Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
8/18.0T8EVR.E1
Relator: MOISÉS SILVA
Descritores: NULIDADE DA SENTENÇA
OBSCURIDADE
CONTRATO DE TRABALHO
SANÇÃO ABUSIVA
FALTA
RETRIBUIÇÃO
GREVE
ASSÉDIO
Data do Acordão: 05/02/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
i) é nula a parte da sentença que não fundamenta a decisão proferida, em termos que a tornam ininteligível, obscura e ambígua.
ii) não tendo a trabalhadora sido sancionada com qualquer sanção disciplinar, não pode sequer falar-se em sanção abusiva.
iii) as faltas ao trabalho só podem ser justificadas nos termos previstos na lei.
iv) tendo o empregador informado a trabalhadora que estava disposto a remover a situação invocada pela trabalhadora para não comparecer ao trabalho, não aceite por esta, e depois de a advertir que incorria em faltas injustificadas caso não comparecesse, continuando a trabalhadora a não comparecer, consideram-se as faltas injustificadas e sem direito ao pagamento da retribuição.
v) na qualificação do contrato como de trabalho entre 1993 e 2002 não se pode atender à presunção de laboralidade prevista no art.º 12.º dos CT de 2003 e de 2009, em virtude de ainda não estarem em vigor e a lei aplicável ser a que regia ao tempo, que não previa índices presuntivos.
vi) o trabalhador que não adere à greve deve comparecer no local de trabalho ou mostrar-se disponível para trabalhar, sob pena da falta ser considerada injustificada e perder o direito à retribuição desse dia.
vii) o assédio moral pressupõe a prática de atos com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador, exigindo-se que a doença de que a trabalhadora é portadora seja a consequência de atos ilícitos e censuráveis praticados pelo empregador, colegas de trabalho ou superiores hierárquicos no âmbito da empresa. (sumário do relator)
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO

Apelante: S… (réu).
Apelada e apelante subordinada: N… (autora).

Tribunal Judicial da Comarca de Évora, Juízo do Trabalho

1. A A. veio intentar a ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra o réu pedindo, inicialmente, seja a ação julgada procedente e provada e, em consequência ser o réu condenado a pagar à autora:
a) A indemnização pela prática sistemática de assédio no valor de € 250 000;
b) Ao pagamento do valor de € 5 431,62, a que acrescerão as remunerações que se forem vencendo desde a presente data até à sentença, bem como o valor correspondente ao dia de greve dos dirigentes do réu que lhe foi indevidamente descontado;
c) Que seja reconhecido o direito da autora a isenção de horário de trabalho, tendo em atenção a cláusula 5.ª do contrato de trabalho e o exposto no presente articulado;
d) Em juros de mora à taxa legal em vigor sobre todas as quantias em dívida, desde a data do vencimento das prestações referidas nos articulados desta P.I., e, desde a citação, no caso da indemnização peticionada no articulado 214.º e alínea a) do pedido, até efetivo e integral pagamento;
E o no articulado superveniente:
e) A indemnização disciplinar abusiva, nos termos e ao abrigo do artigo 331.º n.ºs 5 e 6 do CT no valor de € 108 627,40, a que acrescerão dez vezes o valor da remuneração de cada mês em que a atual situação se mantenha;
f) Ser a indemnização respeitante à prática de assédio moral aumentada em mais € 50 000; e,
g) Os salários vencidos em janeiro e fevereiro de 2018, no valor de € 5 431,62.
Alegou que foi vítima de assédio moral, sanção abusiva e não lhe foram pagas as retribuições que peticiona, tendo sofrido danos não patrimoniais graves.
Frustrada a conciliação na audiência de partes, a ré foi citada, contestou e pugnou pela improcedência da ação.
Foi proferido despacho saneador, fixado o objeto do litígio, efetuado o julgamento e proferida sentença, onde se incluiu a resposta à matéria de facto, com a decisão seguinte:
Pelo exposto julgo a ação parcialmente procedente por provada e em consequência:
a) Condeno o réu S… a pagar à autora N… a quantia de € 54 316,20 (cinquenta e quatro mil trezentos e dezasseis euros e vinte cêntimos), a título de indemnização por aplicação de sanção abusiva acrescida de juros de mora à taxa legal até integral e efetivo pagamento, a que acrescerá a indemnização pelos meses que sem procedimento disciplinar e mantendo-se em vigor o contrato de trabalho, perdure tal situação e respetivos juros de mora e a liquidar em execução de sentença.
b) Custas por ambas as partes na proporção do decaimento.
As partes não litigaram de má-fé.
Fixo à ação o valor de € 419 490,60.

