Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
154/23.8T9OLH.E1
Relator: MARIA CLARA FIGUEIREDO
Descritores: COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL CRIMINAL PARA A EXECUÇÃO DA COIMA
COMPETÊNCIA DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA PARA A EXECUÇÃO DAS CUSTAS
DECISÃO DE DECLARAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA MATERIAL
RECORRIBILIDADE
Data do Acordão: 02/05/2024
Votação: DECISÃO SUMÁRIA
Texto Integral: S
Sumário: I - O regime recursivo previsto no artigo 73º do RGCO não abrange no seu âmbito de aplicação as decisões proferidas nas execuções de decisões administrativas, porquanto as mesmas se não integram em qualquer recurso de impugnação de decisão administrativa que a referida norma visa regular.
II - Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 89º, nº 2 do RGCO e 491º, nº 2 do CPP, a tramitação das execuções de decisões administrativas segue as regras do CPC, incluindo, naturalmente, o sistema recursivo aí previsto, pelo que, consubstanciando a decisão recorrida uma declaração de incompetência em razão da matéria, dúvidas não poderão restar de que a mesma se apresenta como recorrível ao abrigo do disposto no artigo 629º, nº 2, alínea a) do CPC.

III - Pese embora num momento inicial do processo legislativo tenha sido ponderada a solução de integrar as coimas no conjunto das quantias a executar pela Administração Tributária, a verdade é que as alterações legislativas que efetivamente vieram a ser introduzidas pela Lei nº 27/2019, de 28 de março acabaram por não acolher tal solução.

IV - Não obstante a coima consubstanciar uma sanção pecuniária aplicada num procedimento administrativo, a mesma assume inquestionavelmente uma natureza penal, pois encontra o seu campo de aplicação no Ilícito de Mera Ordenação Social pacificamente aceite como direito penal secundário, pelo que não poderão as coimas considerar-se incluídas na previsão da alínea c) do nº 2 do artigo 148.º CPPT.

V - Não obstante a solução encontrada pela articulação das normas vigentes – designadamente tendo em conta a redação que às mesmas foi conferida pela Lei nº 27/2019, de 28 de março – acarretar inarredáveis incongruências, estabelecendo uma solução dual – segundo a qual pertence aos Tribunais Criminais a competência para execução de coima aplicada por autoridade administrativa, pertencendo à Autoridade Tributária a competência para a execução das custas fixadas nas mesmas decisões – em detrimento da uniformidade de procedimentos que seria desejável, é esta a legalmente prevista e que, consequentemente, deverá ser aplicada.

Decisão Texto Integral: Decisão sumária
Constata-se que a questão a decidir no presente recurso – atinente à competência material para a execução de coima e custas – tem vindo a ser judicialmente apreciada de modo uniforme e reiterado nesta Relação (1), pelo que, nos termos do disposto no artigo 417º, nº 6, alínea d) do CPP, encontra-se legitimada a prolação de decisão sumária.

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I - Relatório.

Nos autos de execução de coima e custas que correm termos no Juízo de Competência Genérica de … - J… do Tribunal Judicial da Comarca de …, com o n.º 154/23.8T9OLH, foi proferida decisão de declaração de incompetência material para a sua tramitação.

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Inconformado com tal decisão, veio o Ministério Público interpor recurso da mesma, tendo apresentado, após a motivação, as conclusões que passamos a transcrever:

“1) O Ministério Público promoveu a execução da coima e custas da entidade administrativa, por não terem sido voluntariamente liquidados os valores em dívida por parte do executado.

2) Para o efeito, o Ministério Público submeteu requerimento executivo que deu origem aos presentes autos.

3) Pelo despacho recorrido, o Tribunal a quo decidiu que é absolutamente incompetente em razão da matéria para apreciar a presente acção executiva, considerando que tal competência recai sobre a AT.

4) O legislador não alterou o disposto nos artigos 61.°, 88.° e 89.°, do RCP, mantendo- se a competência para a execução da coima administrativa não paga junto dos Tribunais.

5) Perante a actual redação do artigo 35.°, do RCP, apenas se considera admissível que a AT tenha competência para a execução das custas da entidade administrativa. No que respeita à coima, o legislador não atribuiu essa competência à Autoridade Tributária.

6) Ao julgar que é absolutamente incompetente em razão da matéria para apreciar a acção executiva que deu origem aos presentes autos, com o devido respeito por opinião contrária, o tribunal a quo violou o disposto nos artigos 61.°, 88.°, e 89.°, do RGCO, 35.°, do RCP, e 64.°, do CPC, por força do disposto no artigo 4.°, do CPP.

7) Numa interpretação conforme com o disposto nos artigos antecedentes e demais disposições legais aplicáveis, consideramos que o tribunal recorrido nunca se poderia declarar materialmente incompetente para proceder à execução da coima, por se verificar que o Juízo de Competência Genérica de …, do Tribunal Judicial da Comarca de …, é territorialmente e materialmente para apreciar a presente acção executiva, devendo os autos prosseguir os seus ulteriores termos.

