Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | FRANCISCO MATOS | ||
Descritores: | PERSI EXCEPÇÃO DILATÓRIA INOMINADA CONHECIMENTO OFICIOSO DA EXCEPÇÃO INDEFERIMENTO LIMINAR | ||
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Data do Acordão: | 10/09/2024 | ||
Votação: | RELATOR | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | I – As exceções dilatórias oficiosamente cognoscíveis para efeitos de indeferimento liminar do requerimento executivo (e também assim de determinar a rejeição da execução ao abrigo do disposto no artigo 734.º do CPC) são aquelas que se manifestem de forma evidente (sem necessidade de prova adicional) no requerimento executivo complementado pelo título executivo. II – Junto aos autos pela instituição bancária exequente documentos que constituem um princípio de prova de haver comunicado ao cliente mutuário a sua integração no PERSI e a extinção deste procedimento e de haver comunicado ao fiador a possibilidade de requerer a sua integração no referido procedimento, não há fundamento para indeferir liminarmente o requerimento executivo e, assim, para rejeitar a execução ao abrigo do disposto no artigo 734.º do CPC. (Sumário do Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | 146/24.0T8ELV.E1 Decisão Sumária (Artigo 656.º do CPC) I – Relatório 1. (…) STC, SA, com sede na Av. (…), n.º 110, 5.º, em Lisboa, instaurou contra (…), com domicílio na Rua (…), n.º 22, em Elvas e (…), com domicílio na Rua (…), n.º 16, em Elvas, este na qualidade de fiador, execução para pagamento de quantia de € 8.282,99, acrescida de juros. Deu à execução requerimento de injunção, fundado no incumprimento de contrato de mútuo bancário (crédito pessoal) no qual os executados figuram, respectivamente, como mutuário e fiador, com fórmula executória aposta em 27/12/2023. 2. Notificada, na sequência do despacho de 25-04-2024, para esclarecer sobre se havia integrado o executado mutuário no procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento (PERSI) e informado o executado fiador do mesmo procedimento e, em caso afirmativo, fazer prova das comunicações, a exequente juntou aos autos documentos referentes à integração do mutuário no PERSI e informação do fiador e da extinção do PERSI e informação do fiador. 3. Notificada, na sequência do despacho de 11-06-2024, para “comprovar nos autos o envio e recebimento das comunicações electrónicas juntas com o seu requerimento de 31-05-2024 (ou requerer o que reputar por conveniente relativamente à produção dessa prova), sob pena de, não o fazendo, se considerar que não foi dado cumprimento à obrigação de integração do executado mutuário em PERSI e de informação do executado fiador dessa possibilidade”, a exequente respondeu por forma a considerar, em resumo, o seguinte: as “comunicações, já juntas aos presentes autos, (foram) remetidas pelo Banco Cedente sem recurso a aviso de receção ou registo”; “a notificação dos Executados para o PERSI foi devidamente efetuada, pelo que cumpriu o Banco Cedente o legalmente estipulado para o referido procedimento”. 4. Seguiu-se despacho a considerar que a exequente não fez prova, nem do envio, nem da recepção das comunicações – “pese embora a exequente tenha demonstrado, por via dos documentos juntos, a elaboração, em suporte duradouro, da informação prevista nos artigos 14.º, n.º 1 e 17.º, n.º 2, alínea d), do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, a verdade é que não conseguiu demonstrar, como aliás foi convidada a fazer, que as referidas declarações foram comunicadas ao executado … (mutuário), como também não conseguiu demonstrar que comunicou (na acepção a que se aludiu supra) ao executado … (fiador), (…)” – e a decidir a final: “(…) julga-se verificada a excepção dilatória inominada de preterição da obrigação de comunicação ao executado … (cliente bancário) da sua integração em PERSI e respectiva extinção, e de preterição de comunicação ao executado … (fiador) de comunicação da possibilidade de pedir a sua integração em PERSI e condições do respectivo exercício e, em consequência, rejeita-se o requerimento executivo”. 5. A Exequente recorre da decisão, motiva o recurso e conclui: A. Julgou o Douto Tribunal a quo verificada a exceção dilatória inominada prevista no artigo 18.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro. B. Notificada para vir juntar aos autos prova das comunicações impostas no que concerne ao regime do PERSI, veio a aqui Recorrente, por requerimento datado de 31/05/2024, juntar as respetivas missivas endereçadas aos aqui Executados, respetivamente aplicáveis. C. Com efeito, no entendimento do Douto Tribunal a quo, as missivas enviadas ao Executado (…) referente à integração e extinção no âmbito do procedimento do PERSI, teriam que ser comunicadas em suporte duradouro, sendo do entendimento do Tribunal a quo que a junção de simples documentos não faz prova bastante do cumprimento desta obrigação. D. Conforme é definido pela alínea h) do artigo 3.