2. Inconformado, veio o réu interpor recurso motivado com as conclusões que se seguem:
1ª - O Tribunal a quo julgou improcedentes todas as pretensões deduzidas pela autora na petição inicial, considerando-as infundadas, salvo quanto ao pedido de pagamento da retribuição correspondente aos meses de novembro e dezembro de 2017 e aos meses seguintes enquanto a situação perdurasse.
2ª - Todavia, na parte final da sentença, o Tribunal considerou que a recorrente havia aplicado à recorrida uma sanção abusiva de suspensão, sem precedência de processo disciplinar e condenou a recorrente a pagar à ora recorrida a quantia de € 54 316,20, a título de indemnização por aplicação de sanção abusiva acrescida de juros se mora à taxa legal até integral e efetivo pagamento, a que acrescerá a indemnização pelos meses que sem procedimento disciplinar e mantendo-se em vigor o contrato de trabalho, perdure tal situação e respetivos juros de mora e a liquidar em execução de sentença.
3ª – Esta condenação, que extravasa o pedido deduzido pela recorrida na petição inicial, é totalmente infundada, uma vez que a recorrente jamais aplicou à recorrida qualquer sanção de suspensão, nem sequer a suspendeu preventivamente, tendo-se limitado a suspender-lhe o pagamento da retribuição durante o período em que a mesma esteve ausente do trabalho injustificadamente.
4ª – Provou-se que, desde 30 de outubro de 2002, a recorrida se encontrava vinculada à recorrente por contrato de trabalho.
5ª – Em conformidade com o que ficou estipulado na cláusula 5ª do contrato de trabalho, foi estabelecido entre as partes que a autora cumpriria um horário de trabalho de vinte e quatro horas e trinta minutos por semana, de segunda a sexta-feira, nos moldes seguintes:
a) Às segundas e terças, das 09:00 às 12:30 e das 14:30 às 18:00;
b) Às quartas, quintas e sextas, das 14:30 às 18:00;
c) Descanso semanal aos sábados e domingos.
6ª – Em 23 de setembro de 2017, o técnico de informática que presta assistência ao sindicato procedeu a uma intervenção de segurança e rotina nos computadores do sindicato, neles se incluindo o computador distribuído à autora, procedendo, além do mais, à alteração das passwords de acesso a cada computador, tendo entregado à coordenadora da sede do sindicato um envelope fechado com a password para o computador distribuído à autora, que não se encontrava presente no sindicato por motivos profissionais.
7ª – No dia 26 de setembro de 2017, o técnico de informática voltou ao sindicato para corrigir uma password noutro computador e verificar todas as restantes, tendo constatado que o computador da autora estava vazio.
8ª – Nesse mesmo dia 26 de setembro, a autora, quando se apresentou ao serviço disse ter encontrado o sobrescrito contendo a sua nova password aberto, e que teria detetado indícios de acesso de terceiros ao computador com que trabalhava e, mostrando-se indignada, ausentou-se das instalações do sindicato, levando consigo, do seu gabinete de trabalho diversos materiais e documentos.
9ª – A autora recusou o acesso do técnico de informática ao seu computador, alegando que iria apresentar queixa do ocorrido na Policia Judiciária.
10ª – Desde essa data (2017.09.26) a autora deixou de comparecer no sindicato, tendo-se deslocado aí apenas no dia 11 de outubro de 2017, ao fim do dia.
11ª – No dia 27 de setembro de 2017, através do seu advogado, por e-mail datado dessa mesma data, a autora comunicou ao sindicato que, por impossibilidade de acesso aos seus ficheiros por «avaria informática» do computador que lhe estava distribuído, estava obrigada a efetuar o seu trabalho do sindicato no seu escritório particular até que os «referidos meios informáticos» se encontrassem operacionais, deslocando-se à sede (seu local de trabalho contratualizado) «para as consultas que se encontram ou venham a ser marcadas».
12ª - No dia 3 de outubro de 2017, a direção do sindicato respondeu ao Sr. advogado da autora e diretamente à própria autora, comunicando-lhe a oposição do sindicato à sua atitude e determinando-lhe que se deveria apresentar nas instalações do sindicato para aí exercer as suas funções conforme se encontra contratado.
13ª - Nessa comunicação, a direção do sindicato manifestou à autora a sua disponibilidade para lhe facultar, se esta o entendesse necessário, um computador portátil que permitiria afastar qualquer temor quanto a eventuais intromissões de terceiros no seu computador.
14ª - No dia 4 de outubro de 2017, a autora, através do seu advogado, informou o sindicato de que, em relação aos factos ocorridos com o computador que lhe estava distribuído, tinha apresentado denúncia por crime informático, acrescentando que o referido computador continha o certificado digital para seu uso exclusivo, sem o qual não é possível o acesso às peças processuais, nem o envio de correio eletrónico, sendo que a disponibilização de um computador portátil apenas permitiria o seu uso como máquina de escrever. E reiterou a sua recusa de se apresentar ao serviço, invocando falta de condições para esse efeito, afirmando que se deslocaria ao sindicato apenas para consultas ou para participar em reuniões.
15ª - Em 11 de outubro de 2017, o sindicato comunicou à autora, por carta registada com aviso de receção, a sua disponibilidade para substituir o contrato de trabalho pelo qual se encontram vinculados por um contrato de prestação de serviços, informando-a de que no caso de a sua situação de ausência se manter as suas faltas ao trabalho seriam consideradas, a partir dessa data (11de outubro) injustificadas, com as legais consequências, nos termos seguintes:
“Consequentemente, informamo-la que a partir desta data consideraremos injustificadas as suas faltas ao serviço, não aceitando a sua prestação noutro local, correndo por sua conta e risco as consequências da sua ausência.
Insistimos em afirmar que não existe justificação aceitável para a sua atitude. Não entendemos a mesma, a não ser quando analisada no contexto de um desejo seu de transformar o seu contrato de trabalho numa prestação de serviços. Mas se assim for, só terá de dirigir-se a esta direção e expor a sua vontade, com a certeza de que estaremos abertos à celebração de um acordo de alteração do seu vínculo contratual, caso entenda que essa alteração será desejável para a sua atividade profissional.
Entretanto, ficamos aguardando o seu imediato regresso ao local de trabalho, evitando que a situação atinja um lamentável ponto sem retorno.”.
16ª - Dado que a situação de ausência da autora se manteve inalterada, sem qualquer resposta positiva aos apelos reiterados do sindicato para que se apresentasse ao serviço, foi-lhe comunicado pelo sindicato, em 26 de outubro de 2017, que deixaria de ser-lhe paga a respetiva retribuição.
17ª - A autora manteve-se ausente do seu local de trabalho.
18ª - Por deliberação da direção central do sindicato réu, de 30 de novembro de 2017, foi instaurado à autora um processo disciplinar com intenção de despedimento.
19ª - Tal como decorre da douta sentença recorrida, v.g. da matéria provada, as faltas da recorrida ao trabalho a partir de 11 de outubro de 2017 são, efetivamente, faltas injustificadas.
20ª - Com efeito, considera-se falta a ausência do trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário, nos termos do n.º 1 do art.º 248.º do Código do Trabalho.
21ª - E, nos termos do n.º 3 do art.º 249.º do mesmo Código, é considerada injustificada qualquer falta não prevista no número anterior.
22ª - Por deliberação da direção central do recorrente, de 30 de novembro de 2017, foi instaurado à recorrida um processo disciplinar com intenção de despedimento, pelos fundamentos que constam da respetiva nota de culpa, junta aos autos pela recorrente, com a contestação, como doc. nº. 9.
23ª - Nos termos do artigo 256.º do Código do Trabalho, a falta injustificada constitui violação do dever de assiduidade e determina perda de retribuição correspondente ao período de ausência, que não é contado na antiguidade do trabalhador.
24ª - Face à ausência consecutiva da recorrida a partir da data em que a recorrente lhe comunicou que essas suas ausências seriam consideradas faltas injustificadas ao trabalho (11 de outubro de 2017), e após ter-lhe comunicado que, nessas circunstâncias, deixaria de pagar-lhe a retribuição, a recorrente deixou, efetivamente, de pagar-lhe a retribuição com efeitos a partir de 1 de novembro de 2017.
25ª - Mas esta suspensão do pagamento da retribuição não constituiu a aplicação de qualquer sanção. Aliás, a instauração de processo disciplinar com fundamento nessas faltas consideradas injustificadas foi decidida pela recorrente apenas em 30 de novembro de 2017.
26ª - E também não ocorreu de qualquer suspensão da recorrida, nem com caráter preventivo após a instauração do processo disciplinar.
27ª - Aliás, em articulado superveniente que apresentou e foi admitido pelo Tribunal, a recorrida criticou a recorrente pelo facto de “teimar em não suspender a autora” (artigos 13º e 20º do articulado superveniente).
28ª - Esta pretensão da recorrida, de que a recorrente a suspendesse, tinha como objetivo, naturalmente, adquirir por essa via o direito ao pagamento da retribuição apesar de continuar ausente do trabalho, uma vez que tal suspensão – reclamada quando se encontrava em curso processo disciplinar com intenção de despedimento -, a ocorrer só poderia ter caráter preventivo e não determinaria perda de retribuição, nos termos do art.º 354.º do Código do Trabalho.
29ª - Ora, o efeito da perda da retribuição correspondente aos períodos de falta injustificada ao trabalho constitui um efeito ope legis, decorrente do disposto no artigo 256.º do Código do Trabalho, que não depende de instauração de processo disciplinar – nem prévio, nem posterior -, nem de prévia apreciação do Tribunal.
30ª - À semelhança, de resto, com o que se passa com algumas faltas justificadas, previstas no n.º 2 do artigo 255.º do mesmo Código.
31ª - Na convicção, fundada, de que a falta de comparência da recorrida ao trabalho constituía uma situação de faltas injustificadas, a recorrente fez o que se encontra previsto na lei, isto é, não pagou a retribuição correspondente a esse período.
32ª - E quando entendeu que essa situação atingiu um ponto insuportável, instaurou à recorrida um processo disciplinar com intenção de despedimento, em 30 de novembro de 2017, que culminou com o seu efetivo despedimento.
33ª - A recorrida não se conformou com o despedimento e impugnou-o em ação que corre termos no mesmo Juízo do Trabalho de Évora sob o n.º 612/18.6T8EVR.
34ª - Estranho seria se a recorrente tivesse mantido o pagamento da retribuição durante meses a fio em que a recorrida esteve, ininterruptamente, ausente do serviço e viesse a instaurar-lhe processo disciplinar com intenção de despedimento com base nessas ausências.
35ª - Salvo o devido respeito, o que é incompreensível é considerar sanção abusiva a suspensão do pagamento da retribuição correspondente a faltas injustificadas.
36ª - Contraditoriamente, depois de criticar a ora recorrente por esta “teimar em não suspender a autora” a recorrida invocou, no mesmo articulado superveniente (art.º 35.º), que a situação vivida pela autora corresponde a uma verdadeira suspensão sem que lhe tenha sido dada a possibilidade de defesa.
37º - Alegando também, no artigo 38.º, que essa suspensão teve caráter abusivo, o que, aliás, se presume. – Código do Trabalho, art.º 331.º.
38ª - Esta alegação foi contestada pela recorrente nos artigos 51.º a 53.º e 72.º a 74.º da sua resposta ao articulado superveniente.
39ª - Aparentemente, o Tribunal a quo considerou que a suspensão do pagamento da retribuição, com fundamento em faltas injustificadas, sem a prévia instauração de procedimento disciplinar, constitui aplicação de sanção abusiva. Fê-lo, porém, erradamente.
40ª - Desde logo porque resulta dos autos, manifestamente, que a recusa da recorrida de se apresentar no seu local de trabalho e de cumprir o seu horário de trabalho, foi ilegítima.
41ª - É igualmente manifesto que a recorrente fez todos os esforços possíveis para demover a recorrida da sua posição e conseguir o seu regresso ao serviço com vista ao cumprimento do contrato.
42ª - Provou-se também que a recorrente informou a recorrida com antecedência de que considerava a sua ausência injustificada e de que iria suspender o pagamento da retribuição com esse fundamento se não ocorresse o seu regresso ao trabalho, o que não demoveu a recorrida da sua posição.
43ª - Não existe o mínimo indício de que a recorrente tenha suspendido o pagamento da retribuição da recorrida com intenção sancionatória. Pelo contrário, ficou bem patente, pelas comunicações feitas pela recorrente à recorrida, que essa suspensão constituía um efeito das faltas injustificadas, como resulta do citado art.º 256.º do Código do Trabalho.
44ª - Aliás, como ficou provado, a instauração do processo disciplinar pela recorrente à recorrida com fundamento nas faltas injustificadas foi decidido apenas em 30 de novembro de 2017.
45ª - Pelo que, salvo o devido respeito, é manifestamente errada a conclusão, sem qualquer fundamentação, de que a suspensão do pagamento da retribuição constitui a aplicação de sanção abusiva.
46ª - Aliás, o Tribunal a quo não se pronunciou, sequer, sobre a questão de saber se as ausências da recorrida constituíam, ou não, faltas injustificadas.
47ª - Sendo certo, em todo o caso, que, se o Tribunal tivesse apreciado esta questão e tivesse concluído que as ausências da recorrida foram justificadas – o que se admite apenas para efeitos de raciocínio, sem conceder -, o que deveria ter decidido era pela condenação da ré ao pagamento dessas retribuições indevidamente descontadas, como pediu a recorrida na sua petição inicial.
48ª - Acresce que a douta sentença recorrida é nula, por força do disposto nas alíneas b), c) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, porquanto:
49ª - A decisão de condenação da recorrente assenta no pressuposto de que esta aplicou à recorrida uma sanção abusiva, sem que esta decisão contenha qualquer fundamentação, uma vez que o Tribunal se limita a invocar o regime aplicável às sanções abusivas, no pressuposto, errado e sem fundamentação, de que a suspensão do pagamento da retribuição constituiu a aplicação de uma sanção.
50ª - A mesma condenação é, aliás, contraditória, em relação à matéria provada e às demais considerações constantes da sentença, v.g. em relação aos números 64 a 68 da matéria provada.
51ª - A invocação do caráter sancionatório da suspensão do pagamento da retribuição, feita pela recorrida no articulado superveniente, não deveria ter sido admitida, uma vez que essa situação se verificava desde data muito anterior à instauração da presente ação e não foi invocada na petição inicial.
52ª - Com efeito, a recorrida foi informada pela recorrente de que iria suspender o pagamento da retribuição com fundamento na situação de ausência injustificada ao trabalho, em 26 de outubro de 2017 (n.º 66 dos factos provados).
53ª - E suspendeu, efetivamente, esse pagamento com efeitos a partir de 1 de novembro de 2017.
54ª - A presente ação deu entrada em juízo em 3 de janeiro de 2018, quando se encontrava já em curso o processo disciplinar instaurado à recorrida e quando tinham decorrido já dois meses após a suspensão do pagamento da retribuição.
55ª - Na petição inicial, o que a recorrida pede, em relação à retribuição correspondente aos meses de novembro e dezembro de 2017 e aos meses seguintes é que lhe sejam pagas as retribuições correspondentes aos meses de novembro e dezembro de 2017, no montante de € 5 431,62, e as que se forem vencendo no decurso da ação (artigos 197.º e 199.º e alínea b) do pedido final). Não tendo invocado, em parte alguma dessa petição, ter-lhe sido aplicada qualquer sanção.
56ª - A recorrida veio a invocar o caráter sancionatório da suspensão do pagamento da retribuição apenas em articulado superveniente que apresentou posteriormente, em 22 de fevereiro de 2018.
57ª - Ora, atento o disposto no artigo 588.º do CPC, o Tribunal a quo não poderia aceitar esse articulado superveniente nem basear a condenação da recorrente nessa invocação, que, a justificar-se, teria de ser invocada na petição inicial.
58ª - A douta sentença recorrida padece também de obscuridade na parte em que decide condenar a recorrente, porquanto:
f) Para além da condenação da recorrente no pagamento à recorrida de indemnização – alegadamente por sanção abusiva - correspondente à suspensão do pagamento da retribuição nos meses de novembro e dezembro de 2017 (€ 5 431,62 X 10 = € 54 316,20), condena-a também a “indemnização pelos meses que sem procedimento disciplinar e mantendo-se em vigor o contrato de trabalho perdure tal situação, a liquidar em execução de sentença”;
g) Ora, como se provou (nº 68 da matéria provada), “Por deliberação da direção central do sindicato réu, de 30 de novembro de 2017, foi instaurado à autora um processo disciplinar com intenção de despedimento”;
h) A nota de culpa tem por base, fundamentalmente, as ausências injustificadas da recorrida e foi enviada a esta em 28 de dezembro de 2017, conforme doc. n.º 9 junto à contestação, que inclui o comprovativo do registo do envio efetuado nessa data;
i) Assim, quer se considere como início do procedimento disciplinar a deliberação de 30 de novembro de 2017, quer se considere o envio da nota de culpa, a verdade é que, para além de 31 de dezembro de 2017 a manutenção da suspensão do pagamento da retribuição ocorre quando se encontra pendente o processo disciplinar baseado nas faltas injustificadas a que se reporta essa suspensão;
j) Pelo que, estando isto provado nos autos, é impercetível a expressão constante da decisão condenatória: “indemnização pelos meses que sem procedimento disciplinar e mantendo-se em vigor o contrato de trabalho perdure tal situação, a liquidar em execução de sentença”.
59ª - Pelo exposto, a douta sentença recorrida é nula, na parte em que condenou a recorrente, sendo, em todo o caso, ilegal, por manifesto erro nos pressupostos, porquanto assenta na presunção, infundada, de que foi aplicada à recorrida uma sanção abusiva que, na verdade, jamais foi aplicada.
Nestes termos, nos mais de direito e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida na parte em que condenou a recorrente e absolvendo-se esta de todos os pedidos.