8) Deve, assim, ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, determinando-se, consequentemente, que prossiga a presente execução relativamente à coima aplicada pela entidade administrativa e, eventualmente, relativamente às custas aplicadas pela entidade administrativa, caso se entenda que o Tribunal recorrido é igualmente competente para a sua execução.”

Termina pedindo a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que que receba o requerimento executivo.

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O recurso foi admitido, tendo no despacho de admissão o tribunal recorrido consignado que: “(…) Nos termos do disposto no artº 641º do CPC ex vi do art.º 414º, nº4º do C.P.P., procede-se a despacho de apreciação da nulidade invocada nos seguintes termos (…)”. Ora, não tendo sido arguida no recurso qualquer nulidade relativamente à decisão recorrida, inexiste fundamento de ordem processual para conhecimento de tal vício nos termos das invocadas normas, pelo que se terá como não escrita tal parte do aludido despacho.

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A Exmª. Procuradora Geral Adjunta neste Tribunal da Relação emitiu parecer, tendo-se pronunciado pela procedência do recurso e tendo concluído da seguinte forma:

“(…) ponderados os termos da motivação do recurso interposto pelo Ministério Público, manifestamos a nossa concordância com os seus termos, na parte relativa à execução relativa à coima.

Na verdade, tal como constitui entendimento do Ministério Público, nomeadamente, junto deste Tribunal de Recurso, é aos Tribunais que assiste competência para processar e decidir o processo de execução relativo à cobrança de coima resultante de decisão de autoridade administrativa. Sucede até que, em resultado de oposição de julgados sobre este mesmo tema, interpôs já o Ministério Público recurso extraordinário para fixação de jurisprudência.

É, pois, assim, que neste caso se adere à motivação do Ministério Público recorrente, com a delimitação que dela deve ser feita ao caso da coima, como suprarreferido, sendo, portanto, o nosso parecer de que deve o presente recurso obter provimento.”

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Cumpre apreciar e decidir.

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II – Fundamentação.

II.I Delimitação do objeto do recurso.

Nos termos consignados no artigo 412º nº 1 do CPP, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente na sua motivação, as quais definem os poderes cognitivos do tribunal ad quem, sem prejuízo de poderem ser apreciadas as questões de conhecimento oficioso.

Em obediência a tal preceito legal, a motivação do recurso deverá enunciar especificamente os fundamentos do mesmo e deverá terminar pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, nas quais o recorrente resume as razões do seu pedido, de forma a permitir que o tribunal superior apreenda e conheça das razões da sua discordância em relação à decisão recorrida.

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Assim, considerando as conclusões apresentadas pelo recorrente – e sem prejuízo de primeiramente analisarmos a questão da recorribilidade da decisão recorrida – é apenas uma a questão a apreciar e a decidir quanto ao mérito do recurso, a saber:

- Determinar se a decisão recorrida, ao declarar a sua incompetência material para tramitar a presente execução por coima e custas violou os critérios de atribuição de competência legalmente previstos.

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II.II - A decisão recorrida.

A apresentação pelo Ministério Público do requerimento executivo mereceu por parte do Tribunal a quo a seguinte decisão:

“Iniciaram-se os presentes autos executivos com requerimento executivo apresentado pelo Ministério Publico, para cobrança de coima, devida ao Município de ….

Estabelece o actual art.° 35° do Regulamento das custas processuais (após - Lei n.° 27/2019, de 28/03) o seguinte:

1 - Compete à administração tributária, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, promover em execução fiscal a cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial.

2 - Cabe à secretaria do tribunal promover a entrega à administração tributária da certidão de liquidação, por via eletrónica, nos termos a definir por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, juntamente com a decisão transitada em julgado que constitui título executivo quanto às quantias aí discriminadas.

3 - Compete ao Ministério Público promover a execução por custas face a devedores sediados no estrangeiro, nos termos das disposições de direito europeu aplicáveis, mediante a obtenção de título executivo europeu.

4 - A execução por custas de parte processa-se nos termos previstos nos números anteriores quando a parte vencedora seja a Administração Pública, ou quando lhe tiver sido concedido apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.

5 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a execução por custas de parte rege-se pelas disposições previstas no artigo 626.° do Código de Processo Civil.

Com a actual redacção da sobredita norma, o Ministério Publico no âmbito da jurisdição criminal junto dos Juizos Locais criminais tem competência unicamente para instaurar execução por multa devida nos processos e indemnizações arbitradas aos ofendidos/vitimas dos processos criminais.

Todos os demais valores são cobrados pela A.T. após emissão da competente certidão de divida no processo.

É aliás este o entendimento vertido no parecer n.° 27/2020, de 04-10 do Ministério Publico. Fazendo, como se entende, todo o sentido que se o Ministério Publico junto do tribunal não tem competência para cobrar as custas devidas no próprio processo, não poderá executar custas ou coimas devidas em qualquer outro processo de natureza administrativa, junto de qualquer outra entidade.

