberta da verdade. Aliás, por isso, sobre essa factualidade foram ouvidas diversas testemunhas».
Esta primeira questão surge entrelaçada com os princípios do dispositivo e da controvérsia precipitados no artigo 5º do Código de Processo Civil e com o alcance do ónus da substanciação e dos poderes investigatórios do Tribunal.
Prescreve o artigo 5º, nº 2, do Código de Processo Civil que, para além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo Juiz: a) os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; c) os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções[4].
O princípio da aquisição processual está precipitado no artigo 413º do Código de Processo Civil, sendo que, por essa via, «o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las».
O Tribunal, no julgamento da matéria de facto, deve procurar tomar em consideração e atender a todas as provas produzidas nos autos, mesmo que elas aproveitem à parte contrária, ou mesmo que respeitem a factos (instrumentais) que, não tendo sido expressamente alegados, resultem da instrução e do julgamento da causa[5].
Os factos essenciais devem ser alegados e provados pelas partes, mas o juiz pode atender aos factos notórios (artigo 512º do Código de Processo Civil) e aos factos instrumentais, não alegados pelas partes, que resultem da instrução e do julgamento[6] [7] [8].
Quanto aos factos instrumentais, o Tribunal pode não só investiga-los, como ordenar quanto a eles as actividades instrutórias que possam ser de iniciativa oficiosa; pelo contrário, quanto aos factos essenciais, o tribunal não possui poderes inquisitórios, pelo que, relativamente a eles, só pode ordenar as actividades oficiosas de instrução legalmente permitidas[9].
Neste sentido podem ser consultados Isabel Alexandre[10], Lopes do Rego[11], Teixeira de Sousa[12] e Lebre de Freitas[13]. Este autor é partidário da tese que «estes factos (probatórios e acessórios) são factos instrumentais, que como tais não têm de ser alegados pelas partes nem de ser incluídos na base instrutória, podendo surgir no decorrer da instrução da causa. O Juiz tem, portanto, de os considerar, independentemente da alegação das partes».
A grande diferença em relação ao anterior Código de Processo Civil é que a consideração dos factos essenciais que sejam complemento ou concretização dos alegados não depende já de requerimento da parte interessada nesse aproveitamento para que ele aconteça, como exigia o artigo 264º, nº 3, daquele diploma.
Presentemente, o juiz pode considerá-los mesmo oficiosamente, sem requerimento de nenhuma das partes, bastando que os sujeitos processuais tenham tido a possibilidade de se pronunciar sobre tais factos.
Aliás, recentemente, em comentário a Acórdão por nós subscrito (processo nº 232/10.3T2DLD.E1 do Tribunal da Relação de Évora, relatado em 03/11/2016), Miguel Teixeira de Sousa[14] escreve que «a circunstância de, no artigo 5º, nº 2, al. b), CPC, ter deixado de se exigir a concordância da parte quanto ao aproveitamento pelo tribunal do facto complementar adquirido durante a instrução da causa não foi acidental, nem é inócua. A solução é orientada pela busca da verdade em processo, entendendo-se que nada pode justificar que a parte possa impedir o tribunal de utilizar na sua actividade decisória um facto de que o tribunal tem conhecimento (…).
Uma coisa é a parte ter disponibilidade quanto aos factos que quer alegar; outra bem diferente é a parte ter disponibilidade sobre um facto que o tribunal apurou e poder impedir o tribunal de o considerar na apreciação da acção. O princípio dispositivo só respeita àquele primeiro aspecto, pelo que a consideração pelo tribunal de um facto apurado em juízo, mas não alegado pelas partes, nunca pode ser vista como uma violação daquele princípio».
Feito este enquadramento jurídico-normativo, cumpre salientar que, na realidade, os factos em questão não se tratam de episódios constitutivos do direito, a questão essencial foi vertida num dos enunciados temas da prova e o Tribunal «a quo» admitiu já a produção de prova sobre a matéria que deu azo à apresentação do articulado superveniente.
E, quanto a este último item, ao assim actuar, o julgador de Primeira Instância ficou assim vinculado a tomar posição expressa sobre esses assuntos, pois isso é admitido claramente quando refere que «sem prejuízo da eventualidade do Tribunal poder considerar tais factos, e nos termos em que resultem da discussão da causa, em sede de sentença».
É compreensível o discurso seja apresentado na forma condicional. Porém, ao estruturar o despacho agora recorrido com recurso à distinção entre factos constitutivos (essenciais) e factos instrumentais com relevo para a decisão e ao assumir que sobre essa factualidade foram ouvidas testemunhas, independentemente da questão da admissibilidade do articulado superveniente, o Tribunal «a quo» fica jungido a deliberar de facto sobre a questão controvertida na parte em que foi produzida prova.