º do Decreto Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, suporte duradouro “é qualquer instrumento que permita armazenar informações durante um período de tempo adequado aos fins a que as informações se destinam e que possibilite a reprodução integral e inalterada das informações armazenadas”. E. Sendo que, conforme resulta do artigo supra referido, o legislador não faz qualquer menção expressa ao envio por correio registado ou com aviso de receção. F. Aliás, como vem sendo entendimento da jurisprudência, se o legislador pretendesse que a prova fosse feita por aviso de receção tê-lo ia consagrado expressamente na lei. G. A este propósito leia-se o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 05/11/2018, proferido no âmbito do Processo n.º 3413/14.7TBVFR-A.P1, Relator: Augusto de Carvalho que “(…) ao exigir-se como forma de declaração uma comunicação em suporte duradouro, uma carta pode ser entendida como tal, pois, possibilita reproduzir de modo integral e inalterado o seu conteúdo”, continuando o acórdão supra referido que “Se a intenção do legislador fosse a de sujeitar as Partes do procedimento extrajudicial de regularização das situações de incumprimento a comunicar através de carta registada com aviso de receção, tê-la-ia consagrado expressamente”. H. Veja-se também o Acórdão desta Relação, datado de 21/05/2020, proferido no âmbito do Processo n.º 715/16.1T8ENT-B.E1, Relator: Tomé de Carvalho: “se a intenção do legislador fosse a de sujeitar as (…) partes do procedimento extrajudicial de regularização das situações de incumprimento a comunicar através de carta registada com aviso de recepção, tê-la-ia consagrado expressamente» […]. Não está assim obrigada a instituição bancária a utilizar correio registado com aviso de recepção para cumprir a obrigação legal sub judice”. I. E o Acórdão desta Relação de 10/09/2020, proferido no âmbito do Processo n.º 1834/17.2T8MMN-A.E1, Relator: Vítor Sequinho: “A lei não exige que as comunicações da integração do cliente bancário no PERSI e da extinção deste sejam efectuadas através de carta registada com aviso de recepção. Não obstante, a instituição de crédito tem o ónus da prova de que efectuou tais comunicações em suporte duradouro, entendido este, nos termos do artigo 3.º, alínea h), do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10, como qualquer instrumento que permita armazenar informações durante um período de tempo adequado aos fins a que as informações se destinam e que possibilite a reprodução integral e inalterada das informações armazenadas”. J. Ora, no caso vertente, e como se deixou supra exposto, foi a aqui Recorrente notificada que vir informar os autos de que forma foi dado cumprimento ao disposto no Decreto Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, juntando para esse efeito a carta de integração no PERSI remetida pelo Banco Cedente para a morada do Executado (…) constante no contrato, tendo procedido em conformidade com o requerido. K. Não tendo havido, da parte do Executado, qualquer tentativa de resolução do referido incumprimento, tendo o Banco Cedente procedido à extinção do PERSI, comunicando-o, no mesmo sentido, ao mutuário através de carta, também junta aos autos executivos pela ora Recorrente. L. Ademais, conforme refere o Acórdão desta Relação, de 14/10/2021, proferido no âmbito do Processo n.º 2915/18.0T8ENT.E1, Relator: Mário Coelho: “Apresentando a instituição bancária cópia das cartas simples enviadas aos executados no âmbito do PERSI, estas constituem princípio de prova do envio da comunicação, pelo que o juiz não pode oficiosamente concluir pela não recepção de tais cartas”. M. Não pode então a Recorrente concordar com o douto Tribunal a quo quando o mesmo julga verificada a exceção dilatória inominada do PERSI, uma vez que a aqui Recorrente fez prova da integração do Executado no âmbito do referido procedimento, bem como, da respetiva extinção, juntando, para isso, as competentes cartas. N. Entendeu, também, o douto Tribunal a quo julgar verificada a exceção dilatória inominada quanto ao Executado (…), alegando, para tanto, que, não foi o mesmo informado do atraso verificado e montantes em dívida, e que o mesmo nunca foi informado da faculdade para recorrer ao procedimento PERSI e condições do respetivo exercício. O. Conforme resulta do contrato que instruí o requerimento executivo, o referido Executado é, realmente, fiador. P. Quanto às disposições aplicáveis aos fiadores, resulta do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, designadamente dos n.