Em face do exposto, e tendo em conta o objecto da presente execução, constatamos que este Tribunal é absolutamente incompetente, em razão da matéria, para apreciar e a presente acção executiva, a qual entendemos ser da Autoridade Tributária.

A incompetência absoluta em razão da matéria verificada constitui excepção dilatória, de conhecimento oficioso e a todo o tempo, e importa a absolvição do Executado da instância, nos termos do disposto nos artigos 65°, 97°, 98°, 99° e 577°, al. a) do Código de Processo Civil.

Registe e Notifique.

Após trânsito:

-Existindo alguma penhora nos autos proceda ao seu imediato cancelamento.

- Existindo valores pagos proceda notificação do executado com informação dos respectivos valores.

- Remeta os autos à conta.”

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Questão prévia: Da admissibilidade do presente recurso

Conforme acima enunciámos, de entre as recentes decisões que neste Tribunal da Relação têm sido proferidas em recursos de natureza semelhante ao dos presentes autos, algumas existem – são do nosso conhecimento dois acórdãos decididos por unanimidade (2), um acórdão decidido por maioria (3) uma decisão sumária (4), e um voto de vencido (5) proferido num outro acórdão – que decidiram não conhecer do recurso por terem considerado irrecorrível a decisão recorrida.

Analisados os argumentos apresentados, nos quais se ancoram as citadas decisões para sustentarem a irrecorribilidade da decisão recorrida e a consequente rejeição do recurso, sempre ressalvado o muito respeito que temos pelas opiniões ali expressas, não subscrevemos tal linha argumentativa. E explicamos brevemente porquê. Tal como sucedia nos recursos nos quais foram proferidas as decisões desta Relação a que vimos de aludir, também na situação em causa nos presentes autos a certidão de dívida, respeitante a coima e custas, que dá origem à execução recusada, foi extraída de um processo de contraordenação. O que se executa é, pois, uma decisão administrativa, não impugnada judicialmente, proferida no âmbito do referido processo contraordenacional. Tratando-se o processo no qual foi proferida a decisão recorrida de uma execução de decisão administrativa proferida no âmbito de um processo contraordenacional, a sua tramitação deverá obedecer às regras previstas no Regime Geral das Contraordenações (RGCO). Até aqui estamos de acordo com o raciocínio expendido nas aludidas decisões. Mas só até aqui. Com efeito, deixamos de poder acompanhar o raciocínio ali exposto a partir do momento em que estabelece como pressuposto da conclusão a que vem a chegar subsequentemente, a aplicabilidade do regime recursivo previsto no artigo 73.º do RGCO às decisões proferidas na referida ação executiva. Salvo devido respeito, tal pressuposto não encontra apoio, nem na letra do aludido artigo 73.º, nem na sua inserção sistemática no diploma em causa, nem na análise global do RGCO.

Vejamos.

Dispõe o artigo 73.º do RGCO: “Artigo 73º

Decisões judiciais que admitem recurso

1 - Pode recorrer-se para a Relação da sentença ou do despacho judicial proferidos nos termos do artigo 64.º quando:

a) For aplicada ao arguido uma coima superior a 249,40€;

b) A condenação do arguido abranger sanções acessórias;

c) O arguido for absolvido ou o processo for arquivado em casos em que a autoridade administrativa tenha aplicado uma coima superior a 249,40€ ou em que tal coima tenha sido reclamada pelo Ministério Público;

d) A impugnação judicial for rejeitada;

e) O tribunal decidir através de despacho não obstante o recorrente se ter oposto a tal.

2 - Para além dos casos enunciados no número anterior, poderá a relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso da sentença quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência.

3 - Se a sentença ou o despacho recorrido são relativos a várias infrações ou a vários arguidos e se apenas quanto a alguma das infrações ou a algum dos arguidos se verificam os pressupostos necessários, o recurso subirá com esses limites.»

A norma transcrita insere-se no Capítulo VI denominado “Recurso e processo judiciais”, composto de 19 artigos – do 59º ao 75º – sendo que o âmbito de aplicação de tal capítulo se encontra desde logo delimitado pelo primeiro dos artigos que o integram, ou seja, pelo artigo 59º, que dispõe da seguinte forma:

“Artigo 59.º

Forma e prazo

1 - A decisão da autoridade administrativa que aplica uma coima é susceptível de impugnação judicial.

2 - O recurso de impugnação poderá ser interposto pelo arguido ou pelo seu defensor.

3 - O recurso é feito por escrito e apresentado à autoridade administrativa que aplicou a coima, no prazo de 20 dias após o seu conhecimento pelo arguido, devendo constar de alegações e conclusões.”

A tal norma, que expressamente estabelece a suscetibilidade de impugnação judicial das decisões administrativas, seguem-se mais dezoito artigos, entre os quais se inclui artigo 73º, todos eles reguladores da tramitação de tal recurso de impugnação judicial.