3. A A. recorreu subordinadamente e respondeu ao recurso do réu com as conclusões seguintes:
1 – O recurso subordinado abrange quer a matéria de facto, com reapreciação de prova gravada, quer a matéria de direito.
2 – A recorrente considera incorretamente julgados os pontos 8 e 58 dos factos provados e ainda os pontos 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10 dos factos não provados.
3 – Quanto ao ponto 8 dos factos provados, os meios de prova que impunham uma decisão diversa são as declarações de parte da autora na sessão da audiência de julgamento que teve lugar no dia 6 de junho de 2018 e os depoimentos das testemunhas M… prestado na sessão de 12-06-2016 e de Ma… prestado na sessão de 25-06-2018 e que se encontram gravados através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso no tribunal recorrido e de que acima se transcreveram os pontos mais significativos
4 – Devendo a decisão de facto ter sido do seguinte teor: “Desde o ano de 2012 que o horário de trabalho efetivamente praticado pela autora correspondia à totalidade dos dias de segunda e terça-feira e às tardes dos restantes dias úteis, sem prejuízo de alterações relacionadas com os compromissos profissionais da autora.”
5 – O ponto 58 dos factos provados deverá ser retirado do elenco dos mesmos por o seu conteúdo ter sido contrariado pelas declarações de parte da autora na sessão da audiência de julgamento que teve lugar no dia 6 de junho de 2018 e também, e com especial relevância, pelo depoimento da testemunha H…, prestado na sessão de 25-06-2018 e que se encontra gravado através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso no tribunal recorrido, de que acima se transcreveram os pontos mais significativos.
6 – Os pontos 3 e 5 dos factos não provados, embora despidos da adjetivação e da forma utilizada pela autora para alegar os factos respetivos foram julgados provados nos pontos 95 e 96 dos factos provados, pelo que devem ser eliminados do elenco dos factos não provados.
7 – O ponto 4 dos factos não provados foi expressamente confirmado no depoimento do seu autor An… prestado na sessão de 12-06-2018 e que se encontram gravados através do sistema integrado de gravação digital disponível na aplicação informática em uso no tribunal recorrido de que acima se transcreveram os pontos mais significativos, devendo, por isso, ser considerado como provado.
8 – Os pontos 6 a 10 da matéria não provada devem ser considerados provados face ao teor do documento clínico junto aos autos como documento n.º 8, com o articulado superveniente e cujo teor foi deficientemente interpretado pelo M,.º Juiz recorrido.
9 – Na situação anterior à celebração do contrato de trabalho entre as partes em 2002, encontram-se todos as caraterísticas de uma verdadeira relação laboral, tal como vêm definidas no art.º 12.º do Código do Trabalho, pelo que a existência deste se presume.
10 – Deverá, pois, concluir-se que a relação laboral entre as partes se iniciou em 1993 e apenas terminou com o despedimento da autora em março de 2018.
11 – Deverá a autora[1] ser condenada ao pagamento do dia de greve de 14 de novembro de 2012.
12 – As situações descritas na matéria provada, nomeadamente as referentes à deliberação da direção na questão da “caixa do gato”, aos vários episódios acima descritos e qualificados relacionados com a questão da Academia de …, nomeadamente os que colocaram em causa a credibilidade da autora perante terceiros e que estão melhor descritas no corpo das presentes alegações, a omissão de resposta às questões colocadas pela autora, o desprezo pela situação laboral desta que permitiu aos dirigentes do réu o acesso ao computador de serviço que continha dados sigilosos, a incompreensão da situação profissional da autora, nomeadamente em relação aos associados da ré que patrocinava e as diligências posteriores ao episódio do computador tendentes a impedir a ré de exercer aas suas funções e a denegri-la perante os seus constituintes, constituem atos ilícitos subsumíveis à previsão do art.º 26.º do Código do Trabalho, devendo ser qualificados como atos de assédio moral por constituírem comportamentos indesejados com objetivo de afetar a dignidade pessoal e profissional da autora, humilhando-a e destabilizando-a.
13 – Não pode aceitar-se o entendimento de que, num contrato como o celebrado entre as partes em que cabe à autora, além do mais, exercer o mandato forense a favor de associados do réu, que o cliente daquele seja o sindicato.
14 - Pelo contrário, o contrato em questão tem a natureza de contrato a favor de terceiro, sendo os clientes da autora os associados da ré que lhe passarem procuração, ficando a mesma vinculada a todos os deveres para com os clientes prescritos no Estatuto da Ordem dos Advogados e em mais legislação.
15 – A douta sentença recorrida violou, além do mais, os art.ºs 12.º e 29.º do Código do Trabalho, bem como os art.ºs 73.º, 92.º e 97.º a 101.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, pelo que deverá ser revogada, sendo a ação julgada procedente e a ré condenada a indemnizar a ré dos prejuízos que lhe causou pela sua atuação ilícita, fixando-se um valor indemnizatório que corresponda aos danos sofridos.
16 – No que a recurso a que se responde diz respeito, nada há apontar à douta sentença recorrida a qual apreciou com grande correção a questão colocada à sua consideração.
17 – Não se verificando qualquer nulidade da mesma.
18 – Pelo que a condenação do réu deverá ser mantida e acrescida do valor que resultar da procedência do recurso subordinado.

4. O Ministério Público junto desta Relação emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.
As partes foram notificadas do parecer e nada disseram.

5. Colhidos os vistos, em conferência, cumpre apreciar e decidir.

6. Objeto do recurso

O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das alegações formuladas, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso.
As questões a decidir são as seguintes:
Recurso de apelação principal: as nulidades da sentença
Recurso subordinado:
1. Reapreciação de matéria de facto
2. Apurar se o contrato de trabalho se iniciou em 1993
3. Pagamento do dia de greve do sindicato
4. Assédio moral