ºs 1 e 2: “1 – Nos casos em que o contrato de crédito esteja garantido por fiança, a instituição de crédito deve informar o fiador, no prazo máximo de 15 dias após o vencimento da obrigação em mora, do atraso no cumprimento e dos montantes em dívida. 2 – A instituição de crédito que interpele o fiador para cumprir as obrigações decorrentes do contrato de crédito que se encontrem em mora está obrigada a iniciar o PERSI com esse fiador sempre que este o solicite através de comunicação em suporte duradouro, no prazo máximo de 10 dias após a referida interpelação, considerando-se, para todos os efeitos, que o PERSI se inicia na data em que a instituição de crédito recebe a comunicação anteriormente mencionada”. Q. Conforme supra exposto, o regime do PERSI é apenas aplicável aos fiadores quando este o requeira sendo que o mesmo terá que ser informado do vencimento das obrigações em mora, do atraso no cumprimento das mesmas e dos montantes que se encontram em dívida, o que, salvo o devido respeito pelo Tribunal a quo, aconteceu no caso vertente. R. Conclui-se, assim, que mal andou o douto Tribunal a quo ao ter proferido a decisão de rejeição do requerimento executivo, com a consequente extinção dos presentes autos, julgando verificada a exceção dilatória inominada de preterição da obrigação de comunicação ao Executado (…), na qualidade de mutuário, da sua integração em PERSI e respetiva extinção, e de preterição de comunicação ao executado (…), na qualidade de fiador, de comunicação da possibilidade de pedir a sua integração em PERSI e condições do respetivo exercício, o que, como aqui se demonstrou foi cumprido. Nestes termos e nos demais de Direito que V/Exa. mui doutamente suprirá, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, por provado e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, prosseguindo a ação os seus trâmites normais, fazendo-se a tão acostumada Justiça”. Não houve lugar a resposta. Atenta a simplicidade da questão a decidir, profere-se decisão sumária (artigo 656.º do Código de Processo Civil, doravante CPC). II. Objeto do recurso Considerando que o objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso (artigos 635.º, n.º 4 e 608.º, n.º 2 e 663.º, n.º 2, do CPC), que nos recursos se apreciam questões e não razões ou argumentos e que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido, importa decidir se não ocorre a excepção dilatória da preterição da obrigação de comunicação aos executados da integração (ou possibilidade de integração) e da extinção do PERSI. III. Fundamentação 1. Factos Relevam os factos constantes no relatório supra. 2. Direito A Exequente, na sequência de despacho convite para o efeito, juntou aos autos cópias de cartas por si elaboradas referentes à integração do mutuário no PERSI e informação do fiador e da extinção do PERSI e informação do fiador. Considerada insuficiente a prova junta, houve lugar a outra notificação, na sequência de novo despacho convite, com vista a permitir à Exequente “comprovar (…) o envio e recebimento das comunicações electrónicas juntas (…) ou requerer o que reputar por conveniente relativamente à produção dessa prova”, à qual a Exequente respondeu por forma a considerar que as comunicações juntas “sem recurso a aviso de receção ou registo” são suficientes para se considerar “que foi dado cumprimento à obrigação de integração do executado mutuário em PERSI e de informação do executado fiador dessa possibilidade”. Coloca-se a questão de saber se antes da citação dos executados (por inexistência de penhora de bens), há lugar à rejeição do requerimento executivo por não provar o exequente o envio e o recebimento das comunicações que demonstra haver elaborado com vista ao cumprimento da obrigação de integração do executado mutuário no PERSI e da extinção deste procedimento, e da informação devida ao executado fiador. 2.1. Do conhecimento de excepções dilatórias na fase liminar do processo Estabelece o artigo 734.º do CPC: “1 - O juiz pode conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo. 2 - Rejeitada a execução ou não sendo o vício suprido ou a falta corrigida, a execução extingue-se, no todo ou em parte”. A extinção da execução em vista da norma comporta um requisito temporal – só pode ocorrer até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados – e um requisito substancial – só pode ocorrer pelos mesmos motivos que poderiam ter determinado o indeferimento liminar do requerimento executivo. Sobre os motivos ou causas de indeferimento o artigo 726.