Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
892/07.2TAFAR.E1
Relator: ANTÓNIO LATAS
Descritores: EXECUÇÃO DE COIMA
COMPETÊNCIA MATERIAL
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA
ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
Data do Acordão: 11/19/2015
Votação: MAIORIA COM * DEC VOT E * VOT VENC
Texto Integral: S
Sumário: I - É recorrível a decisão do juiz de secção criminal que se declara incompetente, por considerar ser materialmente competente a secção de execução.
II - O regime previsto nos artigos 34º a 36º do C. P. Penal rege apenas para os conflitos de competência entre tribunais de primeira instância (no que aqui importa) com competência em matéria criminal, conflitos cuja resolução é da competência dos presidentes das secções criminais das Relações, nos termos do disposto no artigo 12º, nº 5, al. a), do C. P. Penal, norma para a qual remete, expressamente, o artigo 35º do mesmo C. P. Penal.
III - O tribunal/secção competente para tramitar a execução para cobrança de uma coima (e das custas respetivas) é o tribunal/secção criminal (e não o tribunal/secção de execução).
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora


I. Relatório

1. Na Secção criminal (J3) da Instância local de Faro da Comarca de Faro, foi instaurada pelo MP a presente execução por coima e custas contra OLS, por factos de 09.04.2005, tendo sido aí proferido despacho em 30.09.2009 (cfr fls 61-2) que declarou prescrita a coima aplicada, mas ordenou o prosseguimento da execução para pagamento das custas decorrentes da condenação pela prática da contraordenação, proferida em 20.04.2006 pela Direcção-Geral de Viação, sendo certo que não foi sequer invocada a prescrição das custas em dívida (que não é de conhecimento oficioso) nos presentes autos.
2. Liquidadas as custas em dívida, no montante de €268,90, a execução prosseguiu com a realização de diversas diligências incluindo penhora de bens, até que, na sequência da entrada em vigor da Lei 62/2013 de 26 de agosto que aprovou a nova organização judiciária, a senhora juíza daquela secção criminal proferiu o despacho de fls 129 a 133 com data de 13.04.2015, em que declara a incompetência absoluta do tribunal para conhecer da presente execução e, em consequência, absolve o R. da instância, ordenando que, após trânsito, se remeta os autos às secções de execução competentes.
3. Regularmente notificado, vem o MP recorrer daquele despacho, extraindo da sua motivação as seguintes

« Conclusões:

1 - No regime legal anterior ao da entrada em vigor da Lei n° 62/2013, de 26/08 (LOSJ), e nos termos das disposições conjugadas dos arts. 100° e 102°, n°2, da LOFT, a competência para conhecer dos recursos de contraordenação cabia aos juízos criminais ou, quando existissem, aos juízos de pequena instância criminal; em Faro, onde não existia juízos de pequena instância criminal, a competência para conhecer dos recursos de contraordenação cabia aos juízos criminais, que, de acordo com os arts. 61° e 89°, n°1, do RGCO, também eram competentes para conhecer das execuções por coima;
2 - Da análise do art. 129°, n°1, da LOSJ, resulta inequívoco que o legislador pretendeu atribuir às secções de execução a competência exclusiva dos processos de execução de natureza cível, com as exceções previstas no n°2, do mesmo artigo;
3 - As execuções por coima não se enquadram na previsão do art. 129°, n°1, da LOSJ, já que não se tratam de processos de execução de natureza cível; com efeito, as coimas têm por base decisões de processos de contraordenação, cujo regime substantivo e adjetivo segue, subsidiariamente, as normas penais e processuais penais - cfr. arts. 32° e 41°, do RGCO - sendo que o seu regime executivo pode implicar a necessidade de formulação de juízo para além da mera execução patrimonial, como seja, a aplicação do art. 89°-A, do RGCO;
4 - A fase executiva da coima não assume uma natureza de mera execução patrimonial, não se restringindo a matéria executiva civil, atenta a natureza contraordenacional das coimas e as especificidades do seu regime;
5 - Não tendo a LOSJ introduzido qualquer norma expressa relativamente às execuções por coimas, deve entender-se que a sua competência permaneceu inalterada face ao regime anterior;
6 - Ao entender que as execuções por coima se enquadram na previsão do art. 129°, n°1, da LOSJ, entendemos, salvo o devido respeito, que é muito, que a Mma Juiz “a quo” interpretou erradamente o disposto no art. 129°, n°1, da Lei n° 62/2013, de 26/08 (LOSJ), o que expressamente se argui, quando englobou na referida disposição legal as execuções por coimas, quando tal disposição legal devia ter sido interpretada, segundo o nosso entendimento, no sentido de não englobar as execuções por coima, por não se enquadrarem no conceito de processos de execução de natureza cível;
7 - Pelo que se requer que seja determinada a revogação da decisão judicial de fls. 129 a 133, que decidiu pela incompetência absoluta deste Tribunal, com fundamento na incompetência material, e absolveu o Réu da instância, por outra que considere que este juízo é materialmente competente para a presente execução por coima, com o prosseguimento da execução. »