II - FUNDAMENTAÇÃO
A) DE FACTO

O tribunal recorrido considerou provada a matéria de facto seguinte:
1 – O réu é uma associação sindical de educadores e professores de todos os graus de ensino, exercendo funções educativas ou de investigação, de técnicos de educação e de outros trabalhadores em funções pedagógicas.
2 - O âmbito geográfico do réu abrange os distritos de Évora, onde situa a sede, Portalegre, Beja, Faro onde tem delegações e Portimão onde tem uma subdelegação.
3 - O réu e a autora celebraram em 1 de dezembro de 1993 um contrato denominado de prestação de serviços em regime de avença mediante o qual a autora "... a) obriga-se a exercer as funções de consultora jurídica do sindicato dos professores da zona sul.
b) Estas funções compreendem o patrocínio forense em ações, recursos e outras diligências judiciais em que seja parte o S… e, ou, os sócios.
c) Igualmente se obriga a signatária advogada à emissão de pareceres técnico-jurídicos que lhe forem solicitados pelo S... (...)
A signatária advogada compromete-se a:
Dar consultas no edifício do S…., em Évora duas vezes por semana, compreendendo estas, uma manhã e uma tarde.
(...) Pela prestação de serviços o primeiro outorgante pagará à segunda outorgante a avença mensal de Esc. 37 000$00, atualizável anualmente.
4 - A A. deslocava-se à sede que na altura se situava na Rua … em Évora, para fazer as consultas marcadas, e, fazia o trabalho daí decorrente no seu escritório à data sito na Rua … em Évora.
5 – Este contrato foi renovado em 1 de Outubro de 1994, passando a avença mensal para o montante mensal de Esc. 43.000$00 e desaparecendo a cláusula de "... Dar consultas no edifício do S…, em Évora duas vezes por semana, compreendendo estas, uma manhã e uma tarde ...".
6 – Em 1 de outubro de 2000 foi celebrada uma adenda ao contrato de prestação de serviços em regime de avença e no qual a autora "... obriga-se a exercer as funções dos dois contratos anteriores.
Consideram-se ambos como um único contrato de prestação de serviços em regime de avença.
(...) Pela prestação de serviços, o primeiro outorgante pagará à segunda outorgante, o valor de Esc. 180.000$00, valor esse que será pago em dobro nos meses de junho e novembro.
Pelo presente, compromete-se a segunda outorgante, a prestar apoio ao primeiro outorgante, 4 tardes por semana, nos seguintes dias: segundas-feiras, terças-feiras, quintas-feiras e sextas-feiras. Podendo estas ser alteradas casualmente, em virtude de diligências profissionais...".
7 - Em 30 de outubro de 2002 o réu e a autora celebraram um contrato de trabalho constando da cláusula 2ª "... a) a 2ª outorgante terá as funções de consultora jurídica da Direcção do S...
b) estas funções compreendem o patrocínio forense em ações, recursos e outras diligências judiciais ou administrativas em que seja parte o S… e a sua Direção.
c) as suas funções compreendem o apoio jurídico aos sócios do S…, no que concerne ao âmbito profissional dos mesmos, e compreende, consultas, patrocínio forense em ações, recursos e outras diligências judiciais ou administrativas em que sejam parte os sócios.
Cláusula 3ª
O local de trabalho da 2ª outorgante será na sede do 1º outorgante, e, um dia por semana na Delegação do 1º outorgante sita em Portalegre. (...)
O Horário de trabalho será em regime de horário flexível em virtude do caráter técnico da sua função e das diligências profissionais ...".
8 - Em conformidade com o que ficou estipulado na cláusula 5ª do contrato de trabalho, foi estabelecido entre as partes que a autora cumpriria um horário de trabalho de vinte e quatro horas e trinta minutos por semana, de segunda a sexta-feira, nos moldes seguintes:
a) Às segundas e terças, das 09:00 às 12:30 e das 14:30 às 18:00;
b) Às quartas, quintas e sextas, das 14:30 às 18:00;
Descanso semanal aos sábados e domingos.
9 – Eram pedidos à autora, de quando em quando, esclarecimentos e informações jurídicas sobre questões e dúvidas comuns a vários sindicatos e à Federação em que estes se encontram filiados, a F…, cujo esclarecimentos e informações interessavam ao réu e às demais organizações sindicais do mesmo setor.
10 – E era também solicitada à autora a participação em reuniões sobre questões jurídicas comuns aos vários sindicatos do setor da educação e à Federação respetiva (F…) em que participavam advogados e dirigentes desse setor.
11 – A autora participou em várias reuniões em que participaram advogados e dirigentes de outros sindicatos do setor da educação para analisar questões jurídicas comuns àquele setor.
12 – Nestes casos, sempre foram pagas pelo réu as despesas da autora com o transporte e a alimentação.
13 – O contrato de trabalho celebrado entre a autora e o réu foi elaborado pela própria autora e aceite pelo réu.
14 – Em data não concretamente apurada, mas anterior à celebração do contrato de trabalho a funcionária R.. passou a fazer parte do gabinete jurídico.
15 - A esta funcionária competia designadamente:
"... Proceder à abertura diária dos Diários da República, logo que lhes sejam entregues, preferencialmente, durante o período da manhã;
- Análise e distribuição das fotocópias da legislação pelos vários dirigentes e pela advogada;
- Elaboração do arquivo próprio de toda a legislação no seu gabinete
Apoio Jurídico aos Sócios - Presencial
- Atendimento individual aos sócios, por ordem de chegada e após o preenchimento prévio da respetiva ficha de inscrição;
- Atendimento de docentes não sócios, desde que não haja sócios por atender e sempre que a funcionária se encontre disponível;
Apoio Jurídico aos Sócios - Telefónico
- Atendimento telefónico aos sócios sempre que não se encontre ninguém no gabinete (as chamadas só deverão ser encaminhadas para o gabinete jurídico quando nenhum sócio estiver a ser atendido)
- Não há atendimento jurídico telefónico a docentes não sócios.
- A funcionária quando estiver em atendimento presencial a sócios, não deverá ser interrompida quer por dirigentes, quer pela advogada
Apoio à advogada no processamento de texto
- Sempre que a advogada necessite de um texto relacionado com qualquer processo ou documento e desde que solicitado com antecedência mínima de 24horas ...".
16 - Pelo desempenho destas funções a funcionária passou a receber um subsídio designado de "subsídio de legislação".
17 - A delegação de Portalegre não tinha um gabinete jurídico, nem processos, sendo a autora quem iniciou e colocou em funcionamento tal gabinete.
18 - Passados alguns anos e dado o aumento do volume de trabalho naquele gabinete jurídico foi contratada em regime de avença uma advogada para Portalegre e outra para Beja.
19 - A autora recebe, desde novembro de 2002, um subsídio fixo de deslocação no valor de € 48,45.
20 - O réu paga à autora as despesas que efetua com transportes, alimentação e alojamento, contra a apresentação do respetivo comprovativo.
21 - As despesas de alojamento e a respetiva marcação, quando a autora pernoita fora de casa são suportadas pelo réu.
22 - No dia 14 de novembro de 2012 ocorreu uma greve geral de trabalhadores.
23 - Nesse dia todos os funcionários do réu estiveram ausentes do sindicato.
24 - A autora não compareceu no sindicato por lhe ter sido dito que o mesmo estava fechado.
25 - No sindicato apenas permaneceu uma dirigente sindical para receber informação da adesão à greve por parte dos professores.
26 - O réu descontou à autora no seu vencimento, no final do mês, esse dia de greve.
27 - A autora quando se apercebeu desse desconto reclamou junto do réu.
28 - Nessa sequência o réu emitiu em 14 de dezembro 2012 e entregou à autora e esta recebeu em 18 de Dezembro de 2012 pelas 10horas o escrito do seguinte teor:
Assunto: Desconto no salário de novembro de 2012
Relativamente ao assunto exposto no seu requerimento, recebido pelo S… dia 4 do corrente, a Comissão Executiva do S…, na reunião realizada dia 7 do corrente mês, decidiu que procederá ao pagamento do dia de trabalho descontado, devendo V.ª Exª dar indicações escritas que não aderiu à greve geral de dia 14 de novembro de 2012
Com os melhores cumprimentos
Presidente da Direcção do S...
29 - No seguimento da resposta do réu a autora apresentou queixa-crime que correu termos no DIAP de Évora sob o nº 4/13.3TDEVR.
30 - Com data de 19 de março de 2013 foi proferido despacho de arquivamento "... essencialmente com fundamento na ausência de indícios da prática de qual quer crime, ou seja de que os factos denunciados não são suscetíveis de integrar a prática de qualquer crime ...".
31 - Em 14 de maio de 2013 foi proferido despacho por superior hierárquico, mantendo o arquivamento dos autos e onde se pode ler "... Do mesmo modo que se me afigura não haver de qualquer outro, maxime de abuso de poder ... Não se alcança que poderes determinados inerentes às suas funções teriam os denunciados, extravasando-os ou violando-os e desse modo obtendo benefício ilegítimo ou causando prejuízo à denunciante.
(...) Com efeito poderá indiciar-se a violação do disposto no art.º 25.º (Proibição de Discriminação) e no art.º 29.º (Proibição de Assédio), do Código do Trabalho ...".
31 - Com data de 10. 4. 2015 a autora enviou um email do seguinte teor:
"... Dirigente S… AF…
Há já bastantes meses, v. exª levou da sede do sindicato uma caixa de transporte de animais. Caixa essa que eu trouxe para cá para servir a princesa. Uma vez sem ser esperado, a caixa fez falta por causa de um "ataque de pulgas" que a gata teve, e, a senhora estava em Lisboa, e como muitas vezes aconteceu, tive que levar a gatinha ao veterinário (o que fiz sempre no meu carro), mas a caixa não se encontrou, uma funcionária telefonou-lhe e v.ex.ª dise que tinha a caixa no seu carro. Assim, fui a minha casa e trouxe outra, que deixei cá ficar. Pedi à senhora da limpeza que lhe dissesse (o que fez várias vezes) para devolver a caixa que tinha levado (como sabe estes objetos são caros), até que obteve a resposta: "ela que ma peça".
Apesar dessa reação, tenho aguardado que pensasse bem na sua resposta, mas parece que não, e, como a caixa de transporte é minha e foi daqui levada sem o meu conhecimento e consentimento, não tenho que lhe pedir, mas dizer que aguardo que a mesma seja devolvida. A outra que cá está, ficará para ser usada pela gatinha durante toda a avida dela.
Atentamente ...".
32 - Em 18.4.2015 a autora enviou um email de resposta ao email enviado pela dirigente AF… em 17.4.2015 com o seguinte teor "... Em 2015-04-17 22:36, ….pt escreveu:
Exma Senhora Dra. N…;
Venho pelo presente meio, em resposta à missiva remetida por V.Exa. a 10-04-2015, informar o seguinte: não estou, nem nunca estive, em posse de qualquer caixa de transporte de animais que tenha sido levada para as instalações do sindicato por V.Exa.
É falso que tenha respondido a quem me interpelou sobre o assunto:
"Ela que ma peça".
Venho assim oferecer a oportunidade de V.Exa. se retratar das considerações e acusações infundadas que efetuou, uma vez que atentam contra a minha honra e dignidade a nível pessoal e profissional.
Mais informo que estou ao dispor de V.Exa. para qualquer outra questão que suscite a V.Exa., atento o supra-exposto.
Com os melhores cumprimentos,
AF
Exmª Srª Dirigente S…
AF
Não a acusei de nada, e o e-mail foi exclusivamente dirigido a V.Exª, logo se outrem tem ou teve conhecimento foi V.Exª que o divulgou.
A Caixa, é uma caixa grande cor de rosa, e a senhora sabe qual é, conheceu a bem, pode não se lembrar. O que se passou com a gata e a caixa foi o que lhe disse e reafirmo, se entendeu como algum tipo de acusação, a ilação foi sua. Se afirma nada saber da caixa, ficou a sua afirmação devidamente registada através do seu e-mail. Não tenho que me retratar de absolutamente nada, se achar que atentei contra a sua honra, atue como achar conforme, e, eu aguardarei pela fase do contraditório. A nível profissional nem sequer entendo o "atentamento".
Declaro que copiei o seu e-amail, para o endereço da minha resposta para que a mesma faça sentido e seja clara, e a assinatura válida. ...".
33 - Em 28 de abril de 2015 o réu enviou à autora um mail comunicando-lhe que "... A Comissão Executiva do S…, manifesta o seu desagrado pelo mail que enviou a uma dirigente deste sindicato ...".
34 - Em julho de 2015, o atual presidente da direção, M… pediu à autora para ir com ele a Portimão para ver se percebia o que se passava no Algarve, pois os sócios do S…, professores na Academia de …, ameaçavam dessindicalizar-se por falta de apoio jurídico do sindicato.
35 - Esta ouviu os problemas de cinco ou seis professores que estavam na subdelegação do sindicato em Portimão, pediu alguns documentos a esses presentes, esclarecendo que só analisaria os documentos desses professores, para melhor analisar o problema, e o comunicar à direção. Os documentos ser-lhe-iam enviados pelo sindicato, sem qualquer comprometimento profissional de sua parte para assumir aquele trabalho.
36 - No caminho de volta com o presidente, voltou a esclarecê-lo que não assumia compromissos no Algarve, e pô-lo a par do resultado da sua breve análise, do que seriam os problemas, pelo que se tinha apercebido pela conversa que tiveram com os sócios.
37 - Da conversa/reunião que posteriormente os professores tiveram com a Comissão Executiva do S…, os mesmos foram informados que a “responsabilidade da Academia” seria da Dr.ª N….
38 - A dirigente A… recebeu a documentação dos sócios em causa e não a enviou à autora.
39 - Em setembro/outubro de 2015 a autora voltou a acompanhar o presidente do sindicato a Portimão, a pedido deste, para nova reunião com os professores da Academia de … que eram sócios do S….
40 - Foi nessa reunião que a dirigente A… entregou os documentos à autora.
41 - Nessa reunião a autora voltou a afirmar que apenas analisaria o caso dos professores que tinham estado na 1.ª reunião e mais nenhum outro.
42 - Os dirigentes do réu continuaram a tentar que a autora representasse todos os professores da academia de … sócios do sindicato.
43 - A autora enviou um e-mail em 23 de outubro de 2015 ao presidente com conhecimento à tesoureira do sindicato e à coordenadora dos gabinetes jurídicos do mesmo sindicato do seguinte teor:
“Nobre CA…
O Algarve tem o problema da Academia há pelo menos dois anos, e deixou-o chegar ao ponto dos sócios quererem abandonar o sindicato.
Tenho sido perseguida, difamada e maltratada pelo Algarve, como sabem, apesar disso perante esta situação da academia, fui lá a primeira vez apenas para falar com os sócios, creio que em julho. Apesar disso não me foram entregues quaisquer elementos, isto para não acrescentar mais nada por ora, e, em setembro houve necessidade de lá voltar, os sócios estavam à espera convencidos que os assuntos deles tinham finalmente começado a ser tratados, um deles já tinha um processo disciplinar, outro já tinha sido despedido, e, quando perceberam que nada havia sido feito, apercebi-me do descontentamento e de problemas para a direção, razão pela qual, os ouvi e atendi a todos, e, acabei vendo-me responsável por processos de sócios da direção de Faro.
De setembro até hoje já voltei a Portimão, ao tribunal, já respondi à nota de culpa do delegado sindical, e, todos os dias recebo e-mails dos sócios e pedidos para responder a questões, pedidos para fazer requerimentos, respostas etc.
Todos os dias recebo telefonemas, que respondo praticamente sempre.
Quando estive em Portimão fiquei a saber que a vice-presidente tinha determinado que tudo o que fosse da academia, era para mim.
Pergunto, com que legitimidade? Alguém falou comigo? Mantenho o meu trabalho normal em Évora, mantenho o meu trabalho de apoio à direção, este assunto do Algarve não é acréscimo de trabalho? Não estou a fazer o trabalho de pelo menos dois advogados?
Não tenho obrigação contratual de acompanhar quaisquer sócios de outras delegações, tenho apenas obrigação contratual de dar apoio contencioso aos sócios de Évora e dar apoio jurídico à Direção. Apoio contencioso é outra área, que apesar de tudo, tenho feito à direção e a sócios das delegações sempre que me tem sido pedido, sempre me desloquei, para ouvir testemunhas, acompanhar sócios, ir a reuniões onde quer que elas fossem, e, sempre o fiz mesmo quando era avençada, e só tinha dois dias por semana no sindicato, e sem ganhar nem mais um tostão (esse assunto também não desenvolvo mais aqui). Há anos tratei da academia de Évora, assunto complicadíssimo, sozinha, tranquilamente, e os vossos sócios todos receberam as indemnizações a que tinham direito. Milagre? Não. Boa vontade, muitas horas de trabalho, serões, férias, fins-de-semana, oferecidos, naquela situação e habitualmente, como também têm obrigação de saber.
Lembrem-se que não sou dirigente sindical, trabalho para o sindicato, por isso há quem goste de lembrar que é patroa, julgando que pode exigir o que entende. Reconhecimento? Nenhum, de sindicalistas?!
Quando começaram a fazer-se reuniões do jurídico da F… com um caráter mais sério, fui "investida" como advogada de contacto, esclareço de uma vez por todas que advogada de contacto, é isso mesmo e apenas isso, a F… envia para mim os elementos de trabalho para distribuir pelos gabinetes jurídicos do sindicato e em contrapartida, deveria ser eu a contactar a F… pelos nossos gabinetes, mas até nisso o algarve foi sempre a excepão. Ora, sabem perfeitamente que o contacto se transformou em mais trabalho e obrigações laborais?! sem qualquer contrapartida.
Ou seja, eu só tenho obrigações!