Ora, como já se antevê, o regime recursivo previsto no artigo 73º do RGCO, nos qual as decisões acima identificadas fizerem assentar a irrecorribilidade da decisão recorrida, não abrange no seu âmbito de aplicação as decisões proferidas nas execuções de decisões administrativas, porquanto as mesmas se não integram em qualquer recurso de impugnação de decisão administrativa que a referida norma visa regular.

E se dúvidas subsistissem relativamente à abrangência do campo de aplicação da referida norma processual, as mesmas dissipar-se-iam através da análise do seu texto, pois que é o próprio corpo do nº 1 do citado artigo 73º que a delimita estabelecendo que “1 - Pode recorrer-se para a Relação da sentença ou do despacho judicial proferidos nos termos do artigo 64.º (…)”. Ora, o artigo 64º (6) regula as possibilidades de decisão do recurso de impugnação – quanto à forma (com audiência ou através de simples despacho) e quanto ao mérito (absolvição, manutenção ou alteração da decisão recorrida) – pelo que, também da conjugação do artigo 73º com o artigo 64º do RGCO, resulta, inequivocamente, que o regime recursivo estabelecido no primeiro de tais preceitos se aplica apenas às decisões proferidas no âmbito dos recursos de impugnação de decisões contraordenacionais.

E qual o regime processual aplicável às execuções de decisões administrativas, nas quais se incluem os presentes autos?

Tal questão encontra resposta expressa no artigo 89º do RGCO, concretamente no seu nº 2 que estabelece:

“Artigo 89.º

Da execução

(…) 2 - A execução é promovida pelo representante do Ministério Público junto do tribunal competente, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no Código de Processo Penal sobre a execução da multa. (…)” (7)

À execução de decisão administrativa aplicam-se, pois, remissão expressa da norma transcrita, as disposições reguladoras da execução da multa constantes do Código de Processo Penal, ou seja, os artigos 489º a 491º-B de tal código, sendo certo que a respeito da execução instaurada em caso de não pagamento da multa estabelece o artigo 491º nos seguintes termos:

“Artigo 491.º

Não pagamento da multa

1 - Findo o prazo de pagamento da multa ou de alguma das suas prestações sem que o pagamento esteja efectuado, procede-se à execução patrimonial.

2 - Tendo o condenado bens penhoráveis suficientes de que o tribunal tenha conhecimento ou que ele indique no prazo de pagamento, o Ministério Público promove logo a execução, que segue as disposições previstas no Código de Processo Civil para a execução por indemnizações.(…)” (8)

Do exposto decorre, pois, a nosso ver, que, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 89º, nº 2 do RGCO e 491º, nº 2 do CPP, a tramitação das execuções de decisões administrativas segue as regras do CPC, incluindo, naturalmente, o sistema recursivo aí previsto.

Como é sabido, o CPC não prevê um sistema recursivo idêntico ao do processo penal – nos termos qual é permitido recorrer de todas as decisões cuja irrecorribilidade não esteja prevista na lei (artigo 399.º CPP) – nem tão restritivo como o previsto no RGCO – no qual a regra é a da irrecorribilidade, excecionando a previsão do artigo 73º de tal regime legal as decisões que admitem recurso. É o artigo 629.º do CPC que estabelece as decisões que admitem recurso no âmbito do processo civil, dispondo no seu nº 1 que:

“1 - O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa. (…)” e prevendo no nº 2 que “Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso:

a) Com fundamento na violação das regras de competência internacional, das regras de competência em razão da matéria ou da hierarquia, ou na ofensa de caso julgado;(…)” (9)

Ora, consubstanciando a decisão recorrida uma declaração de incompetência em razão da matéria, dúvidas não poderão restar de que a mesma se apresenta como recorrível ao abrigo do disposto no artigo 629º, nº 2, alínea a) do CPC.

Não colhe, a nosso ver, o argumento extraído por alguns autores (10) da alteração da redação do n.º 2 do artigo 91º do RGCO, no sentido de entenderem que a redação conferida a tal preceito pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de setembro, ao suprimir as limitações ao direito de recurso estabelecidas na redação originária, tornou admissível a interposição de recurso nos termos previstos no artigo 73º, n.º 1, do RGCO (11). Reiterando o que acima expusemos relativamente à abrangência do campo de aplicação de tal norma, somos a concluir que a supressão das referidas limitações ao direito ao recurso anteriormente estabelecidas no artigo 91º apenas viabilizou o entendimento que defendemos, segundo o qual aos recursos das decisões proferidas nas execuções de decisões contraordenacionais se aplicará o regime recursivo previsto no CPC, ao qual chegamos através do caminho acima delineado.

São, pois, estas as razões pelas quais entendemos ser admissível o presente recurso.

*

II.III - Apreciação do mérito do recurso.