º do CPC prevê o seguinte, na parte que releva: “(…) 2 - O juiz indefere liminarmente o requerimento executivo quando: b) Ocorram exceções dilatórias, não supríveis, de conhecimento oficioso; (…) 4 - Fora dos casos previstos no n.º 2, o juiz convida o exequente a suprir as irregularidades do requerimento executivo, bem como a sanar a falta de pressupostos, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do artigo 6.º. 5 - Não sendo o vício suprido ou a falta corrigida dentro do prazo marcado, é indeferido o requerimento executivo”. As excepções dilatórios que geram o indeferimento liminar (imediato ou por efeito de não suprimento do vício no prazo marcado), devem decorrer do próprio requerimento inicial da execução e dos documentos que o instruem, ou seja, devem manifestar-se ou evidenciar-se em função destes. “Embora a lei não exija expressamente que seja manifesta a verificação de tais exceções, cremos também que deverão ser excluídas do indeferimento liminar as situações em que exista alguma polémica acerca da sua configuração.”[1] Em apoio desta ideia, não será despropositado (artigo 551.º do CPC), recorrer à figura do indeferimento liminar em processo de declaração com fundamento na verificação de excepções dilatórias. A petição é indeferida quando ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente (artigo 590.º, n.º 1, do CPC). Já era assim no Código de Processo Civil de 1939, segundo o qual a petição deveria ser indeferida in limine quando “for manifesta a incompetência absoluta do tribunal, a falta de personalidade ou de capacidade judiciária do autor ou do réu, ou a sua ilegitimidade” [artigo 481.º, 2º]. Alberto dos Reis anotava então: “Chamamos a atenção para o adjectivo «manifesta» que domina toda a matéria do n.º 2º do artigo 481.º. O uso do poder-dever aí atribuído ao juiz está subordinado à condição de ser manifesta a falta de qualquer dos pressupostos processuais de que aí se fala e que são condições para o mérito da causa, Só quando for evidente ou transparente (…) é que o juiz deve (…) indeferir a petição in limine”. Explicação com actualidade quanto ao conhecimento oficioso das excepções dilatórias insupríveis [quanto às supríveis deve o juiz providenciar pelo seu suprimento – artigo 590.º, n.º 2, alínea a), do CPC] que determinam o indeferimento liminar da petição inicial; o juiz deve conhecer delas quando ocorram de forma evidente, isto é, quando resultarem manifestas da leitura da petição e dos documentos que a instruem. O que se compreende; seria impraticável o juiz oficiosamente, face à petição inicial, v.g. convidar o autor a fazer “prova de vida” do réu, afim de verificar se este tem personalidade judiciária ou convidá-lo a fazer prova sobre se ele autor ou o réu se mostram capazes de, por si só, governarem a sua pessoa e bens para averiguar da sua, respectiva, capacidade e, por aí fora; note-se, aliás, que “o conhecimento oficioso da exceção dilatória não se confunde com o conhecimento oficioso dos factos em que ela se baseia, o qual só pode ter lugar nos termos dos artigos 5.º-2-c, 2ª parte e 412.º-1”[2], o que significa que o conhecimento, ainda que oficioso, das excepções na fase liminar do processo, como em qualquer outra, está condicionado à existência dos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do recurso a factos notórios e a factos que o tribunal tem conhecimento por virtude das suas funções; se a petição não der a conhecer os factos necessários e suficientes para o juiz formar uma opinião quanto à ocorrência ou verificação da excepção dilatória não conhece dela ainda que oficiosamente o possa fazer; a iniciativa do conhecimento não se confunde com a oportunidade ou possibilidade do conhecimento. O que tudo nos encaminha para concluir que exceções dilatórias oficiosamente cognoscíveis susceptíveis de determinar o indeferimento liminar do requerimento executivo (e também assim de determinar a rejeição da execução ao abrigo do disposto no artigo 734.º do CPC) são aquelas que se manifestem de forma evidente (sem necessidade de prova adicional) no requerimento executivo e no título executivo que, necessariamente, o complementa. 2.2. Se a excepção dilatória inominada da preterição da obrigação das comunicações é manifesta face ao requerimento executivo O DL n.º 272/2012, de 25/10, instituiu o procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento (PERSI), aplicável a clientes bancários (consumidores) que estejam em mora ou em incumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito e, entre outras imposições, obriga as instituições de crédito a informar o cliente bancário através de comunicação em suporte duradouro, da integração do cliente no PERSI e da extinção do procedimento [artigo 14.