Voltando à Academia de …, só me "comprometi" com os sócios que atendi, e volto a repetir, para não deixar, naquele dia, criar uma situação complicada para a direção, e da qual não tinha nem tenho responsabilidade absolutamente nenhuma, no algarve havia dois advogados.
O meu contacto com o delegado sindical tem sido diário, e, com os dirigentes que estão em Portimão também há contacto sempre que necessário. Todos eles sabem, e os colegas que o delegado contacta sabem que os assuntos deles vão sendo analisados consoante as prioridades, e, sabem que sempre que pedem uma resposta urgente a recebem de imediato.
Mas, agora comecei a ser pressionada pela "chefe" do algarve, que o faz através da coordenadora que está em Portalegre. Ora, durante dois anos o assunto chegou ao estado em que está, e agora eu que de boa vontade, apesar de tudo, pensando antes de mais no sindicato, aceitei sem sequer ter falado em contrapartidas, dar uma ajuda, estou a ver-me ser usada e explorada pelo sindicato, e estou a ver que a perspetiva é a de ser usada como bode expiatório para o que der e vier, como se em menos de quinze dias tivesse obrigação de resolver tudo e todos os problemas que lá acumularam.
Ontem perguntou por uma ação coletiva que ainda não estava pronta.
Assistiu às duas reuniões, quem falou em tal ação?
Qual ação coletiva?
No tribunal do trabalho fazem-se ações coletivas?
Alguém falou comigo? Quem transmitiu e decidiu tal disparate?
Agora nesta situação da academia de lagos e depois do histórico vivido com alguns "dirigentes" do Algarve, a manter-se esta intromissão, imposição e pressão não tenciono continuar com este assunto.
Farão o que entenderem melhor.”.
44 - A autora desenvolvia o seu trabalho a favor dos professores da Academia de … que havia atendido nas reuniões de julho e de setembro de 2015, minutando cartas, dando orientações e instaurando os primeiros processos judiciais.
45 - No início de 2016, iniciaram-se as deslocações da autora ao Algarve para intervir nas diligências judiciais dos processos que instaurou que implicavam deslocações, conferências noturnas com os sócios até às horas que fosse necessário, incluindo dormidas fora e muitos dias fora de casa.
46 - A autora em 25 de outubro de 2016, através do seu mandatário, enviou ao réu uma missiva onde se historiavam as vicissitudes do contrato de trabalho e se propunham algumas soluções alternativas para a sua manutenção ou revogação.
47 - Essa carta não obteve qualquer resposta o que obrigou o signatário a requerer, em 6 de fevereiro de 2017, ao abrigo do disposto no art.º 82.º do Código do Procedimento Administrativo, que lhe fosse remetida informação sobre o decidido sobre a mesma.
48 - Em 16 de fevereiro de 2017 o réu respondeu à carta da autora, recusando as suas propostas.
49 - O Presidente do S… pediu à autora verbalmente que apresentasse uma previsão das despesas e honorários que cobraria pela representação do delegado sindical como assistente no processo criminal referido na parte final do art.º 80.º desta petição inicial, uma vez que essa atividade estava fora do âmbito do contrato de trabalho da autora.
50 - A autora apresentou essa previsão a qual não foi objeto de qualquer resposta.
51 - Terminadas as férias do ano de 2017, gozadas no mês de agosto, a autora regressou ao trabalho da forma habitual, fazendo atendimentos, elaborando documentos e assegurando diligências judiciais.
52 - A autora para a sua atividade tinha ao seu dispor um computador de uso exclusivo, onde tinha instalado o seu certificado profissional que lhe permite o acesso às plataformas jurídicas, bem como o seu e-mail profissional e o e-mail de trabalho atribuído pelo S….
53 - O acesso a esse computador estava protegido por uma palavra passe que limitava o acesso ao computador a outras pessoas.
54 - No referido computador, propriedade do sindicato, mas afeto ao serviço da autora, estava instalada a assinatura digital da Ordem dos Advogados que permite o acesso direto ao portal Citius, ao SITAF e ao correio eletrónico profissional da Ordem dos Advogados. Tinha também acesso ao correio eletrónico criado pelo sindicato para si, para o contacto direto da autora com os seus constituintes, sócios do sindicato, e continha todos os processos e as informações dadas pelos mesmos àquela, tudo sujeito a sigilo profissional.
55 - Em 23 de setembro de 2017, o técnico de informática que presta assistência ao sindicato procedeu a uma intervenção de segurança e rotina nos computadores do sindicato, neles se incluindo o computador distribuído à autora, procedendo, além do mais, à alteração das passwords de acesso a cada computador, tendo entregado à coordenadora da sede do sindicato um envelope fechado com a password para o computador distribuído à autora, que não se encontrava presente no sindicato por motivos profissionais.
56 - No dia 26 de setembro de 2017, o técnico de informática voltou ao sindicato para corrigir uma password noutro computador e verificar todas as restantes, tendo constatado que o computador da autora estava vazio.
57 - Nesse mesmo dia 26 de setembro, a autora, quando se apresentou ao serviço disse ter encontrado o sobrescrito contendo a sua nova password aberto, e que teria detetado indícios de acesso de terceiros ao computador com que trabalhava e, mostrando-se indignada, ausentou-se das instalações do sindicato, levando consigo, do seu gabinete de trabalho diversos materiais e documentos.
58 - A autora recusou o acesso do técnico de informática ao seu computador, alegando que iria apresentar queixa do ocorrido na Policia Judiciária.
59 - Desde essa data (2017.09.26) a autora deixou de comparecer no sindicato, tendo-se deslocado aí apenas no dia 11 de outubro de 2017, ao fim do dia.
60 - No dia 27 de setembro de 2017, através do seu advogado, por e-mail datado dessa mesma data, a autora comunicou ao Sindicato que, por impossibilidade de acesso aos seus ficheiros por «avaria informática» do computador que lhe estava distribuído, estava obrigada a efetuar o seu trabalho do sindicato no seu escritório particular até que os «referidos meios informáticos» se encontrassem operacionais, deslocando-se à sede (seu local de trabalho contratualizado) «para as consultas que se encontram ou venham a ser marcadas».
61 - Na mesma data (27/9), a autora dirigiu à professora Ma…, membro da direção do sindicato, uma outra mensagem sobre o trabalho que, por sua iniciativa, passou a desenvolver fora do Sindicato, acrescentando, sem concretizar, a afirmação de que existem «pessoas que querem que a direção lhe pague para desaparecer».
62 - No dia 3 de outubro de 2017, a direção do sindicato respondeu ao Sr. advogado da autora e diretamente à própria autora, comunicando-lhe a oposição do sindicato à sua atitude e determinando-lhe que se deveria apresentar nas instalações do sindicato para aí exercer as suas funções conforme se encontra contratado.
63 - Nessa comunicação, a direção do sindicato manifestou à autora a sua disponibilidade para lhe facultar, se esta o entendesse necessário, um computador portátil que permitiria afastar qualquer temor quanto a eventuais intromissões de terceiros no seu computador.
64 - No dia 4 de outubro de 2017, a autora, através do seu advogado, informou o sindicato de que, em relação aos factos ocorridos com o computador que lhe estava distribuído, tinha apresentado denúncia por crime informático, acrescentando que o referido computador continha o certificado digital para seu uso exclusivo, sem o qual não é possível o acesso às peças processuais, nem o envio de correio eletrónico, sendo que a disponibilização de um computador portátil apenas permitiria o seu uso como máquina de escrever.
E reiterou a sua recusa de se apresentar ao serviço, invocando falta de condições para esse efeito, afirmando que se deslocaria ao sindicato apenas para consultas ou para participar em reuniões.
65 - Em 11 de outubro de 2017, o sindicato comunicou à autora, por carta registada com aviso de receção, a sua disponibilidade para substituir o contrato de trabalho pelo qual se encontram vinculados por um contrato de prestação de serviços, informando-a de que no caso de a sua situação de ausência se manter as suas faltas ao trabalho seriam consideradas, a partir dessa data (11 de outubro) injustificadas, com as legais consequências, nos termos seguintes:
“Consequentemente, informamo-la que a partir desta data consideraremos injustificadas as suas faltas ao serviço, não aceitando a sua prestação noutro local, correndo por sua conta e risco as consequências da sua ausência.
Insistimos em afirmar que não existe justificação aceitável para a sua atitude. Não entendemos a mesma, a não ser quando analisada no contexto de um desejo seu de transformar o seu contrato de trabalho numa prestação de serviços. Mas se assim for, só terá de dirigir-se a esta direção e expor a sua vontade, com a certeza de que estaremos abertos à celebração de um acordo de alteração do seu vínculo contratual, caso entenda que essa alteração será desejável para a sua atividade profissional.
Entretanto, ficamos aguardando o seu imediato regresso ao local de trabalho, evitando que a situação atinja um lamentável ponto sem retorno.”.
66 - Dado que a situação de ausência da autora se manteve inalterada, sem qualquer resposta positiva aos apelos reiterados do sindicato para que se apresentasse ao serviço, foi-lhe comunicado pelo sindicato, em 26 de outubro de 2017, que deixaria de ser-lhe paga a respetiva retribuição.
67 - A autora manteve-se ausente do seu local de trabalho.
68 - Por deliberação da direção central do sindicato réu, de 30 de novembro de 2017, foi instaurado à autora um processo disciplinar com intenção de despedimento.
69 - Por carta de 13 de dezembro de 2017, o réu comunicou à autora essa deliberação, tendo-lhe solicitado que apresentasse relatório completo de todos os assuntos jurídicos que vinha acompanhando, que substabelecesse nos advogados que lhe foram indicados os poderes de que dispunha nos processo pendentes, âmbito do réu, tendo-lhe comunicado, também, que deveria abster-se de praticar quaisquer atos no âmbito do contrato pela qual se encontra vinculada ao sindicato, nos termos em que pretendia fazê-lo, isto é, a partir do seu escritório e sem comparecer no seu local de trabalho.
70 - Em 28 de dezembro de 2017 foi-lhe enviada a respetiva nota de culpa.
71 - A exigência de que a autora aceitasse o patrocínio de outros sócios do S… professores da Academia de … para além daqueles que a mesma aceitara, mantinha-se por parte dos dirigentes do réu.
72 - O associado Ju… que mantém um conflito com a referida Academia de …, mas não fazia parte dos associados do Algarve que a advogada tinha aceitado patrocinar, pediu com muita insistência à direção para que a autora o representasse.
73 - Nesse âmbito, a dirigente Ma… pediu que a autora marcasse consulta com o sócio, pelo que foi marcada para o dia 19 de outubro de 2017, pelas 15,30 horas na sede do sindicato.
74 - Tratava-se de um professor que tinha participado nas primeiras reuniões no Algarve e que tinha acompanhado os processos e os julgamentos dos colegas, pelo que a autora entendeu poder aceitar o seu patrocínio.
75 - Após essa “conversa” com a Ma…, a ora autora telefonou ao professor confirmando a data da consulta, tendo logo ficado registado na sua agenda o contacto telefónico e de e-mail do professor.
76 - No dia 18 de Outubro de 2017 pelas 18:36, a ora autora recebeu um e-mail de trabalho, da “coordenadora” dos gabinetes jurídicos do S…, a informar que a consulta com o professor Ju… tinha sido desmarcada.
77 - No dia 18 de outubro de 2017, a funcionária do réu R…, enviou ao associado em causa uma mensagem de correio eletrónico do seguinte teor:
“Caro Professor,
Serve o presente para lhe comunicar que foi desmarcada a consulta no Gabinete Jurídico do S…, com a Dr.ª N…, para o dia 19 de outubro, pelas 15.30h, em virtude de a Dr.ª N… não poder estar presente no sindicato na data marcada. Pelo transtorno pedimos as nossas desculpas. Todavia, caso o professor assim o entenda, poderá marcar consulta com os nossos advogados da Delegação de Faro. Para tanto poderá ligar o nº telefone …, ou, caso queira, poderemos nós proceder no sentido da marcação da mesma.
Reiteramos as nossas desculpas, apresentamos os nossos melhores cumprimentos,
a funcionária R…”.
78 - A autora havia expressamente comunicado aos serviços do sindicato que se deslocaria à sede do mesmo para levar a efeito a aludida consulta.
79 - Nessa sequência a autora através do seu mandatário em resposta a uma carta de 26 de outubro de 2017, enviou ao réu a seguinte missiva:
“Tomei conhecimento de que foi enviada à m/ constituinte uma carta sob registo e aviso de receção, lamentando que não me tenha sido dado conhecimento da mesma, enquanto seu representante legal.
Lamento o tom ameaçador da mesma.
Em primeiro lugar, sou a informar que a consulta ao sócio Ju…, que se encontrava marcada para o dia 19 de outubro e que foi desmarcada sob um falso pretexto, cujo tratamento criminal não deixará de ser levado a cabo, terá lugar hoje, por insistência do sócio, no escritório da m/ constituinte, por a atitude acima referida ter tornado inviável a sua realização no sindicato.
Quanto à entrega das chaves de acesso aos armários do gabinete da m/ constituinte, a mesma levanta questões de sigilo profissional, o mesmo acontecendo com a intenção de os processos ficarem à disposição da Comissão Executiva.
Caso V. Ex.ªs insistam nessa entrega, a mesma apenas será feita após parecer nesse sentido da Ordem dos Advogados.
Relativamente aos associados, o acesso aos processos deverá ser feito através da sua advogada.
No que diz respeito ao relatório pretendido, a informação pedida foi prestada há cerca de quinze dias à coordenadora dos gabinetes jurídicos, devendo a comissão solicitar à mesma essa informação.
Quanto às demais considerações, reitera-se que a m/ constituinte está a dar cabal cumprimento às suas obrigações contratuais e laborais, pelo que quaisquer violações dos seus direitos serão de imediato objeto do adequado tratamento com vista à defesa dos seus direitos.”.
80 - Em 13 de novembro de 2017, foi enviado ao réu mais um relatório da atividade da autora.
81 - No último recibo de vencimento a que a autora teve acesso, consta o valor ilíquido da sua remuneração € 2 528,32, a que corresponde a remuneração líquida de € 1 616,79; além disso, recebia mensalmente os duodécimos de metade dos subsídios de férias e de Natal, sendo o vencimento recebido no dia 28 de cada mês.
82 - No dia 28 de novembro de 2017, a autora recebeu apenas o valor de € 954,47, valor que a autora pensa corresponder a metade do subsídio de Natal, pois não lhe foi enviado ou dado a conhecer o recibo do vencimento.
83 - Em 14 de dezembro de 2017, a autora, através do signatário, solicitou o envio do modelo GD18/2010 da Segurança Social (declaração de retribuições em mora).
84 - Em 15 de dezembro de 2017 o réu enviou a seguinte resposta à autora:
"... 2. Este sindicato não emitirá a pretendida declaração de modelo GD18/2010 por considerar que não se encontra em mora relativamente ao pagamento da retribuição à Sra. Dra. N…. Com efeito, a retribuição que a Sra. Dra. N… considera em mora não é devida, uma vez que se reporta a um período de faltas injustificadas ao trabalho ...".
85 - No início de dezembro de 2017, foi depositada na conta da autora por parte do réu, a importância de € 121,50, valor que a autora desconhece a que respeita.
86 - A partir de 20-12-2017, a autora deixou de ter acesso ao servidor informático do réu.
87 - O S… é membro da F… e ambos são membros da CGTP.
88 - Esporadicamente em situações muito pontuais e especiais a autora pede a presença da coordenadora do jurídico na consulta, após explicar ao consulente o porquê e após obter o consentimento do mesmo, e a coordenadora quando entra, apresenta-se e diz porque vai estar presente.
89 - A autora optou por não enviar quaisquer substabelecimentos, ordenados pelo presidente.
90 - À autora não lhe foram pagos os vencimentos dos meses de novembro e dezembro de 2017 no valor de € 5 431,62 (valor bruto).
91 - A A. sentiu-se vexada, humilhada e descredibilizada perante os seus colegas, amigos e familiares.
92 - A autora investiu na sua carreira académica e profissional, colocando-as em pleno ao serviço do réu e dos seus associados e dedicou sempre o máximo zelo, empenho, profissionalismo, assertividade, eficácia e rigor nas funções que lhe foram sendo atribuídas.
93 - A A. encontra-se desmoralizada, confusa, receosa quanto ao seu futuro dentro e fora do sindicato.
94 - No dia 15 de janeiro de 2018 a autora recebeu do réu uma carta com o seguinte teor:
"... Vimos chamar a sua atenção para o facto de que, em virtude de não ter V.Exa., como lhe foi ordenado no nosso ofício de 13 de dezembro de 2017, substabelecido a favor da sua colega, Sra. Dra. Mar…, os processos pendentes dos associados deste Sindicato do Distrito de Évora e estando calendarizada uma diligência no Tribunal do Trabalho de Évora relativa ao processo da associada, Sra. professora D. H…, será V.Exa. responsabilizada por qualquer facto que prejudique a pretensão da referida associada, decorrente da falta de patrocínio jurídico na referida diligência ...".
95 - Em 22 de dezembro de 2017 o réu enviou aos sócios a comunicação assinada pelo presidente sob a epígrafe de “Substituição de mandatário judicial”.
96 - O presidente do sindicato afirmou que: “eram os procedimentos de Faro, e que em Évora também estão dirigentes no atendimento jurídico aos sócios” quando solicitado pelo advogado ou pelos sócios.