No que diz respeito à única questão que é colocada no recurso à nossa apreciação, perfilhamos, sem qualquer, dúvida o entendimento segundo o qual o Tribunal recorrido é o competente para tramitar a execução da coima, pertencendo a competência para a tramitação das custas à Autoridade Tributária.

O enquadramento jurídico da matéria em causa foi já objeto de aprofundado tratamento em vários acórdãos desta Relação (12), recentemente proferidos em recursos oriundos do Juízo de Competência Genérica de …, do qual também o presente recurso emana, e no Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, publicado no DR-II, de 20 de outubro de 2021 (13). Tantos e tão valiosos são os argumentos apresentados em tais arestos e no mencionado Parecer, no sentido que acima indicámos, que nos limitaremos a enunciá-los com a brevidade que questão reclama.

* Assim, no que concerne ao não pagamento voluntário da coima, decorre do artigo 89.º do RGC, que:

“Artigo 89º

Da execução

1. O não pagamento em conformidade com o disposto no artigo anterior dará lugar à execução, que será promovida, perante o tribunal competente, segundo o artigo 61.º, salvo quando a decisão que dá lugar à execução tiver sido proferida pela relação, caso em que a execução poderá também promover-se perante o tribunal da comarca do domicílio do executado.

2. A execução é promovida pelo representante do Ministério Público junto do tribunal competente, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no Código de Processo Penal sobre a execução da multa.” (14) Ora, a remissão feita pelo nº 2 deste preceito para o CPP, para além de nos remeter para os artigos 489º a 491º-B, que regulam a execução por multa – conforme acima explicitámos no âmbito da apreciação da questão prévia atinente à recorribilidade da decisão recorrida – remete-nos também para o artigo 510.º CPP, no qual se preceitua que “Em tudo o que não esteja especialmente previsto neste Código, a execução de bens rege-se pelo disposto no Código de Processo Civil e no Regulamento das Custas Processuais.” E é no artigo 35.º do RCP, que claramente se estipula que:

“1. Compete à administração tributária, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, promover em execução fiscal a cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial.” Por outro lado, o artigo 148.º do CPPT, que delimita o âmbito da execução fiscal, tramitada pela Autoridade Tributária, estabelece que:

“Artigo 148.º

Âmbito da execução fiscal

1 – O processo de execução fiscal abrange a cobrança coerciva das seguintes dívidas:

a) Tributos, incluindo impostos aduaneiros, especiais e extrafiscais, taxas, demais contribuições financeiras a favor do Estado, adicionais cumulativamente cobrados, juros e outros encargos legais;

b) Coimas e outras sanções pecuniárias fixadas em decisões, sentenças ou acórdãos relativos a contraordenações tributárias, salvo quando aplicadas pelos tribunais comuns.

c) Coimas e outras sanções pecuniárias decorrentes da responsabilidade civil determinada nos termos do Regime Geral das Infrações Tributárias.

2 – Poderão ser igualmente cobradas mediante processo de execução fiscal, nos casos e termos expressamente previstos na lei:

a) Outras dívidas ao Estado e a outras pessoas coletivas de direito público que devam ser pagas por força do ato administrativo;

b) Reembolsos ou reposições.

c) Custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial. (15)

