Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
205/23.6T8ELV.E1
Relator: MARIA ADELAIDE DOMINGOS
Descritores: ARRESTO PREVENTIVO
TRATO SUCESSIVO
BEM COMUM
REGISTO PROVISÓRIO
Data do Acordão: 02/20/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
1. O arresto preventivo previsto no artigo 228.º do Código de Processo Penal visa obter uma garantia patrimonial que assegure o efetivo cumprimento de determinadas obrigações patrimoniais que venham a constar da sentença penal condenatória.
2. O seu decretamento obedece a condicionantes processuais penais prévias, aplicando-se subsidiariamente as normas processuais civis que se harmonizem com o processo penal.
3. O registo do seu decretamento segue as regras e os princípios previstos no Código de Registo Predial.
4. Um desses princípios é o do trato sucessivo previsto no artigo 34.º, n.º 4, do referido Código, segundo o qual, entre os factos inscritos no registo, tem de existir um nexo ininterrupto entre os vários sujeitos que aprecem investidos de poderes sobre a coisa, pelo que, em regra, o direito do adquirente deve apoiar-se no do transmitente e o encargo só pode ser constituído por, ou contra, o respetivo titular.
5. A violação do princípio do trato sucessivo determina a nulidade do registo.
6. Decretado o arresto preventivo de um bem comum do casal (imóvel), que se encontra registado em nome dos ex-cônjuges que o adquiriram durante o casamento celebrado sob o regime de comunhão de adquiridos (sem que ainda tenha sido feita a partilha ou requerida a separação da meação), o seu registo deve ser lavrado como provisório por dúvidas, se apenas um dos ex-cônjuges for arguido no processo crime onde foi decretado.
7. As dúvidas podem ser removidas por via do mecanismo previsto no artigo 740.º do Código de Processo Civil.
(Sumário elaborado pela relatora)
Decisão Texto Integral:
Processo n.º 205/23.6T8ELV.E1 (Apelação)
Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca ..., ... - JL Cível - Juiz ...
Apelante: Ministério Público
Apelado: Conservatória do Registo Predial ..., Instituto dos Registos e Notariado - I.P.


Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Évora

I – RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO, em 30-11-2022, ao abrigo do artigo 140.º, n.º 1, do Código do Registo Predial (C.R. Predial) veio impugnar judicialmente a decisão da Sr.ª Conservadora do Registo Predial de ..., proferida em 10-11-2022, que lavrou como provisório por natureza e por dúvidas, o registo do arresto preventivo do prédio urbano composto de casa de rés-do-chão, 1.º andar e logradouro, sito na ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...37, decretado por decisão proferida em 01-10-2022, já transitada em julgado, no âmbito do procedimento cautelar que correu os seus termos por apenso (B) ao inquérito n.º 309/20.....
A Sr.ª Conservadora do Registo Predial de ... proferiu despacho de sustentação, dando cumprimento ao disposto no artigo 142.º-A, n.º 3, do C.R.Predial.
O MINISTÉRIO PÚBLICO junto do Juízo Local Cível ... - J..., aderiu integralmente aos fundamentos da impugnação judicial.
Em 21-05-2023, foi proferida sentença, constando da sua parte dispositiva, o seguinte:
«Pelo exposto, e ao abrigo das disposições legais citadas supra, concede-se provimento parcial à impugnação judicial deduzida pelo Ministério Público e, em consequência, revoga-se parcialmente a decisão proferida em 10-11-2022 pela Sr.ª Conservadora do Registo Predial de ... (referente à Ap. ...45 de 2022/10/04), substituindo-a por decisão que:
i) Rectifique a inscrição do registo requerido através da Ap. ...45 de 2022/10/04 de procedimento cautelar de arresto para arresto preventivo (decretado por decisão judicial proferida em 01-10-2022 no âmbito do procedimento do cautelar que correu os seus termos no Juízo Local Criminal ... sob processo n.º 309/20....), em conformidade com as disposições contidas nos artigos 2.º, n.º 1, al. o), 3.º, n.º 1, al. e), 8.º-B, n.º 3, al. a), e 8.º-C. n.º 3, todos do C.R.Pred..
ii) Considere removidas quaisquer dúvidas quanto provisoriedade do referido registo por natureza (por não estar em causa o registo de facto previsto no artigo 92.º, n.º 1, al. a), do C.R.Pred.),
Mantendo-se, no mais, a decisão impugnada, nomeadamente no que respeita as dúvidas opostas ao registo por violação do princípio do trato sucessivo.»