B) APRECIAÇÃO

As questões a decidir são as que já elencamos.

B1) As nulidades da sentença (apelação principal do réu)

A apelante conclui que a sentença é nula, por ter violado do disposto no art.º 615.º n.º 1, alíneas b), c) e d) do CPC.
Este artigo prescreve no seu n.º 1 que é nula a sentença quando:
Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (alínea b);
Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível (alínea c); e
O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (alínea d);
O apelante conclui que; “atento o disposto no artigo 588.º do CPC, o Tribunal a quo não poderia aceitar esse articulado superveniente nem basear a condenação da recorrente nessa invocação, que, a justificar-se, teria de ser invocada na petição inicial”.
O articulado superveniente foi apresentado em 22.02.2018 e foi admitido através de despacho proferido em 26.02.2018. Este despacho foi notificado ao réu, o qual veio responder ao mesmo. Na resposta, ou em qualquer outro requerimento, o réu não arguiu a nulidade do despacho de admissão do articulado superveniente nem recorreu. Na resposta que apresentou não se pronuncia sobre a inadmissibilidade do articulado superveniente.
Igual silêncio ocorreu durante a audiência prévia e durante a audiência de julgamento, em que foi produzida prova sobre os factos alegados pela autora no articulado superveniente.
Só agora, no presente recurso de apelação, vem o réu arguir a nulidade da sentença por se ter pronunciado sobre os factos alegados no articulado superveniente e ter condenado com base nos mesmos.
O réu, caso não concordasse com o despacho que admitiu o articulado superveniente, deveria ter reagido dentro do prazo em que poderia arguir a sua nulidade ou recorrer.
O réu nunca manifestou antes qualquer discordância com o despacho que admitiu o articulado superveniente, pelo que este transitou em julgado.
Assim, a sentença não conheceu de questões de que não pudesse conhecer nem condenou em objeto diverso ou cometeu qualquer outra nulidade ao apreciar os factos alegados no articulado superveniente e decidir com fundamento nos mesmos, pelo que se indefere esta nulidade da sentença.
***
A apelante conclui ainda que:
1ª - O Tribunal a quo julgou improcedentes todas as pretensões deduzidas pela autora na petição inicial, considerando-as infundadas, salvo quanto ao pedido de pagamento da retribuição correspondente aos meses de novembro e dezembro de 2017 e aos meses seguintes enquanto a situação perdurasse.
2ª - Todavia, na parte final da sentença, o Tribunal considerou que a recorrente havia aplicado à recorrida uma sanção abusiva de suspensão, sem precedência de processo disciplinar e condenou a recorrente a pagar à ora recorrida a quantia de € 54 316,20, a título de indemnização por aplicação de sanção abusiva acrescida de juros se mora à taxa legal até integral e efetivo pagamento, a que acrescerá a indemnização pelos meses que sem procedimento disciplinar e mantendo-se em vigor o contrato de trabalho, perdure tal situação e respetivos juros de mora e a liquidar em execução de sentença”.
Para melhor compreensão, transcrevemos os pedidos formulados pela autora na petição inicial e no articulado superveniente.
Petição inicial:
“Nestes termos e nos mais de direito aplicável, deve o R. ser condenado a pagar à A.:
a) A indemnização pela prática sistemática de assédio no valor de € 250 000;
b) Ao pagamento do valor de € 5 431,62, a que acrescerão as remunerações que se forem vencendo desde a presente data até à sentença bem como o valor correspondente ao dia da greve dos dirigentes do réu que lhe foi indevidamente descontado;
c) Que seja reconhecido o direito da autora a isenção de horário de trabalho, tendo em atenção a cláusula 5.ª do contrato de trabalho e o exposto no presente articulado;
d) Em juros de mora à taxa legal em vigor sobre todas as quantias em dívida, desde a data do vencimento das prestações referidas nos articulados desta P.I., e, desde a citação, no caso da indemnização peticionada no articulado 214.º e alínea a) do pedido, até efetivo e integral pagamento”.
Articulado superveniente:
“Requer-se a admissão do presente articulado superveniente, bem como a condenação da ré em mais os seguintes pedidos:
1 – Ser a R. condenada a pagar a indemnização disciplinar abusiva, nos termos e ao abrigo do artigo 331.º n.ºs 5 e 6 do CT no valor de € 108 627,40, a que acrescerão dez vezes o valor da remuneração de cada mês em que a atual situação se mantenha.
2 – Ser a indemnização respeitante à prática de assédio moral aumentada em mais € 50 000;
3 – Ser o R. condenado a pagar os salários vencidos em janeiro e fevereiro de 2018, no valor de € 5 431,62”.
Constata-se que o pedido de pagamento dos salários vencidos em janeiro e fevereiro de 2018 (n.º 3) formulado no articulado superveniente já está contido no pedido formulado na alínea b) do pedido formulado na petição inicial, pois aí pede-se o pagamento do valor de € 5 431,62 (relativos aos meses de novembro e dezembro de 2017 – como decorre do alegado -, a que acrescerão as remunerações que se forem vencendo desde a presente data até à sentença. Esta última parte do pedido contempla já o pedido de pagamento de todos os salários que não forem pagos pelo réu até à data da sentença.
Daí que o pedido formulado sob o n.º 3 no articulado superveniente está sobreposto ao pedido dos salários que se vencerem a partir de janeiro de 2018 até à sentença e é neste sentido que será entendido.
A sentença recorrida, sobre esta questão, fundamenta deste modo:
“Porém deve ser julgado o pedido de pagamento das remunerações desde que o réu sem qualquer procedimento disciplinar, embora alegando a prática de faltas injustificadas por parte da autora, decidiu suspender-lhe o pagamento da sua remuneração mensal.
Dispõe o art.º 328.º n.º 1 e) que no exercício do poder disciplinar o empregador pode aplicar a sanção de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade, e deve ser aplicado na sequência da instauração do respetivo procedimento disciplinar, art.º 329.º.
No caso dos autos resultou provado que à autora não lhe foram pagos os vencimentos dos meses de novembro e dezembro de 2017 no valor de € 5 431,62 nem quaisquer outros vencimentos posteriormente, mais resultando provado que tal resultou no entendimento do réu por faltas injustificadas da autora.
A aplicação daquela sanção ao não ter sido precedida de procedimento disciplinar deve ser considerada abusiva dando lugar a indemnização à autora no montante de € 54 316,20, art.º 331.º n.º 1 d) e 5, a que acrescerão a indemnização pelos meses que sem procedimento disciplinar e mantendo-se em vigor o contrato de trabalho, perdure tal situação e a liquidar em execução de sentença”.
O art.º 331.º n.º 5 do CT prescreve que quando a sanção abusiva for uma sanção pecuniária ou suspensão do trabalho, a indemnização não deve ser inferior a 10 vezes a importância daquela ou da retribuição perdida.
O salário mensal da A. é de € 2 528,32, como está provado no ponto 81 dos factos provados.
A sentença não explica como obteve o montante de € 54 316,20.
Não se consegue entender como é que o tribunal recorrido obteve este montante relativo à indemnização pela sanção abusiva, uma vez que nada é dito.
Analisando a decisão e a fundamentação, parece resultar que a condenação abrange a indemnização por aplicação de sanção abusiva e o pagamento dos salários em falta, desde novembro de 2017 até à sentença, embora nada diga quanto à questão das faltas serem ou não justificadas. Parece que o julgador de primeira instância considerou que o não pagamento das retribuições a partir de novembro de 2017 constitui uma sanção de suspensão de retribuição, ilegal.
Todavia, a sentença não é clara. A sentença é manifestamente ambígua, obscura, não fundamentada e omissa, nesta parte, o que a torna nula nos termos do art.º 615.º n.º 1, alíneas b), c) e d) do CPC.
Nos termos do art.º 665.º n.º 1 do CPC, ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objeto da apelação.
O n.º 3 deste artigo manda ouvir as partes. Todavia, como estas já se pronunciaram sobre as questões em debate, mostra-se cumprido o contraditório, pelo que não há necessidade de as notificar de novo para se pronunciarem sobre estas questões[2], quais sejam, a aplicação de sanção abusiva e de pagamento dos salários desde novembro de 2017 até à data da sentença.
Como a A. interpôs recurso subordinado onde pede a reapreciação de alguns pontos da matéria de facto, iremos primeiro conhecer desta questão, a fim de que a decisão de direito tenha em conta os factos definitivamente fixados como provados.

B2) Apreciação da matéria de facto (recurso subordinado da autora)