Como sabemos, não obstante a coima consubstanciar uma sanção pecuniária aplicada num procedimento administrativo, a mesma assume inquestionavelmente uma natureza penal, pois encontra o seu campo de aplicação no Ilícito de Mera Ordenação Social pacificamente aceite como direito penal secundário, no qual, embora com autonomia dogmática, se afirma também, ainda que com menor ressonância ética (16), a função punitiva do Estado, com recurso aos critérios de responsabilização subjetiva (17). Como parâmetro constitucional da questão relativa à natureza penal dos ilícitos de mera ordenação social convocamos o artigo 32.º, n.º 10 da Constituição da República Portuguesa, que dispõe: “Nos processos de contraordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa.”. A orientação do Tribunal Constitucional tem sido no sentido de evitar a inteira correspondência entre as normas processuais dos ilícitos contraordenacional e criminal, mas salvaguardando sempre a defesa de princípios comuns a esses dois ramos do direito. (18) Também a jurisprudência do TEDH tem confluído para a afirmação da natureza penal sancionatória do direito contraordenacional e para a sua sujeição aos ditames do artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Estas as razões pelas quais não poderão as coimas considerar-se incluídas na previsão da alínea c) do nº 2 do artigo 148.º CPPT acima transcrito. E a tal entendimento não constituirá óbice a circunstância de na alínea b) do nº 1 do mesmo artigo se referirem as “coimas aplicadas pelos tribunais comuns” para se excluir a sua execução da competência da Autoridade Tributária, pois que em tal segmento o legislador não terá querido reportar-se às coimas concretamente aplicadas pelos tribunais comuns mas sim à competência atribuída aos tribunais comuns para conhecerem das decisões administrativas que aplicaram as coimas sempre tais decisões sejam objeto de impugnação judicial. A distinção entre a coima e a sua execução, por um lado, e as custas, multas processuais e outras sanções pecuniárias não penais e as respetivas execuções, por outro – distinção à luz da qual devemos ler o disposto no artigo 148.º, nº 2.º, al. c) do CPPT – resulta, pois, das indicadas especialidades da primeira. Neste conspecto, e pese embora saibamos que, num momento inicial do processo legislativo, foi ponderada a solução de integrar as coimas no conjunto das quantias a executar pela Administração Tributária (19), a verdade é que as alterações legislativas que efetivamente vieram a ser introduzidas, acabaram por não acolher tal solução, tendo-se optado, a final, por não incluir as coimas no referido universo, o que se patenteia nas atuais redações e na concatenação dos artigos 148.º do CPPT e 89º do RGCO acima transcritos, conforme, aliás, clara e profusamente se explana no Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, publicado no DR-II, de 20 de outubro de 2021, acima referido. (20) Sucede que, faltando às coimas e multas esse caráter t, faltando às coimas e multas esse caráter tributário e sinalagmático e tratandoributário e sinalagmático e tratando--se de sanções se de sanções decorrentes de uma responsabilidade pessoaldecorrentes de uma responsabilidade pessoal, , em caso de falecimento do executado/arguido, extingueem caso de falecimento do executado/arguido, extingue--se a se a responsabilidade criminal e contraordenacionalresponsabilidade criminal e contraordenacional, o que (é) frontalmente incompatível com o disposto no, o que (é) frontalmente incompatível com o disposto nos referidos preceitos. Este será apenas um exemplo da incompatibilidade e inadequação entre regime previsto Este será apenas um exemplo da incompatibilidade e inadequação entre regime previsto para a execução fiscal e a natureza das coimas e penas de multa aplicadas pelos tribunais comunspara a execução fiscal e a natureza das coimas e penas de multa aplicadas pelos tribunais comuns (…)”(…)”.(21)

*

No que tange às custas fixadas na decisão contraordenacional cuja execução foi rejeitada pelo tribunal recorrido, convocamos novamente o aludido Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria, cujo entendimento – no sentido de que as mesmas devem ser executadas pela Autoridade Tributária – inteiramente subscrevemos. Pelo seu acerto, optamos por transcrever as conclusões do aludido Parecer, na parte que a este propósito releva:

“(…) 1.ª Na sua versão original, o Regime Geral das Contraordenações remetia a execução das custas para o disposto nos artigos 171.º e seguintes do Código das Custas Judiciais, assim atribuindo ao Ministério Público competência para promover a sua execução junto dos tribunais judiciais (art. 202.º, n.º 2, daquele Código);

2.ª Esta solução, apesar das inúmeras alterações legislativas que enfrentou, manteve-se quase inalterada até à entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de 28 de março, relativa à aplicação do processo de execução fiscal à cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial;

3.ª Com efeito, considerando a natureza tributária das custas e seguindo o exemplo da jurisdição administrativa e fiscal, o legislador inverteu aquele paradigma, remetendo para a execução fiscal a cobrança coerciva das custas fixadas em processo judicial;

4.ª Para esse efeito, a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, alterou o Código de Procedimento e de Processo Tributário que passou a dispor que «Poderão ser igualmente cobradas mediante processo de execução fiscal, nos casos e termos expressamente previstos na lei: (…) Custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial [art. 148.º, n.º 2, alª c)];

5.ª Bem como o artigo 35.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais, que sob a epígrafe «execução», passou a dispor que: «Compete à administração tributária, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, promover em execução fiscal a cobrança coerciva das custas, multas não penais e outras sanções pecuniárias fixadas em processo judicial»;

6.ª Embora nem a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, nem as normas que ela alterou, o digam expressamente, deve entender-se que este regime é aplicável às custas fixadas na fase administrativa do processo de mera ordenação social, competindo à Administração Tributária proceder à sua cobrança coerciva;

7.ª Desde logo, porque, continuando o artigo 92.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações, a remeter para os preceitos reguladores das custas em processo criminal, será aqui aplicável o disposto no artigo 35.º do Regulamento das Custas;

8.ª Depois, porque, atenta a sua natureza, tais custas estão incluídas no âmbito do artigo 148.º, n.º 1, al.ª a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, segundo o qual o processo de execução fiscal abrange, para além do mais, a cobrança coerciva de taxas, demais contribuições financeiras a favor do Estado, adicionais cumulativamente cobrados, juros e outros encargos legais;

9.ª Em terceiro lugar, porque, em vez de atribuir ao juízo ou tribunal que as tenha proferido competência para executar as decisões relativas a multas, custas e indemnizações previstas na lei processual aplicável, o legislador passou a atribuir-lhe, apenas, competência para a execução das decisões relativas a multas penais e indemnizações previstas na lei processual aplicável (art. 131.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário);