Todavia, alerte-se que o Juízo de Competência Cível da Instância Central do Tribunal Judicial de Faro não se encontra a fazer o escrutínio de um contrato de arrendamento celebrado subsequentemente sobre o mesmo espaço entre o dono do imóvel e um terceiro, mas tão-só, na parte que agora assume pertinência, a avaliar se o comportamento contratual da aqui Ré atenta contra as regras do abuso de direito e da boa-fé negocial e se, em função disso, existiu incumprimento contratual da “(…) – Mediação Imobiliária, Lda.”, se essa conduta substantiva serve como justa causa para a resolução do arrendamento firmado e, como corolário lógico, se constitui o direito ao ressarcimento de danos.
O conteúdo do contrato celebrado com terceiro pode servir como termo comparativo e a partir do mesmo é lícito extrapolar conclusões mas esse acordo de arrendamento não corresponde ao objecto do litígio sub judice. E a utilização – ou conhecimento – desse contrato é meramente acessória ao objecto do presente processo.
Posto isto, não é um direito processual da Autora que o Tribunal conheça o contrato da nova inquilina, até porque a questão não foi directamente colocada nesses termos ao Tribunal de Primeira Instância. Em abono da verdade, não foi essa a questão suscitada junto do Tribunal «a quo» inicialmente, no momento da formulação do pedido e da enunciação das causas de pedir nem, posteriormente, aquando da apresentação do articulado superveniente. Saber se existe um comportamento distinto perante a mesma situação de exploração de estabelecimento corresponde a uma realidade factual e processual distinta e que apenas poderá ter interesse em decifrar em termos instrumentais e não constitutivos.
A admissibilidade dos articulados supervenientes depende, além do mais, da relevância ou irrelevância do facto respectivo quanto à pretensão deduzida[15]. Isto significa que as partes podem, observadas certas condições, trazer ao processo factos relevantes que ocorreram até ao encerramento da discussão, que elas não puderam trazer por desconhecimento ou por terem ocorrido após o decurso do prazo para a apresentação dos articulados onde tais factos deveriam ser alegados[16].
E, embora a avaliação da pertinência e da utilidade dessa superveniência para os fins da causa seja realizada casuisticamente, na presente situação, em função dos dados carreados para o recurso, não se descortina que o articulado superveniente possa traduzir-se na invocação de novos factos essenciais constitutivos do direito convocado, sem atingir o núcleo estabilizado da causa de pedir formulada.
Em boa verdade existe aqui uma fronteira muito ténue entre a prova de determinado facto e a possibilidade legal da alteração da causa de pedir. Por isso, o julgador terá igualmente que recorrer à distinção entre factos e causa de pedir. Na verdade, no segmento que foi convocado em sede de recurso a causa de pedir é genericamente a invocação de um venire contra factum proprium (pontos 277 a 285 da acção) numa linha relacionada com a tutela da confiança e da boa-fé. No entanto, caso não seja entendida na sua justa dimensão valorativa, a invocação de outro contrato de arrendamento de arrendamento para criticar a postura contratual prévia poderá situar-se já fora do contexto da imagem global impressa na petição inicial, procedendo eventualmente doutro motivo determinante (exigência de um comportamento concordante entre os sucessivos arrendatários) e não do mesmo facto jurídico. E, nesta visão, se não se observar correctamente a linha divisória entre o conceito de facto e de causa de pedir, a situação poderá na prática corresponder a um aditamento da causa petenti.
Em determinado sentido, se isso acontecesse, a hipótese vertente poderia já não estar abrangida no desenho factual efectuado na petição inicial mas corresponder a uma alteração (ampliação) da causa de pedir sujeita a regras distintas daquelas que estão em apreciação no presente recurso, designadamente das que estão provisionadas nos artigos 264º e 265º do Código de Processo Civil.
A situação jurídica de solucionamento do pedido com base no quadro de accionamento do princípio do venire contra factum proprium configura uma resolução distinta daquele que é proposta quando se afirma que ocorreu uma alteração do posicionamento contratual relativamente à hipótese de utilização do locado em condições distintas. E nesta segunda modalidade aquilo que poderá verdadeiramente ocorrer é uma alteração parcial da causa de pedir, caso não seja objectiva e correctamente delimitada a fronteira conceptual.
Todavia, como é óbvio, não cabe a este Tribunal antecipar a actividade probatória futura, condicionar a integração dos factos que vierem a ser apurados pelo julgador de primeira instância ou sugestionar o juízo judicativo do Tribunal de Primeira Instância quanto a questões controvertidas que ainda foram decididas.