A apelante subordinada pretende a reapreciação dos factos dados como provados nos pontos 8 e 58 e dos pontos 3 a 10 dos factos dados como não provados na sentença no sentido e com a prova que indica.
Em relação ao ponto 8 a A. pretende que fique com a redação seguinte:
“Desde o ano de 2012 que o horário de trabalho efetivamente praticado pela autora correspondia à totalidade dos dias de segunda e terça-feira e às tardes dos restantes dias úteis, sem prejuízo de alterações relacionadas com os compromissos profissionais da autora”.
O facto dado como provado no ponto 8 é o seguinte: “Em conformidade com o que ficou estipulado na cláusula 5ª do contrato de trabalho, foi estabelecido entre as partes que a autora cumpriria um horário de trabalho de vinte e quatro horas e trinta minutos por semana, de segunda a sexta-feira, nos moldes seguintes:
a) Às segundas e terças, das 09:00 às 12:30 e das 14:30 às 18:00;
b) Às quartas, quintas e sextas, das 14:30 às 18:00;
Descanso semanal aos sábados e domingos”.
Analisada a prova produzida, não encontramos fundamento para alterar a resposta dada a este facto. Aliás, a forma como a A. pretende que o facto seja dado como provado é vago, na medida em que refere “totalidade dos dias de segunda e terça-feira e às tardes dos restantes dias úteis, sem prejuízo de alterações relacionadas com os compromissos profissionais da autora”.
Não sabemos o que entende a autora com totalidade do dia e das tardes e sem prejuízo de alterações relacionadas com os compromissos profissionais. Com a redação que pretende, ficaríamos sem saber qual é o seu horário de trabalho em concreto e o tempo de trabalho.
Assim, por estar de acordo com a prova produzida, mantém-se este facto inalterado.
A A. pretende que o facto provado do ponto 58 da sentença seja dado como não provado.
Este facto é o seguinte: “58 - A autora recusou o acesso do técnico de informática ao seu computador, alegando que iria apresentar queixa do ocorrido na Policia Judiciária”.
O depoimento da testemunha H… indicado pela A., ou outra prova, não coloca em causa este facto, antes o reforça. Quando a A. verificou que tinham mexido no seu computador recusou ao cesso do técnico e disse que apresentaria queixa na polícia, conforme está dado como provado.
Assim, não encontramos qualquer fundamento para dar este facto como não provado.
Os factos 3 a 10 dos factos não provados da sentença são os seguintes:
“3 – Em 22 de dezembro de 2017 o réu enviou aos sócios a comunicação assinada pelo presidente que se junta e cujo conteúdo se dá como reproduzido na qual sob a epígrafe de “substituição de mandatário judicial” são tecidas várias considerações sobre o esvaziamento das funções da autora que, repete-se, não se encontra suspensa, e sobre os procedimentos a tomar por cada um deles.
4 – Numa reunião dos gabinetes jurídicos do S…, ocorrida no dia 7 de março de 2017 na delegação de Beja, na qual a autora não esteve presente, mas que lhe foi relatada por pessoas que nela estiveram, o dirigente do réu Na..., com a concordância do presidente M…, demonstrando o que entendem sobre o exercício da profissão da autora, disse a seguinte pérola: “advogado/sócio…não é uma relação advogado/cliente, mas sim sindicato/advogado/sócio…por isso os dirigentes podem e devem assistir às consultas e também estão abrangidos pelo segredo profissional…“.
5 - E o Presidente M… acrescentou à jóia mais uma pérola, referindo-se ao assunto de uma sócia do S…, disse que: “os dirigentes de Faro, acusaram aquela sócia de querer tratar o advogado do sindicato como se fosse dela, porque reclamou e exigiu reunir com o advogado sem a presença do dirigente”!. (a professora não sabia quem era a pessoa que estava a ouvir a conversa, porque esta não se apresentou sequer, e estranhou o facto de ter enviado documentos pessoais, como extratos bancários, contratos, etc., para um e-mail geral do sindicato que não sabe quem abre e que tratamento têm tais documentos).
6 - Apresentando a autora sintomas de humor depressivo, desmotivação, astenia e dificuldade de concentração.
7 - Tendo ocorrido episódios de ansiedade aguda interpostos com ansiedade generalizada.
8 - A A. está medicada com venlafaxina XR, 75 mg/dose, trazodona OD 300 noite e buspirona 5 mg, três vezes ao dia.
9 - Mantendo-se o prognóstico reservado.
10 - Existindo indicações para continuar em consultas de psiquiatria a longo prazo”.
Em relação aos pontos 3 e 5 entende que já estão dados como provados nos pontos 95 e 96 dos factos provados, pelo que devem se eliminados dos factos não provados.
Os factos dados como provados nos pontos 95 e 96 são os seguintes:
“95 - Em 22 de dezembro de 2017 o réu enviou aos sócios a comunicação assinada pelo presidente sob a epígrafe de “Substituição de mandatário judicial”.
96 - O presidente do sindicato afirmou que: “eram os procedimentos de Faro, e que em Évora também estão dirigentes no atendimento jurídico aos sócios” quando solicitado pelo advogado ou pelos sócios”.
O facto 3 não provado está contemplado no ponto 95 dos factos provados na sua vertente factual, extirpada das conclusões e juízos de valor, pelo que se retira o ponto 3 dos factos não provados do elenco dos factos não provados, até para evitar contradição.
Salvo o devido respeito, o facto dado como provado no ponto 96 é diferente do que foi dado como não provado no ponto 5 dos factos não provados.
No facto 96 referem-se os procedimentos de Faro e de Évora e que os dirigentes estão no atendimento jurídico quando solicitado pelo advogado, enquanto no ponto 5 dos factos não provados se descreve uma factualidade diferente: “os dirigentes de Faro, acusaram aquela sócia de querer tratar o advogado do sindicato como se fosse dela, porque reclamou e exigiu reunir com o advogado sem a presença do dirigente”!. (a professora não sabia quem era a pessoa que estava a ouvir a conversa, porque esta não se apresentou sequer, e estranhou o facto de ter enviado documentos pessoais, como extratos bancários, contratos, etc., para um e-mail geral do sindicato que não sabe quem abre e que tratamento têm tais documentos)”.
Assim, mantém-se este facto no elenco dos factos não provados.
Em relação ao ponto 4 dos factos não provados, a testemunha António Augusto Ribeiro da Silva, dirigente do R., que interveio na reunião confirmou o facto, pelo que se dá como provado.
Assim, acrescenta-se ao elenco dos factos provados o seguinte:
“Numa reunião dos gabinetes jurídicos do S…, ocorrida no dia 7 de março de 2017 na delegação de Beja, na qual a autora não esteve presente, mas que lhe foi relatada por pessoas que nela estiveram, o dirigente do réu An…, com a concordância do presidente M…, demonstrando o que entendem sobre o exercício da profissão da autora, disse o seguinte: “advogado/sócio…não é uma relação advogado/cliente, mas sim sindicato/advogado/sócio…por isso os dirigentes podem e devem assistir às consultas e também estão abrangidos pelo segredo profissional”.
Em relação aos pontos 6 a 10 dos factos não provados, a A. pretende que sejam dados como provados com base no documento clínico que juntou aos autos com o articulado superveniente.
A A. juntou uma informação clínica emitida em 25.01.2018, subscrita por médico da especialidade de psiquiatria, onde se referem os factos que a A. pretende que sejam dados como provados.
O réu impugnou a veracidade dos factos alegados por desconhecimento, mas não impugnou o documento que a A. juntou como prova da sua veracidade.
O art.º 374.º n.º 1 do Código Civil, prescreve que a letra e a assinatura, ou só a assinatura, de um documento particular consideram-se verdadeiras, quando não impugnadas pela parte contra quem o documento é apresentado.
Nos termos do art.º 376.º n.º 1 do CC, o documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor.
Assim, os factos alegados são dados como provados, tal como constam do documento clínico, nos termos seguintes:
6 - Apresentando a autora sintomas de humor depressivo, desmotivação, astenia e dificuldade de concentração.
7 - Refere episódios de ansiedade aguda interpostos com ansiedade generalizada.
8 - A A. está medicada com venlafaxina XR, 75 mg/dose, trazodona OD 300 noite e buspirona 5 mg, três vezes ao dia.
9 – O prognóstico mantém--se reservado.
10 - Tem indicações para continuar em consultas de psiquiatria a longo prazo”.
Fica assim definitivamente fixada a matéria de facto provada e não provada.

B3) Apreciação do objeto do recurso principal do réu

B3.1) A questão da sanção abusiva

O objeto do recurso consiste em apurar se o autor foi sancionado abusivamente e se a A. tem direito à indemnização que peticiona com este fundamento.
A sanção disciplinar resulta do poder disciplinar do empregador, como resulta do art.º 328.º do CT.
Para que um determinado comportamento possa ser considerado como sanção disciplinar torna-se necessário provar que foi exercido no âmbito de um contrato de trabalho.
No caso concreto, o que está em causa é o não pagamento da retribuição da autora a partir de novembro de 2017, com fundamento em faltas injustificadas.
Não resulta dos factos provados, nem de outros elementos dos autos, que o réu tenha aplicado à A. uma sanção disciplinar.
Por razões que a A. entendeu justificadas, deixou de comparecer no local de trabalho.
O empregador comunicou-lhe para se apresentar, sob pena de incorrer em faltas injustificadas.
A A. continuou a não se apresentar no local de trabalho, apesar dessa advertência. Nessa sequência, o réu deixou de lhe pagar a retribuição, com fundamento em faltas injustificadas.
Nos termos do art.º 256.º n.º 1 do CT, a falta injustificada constitui violação do dever de assiduidade e determina perda da retribuição correspondente ao período de ausência, que não é contado na antiguidade do trabalhador.
Em face dos factos provados, o réu, invocando faltas injustificadas da A., deixou de lhe pagar a retribuição enquanto estas se verificarem.
Independentemente das faltas serem consideradas justificadas ou não, questão que analisaremos de seguida, a verdade é que o não pagamento da retribuição não se deveu à aplicação de uma sanção disciplinar, mas sim às faltas da autora.
Não tendo sido aplicada uma sanção disciplinar à A., não há sanção abusiva nos termos do art.º 331.º do CT.
Só quando é aplicada uma sanção é que podemos averiguar se é abusiva. No caso, não foi aplicada qualquer sanção disciplinar, pelo que não existe sanção abusiva, nem há lugar a qualquer indemnização com este fundamento.
Nesta conformidade, julgamos a apelação procedente quanto a esta questão, revogamos a decisão de condenação preferida em primeira instância nesta parte e absolvemos o réu do pedido de indemnização por sanção abusiva.

B3.2) As faltas da autora, sua justificação e retribuição

Como já referimos quanto à questão anterior, por razões que a A. entendeu justificadas, deixou de comparecer no local de trabalho.
O empregador comunicou-lhe para se apresentar, sob pena de incorrer em faltas injustificadas.
A A. continuou a não se apresentar no local de trabalho, apesar dessa advertência. Nessa sequência, o réu deixou de lhe pagar a retribuição, com fundamento em faltas injustificadas.
Nos termos do art.º 256.º n.º 1 do CT, a falta injustificada constitui violação do dever de assiduidade e determina perda da retribuição correspondente ao período de ausência, que não é contado na antiguidade do trabalhador.
As partes acordaram que o local de trabalho da autora seria na sede do réu e, um dia por semana, na delegação do réu sita em Portalegre.
A autora deixou de se apresentar no local de trabalho acordado.
O art.º 249.º do CT define os tipos de falta e enumera as que considera justificadas, nos termos seguintes:
1. A falta pode ser justificada ou injustificada.
2. São consideradas faltas justificadas:
a) As dadas, durante 15 dias seguidos, por altura do casamento;
b) A motivada por falecimento de cônjuge, parente ou afim, nos termos do artigo 251.º;
c) A motivada pela prestação de prova em estabelecimento de ensino, nos termos do artigo 91.º;
d) A motivada por impossibilidade de prestar trabalho devido a facto não imputável ao trabalhador, nomeadamente observância de prescrição médica no seguimento de recurso a técnica de procriação medicamente assistida, doença, acidente ou cumprimento de obrigação legal;
e) A motivada pela prestação de assistência inadiável e imprescindível a filho, a neto ou a membro do agregado familiar de trabalhador, nos termos dos artigos 49.º, 50.º ou 252.º, respetivamente;
f) A motivada por deslocação a estabelecimento de ensino de responsável pela educação de menor por motivo da situação educativa deste, pelo tempo estritamente necessário, até quatro horas por trimestre, por cada um;
g) A de trabalhador eleito para estrutura de representação coletiva dos trabalhadores, nos termos do artigo 409.º;
h) A de candidato a cargo público, nos termos da correspondente lei eleitoral;
i) A autorizada ou aprovada pelo empregador;
j) A que por lei seja como tal considerada.
3 - É considerada injustificada qualquer falta não prevista no número anterior.
O regime de faltas tem caráter imperativo, nos termos do art.º 250.º do CT.
O art.º 249.º n.º 2 indica taxativamente quais as faltas que podem considerar-se justificadas.
Analisados os factos provados, as faltas da autora apenas poderão ser eventualmente enquadradas na alínea d): motivadas por impossibilidade de prestar trabalho devido a facto não imputável ao trabalhador.
A autora funda a justificação das faltas ao trabalho no facto de terem acedido ao seu computador. A verdade é que tratando-se de uma advogada, tem um regime especial de confidencialidade. A entrada no seu computador poderá eventualmente constituir num ato ilícito.
Os factos provados não permitem concluir se ocorreu devassa do sigilo profissional por parte do réu, ou por pessoa por si mandatada.
O réu prontificou-se a entregar um computador portátil à A., o que esta recusou. Igualmente, antes de ter considerado as faltas injustificadas, sugeriu alternativas, caso a A. não quisesse trabalhar nas instalações do sindicato, o que a A. não aceitou.
Os factos provados mostram que o réu tentou propiciar à autora condições de trabalho consentâneas com o seu estatuto profissional, mas esta recusou e decidiu deixar de comparecer no local de trabalho.
Neste contexto, a realidade fática mostra que não se pode concluir que a A. estava impossibilitada de prestar trabalho devido a facto que não lhe era imputável.
O mesmo é dizer que não existe justificação para faltar ao trabalho.
As faltas que a A. vem dando desde novembro de 2017 devem considerar-se injustificadas, pelo que o empregador só paga o tempo relativo às mesmas se assim o quiser, pois nos termos da lei determinam perda de retribuição - art.º 256.º n.º 1 do CT.
O réu empregador decidiu não as pagar e não pode ser censurado por isso.
Nesta conformidade, julgamos a apelação procedente quanto a esta questão, revogamos a decisão de condenação preferida em primeira instância nesta parte e absolvemos o réu do pedido de pagamento dos salários desde novembro de 2017 até à sentença.