4. Nesta Relação, o senhor Procurador-geral Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

5. Foi cumprido o disposto no art. 417º nº 2 do C.P.P., não tendo sido apresentada resposta.

6. Transcrição integral do despacho recorrido:

« Dispõe o artigo 129º n.º 1 da Lei n.º 62/2013 de 26 de agosto, entrada em vigor no dia 1 de setembro de 2014, que compete às secções de execução exercer, no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no Código de Processo Civil.
Acrescenta o seu n.º 2 que “Estão excluídos do número anterior os processos atribuídos ao tribunal de propriedade intelectual, ao tribunal da concorrência, regulação e supervisão, ao tribunal marítimo, às secções de família e menores, às secções do trabalho, às secções de comércio, bem como as execuções de sentenças proferidas por secção criminal que, nos termos da lei processual penal, não devam correr perante uma secção cível.” (sublinhado nosso)
O artigo 131º estabelece, por sua vez, que as secções genéricas da instância local, no que ora nos interessa, são competentes para executar as decisões por si proferidas relativas a custas, multas ou indemnizações previstas na lei processual aplicável.
Resulta evidente do exposto que, em matéria de execução, as secções de instância local criminal apenas têm competência para executar decisões, (em sentido amplo, quer sejam sentenças, decisões de recursos de contraordenação, despachos de aplicação de multas, custas e indemnizações) por si proferidas, sendo certo que relativamente às sentenças, com a ressalva da parte final do n.º2 do artigo 129º supra citado.
Ora, não se incluindo a presente execução de coima e custas em nenhum dos casos supra referidos, porquanto não foi a mesma aplicada por nenhuma decisão deste tribunal, terá necessariamente de cair na regra geral prevista no n.º1 do artigo 129º que atribui competência às secções de execução.
A este entendimento não obvia o facto do referido preceito se referir aos processos de execução de natureza cível. Com efeito, tal qualificativo reporta-se à natureza da execução e não à origem do respetivo título executivo ou à natureza do processo onde a mesma teve origem. Para efeitos de qualificação da natureza da execução como cível, deve-se apenas considerar a execução patrimonial das decisões proferidas, por contraponto à natureza criminal da execução que inclui, a título de exemplo, a passagem de mandados de captura; a substituição de uma pena de multa por dias de trabalho; o pagamento da multa em prestações ou a sua conversão em prisão subsidiária.
Tanto assim é que é o próprio artigo 129º n.º2 que exclui do número anterior as execuções proferidas por secção criminal, utilizando a expressão “estão excluídos do número anterior”.
Ora, se tal exclusão decorresse já, e por si só, da própria natureza da execução por referência à natureza do processo que deu origem à decisão que lhe serve de base, seria totalmente redundante e desprovida de sentido utilizar a expressão referida.
Se o legislador teve necessidade de consagrar a expressão “estão excluídos do número anterior” deveu-se inequivocamente ao facto das execuções referidas no número dois do artigo 129º terem ou poderem ter natureza cível.
E isto, porque, na hermenêutica legislativa o intérprete deve presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, conforme resulta do disposto no artigo 9º n.º 3 do Código Civil.
Acresce que o artigo 131º cria uma norma especial relativa à execução de custas, multas e indemnizações, atribuindo competência às secções de competência genérica da instância local (que se desdobra em secções cíveis e secções criminais) para executar as decisões por si proferidas relativas a custas, multas ou indemnizações previstas na lei processual aplicável.
É certo que este preceito não se refere expressamente às coimas. No entanto, estas deverão ser, para estes efeitos, equiparadas à multa penal, conforme dispõe o artigo 89º n.º 2 do Decreto-lei n.º 433/82 de 27 de outubro.
Esclarece-se que este preceito não atribui qualquer competência para a execução das coimas, limitando-se a remeter o seu regime de execução, com as necessárias adaptações, para o regime previsto no Código de Processo Penal para a execução da multa. O que, na prática, significa, como bem refere António de Oliveira Mendes e José dos Santos Cabral, nas suas “Notas ao Regime Geral das Contraordenações e Coimas” (3ª Edição, Almedina, página 288), a remissão para os artigos 491º e 510º do CPP, onde, por sua vez, se faz remissão para o Regulamento das Custas Processuais.
Assim, aplicando-se também às coimas o regime das multas criminais, vamos novamente cair no artigo 129º – no n.º2, sendo da competência das secções criminais a execução de coimas que decorram de decisão proferida por esses tribunais (em sede de recurso de contraordenação); e no n.º1 – sendo da competência das secções de execução nos restantes casos (ou seja quando as mesmas decorram de uma decisão administrativa).
Sendo certo que a equiparação da coima às multas processuais, seguiria o regime do artigo 131º da Lei 63/2013 que apenas atribui competência às instâncias locais para executar multas de decisões por si proferidas, o que, mais uma vez, não é o caso.
Em reforço do elemento literal de interpretação que se vem defendendo está o elemento teleológico, na medida em que o espírito que enformou a reforma da organização judiciária foi precisamente o princípio da especialização, nenhuma razão se vislumbrando para que uma execução de natureza cível, ou seja, de natureza meramente patrimonial ocupe as secções de competência genérica, quando exista na comarca secções de execução. Tendo, ainda, sido esse o principal objetivo também da própria reforma executiva - libertar os tribunais que declaram o direito da atividade executiva.
A incompetência material consubstancia uma incompetência absoluta, nos termos do disposto no artigo 96º alínea a) do CPC, consistindo numa exceção dilatória e que implica a absolvição do R. da instância, nos termos do disposto nos artigos 577º alínea a) e 99º n.º 1 do CPC.

