Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
168/11.0TBVRS-B.E1
Relator: SÍLVIO SOUSA
Descritores: RECONVENÇÃO
PRAZO
REGIME APLICÁVEL
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Data do Acordão: 01/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: A nova lei, que “alonga” um prazo perentório, aplica-se “aos atos processuais futuros incluídos em ações pendentes”; o princípio da igualdade das partes, tem como pressuposto a instauração de uma ação - seja por via de reconvenção ou através de outro processo; como tal, optando o demandado/reconvinte pela “ação cruzada” (reconvenção) só a partir do conhecimento desta, por parte dos demandantes/reconvindos, é que entra em ação o princípio da igualdade das partes (“igualdade de armas”).
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Évora:

Relatório

Na presente ação declarativa, instaurada em 25 de fevereiro de 2011, na forma de processo sumário, em que são Autores/reconvindos AA[1] e mulher, BB, e Réus CC e DD, com pedido reconvencional deduzido apenas por este, admitiu o Tribunal recorrido, em sede de audiência prévia, realizado no dia 15 de fevereiro de 2017, o articulado de resposta à reconvenção, por, em seu critério, ter sido, tempestivamente, apresentado.


Inconformado com esta decisão, apelou o Réu CC, com as seguintes conclusões[2]:

- As normas reguladoras dos atos processuais da fase dos articulados não são aplicáveis às ações pendentes, na data da entrada em vigor do novo Código de Processo Civil;

- Só assim se verifica o respeito pelo princípio da igualdade das partes, atendendo a que, no caso concreto, o Réu dispôs do prazo de 20 dias para apresentar a sua contestação, com reconvenção;

- O princípio da aplicabilidade imediata do novo Código de Processo Civil aos processos pendentes, comtempla exceções;

- Uma delas diz respeito às normas relativas à determinação dos atos processuais da fase dos articulados;

- Violou o Tribunal recorrido o disposto nos artigos 5º., nºs 1, 2 e 3 da Lei nº 41/2013, de 26 de junho, e 786º. do Código de Processo Civil, na redação anterior o primeiro destes diplomas.



Contra-alegaram os recorridos, pugnando pela manutenção do decidido.


Face às conclusões antes referidas, o objeto do recurso circunscreve-se à apreciação da seguinte questão: saber se a resposta à reconvenção foi ou não, tempestivamente, apresentada.


Foram colhidos os vistos legais.


Fundamentação

A - Os factos


A.a -Despacho recorrido


“ (...) compulsados os autos verifica-se que os réus vieram arguir a intempestividade da resposta à reconvenção apresentada pelos autores, porquanto a mesma foi deduzida no prazo de 30 dias ao abrigo do novo regime do Código de Processo Civil, entendendo o réu que deveria ser no prazo de 20 dias, ao abrigo do regime anterior, por força do disposto no artigo 5º. nºs 2 e 3 da Lei nº 41/2013, de 26-06, beneficiando assim os autores do prazo de 30 dias previsto no artigo 585º. do Código de Processo Civil, pelo que considera intempestivo o referido articulado.


Cumpre decidir


Salvo o devido respeito por entendimento diverso afigura-se-nos não assistir razão ao réu, atento disposto no artigo 5º., nº 1 da citada lei nº 41/2013 de 26-06, porquanto entendemos que resulta do citado preceito que se aplica aos processos pendentes, os prazos em vigor no regime atualmente vigente.


Notifique.”


A.b - Data da resposta à reconvenção


30 de setembro de 2016


A.c - Data da notificação da contestação/reconvenção


20 de julho de 2016


B - O direito/doutrina


- “Tem-se entendido (…) que a nova lei processual deve aplicar-se imediatamente, não apenas às ações que venham a instaurar-se após a sua entrada em vigor, mas a todos os atos a realizar futuramente, mesmo que tais se integrem em ações pendentes, ou seja, em causas anteriormente postas em juízo” [3];


- “Ideia, complementar desta, de que a nova lei não regula os factos pretéritos (…), traduzir-se-á, no âmbito do direito processual, em que a validade e regularidade dos atos processuais anteriores continuarão a aferir-se lei antiga, na vigência da qual foram praticados” [4];


- “Ora, quanto às leis que alterem prazos anteriormente estabelecidos a boa doutrina tem distinguido as diferentes situações que podem ocorrer, em obediência à orientação geral sobre alteração de prazos estabelecida no Código Civil (artº. 297º). a) Se a nova lei alonga um prazo perentório, ou cominatório, aplicar-se-á imediatamente, não só aos prazos relativos aos atos futuros incluídos em ações pendentes, mas aos próprios prazos que já estejam a correr, contando-se obviamente o tempo já decorrido na vigência da lei antiga” [5];


