Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1116/08.0TBOLH-B.E1
Relator:
FERNANDO BENTO
Descritores: CUSTAS DE PARTE
Data do Acordão: 12/15/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO CÍVEL
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário:
I – As custas de parte são encargos que se destinam, em princípio, a indemnizar as partes ou litigantes vencedores das despesas efectuadas com o pleito e compreendem tudo o que a parte haja despendido com o processo ou a parte do processo a que se refere a condenação e que tenha direito a ser indemnizada.

II – Se, subsequentemente à condenação, a parte vencedora instaurar execução de sentença, deve requerer não só a execução da sentença propriamente dita mas também a condenação em custas, visando o reembolso das custas de parte.

III – Se a parte vencedora não instaurar execução de sentença, o MP só instaurará execução para cobrança de custas de parte se o interessado o requerer ao MP, indicando logo bens penhoráveis ao devedor.

IV – Todavia, o credor daquelas custas de parte pode, por si e sem necessidade de recurso aos serviços do MP, instaurar a execução para cobrança do que lhe é devido, in casu, as custas de parte.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA

RELATÓRIO
Os recorrentes “A” e “B” instauraram execução para cobrança coerciva das custas de parte que, a seu favor, foram contadas no processo n° … e que lhes são devidas pelos recorridos “C” e “D”, requeridos nesse processo e, por via da respectiva improcedência, condenados nas respectivas custas.
Tal requerimento executivo foi liminarmente indeferido por o Mmo Juiz não lhes reconhecer legitimidade para a instauração de tal execução, pois que, segundo o despacho recorrido, só o MP deteria tal legitimidade.
Decisão contra a qual eles se insurgem por via da presente apelação cuja alegação finalizam com a seguinte síntese conclusiva:
Considerando que:
a) Os presentes autos têm como título executivo uma decisão transitada em julgado;
b) Na qual se decidiu que as custas documentadas e quantificadas, ficariam a cargos dos Requerentes - ora executados;
c) Que, apresentada a conta de custas, os executados não a liquidaram;
d) Que, conforme decorre do título executivo, credores de tais custas são os exequentes, são estes que em face do disposto no artº 55º do CPC, detêm legitimidade para instaurar a acção executiva, sem prejuízo de, em determinados casos, se exercer o direito pela via do requerimento ao MP, o que não é o caso dos autos.
e) Que, a intervenção activa do Ministério Público na promoção da execução é facultativa e não imperativa, conforme dispõe o art. 33° e 33°- A do CPC, na versão aqui aplicável.
No entendimento dos Recorrentes, o despacho é ilegal e viola as disposições que se indicam:
a) Do C.P.C
Artigo 55º 156/1; 234º A (a contrário) e 812°; art. 659° n°. 1 e 2 uma vez que, analisando os factos e interpretando a lei aos mesmos, afigura-se que no caso, nem haveria lugar a despacho prédio quanto mais à sua rejeição liminar da execução.
b) Do CCJ
- Artigo 33º e 33º A na versão anterior ao DL 34/2008
c) Do Código Civil
Artigo 9º na medida em que a norma aplicada pela Mª Juiz não teve em conta as regras de interpretação da lei ali contempladas.
Concluem, pedindo a revogação do despacho recorrido.

Não foram apresentadas contra-alegações.
Remetido o processo a esta Relação, proferiu-se o despacho preliminar, após o que foram corridos os vistos legais.
Nada continua a obstar ao conhecimento do recurso.

FUNDAMENTAÇÃO
Os factos relevantes constam do relatório que antecede.