10.ª Em quarto lugar, porque o legislador restringiu os poderes do Ministério Público, maxime o poder de promover a execução por custas, conferindo-lhe, agora, apenas, competência para promover a execução das penas e das medidas de segurança e, bem assim, a execução por indemnização e mais quantias devidas ao Estado ou a pessoas que lhe incumba representar judicialmente (art. 469.º do Código de Processo Penal);

11.ª Finalmente, porque o legislador eliminou a referência à execução por custas, que constava do artigo 491.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, passando a mesma a ser da competência exclusiva da Administração Tributária;

12.ª Com estas alterações, para além de ter atribuído à Administração Tributária competência para proceder à cobrança coerciva das custas, o legislador eliminou as normas que antes atribuíam ao Ministério Público competência para promover a sua execução e aos tribunais judiciais competência para a tramitar;(…)”

Nesta conformidade, pese embora reconheçamos que a solução encontrada pela articulação das normas vigentes – designadamente tendo em conta a redação que às mesmas foi conferida pela Lei nº 27/2019, de 28 de março – acarreta inarredáveis incongruências, estabelecendo uma solução dual – segundo a qual pertence aos Tribunais Criminais a competência para execução de coima aplicada por autoridade administrativa, pertencendo à Autoridade Tributária a competência para a execução das custas fixadas nas mesmas decisões – em detrimento da uniformidade de procedimentos que seria desejável, é esta a legalmente prevista – concretamente nos artigos 61º, 88º e 89º do RGCO e 64º do CPC no que concerne às coimas, e nos artigos 35º do RCP e 148º do CPPT no que diz respeito às custas – pelo que o recurso merece provimento, impondo-se revogar a decisão recorrida na parte relativa à execução que visa a cobrança coerciva da coima aplicada e mantendo-se a mesma apenas na parte concernente à declaração de incompetência do Tribunal quanto à execução das custas.

***

III- Dispositivo.

Por tudo o exposto e considerando a fundamentação acima consignada, decide-se conceder provimento ao recurso e, consequentemente:

- Revogar a decisão recorrida na parte em que declarou o Tribunal absolutamente incompetente, em razão da matéria, para apreciar a ação executiva instaurada para cobrança coerciva da coima, declarando-se que o mesmo é o competente para o efeito, devendo nessa parte ser determinado o prosseguimento da execução;

- Manter a decisão recorrida, na parte concernente à cobrança coerciva das custas.

Sem custas.

(Processado em computador e revisto integralmente pela signatária)

Évora, 5 de fevereiro de 2024

Maria Clara Figueiredo

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1 As dissidências nas decisões que recentemente têm sido proferidas reportam-se tão somente à questão prévia da recorribilidade ou da irrecorribilidade da decisão que declarou a incompetência para a tramitação da execução, mas não ao mérito do recurso.

2 Proferidos em 21.11.2023 e em 05.12.2023 relatados, respetivamente, pelos Desembargadores Gomes de Sousa e Carlos de Campos Lobo, disponíveis em www.dgsi.pt.

3 Relatado em 09.01.2024 pela Desembargador Fátima Bernardes, disponível em www.dgsi.pt.

4 Proferida em 29.11.2024, pelo Desembargador Moreira das Neves, disponível em www.dgsi.pt.

5 Proferido pela Desembargadora Ana Bacelar no acórdão de 07.11.2023, relatado pelo Desembargador Carlos de Campos Lobo, disponível em www.dgsi.pt.

6 “Artigo 64.º

Decisão por despacho judicial

1 - O juiz decidirá do caso mediante audiência de julgamento ou através de simples despacho.

2 - O juiz decide por despacho quando não considere necessária a audiência de julgamento e o arguido ou o Ministério Público não se oponham.

3 - O despacho pode ordenar o arquivamento do processo, absolver o arguido ou manter ou alterar a condenação.

4 - Em caso de manutenção ou alteração da condenação deve o juiz fundamentar a sua decisão, tanto no que concerne aos factos como ao direito aplicado e às circunstâncias que determinaram a medida da sanção.”

5 - Em caso de absolvição deverá o juiz indicar porque não considera provados os factos ou porque não constituem uma contraordenação.”

7 Negrito acrescentado.

8 Negrito acrescentado.

9 Negrito acrescentado.

10 Entre eles, Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário ao Regime Geral das contraordenações, Almedina, pág. 337; António Beça Pereira, in Regime Geral das Contraordenações e Coimas, 10ª edição, 2014, Almedina, pág. 241 e António de Oliveira Mendes e José Santos Cabral, in Notas ao Regime Geral das Contraordenações e Coimas”, 3ª Edição, Almedina, pág. 291.

11 São as seguintes as redações em causa:

Redação original, conferida pelo Decreto-Lei nº 433/82 de 27 de outubro:

“Artigo 91.º

(Tramitação)

1 - O tribunal perante o qual se promove a execução será competente para decidir sobre todos os incidentes e questões suscitados na execução, nomeadamente:

a) A admissibilidade da execução;

b) As decisões tomadas pelas autoridades administrativas em matéria de facilidades de pagamento;

c) A suspensão da execução segundo o artigo 90.º

2 - Admite-se, todavia, recurso para a relação nos seguintes casos:

a) Admissibilidade de execução de coima aplicada por via judicial;

b) Nos casos referidos na alínea b) do número anterior, quando as decisões forem da competência do tribunal da comarca.