- “Na reconvenção, há um pedido autónomo formulado pelo réu contra o autor. Há uma contraprestação (…) do réu, há um verdadeiro contra-ataque desferido pelo reconvinte contra o reconvindo. Passa a haver assim uma nova ação dentro do processo. O pedido reconvencional é autónomo, na medida em que transcende a simples improcedência da pretensão do autor e os corolários dela decorrentes” [6];


- O princípio da igualdade das partes, “(…) implica a paridade simétrica das suas posições perante o Tribunal”; pretende-se “(…) garantir a ambas as partes, ao longo do processo, a identidade de faculdades e meios de defesa e a sua sujeição a ónus ou cominações idênticas” [7];


- Em regra, a reforma de 2013 do Código de Processos Civil aplica-se aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor[8];


- Constitui exceção à aplicabilidade imediata da aludida reforma, nomeadamente, “as normas reguladoras dos atos processuais da fase dos articulados” [9];


- Excetuando os casos de justo impedimento ou da prática do ato processual, dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, c cuja validade depende do pagamento de uma multa, o decurso de prazo perentório extingue o direito de praticar o ato[10];


- Se o Réu tiver deduzido reconvenção, o prazo para o Autor deduzir toda a defesa quanto à matéria da reconvenção é, atualmente, de 30 dias a contar da notificação da contestação[11].


C - Aplicação do direito aos factos


A questão colocada a esta Relação coincide com a problemática da aplicação, no tempo, da lei processual referente a prazos judiciais perentórios.

Ora, a “boa doutrina“ que a nova lei, que “alonga” um prazo perentório, se aplica “aos atos processuais futuros incluídos em ações pendentes”, encontra-se consagrada no artigo 5º., nº 1 da Lei nº 41/2013, de 26 de junho, e não no nº 3 deste normativo, que contempla, apenas, a questão da validade e regularidade dos atos processuais da fase dos articulados.

Assim sendo, deduzindo os Autores/reconvindos BB, EE e FF a sua defesa, quanto à matéria da reconvenção, em 30 dias, fizeram-no, em prazo.

Este juízo não colide com o princípio da igualdade das partes, uma vez que este tem como pressuposto a instauração de uma ação - seja por via de reconvenção ou não. Efetivamente, coincidindo a reconvenção com uma ação cruzada, só a partir do conhecimento desta por parte dos aludidos demandantes/reconvindos é que entra em ação o princípio da “igualdade de armas”. Não antes.

Acresce que nada obstava que o demandado/reconvinte, ora recorrente, Alberto Dias, fizesse valer a sua pretensão num outro processo e, neste caso, não tinha um prazo de 20 dias para o fazer.

Não é, pois, de subscrever o pedido que formulou, através do presente recurso.

Em síntese[12]: a nova lei, que “alonga” um prazo perentório, aplica-se “aos atos processuais futuros incluídos em ações pendentes”; o princípio da igualdade das partes, tem como pressuposto a instauração de uma ação - seja por via de reconvenção ou através de outro processo; como tal, optando o demandado/reconvinte pela “ação cruzada” (reconvenção) só a partir do conhecimento desta, por parte dos demandantes/reconvindos, é que entra em ação o princípio da igualdade das partes (“igualdade de armas”).





Decisão


Pelo exposto, decidem os juízes desta Relação, julgando a apelação improcedente, manter o despacho recorrido.


Custas pelos recorrentes.


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Évora, 11 de janeiro de 2017


Sílvio José Teixeira de Sousa


Maria da Graça Araújo


Manuel António do Carmo Bargado

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[1] Na sequência do seu falecimento, a ação prosseguiu com os seus sucessores EE e mulher, FF.
[2] Conclusões elaboradas por esta Relação, a partir das longas (17) e prolixas “conclusões” do recorrente.
[3] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, 1985, pág. 47.
[4] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, 1985, pág. 49.
[5] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, 1985, pág. 64.
[6] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, 1985, pág. 323.
[7] José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, in Código de Processo Civil, vol. I, 2ªedição, pág. 10, e artigo 4º. do mesmo diploma.
[8] Artigo 5º., nº 1 da Lei nº 41/2013, de 26 de junho.
[9] Artigo 5º., nº 3 da Lei nº 41/2013, de 26 de junho.
[10] Artigo 139º., nº 3 do Código de Processo Civil.
[11] Artigo 585º. do Código de Processo Civil.
[12] Artigo 663º., nº 7 do Código de Processo Civil.