O MINISTÉRIO PÚBLICO interpôs recurso de apelação desta sentença, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:
«1- Na decisão recorrida decidiu-se pela improcedência da impugnação judicial deduzida pelo Ministério Público do despacho exarado pela Conservadora do Registo Predial no dia 10 de novembro de 2022 (apresentação n.º ...45 de 04.10.2022) e que lavrou o registo de arresto preventivo (art.º 228º do Código de Processo Penal) determinado judicialmente no processo NUIPC 309/20...., como sendo provisório por dúvidas, ao abrigo do disposto no art.º 34º, n.º 4 do Código de Registo Predial.
2- Considerou-se que a decisão da Conservadora em obediência ao princípio de legalidade (art.º 68º do Código de Registo Predial) não atenta contra a decisão judicial que determinou o arresto e respetivo registo, nem que a condicione dado que oportunamente comunicou a forma pela qual as dúvidas opostas ao registo poderiam ser removidas, concretamente, que o Ministério Público, como interessado no registo, providenciasse pela remoção, requerendo ao Tribunal que decretou o arresto preventivo a citação da cônjuge do arguido, de nome AA (também titular inscrita no registo do imóvel arrestado preventivamente) para que, nos termos do disposto no art.º 740º, n.º 1 , «ex vi» art.º 391º, n.º 2 do Código de Processo Civil, requeresse a separação de bens ou comprovasse a pendência de ação com esse objetivo.
3- Considerou ainda que a decisão da Conservadora não coloca entraves e condicionamentos ao registo do arresto preventivo ou que afronte a estabilidade registal e respetivo título de suporte, entravando a ação penal do Estado, levando à inconsequência de eventual execução com vista a cobrar o valor em dívida em que o arguido venha a ser condenado a título de perda de vantagens do facto ilícito, caducando entretanto o registo e possibilitando a sua venda por este, uma vez que as dúvidas opostas podem ser removidas naqueles termos e que ainda que se esteja longe da fase executiva, a circunstância de estar em causa arresto preventivo de um bem comprovadamente comum, enquanto apreensão judicial que é, nunca dispensaria o cumprimento do disposto no art.º 740, n.º 1 do Código de Processo Civil.
4- O Tribunal “a quo” ao decidir nestes termos fez uma incorreta interpretação do disposto nos artigos 34º do Código do Registo Predial, 228º do Código de Processo Penal, 391º e 740º, ambos do Código de Processo Civil.
5- E assim é porque o arresto preventivo é uma medida cautelar inserida num processo penal, não coincidindo e apresentando características diferenciadoras do arresto da lei civil (art.º 619 e ss. Do Código Civil), tendo por objetivo que a futura condenação do arguido na perda da vantagem ou seu pagamento seja assegurada, razão pela qual se lhe aplica aquele regime no decretamento mas mantém a sua natureza e desideratos intocados, assumindo um poder reforçado enquanto emanação da ação penal do Estado, do Ius Imperii, distinguindo-se também por isso do regime da insolvência, motivo pela qual também não se lhe aplicam as regras da penhora sobretudo numa fase de inquérito em que ainda não existe uma decisão definitiva de condenação na perda da vantagem ilícita cuja garantia visa garantir.
6- Esta sua natureza, inconfundível com o processo civil, visa que o arguido não possa retirar da ação ilícita quaisquer proventos e bem assim recolocar ordem patrimonial no estado anterior ao desvio, suscitando especial ponderação na aplicação do regime civilista ao arresto preventivo.
7- A imposição preconizada pela M.ª Juiz de se forçar a citação do cônjuge não arguido, cotitular do registo do imóvel, para requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa de ação de separação (art.º 740º do Código de Processo Civil), seguindo o entendimento da Conservadora do Registo Predial, como forma de remover as dúvidas do registo do arresto preventivo, é desacertada porque decalca e aplica de forma absoluta e sem adaptada conformação as regras da fase executiva quando ainda nem sequer existe uma condenação na perda das vantagens do facto ilícito, estando num momento meramente cautelar em que ainda não se coloca a retirada efetiva e forçada de bens da esfera patrimonial do titular.