º, n.º 4 e 17.º, n.º 3]. O mesmo diploma define o que deve entender-se por «suporte duradouro»: qualquer instrumento que permita armazenar informações durante um período de tempo adequado aos fins a que as informações se destinam e que possibilite a reprodução integral e inalterada das informações armazenadas [artigo 3.º, alínea h)]. Como a lei exige a comunicação da integração do cliente no PERSI e a comunicação da extinção do procedimento, mas nada estabelece quanto à forma como essa comunicação deverá ocorrer (não exige o registo do suporte da comunicação, como não exige que a comunicação deva ocorrer por carta registada com aviso de recepção) e as instituições bancárias, por regra (e também no caso a exequente), juntam aos autos cartas, unilateralmente elaboradas, como documentos de suporte duradouro das referidas comunicações, a jurisprudência das Relações tem oscilado no valor a atribuir a tais documentos, enquanto meio probatório das exigidas comunicações; destas divergências dão conta a decisão recorrida e as alegações de recurso. O Supremo Tribunal de Justiça dirimiu tais divergências em aresto com o seguinte sumário: “I – A comunicação de integração no PERSI, bem como a de extinção do mesmo, constituem condição de admissibilidade da acção (declarativa ou executiva), consubstanciando a sua falta uma excepção dilatória insuprível, de conhecimento oficioso, que determina a extinção da instância (artigo 576.º, n.º 2, do CPC). II – Tais comunicações têm de lhe ser feitas em suporte duradouro, ou seja, a sua representação através de um instrumento que possibilite a sua reprodução integral e inalterada, e, portanto, reconduzível à noção de documento constante do artigo 362.º do CC. III – Tratam-se de declarações receptícias, constituindo ónus da exequente demonstrar a sua existência, o seu envio e a respectiva recepção pela executada. IV – A simples junção aos autos das cartas de comunicação e a alegação de que foram enviadas à executada, não constituem, por si só, prova do envio e recepção das mesmas pela executada. Todavia tal apresentação pode ser considerada como princípio de prova do envio a ser coadjuvada com recurso a outros meios de prova.”[3] As cartas de comunicação juntas aos autos pela exequente, com a alegação de haver notificado os executados em conformidade com o que delas consta constitui, à luz do mencionado aresto, um princípio de prova do envio das comunicações. Princípio de prova que obsta a que a excepção da preterição da obrigação das comunicações (da integração e da extinção do PERSI ao mutuário e da possibilidade de integração no PERSI do fiador), seja manifesta à face do título e, por efeito dela, obsta à rejeição da execução. Estamos, pois, de acordo com o que, a propósito, se escreveu no Acórdão desta de Relação de 14-10-2021, “(…) o juiz não pode oficiosamente concluir pela não recepção. Caberia aos executados, através dos meios processuais ao seu alcance, efectuar essa alegação (…).”[4] Em conclusão: i) o requerimento executivo é liminarmente indeferido quando, em face dele e sem a necessidade de outras provas, ocorram excepções dilatórias, não supríveis, de conhecimento oficioso; ii) se a apreciação da excepção dilatória exigir a produção de outras provas, o estado do processo não permite o seu conhecimento na fase liminar do processo; iii) juntos aos autos pela instituição bancária exequente documentos que constituem um principio de prova de haver comunicado ao cliente mutuário a sua integração no PERSI, a extinção deste procedimento e de haver comunicado ao fiador a possibilidade de requerer a sua integração no referido procedimento, não há fundamento para indeferir liminarmente o requerimento executivo e, assim, para rejeitar a execução ao abrigo do disposto no artigo 734.º do CPC. Havendo sido outro o entendimento da decisão recorrida, resta revogá-la. 3. Custas As custas correm por conta dos recorridos na vertente de custas de parte e procuradoria (artigo 527.º, nºs 1 e 2, do CPC). Sumário: (…) IV. Dispositivo: Decide-se, pelo exposto, na procedência do recurso, em revogar a decisão recorrida e em determinar o prosseguimento dos autos. Custas pelos Recorridos. Évora, 9 de Outubro de 2024 Francisco Matos __________________________________________________ [1] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Pires de Sousa, Código de Processo Civil anotado, vil. 2º, 2ª ed. pág. 75. [2] Lebre de Freitas, Isabel Alexandre, CPC anotado, vol. 2º, 4ª ed. pág. 585. [3] Acórdão do STJ, 13-04-2021 (Proc. 1311/19.7T8ENT-B.E1.S1), disponível em www.dgsi.pt [4] Ac. RE de 14-10-2021 (Proc. 2915/18.0T8ENT.E1), www.dgsi.pt |