Apreciando:
As custas de parte são encargos que se destinam, em princípio, a indemnizar as partes ou litigantes vencedores das despesas efectuadas com o pleito e compreendem tudo o que a parte haja despendido com o processo ou a parte do processo a que se refere a condenação e que tenha direito a ser indemnizada.
Inequivocamente que os exequentes e recorrentes têm direito a ser compensados pelas custas de parte que suportaram no processo onde as mesmas foram contadas e cuja responsabilidade foi assacada aos executados; tal direito é um evidente direito de crédito contra estes, responsáveis pelas custas contadas em tal processo.
Depois de no n° 1 do art. 33° do CC se esclarecer a noção de custas de parte ­"compreendem o que a parte haja despendido com o processo a que se refere a condenação e de que tenha direito a ser compensada em virtude da mesma", designadamente as custas adiantadas, as taxas de justiça pagas, a procuradoria, os preparos para despesas e gastos e as remunerações pagas ao solicitador de execução, as despesas por ele suportadas e demais encargos da execução - e de o nº 2 preceituar que tais quantias e todo o demais despendido de que "a parte tenha direito a ser compensada" são objecto de nota discriminativa e justificativa, prescreve o art. 33°-A do CCJ no seu nº 1 que "sem prejuízo da sua cobrança em execução de sentença, no prazo de 60 dias a contar do trânsito em julgado da mesma, a parte que tenha direito a ser compensada das custas de parte remete à parte responsável a respectiva nota discriminativa e justificativa, para que esta proceda ao seu pagamento".
Os preceitos são claros ao referirem-se ao direito à compensação e à finalidade visada com a remessa da nota discriminativa e justificativa das custas de parte - o pagamento.
Há, portanto, um direito de crédito e uma correspectiva obrigação.
Se, na sequência da remessa da referida notas discriminativa e justificativa, a parte responsável pelas custas não proceder ao pagamento das referidas custas de parte, quid iuris?
Há que distinguir, nos termos do n° 6 do art. 33°-A do CCJ:
- ou é requerida a execução de sentença:
- ou não é requerida, ''por qualquer motivo".
Naquela hipótese, a cobrança coerciva pode (deve) ser requerida na execução de sentença a instaurar: a parte vencedora executa a sentença propriamente dita e a condenação em custas, visando o reembolso das custas de parte.
Nesta hipótese (ausência de execução de sentença, "por qualquer motivo" no qual se inclui, a inexequibilidade da sentença, por ser, v.g., absolutória) e para efeito de cobrança destas custas, a parte credora pode requerer ao MP que instaure execução por custas, nos termos do nº 3 do art. 116° CCJ.
Se, de acordo com o art. 59° CPC, ao MP compete a promoção da instauração da execução por custas em qualquer processo, o nº 1 do art. 116° citado condiciona essa competência - legitimidade do MP - ao conhecimento de bens penhoráveis ao respectivo responsável (daí e para isso a informação referida no art. 115° CCJ) e o nº 2 dispensa tal instauração bem como o prosseguimento de execuções instauradas se a dívida for de montante tão reduzido que não justifique a actividade ou as despesas a que o processo dê lugar".
Contudo, o nº 3 do art. 116° CCJ prevê a hipótese de não estarem em dívida a taxa de justiça ou outras quantias ao Cofre Geral dos Tribunais: neste caso, para além de não haver lugar à informação oficiosa ao MP sobre a existência de bens penhoráveis conhecidos ao devedor, o MP só instaurará execução se o interessado, por um lado, não tiver requerido, por qualquer motivo, a execução de sentença e, por outro, se o interessado requerer ao MP a instauração da execução, indicando logo bens penhoráveis ao devedor.
Mas esta é a legitimidade - digamos, condicionada - do MP para a instauração da execução para cobrança coerciva de custas de parte.
Por outras palavras: o MP só pode instaurar execução por custas de parte se se verificarem os requisitos enunciados no nº 3 do art. 116° CCJ: ausência de execução de sentença, requerimento ao MP e prestação de informação sobre bens penhoráveis.
Daqui não é lícito concluir que o credor daquelas fique privado - dir-se-ia mesmo, "expropriado" - do direito de, por si e sem necessidade de recurso aos serviços do MP, instaurar a execução para cobrança do que lhe é devido, in casu, as custas de parte.
O condicionamento da legitimidade do MP para desencadear a cobrança coerciva das custas contadas e em dívida (incluindo as de parte) visa o pagamento destas conjuntamente com as do tribunal, como era historicamente entendido e praticado.
Com efeito, no regime anterior, era o Cofre Geral dos Tribunais quem, pagas ou cobradas as custas, devolvia à parte vencedora (não responsável pelas custas) as taxas de justiça inicial e subsequente, na proporção do vencimento (anterior redacção do art.º 31.°, n.º 1 do CCJ).
Actualmente, nas acções entradas em juízo a partir de 1 de Janeiro de 2004, o reembolso à parte vencedora das quantias devidas a título de custas de parte e de procuradoria constitui encargo da parte vencida, na medida em que seja condenada. O ónus passou agora a pertencer à parte vencedora que, no prazo de 60 dias a contar do trânsito em julgado da sentença deve remeter à parte vencida a nota discriminativa e justificativa, para que a parte responsável proceda ao seu pagamento (art.º 33.0-A, n.º 1 do CCJ).
Se a parte responsável não proceder a esse pagamento, não proceder ao pagamento da quantia constante da nota discriminativa e justificativa, a parte interessada deve instaurar execução ou requerer ao Ministério Público a instauração de execução por custas (art.º 33.°­A, n.º 6 do CCJ), devendo para o efeito indicar bens penhoráveis do devedor (art.º 116.°, n.º 3 do CCJ).
Mas este recurso aos serviços do MP é (deve entender-se) facultativo, sob pena de ter de se interpretar esta actuação do MP no interesse exclusivo dos particulares como patrocínio obrigatório e exclusivo do MP nas execuções com vista à cobrança coerciva das custas de parte devidas ao vencedor...
Por conseguinte, a parte credora de custas de parte tem legitimidade para, por si e sem necessidade de recurso ao MP, instaurar execução com vista à cobrança coerciva das custas de parte contadas a seu favor em qualquer processo.

ACÓRDÃO
Nesta conformidade, acorda-se nesta Relação em julgar procedente a apelação e, revogando o despacho recorrido, ordenar o prosseguimento da execução.
Sem custas.
Évora e Tribunal da Relação, 15.12.2009