3 - As decisões referidas nos n.os 1 e 2 serão tomadas sem necessidade de audiência oral, assegurando-se ao arguido ou ao Ministério Público a possibilidade de justificarem, por requerimento escrito, as suas pretensões.”

Redação atual, conferida pelo Decreto-Lei nº 244/95 de 14 de setembro:

“Artigo 91.º

Tramitação

1 - O tribunal perante o qual se promove a execução será competente para decidir sobre todos os incidentes e questões suscitados na execução, nomeadamente:

a) A admissibilidade da execução;

b) As decisões tomadas pelas autoridades administrativas em matéria de facilidades de pagamento;

c) A suspensão da execução segundo o artigo 90.º

2 - As decisões referidas no n.º 1 são tomadas sem necessidade de audiência oral, assegurando-se ao arguido ou ao Ministério Público a possibilidade de justificarem, por requerimento escrito, as suas pretensões.”

12 No sentido por nós perfilhado, já decidiram ou se já se pronunciaram também os seguintes acórdãos desta Relação: acórdão de 24.10.2023, relatado pelo Desembargador João Carrola; acórdão de 07.11.2023, relatado pelo Desembargador Jorge Antunes; acórdão de 21.11.2023, relatado pelo esembargador Gomes de Sousa; decisão sumária de 29.11.2023 do Desembargador Moreira das Neves, todos disponíveis em www.dgsi.pt e decisões sumárias de 15.11.2023 e de 30.01.2024, proferidas pela Desembargadora Margarida Bacelar nos processos nºs 57/23.6T9OLH.E1e 124/23.6T9OLH.E1.

13 Disponível in https://www.ministeriopublico.pt/pareceres-pgr/9375 e publicado em extrato no DR, 2ª série, nº 204, de 20-10-2021, páginas 121 e 122.

14 Negritos acrescentados.

15 Negrito acrescentado.

16 Neste sentido, cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Direito penal, Parte Geral, tomo I, 3.ª ed., 2019, Gestlegal, pp. 178 ss. e Inês Ferreira Leite, no seu texto: A autonomização do direito sancionatório administrativo, em especial, o direito contraordenacional, in «Contraordenações e contraordenações administrativas e fiscais», EBook, CEJ, 2015, pp. 40/41.

17 Daí que quer a pena, quer a coima, e os respetivos procedimentos executivos, se extingam com a morte do agente, sendo proibida a sua transmissão para familiares ou para terceiros e sendo proibida a subrogação no cumprimento das mesmas, tal como explicam Gomes Canotilho e Vital Moreira, em anotação ao artigo 30.º, ponto IV, p. 504, na Constituição da República Portuguesa Anotada, I vol., 4.ª ed. revista, 2007, Coimbra e Jorge de Figueiredo Dias, nas páginas 118 ss do seu livro Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas/Editorial Notícias.

18 Neste sentido, cfr. Maria Fernanda Palma e Paulo Otero “Revisão do Regime Legal do Ilícito de Mera Ordenação Social” in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Vol. XXXVII 2. 1996. pág. 564.

Ilustrativos do entendimento que perfilhamos e que vimos de expor encontramos os seguintes segmentos do aludido Parecer, citando o parecer do Conselho Superior da Magistratura sobre o tema:

“(…) As penas de multa e as coimas aplicadas pelo Tribunal, respetivamente em enquadramento de direito penal primário e secundário não têm cariz tributário, nem natureza sinalagmática, representando, ao invés, o essencial reduto do poder punitivo do Estado, o que parece justificar tratamento diferenciado na respetiva execução.

(…) o Código de Procedimento e de Processo Tributário assenta no pressuposto essencial de que a quantia exequenda corresponde a uma divida tributária, assim se justificando, por exemplo a execução de sucessores conforme decorre do artigo 153.º e 154.º do referido diploma.

19 O que resulta, entre o mais, do Parecer do Ministério Público sobre a proposta de Lei n.º 149/XIII/4.ª GOV de 24 de outubro de 2018.

20 Ao contrário do que parece entender o tribunal a quo quando refere na decisão recorrido que “(…) Com a actual redacção da sobredita norma, o Ministério Publico no âmbito da jurisdição criminal junto dos Juizos Locais criminais tem competência unicamente para instaurar execução por multa devida nos processos e indemnizações arbitradas aos ofendidos/vitimas dos processos criminais.

Todos os demais valores são cobrados pela A.T. após emissão da competente certidão de divida no processo.

É aliás este o entendimento vertido no parecer n.° 27/2020, de 04-10 do Ministério Publico.(…)”

21 Negritos acrescentados.