Em face do exposto, declaro a incompetência absoluta deste Tribunal para conhecer a presente execução e, em consequência, a absolvição do R. da instância.
Após trânsito, remeta os autos às secções de execução competentes e dê a correspondente baixa.
Notifique.
Faro, 13 de abril de 2015
(Processei e revi, FML) »

Cumpre agora apreciar e decidir o presente recurso.

II. Fundamentação

1. Objeto do recurso.
A principal questão suscitada no presente recurso, interposto pelo MP, é a de saber se, tal como decidiu o tribunal recorrido, a secção criminal não é competente para conhecer da execução por coima e custas em que arguido em processo de contraordenação foi condenado por decisão administrativa. No caso de o recurso proceder quanto àquela questão, impõe-se decidir ainda dos respetivos efeitos processuais.
1.2. Antes de passar a decidir o recurso, porém, deixamos em nota breve as razões pelas quais entendemos ser a presente decisão recorrível, uma vez que há decisões no sentido da irrecorribilidade em casos semelhantes ao presente, mas que diferem deste num aspeto essencial.
Na verdade, contrariamente ao que se verifica, entre outros, nos casos que foram objeto da decisão do Presidente do Tribunal da Relação de Guimarães de 09.03.2009 (NUIPC 1397/07.7TAOER-A.G1), acessível em www.dgsi.pt, e do acórdão do T.C 158/2003[1] (em ambos estava em causa a competência em razão do território), a questão de competência suscitada no despacho ora recorrido não envolve apenas tribunais com competência em matéria criminal, pois o despacho recorrido entende ser materialmente competente para a execução a Secção de execuções.
Assim, em nosso ver, não é aplicável ao caso sub judice o regime especialmente previsto nos artigos 34º a 36º para os conflitos de competência entre tribunais de 1ª instância (no que aqui importa) que se considerem competentes ou incompetentes para conhecer do mesmo crime imputado ao mesmo arguido, a decidir pelos presidentes das secções criminais, nos termos do art. 12º nº5 a) do CPP, para que remete expressamente o art. 35º do CPP.
No caso presente, a questão de competência respeita a tribunal de competência especializada em matéria penal e a tribunal com competência para processos de execução de natureza cível (Secção de execução da Instância local de Faro da comarca homónima), pelo que, se bem vemos a questão, conflito de competência que viesse a verificar-se entre ambos os tribunais seria resolvido pelo Presidente da Relação (cfr art. 76º da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto e art. 110º nº2 do NCPCivil ), de acordo com o regime comum previsto na secção do C.P.Civil dedicado aos conflitos de jurisdição e competência, determinando expressamente o seu artigo 114º, que o processamento previsto nos arts 111º a 113º é aplicável a quaisquer outros conflitos que devam ser resolvidos pelas relações ou pelo STJ, para além dos casos particulares aí enumerados.
Ora, o artigo 109º do NCPC que contém as noções mais amplas de conflito de jurisdição e conflito de competência, válidas para todo o ordenamento, estabelece no seu nº3 que não há conflito enquanto forem suscetíveis de recurso as decisões proferidas sobre competência, pelo que nas hipóteses, como a presente, em que não é aplicável o regime especial previsto nos artigos 34º a 36º, do CPP, não só é admissível recurso da decisão em que o tribunal se declara incompetente, como o conflito só pode suscitar-se perante decisões transitadas em julgado.
Passamos, pois, a apreciar o presente recurso.

2. Decidindo
2.1. Foi objeto de acórdãos recentes deste tribunal da Relação a decisão de questão de competência em razão da matéria em tudo idêntica à que é objeto do presente recurso, os quais têm decidido unanimemente que o tribunal competente para a execução por coima e custas aplicadas por decisão administrativa, é o tribunal de competência especializada em matéria penal e não as Secções de execução de Instância central ou local, contrariamente ao entendimento expresso nas decisões judiciais de 1ª Instância que deram origem a recursos interpostos pelo MP, tal como se verifica no caso presente.