Em acréscimo, existe uma segunda razão para o indeferimento que está acolitada em argumentos de natureza processual relacionados com a falta de natureza superveniente dos factos. Na decisão sob impugnação por via recursal está escrito que a Autora «não alegou nenhum facto superveniente como o define o artº 588º, nº 1, do Código de Processo Civil». E feita a leitura do articulado presente a fls. 144-146 do presente apenso (correspondente a fls. 778 e seguintes dos autos principais) existe motivo fundado para a validar esta asserção e, por conseguinte, também por esta via interpretativa, não admitir do articulado superveniente.
Assim sendo, não existindo motivo para ampliar o objecto do processo através da admissão de um articulado superveniente, também não sobeja qualquer fundamento para revogar o despacho recorrido relativamente à prova requisitada.
Aliás, perpassa nos motivos subentendidos que aquilo que constitui o motivo determinante para a dedução do articulado superveniente é a obtenção dessa documentação e não o apuramento dos factos no sentido estrito do termo que servem de suporte à pretensão agora submetida à apreciação do Tribunal de recurso, conforme melhor se extraí das conclusões identificadas em f) e y), entre outras. Todavia, mesmo que assim fosse, existiam comportamentos processuais alternativos que poderiam conduzir a tal fim, nomeadamente, ao invés de suscitar o articulado superveniente, pedir directamente ao Tribunal que ordenasse a apresentação daquela documentação, por a mesmo resultar e ser exigível em função da prova produzida nos autos.
A utilidade do articulado superveniente é avaliada casuisticamente, à luz do pedido, causa de pedir e das excepções invocadas pelas partes, não podendo este meio processual ser instrumentalizado para carrear meios de prova para os autos que não foram directamente propostos ao Tribunal, quando o poderiam ser através de outros mecanismos adjectivos.
Por último, o presente recurso incide ainda sobre a questão relacionada com a eventual violação do princípio da cooperação processual e do regime estabelecido nos artigos 7º, 417º, 432º e 436º do Código de Processo Civil. No entanto, tal corresponde a matéria inovatória e não submetida à apreciação do Tribunal de Primeira Instância. Efectivamente, os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo acto recorrido. Na verdade, Miguel Teixeira de Sousa ensina que no direito português, os recursos ordinários visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento do seu proferimento. Isto significa que, em regra, o tribunal não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não foram formulados. Os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais e não meios de julgamento de questões novas[17].
De acordo com a jurisprudência unânime dos Tribunais Superiores[18] [19] os recursos ordinários visam o reexame da decisão proferida dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento em que a proferiu. Por conseguinte, os recursos são meios de impugnação e de correcção de decisões judiciais e não constituem instrumentos processuais para obter decisões novas e daí não pode o tribunal de recurso ser chamado a pronunciar-se sobre questões não suscitadas ao tribunal recorrido.
Também na segunda instância a jurisprudência editada é idêntica[20] e, deste modo, a matéria introduzida ex novo [violação do dever de colaboração para a descoberta da verdade e a apresentação de documentos em poder de terceiro] não é susceptível de ser apreciada em sede de recurso, pois, não foi suscitada perante o Tribunal «a quo» nem nunca foi dada a oportunidade à Primeira Instância de ser confrontada com esse petitório, o que, ab initio, afastava a tese da violação do princípio da cooperação.
Porém, mesmo que assim não fosse, na hipótese de não se tratar de matéria nova, a recusa indirecta da admissão da prova (ela não surge autonomizada mas está alocada à apreciação do articulado superveniente) em causa não configura uma violação do sobredito princípio.
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IV – Sumário:
1. A lei impõe ao julgador uma intervenção de controlo no sentido de apurar da tempestividade e, bem assim, da utilidade dos factos supervenientes para a justa decisão do litígio, expressa esta última na alocução «quando for manifesto que os factos não interessam à boa decisão da causa».
2. A admissibilidade dos articulados supervenientes depende, além do mais, da relevância ou irrelevância do facto respectivo quanto à pretensão deduzida. Isto significa que as partes podem, observadas certas condições, trazer ao processo factos relevantes que ocorreram até ao encerramento da discussão, que elas não puderam trazer por desconhecimento ou por terem ocorrido após o decurso do prazo para a apresentação dos articulados onde tais factos deveriam ser alegados.
3. Os factos novos não podem corresponder a uma situação de alteração da causa de pedir fora dos condicionalismos dos artigos 264º e 265º do Código de Processo Civil nem o articulado superveniente pode surgir associado ao aditamento de factos que sejam mero complemento ou concretização dos que hajam anteriormente alegado ou que se apresentem como simplesmente instrumentais da pretensão deduzida, dado que, nesta última hipótese, por força dos poderes de cognição do Tribunal presentes no artigo 5º do Código de Processo Civil, o julgador está vinculado a tomar posição sobre os mesmos.