B4) Recurso subordinado

B4.1) Apurar se o contrato de trabalho se iniciou em 1993

A A. conclui que o contrato de trabalho se iniciou em 1993, pois apesar de ter subscrito contratos de prestação de serviço, na realidade havia uma relação de trabalho subordinado, com as caraterísticas elencadas no art.º 12.º do CT.
Em 1993 ainda não estava em vigor o atual art.º 12.º do CT. O regime legal até 2002, data até à qual está em discussão a existência de um contrato de trabalho entre a autora e o réu, estava previsto no art.º 1.º do Decreto-Lei n.º 49408, de 24.11.1969, que aprovou o regime jurídico do contrato individual de trabalho, pelo que é este o regime jurídico a aplicar.
Este artigo definia contrato de trabalho como aquele pelo qual uma pessoa se obrigava, mediante retribuição, a prestar a sua atividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direção desta.
A legislação em vigor na altura não continha índices presuntivos de laboralidade, como ocorreu com o art.º 12.º do CT de 2003 e ocorre com o atual art.º 12.º do CT de 2009.
O acento tónico, na altura dos factos, incidia sobre a subordinação jurídica[3]. Esta decorria dos factos concretos que fossem dados como provados. Ocorreria se a empregadora pudesse de algum modo orientar a atividade do trabalhador, de tal modo que a atividade fosse desenvolvida sob as ordens, direção e fiscalização daquela[4].
Na verdade, mediante os factos provados, assim se descortinaria ou não a existência de alguns índices que pudessem conduzir à conclusão de que a prestação da atividade era efetuada na dependência do beneficiário da mesma.
Quanto a esta questão, está provado que: “3 - O réu e a autora celebraram em 1 de dezembro de 1993 um contrato denominado de prestação de serviços em regime de avença mediante o qual a autora "... a) obriga-se a exercer as funções de consultora jurídica do sindicato dos professores da zona sul.
b) Estas funções compreendem o patrocínio forense em ações, recursos e outras diligências judiciais em que seja parte o S… e, ou, os sócios.
c) Igualmente se obriga a signatária advogada à emissão de pareceres técnico-jurídicos que lhe forem solicitados pelo S… (...)
A signatária advogada compromete-se a:
Dar consultas no edifício do S…, em Évora duas vezes por semana, compreendendo estas, uma manhã e uma tarde.
(...) Pela prestação de serviços o primeiro outorgante pagará à segunda outorgante a avença mensal de Esc. 37 000$00, atualizável anualmente.
4 - A A. deslocava-se à sede que na altura se situava na Rua … em Évora, para fazer as consultas marcadas, e, fazia o trabalho daí decorrente no seu escritório à data sito na Rua da … em Évora.
5 – Este contrato foi renovado em 1 de outubro de 1994, passando a avença mensal para o montante mensal de Esc. 43.000$00 e desaparecendo a cláusula de "... Dar consultas no edifício do S…., em Évora duas vezes por semana, compreendendo estas, uma manhã e uma tarde ...".
6 – Em 1 de outubro de 2000 foi celebrada uma adenda ao contrato de prestação de serviços em regime de avença e no qual a autora "... obriga-se a exercer as funções dos dois contratos anteriores.
Consideram-se ambos como um único contrato de prestação de serviços em regime de avença.
(...) Pela prestação de serviços, o primeiro outorgante pagará à segunda outorgante, o valor de Esc. 180.000$00, valor esse que será pago em dobro nos meses de junho e novembro.
Pelo presente, compromete-se a segunda outorgante, a prestar apoio ao primeiro outorgante, 4 tardes por semana, nos seguintes dias: segundas-feiras, terças-feiras, quintas-feiras e sextas-feiras. Podendo estas ser alteradas casualmente, em virtude de diligências profissionais...".
Estes factos mostram que a autora obrigou-se a prestar a sua atividade profissional ao réu, mediante o pagamento de uma quantia mensal, denominada avença. Dava consultas nas instalações do réu, mas fazia o trabalho daí decorrente no seu escritório. Nada está provado quanto à obrigatoriedade de ter um horário, ou de ter o dever de assiduidade, em confronto com o que ocorria após a celebração de contrato de trabalho, em que foi acordado que teria um horário de trabalho e que o local de trabalho de referência, onde se devia apresentar, era nas instalações do réu.
Os factos provados não permitem concluir no sentido de que entre 1993 e 2002 a autora estava dependente do réu quanto à duração do trabalho e local da sua prestação. A A. estava obrigada a apresentar um resultado, nada havendo que indicie a existência de dependência em relação ao réu quanto ao modo de o obter. Embora seja certo que atendendo à natureza das funções a A. tinha total autonomia técnica, a verdade é que poderia haver factos que indiciassem a existência do poder de direção do réu, como seja a existência da obrigatoriedade de cumprir um horário determinado por este, ou da obrigatoriedade de prestar a atividade nas instalações do réu ou onde este determinasse, o que não se verifica.
Assim, improcede o recurso subordinado quanto a esta questão.

B4.2) Pagamento do dia de greve

Quanto a esta questão, está provado que: “22 - No dia 14 de novembro de 2012 ocorreu uma greve geral de trabalhadores.
23 - Nesse dia todos os funcionários do réu estiveram ausentes do sindicato.
24 - A autora não compareceu no sindicato por lhe ter sido dito que o mesmo estava fechado.
25 - No sindicato apenas permaneceu uma dirigente sindical para receber informação da adesão à greve por parte dos professores.
26 - O réu descontou à autora no seu vencimento, no final do mês, esse dia de greve.
27 - A autora quando se apercebeu desse desconto reclamou junto do réu.
28 - Nessa sequência o réu emitiu em 14 de dezembro 2012 e entregou à autora e esta recebeu em 18 de Dezembro de 2012 pelas 10horas o escrito do seguinte teor:
Assunto: Desconto no salário de novembro de 2012
Relativamente ao assunto exposto no seu requerimento, recebido pelo S… dia 4 do corrente, a Comissão Executiva do S…, na reunião realizada dia 7 do corrente mês, decidiu que procederá ao pagamento do dia de trabalho descontado, devendo V.ª Exª dar indicações escritas que não aderiu à greve geral de dia 14 de novembro de 2012.
Com os melhores cumprimentos
Presidente da Direcção do S….
29 - No seguimento da resposta do réu a autora apresentou queixa-crime que correu termos no DIAP de Évora sob o nº 4/13.3TDEVR”.
Nos termos do art.º 536.º n.º 1 do CT a greve suspende o contrato de trabalho de trabalhador aderente, incluindo o direito à retribuição e os deveres de subordinação e assiduidade.
Os factos provados mostram que a autora não compareceu no local de trabalho por lhe ter sido dito que estava fechado. Não está esclarecido quem lhe disse, mas não está provado que tenha sido o réu. A verdade é que está provado que no sindicato apenas permaneceu uma dirigente sindical para receber informação da adesão à greve por parte dos professores. Ora, se aí permaneceu um dirigente sindical, apesar de todos os outros funcionários terem feito greve, a verdade é que o sindicato estaria aberto. Mas, mesmo que estivesse de porta fechada, a A. deveria ter alegado e provado que se dirigiu ao sindicato e que quando aí chegou verificou que estava fechado e não pôde entrar para prestar a sua atividade. A autora, uma vez que afirma que não aderiu à greve, deveria ter comparecido, o que não fez.
Acresce que o réu deu oportunidade à autora para esclarecer se tinha aderido ou não à greve, mas esta não esclareceu.
Assim, seja por ter feito greve, seja por ter faltado sem justificação, a autora não tem direito ao pagamento do dia em causa, pelo que o recurso subordinado improcede quanto a esta questão.

B4.3) Assédio moral

O art.º 29.º n.ºs 1 a 4 do CT prescrevem o seguinte:
1. É proibida a prática de assédio.
2 - Entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em fator de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.
3 - Constitui assédio sexual o comportamento indesejado de carácter sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o objetivo ou o efeito referido no número anterior.
4 - A prática de assédio confere à vítima o direito de indemnização, aplicando-se o disposto no artigo anterior.
O artigo exige, além da prática objetiva de factos ilícitos contra a pessoa do trabalhador, que estes tenham como objetivo ou efeito perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.
O elemento subjetivo pode ser preenchido através de atuação dolosa dirigida
à obtenção do resultado danoso para o trabalhador ou, em no caso de inexistência de dolo, através do efeito causado no trabalhador de forma censurável
[5].
A jurisprudência tem entendido que “não é toda e qualquer violação dos deveres da entidade empregadora em relação ao trabalhador que pode ser considerada assédio moral, exigindo-se que se verifique um objetivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável, para que se tenha o mesmo por verificado.
Mesmo que se possa retirar do artigo 29.º do Código do Trabalho que o legislador parece prescindir do elemento intencional para a existência de assédio moral, exige-se que ocorram comportamentos da empresa que intensa e inequivocamente infrinjam os valores protegidos pela norma – respeito pela integridade psíquica e moral do trabalhador”[6].
Como decorre já da solução dada às questões relativas à não existência de sanção abusiva, faltas injustificadas e não pagamento do salário da autora, não pagamento de um dia em que ocorreu greve geral e inexistência de contrato de trabalho entre 1993 e 2002, os factos provados não permitem concluir que o réu praticou factos integradores de assédio moral sobre a autora com a intenção ou o efeito censurável de a perturbar ou constranger, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.
Na reapreciação da matéria de facto, demos como provados os factos 6 a 10 dos factos que haviam sido dados como não provados, donde resulta que a autora padece de doença.
Todavia, não existe qualquer facto que permita estabelecer um nexo causal entre a doença da autora e o comportamento do réu. Teria que resultar dos factos provados que a doença da autora ocorreu por causa de atos praticados pelo réu, seus dirigentes ou outros trabalhadores. Os factos dados provados referentes ao acesso ao computador da autora mostram que poderá ter havido uma conduta negligente do réu nesta parte.
Contudo, a intenção era reparar todos os computadores existentes e não apenas o da autora. O técnico de informática deveria ter tido o cuidado de não mexer no computador adstrito à autora, advogada, sem que esta estivesse presente e o consentisse, de forma a salvaguardar o sigilo profissional. Neste ponto, um trabalhador advogado não é igual a qualquer outro trabalhador. Há regras que devem ser respeitadas. Nesta matéria, a conduta do técnico de informática não foi a mais adequada.
Este facto, porém, não é suficiente para podermos concluir pela existência de assédio moral, atendendo ao comportamento posterior do réu, que se prontificou de imediato a resolver a situação. Não podemos afirmar que a doença que a autora apresenta é consequência deste facto.
Em relação à caixa da gata, não se provou que alguém em concreto a retirou do gabinete da autora. Existem suposições, mas mais nada do que isso.
Neste contexto, entendemos que não existiu assédio moral sobre a autora, pelo que o recurso subordinado improcede quanto a esta questão.
Nesta conformidade, julgamos a apelação da apelante ré parcialmente procedente e o recurso subordinado da autora parcialmente procedente quanto à matéria de facto e improcedente quanto ao mais, e revogamos a sentença recorrida na parte em que condenou a ré, que se absolve do pedido.

III - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em:
1. Julgar a apelação do réu procedente parcialmente e absolvê-lo do pedido em que foi condenado na sentença recorrida.
2. Julgar o recurso subordinado de apelação da autora procedente parcialmente quanto à impugnação da matéria de facto, nos termos acima expostos, e improcedente quanto ao mais, absolvendo o réu do pedido.
Custas em ambos os recursos a cargo da autora.
Notifique.
(Acórdão elaborado e integralmente revisto pelo relator).
Évora, 02 de maio de 2019.
Moisés Silva (relator)
Mário Branco Coelho
Paula do Paço
1] Supomos que a A. quereria dizer “ré”, em face do contexto da ação, pelo que se considera corrigido neste sentido.
[2] Neste sentido, Ferreira, Fernando, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9.ª edição, Edições Almedina, SA, Coimbra, 2009, p.238.
[3] Neste sentido, Ac. STJ, de 05.05.1999, processo n.º 99S030, www.dgsi.pt/jstj.
[4] Neste sentido, Ac. STJ, de 23.04.1997, processo n.º 96S209, e Ac. de 18.03.1998, processo n.º 97S241, www.dgsi.pt/jstj.
[5] Neste sentido: Ac. STJ, de 01.03.2018, processo n.º 4279/16.8T8LSB.L1.S1, www.dgsi.pt/jstj.
[6] Ac. STJ, de 09.05.2018, processo n.º 532/11.5TTSTRE.E1.S1, que confirmou o acórdão proferido por esta Relação de Évora, www.dgsi.pt/jstj.