Assim, limitamo-nos a enunciar as principais razões pelas quais sufragamos aquele mesmo entendimento, remetendo para uma análise e fundamentação mais ampla da questão para o Ac RE proferido nesta mesma data no processo com o NUIPC 1255/11.0TAFAR.E1, relator, Alberto Borges.
2.1. Em nosso ver, a competência das secções criminais da Instância local ou central para conhecer da execução por coima aplicada por entidade administrativa resulta essencialmente da remissão do art. 89º nº1 para o art. 61º, do Regime das Contraordenações (RGCO) aprovado pelo Dec-lei 433/82, com as alterações subsequentes, normas estas que não foram consideradas pelo despacho recorrido.
Na verdade, o art. 89º nº1 do RGCO determina que a execução da coima por falta de pagamento será promovida perante o tribunal competente nos termos do art. 61º do RGCO, ou seja, perante o tribunal materialmente competente para conhecer do recurso de impugnação judicial em cuja área territorial se tiver consumado a infração. Ora, mantendo no essencial a opção legislativa anterior, o art. 130º nº1 e) da atual Lei da Organização do Sistema Judiciário (LOSJ) aprovada pela Lei 62/2013 de 26 de agosto, atribui competência material-regra para “ Julgar os recursos das decisões das autoridades administrativas em processos de contraordenação” à secções criminais das instâncias locais, “salvo os recursos expressamente atribuídos a secções de competência especializada de instância central ou a tribunal de competência territorial alargada”, sem prejuízo, ainda, da competência atribuída às secções de pequena criminalidade pela al. b) do nº3 do mesmo art. 130º.
Sendo estes tribunais, com competência em matéria criminal, os competentes para julgar os recursos de contraordenações por disposição expressa e direta da LOSJ em conformidade, aliás, com a natureza da coima, que constitui sanção de direito público sancionatório, são eles igualmente competentes para a execução de coima por remissão expressa do art. 89º nº1 do RGCO, sem que possa entender-se que a competência atribuída aos tribunais pelas normas especiais ora citadas, foi derrogada pelo artigo 129º da LOSJ ao dispor genericamente que “Compete às secções de execução exercer, no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no Código de Processo Civil”.
Assim e tendo ainda em conta os demais argumentos corroboratórios expendidos, entre outros, no Ac RE supracitado, a competência para a execução da coima aplicada por decisão administrativa pertence às secções criminais que teriam competência para julgar os respetivos recursos de impugnação judicial, tal como entendimento expresso no recurso do MP.
Deste modo e considerando ainda que nos termos do artigo 38º da LOSJ a competência fixa-se no momento em que a ação se propõe, sendo irrelevantes as modificações de facto e de direito ocorridas posteriormente (com as ressalvas ali explicitadas), mantem-se a competência da secção criminal da instância local de Faro da comarca de Faro para prosseguir com a execução pelas custas aplicadas pela autoridade administrativa.
2.2. Por último, sempre se diga, no que respeita aos efeitos da declaração de incompetência material por parte de tribunal criminal, que esta incompetência, integrando a nulidade insanável de conhecimento oficioso prevista na al. e) do art. 119º do CPP, não teria como efeito a absolvição da instância mas sim a remessa do processo para outro tribunal por disposição expressa do art. 33º CPP, solução já seguida no CPP de 1929, que não obstante incluir a incompetência do juízo entre as exceções processuais como tal catalogadas no art. 138º do CPP, tratava-a como verdadeiro pressuposto processual negativo ao prever no art. 145º a remessa do processo para o tribunal competente como efeito da declaração de incompetência.