4. A utilidade do articulado superveniente é avaliada casuisticamente, à luz do pedido, causa de pedir e das excepções invocadas pelas partes.
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V – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar improcedente o recurso apresentado, confirmando-se o despacho recorrido.
Custas a cargo da apelante nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527º, nos 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Notifique.
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(acto processado e revisto pelo signatário nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 138º, nº 5, do Código de Processo Civil).
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Évora, 23/03/2017
José Manuel Galo Tomé de Carvalho
Mário Branco Coelho
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
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[1] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, Almedina, Coimbra 1982, pág. 242.
[2] Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Coimbra Editora, Coimbra 2001, pág. 340.
[3] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22/09/2009, in www.dgsi.pt.
[4] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15/09/2014, in www.dgsi.pt.
[5] Remédio Marques, Acção Declarativa à Luz do Código Revisto, Coimbra Editora, Coimbra 2007, pág. 162.
[6] Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Conceito e Princípios Gerais, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra 2006, págs. 150-152.
[7] Lopes do Rego, Comentário ao Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra 1999, pág. 200.
[8] Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil (Princípios Fundamentais, Fase Inicial do Processo Declarativo), Almedina, Coimbra 1988, págs. 53-54.
[9] Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, 1ª edição, Lex, Lisboa 1996, pág. 72.
[10] Isabel Alexandre, A Fase de Instrução no Processo Declarativo Comum, Aspectos do Novo Processo Civil, Lex, Lisboa 1997, pág. 280, que salienta que os factos que se pretendem provar podem ser factos instrumentais ou factos essenciais complementares ou concretizadores e, como tal, não terem sido alegados pelas partes nos articulados, atendendo a que o artigo 264º, nº 1 (a que corresponde actualmente o artigo 5º do Código de Processo Civil), apenas estabelece um ónus de alegação dos factos que integram a causa de pedir e daqueles em que se baseiam as excepções.
[11] Lopes do Rego, Comentário ao Código de Processo Civil, pág. 201, advoga que «factos instrumentais definem-se, por contraposição aos factos essenciais, como sendo aqueles que nada têm a ver com substanciação da acção e da defesa e, por isso mesmo, não carecem de ser incluídos na base instrutória, podendo ser livremente investigados pelo juiz no âmbito dos seus poderes inquisitórios de descoberta da verdade material», enquanto que «factos essenciais, por sua vez, são aqueles de que depende a procedência da pretensão formulada pelo autor e da excepção ou da reconvenção deduzidas pelo réu».
[12] Miguel Teixeira de Sousa, Introdução ao Processo Civil, pág. 52, que ensina que ensina que se tratam de factos que indiciam os factos essenciais. Por outras palavras, são factos secundários, não essenciais, mas que permitem aferir a ocorrência e a consistência dos factos principais.
[13] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra 2014, págs. 15 e 16.
[14] Publicado no sítio do Instituto Português de Processo Civil.
[15] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, Vol. III, Almedina, Coimbra 1982, pág. 242.
[16] Remédio Marques, Acção declarativa à luz do Código Revisto (pelo Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto), Coimbra Editora, Coimbra 2007, pág. 311.
[17] Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 2ª ed., LEX, Lisboa 1997, pág. 395.
[18] Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 27/07/1965, BMJ 149-297; de 26/03/1985, BMJ 345-362; de 02/12/1998, BMJ 482-150; de 12-07-1989, BMJ 389-510; de 28/06/2001, in www.dgsi.pt, de 30/10/2003, in www.dgsi.pt, de 20-07-2006, in www.dgsi.pt, de 04/12/2008, in www.dgsi.pt.
[19] A título de exemplo, pode consultar-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Março de 2010, in www.dgsi.pt., que firmou posição no sentido de que «os recursos, como remédios jurídicos que são, não se destinam a conhecer questões novas, não apreciadas pelo tribunal recorrido, mas sim a apurar da adequação e legalidade das decisões sob recurso. Despistam erros in judicando, ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa e específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados (quanto à questão de facto), ou com referência à regra de direito respeitante à prova, ou à questão controvertida (quanto à questão de direito) que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e qual o sentido com que devia ter sido aplicada. Assim, o julgamento do recurso não é o da causa, mas sim do concreto recurso e tão só quanto às questões concretamente suscitadas e não quanto a todo o objecto da causa. Não pode, pois, o Tribunal Superior conhecer de questões que não tenham sido colocadas ao Tribunal de que se recorre».
[20] O acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 22/10/2013, in www.dgsi.pt afirma igualmente que «no direito português, os recursos ordinários, como é o caso, são de reponderação; visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento do seu proferimento; o que significa que o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não foram formulados. Daí o dizer-se que os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais e não meios de julgamentos de questões novas; estando por isso excluída a possibilidade de alegação de factos novos na instância de recurso».