III. Dispositivo

Nesta conformidade, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em julgar procedente o presente recurso e, revogando o despacho recorrido, decidem em substituição que a secção criminal da instância local de Faro da comarca de Faro é competente para continuar a presente execução por coima e custas aplicada por autoridade administrativa em processo de contraordenações.
Sem tributação.

Évora, 19 de novembro de 2015

António João Latas

Carlos Jorge Berguete (com declaração de voto vencido)

Fernando Ribeiro Cardoso (Presidente da Secção Criminal)

Declaração
Votei vencido por entender que o recurso não é admissível e, como tal, deveria ser rejeitado, conforme fundamentação, para situação em tudo idêntica, que expendi na decisão sumária que proferi, em 03.11.2015, no proc. n.º 590/11.2TAFAR.E1, acessível in www.dgsi.pt, que aqui se dá por reproduzida.
Com efeito, pese embora a douta argumentação para a tese de recorribilidade que fez vencimento, não se descortina razão para não aplicação do regime dos arts. 34.º a 36.º do CPP, por via, em concreto, do art. 41.º, n.º 1, do Regime Geral das Contra-Ordenações, independentemente de que, a existir conflito, se tratasse, um deles, de tribunal com competência em matéria cível.
Por seu lado, a circunstância de que a redacção do n.º 1 desse art. 34.º aluda a mesmo crime imputado ao mesmo arguido não tem outro sentido senão o de delimitar a existência e o âmbito de qualquer conflito, sendo menção, inevitavelmente, reportada ao sistema penal, onde está inserida, mas susceptível da devida adaptação.
Ainda, saber qual a entidade competente para resolução do eventual conflito só se colocaria em momento próprio e não para implicitamente vir suportar a prévia recorribilidade.
Finalmente, o art. 109.º, n.º 3, do CPC, não haveria de ser trazido à colação se o regime penal (e o contra-ordenacional na situação) tem regras próprias em sede de incidente de competência.

Carlos Jorge Berguete

__________________________________________________
[1] Embora, como se refere na fundamentação deste acórdão do T.C., “Importa começar por salientar que não incumbe ao Tribunal Constitucional pronunciar-se sobre qual a mais correta interpretação do direito ordinário relativamente à questão da admissibilidade de recurso das decisões sobre a competência territorial dos tribunais criminais, mas tão-só apurar se a interpretação acolhida na decisão recorrida, no sentido da irrecorribilidade desse tipo de decisões, é, ou não, constitucionalmente conforme”.