8- Razão porque se entende que no caso do arresto preventivo não haverá de imediato e nesta fase processual, lugar à referida citação do art.º 740º, n.º 1 do Código de Processo Civil, quer porque tal não está legalmente previsto mas também porque não se afere como possa funcionar o mecanismo da separação de bens comum do casal nesta fase de inquérito dado que o arresto é um mero procedimento cautelar, com natureza preventiva e conservatória, esgotando-se os seus efeitos na reserva de preferência na disponibilidade dos bens sobre que incide, mantendo intocada a propriedade de raiz, com a garantia de que qualquer alteração desta necessariamente envolve a intervenção de todos os titulares inscritos no registo.
9- Porque o arresto não se confunde com a penhora, somente perante um incumprimento da decisão condenatória na perda da vantagem do facto ilícito, seguindo-se a conversão do arresto em penhora, entrando na fase executiva, nos termos do disposto no art.º 762º do Código de Processo Civil, é que o cônjuge (titular registal) não arguido deverá ser citado para então, se quiser, requerer a separação de bens, sem prejuízo de outros meios processuais de defesa e oposição, assim se assegurando a salvaguarda do seu direito patrimonial, razão porque o art.º 740º, n.º 1 do Código de Processo Civil não se pode aplicar sem mais e diretamente ao arresto preventivo antes de essa fase executiva.
10- Ao decidir como decidiu, a Mª. Juiz fez uma aplicação cega e plena do regime civilista do arresto civil e da penhora ao arresto preventivo, sem considerar as especificas particularidades que giram em torno desta medida de garantia.
11- Não existe paralelo entre o arresto preventivo e a apreensão de bens na insolvência porque para além de servirem propósitos vincadamente distintos, podendo até conflituar, o arresto preventivo é uma emanação do Estado na sua veste de garante da ação penal e se sobrepõe à apreensão de bens para a massa insolvente.
12- Razões pelas quais se entende que a decisão e os fundamentos invocados pela M.ª Juiz violam o disposto nos artigos 34º do Código do Registo predial, 228º do Código de Processo Penal, 391º e 740º, ambos do Código de Processo Civil, significando uma errada interpretação e aplicação do direito ao caso, e não devem proceder.
13- Pelo exposto, considera-se que a decisão e os fundamentos invocados pela M.ª Juiz violam o disposto nos artigos 34º do Código do Registo Predial, 228º do Código de Processo Penal, 391º e 740º, ambos do Código de Processo Civil, significando uma errada interpretação e aplicação do direito ao caso, e não devem proceder.
14- A M.ª Juiz entendeu ainda que a qualificação do registo do arresto preventivo como provisório por dúvidas não coloca em causa a ação penal do Estado e que o Ius Imperii não pode «subjugar» o princípio registal do trato sucessivo que obedece a normas com a mesma força do Código de Processo Penal, com o que discordamos.
15- Na verdade, o arresto preventivo assume-se como uma emanação de atuação do Estado na sua veste impositiva, num paradigma diferente do arresto civil, refletindo-se por exemplo na norma constante do n.º 4 do art.º 228º do Código de Processo Penal a qual determina que mesmo existindo litígio civil sobre a propriedade do bem arrestado preventivamente se mantém o mesmo decretado.
16- A introdução do registo do aresto preventivo (n.º 6 do art.º 228º do Código de Processo Penal) teve por base a conformação do direito processual penal e registal interno a normas de direito europeu, transpondo a Diretiva 2014/42/EU do Parlamento Europeu e do Conselho de 03 de abril de 2014, sobre o congelamento e a perda dos instrumentos e produtos do crime na União Europeia e sua garantia, como aliás, já decorria da Convenção das Nações Unidas de 2000 relativa à criminalidade transnacional organizada (Convenção de Palermo) em articulação com a Convenção das Nações Unidas de 2003 contra a corrupção (Convenção de Mérida) e Convenção das Nações Unidas de 1988 relativa ao tráfico de estupefacientes e substâncias Psicotrópicas (Convenção de Viena) em articulação com a Convenção do Conselho da Europa de 2005 relativa ao branqueamento, deteção, apreensão e perda dos produtos do crime e ao financiamento do terrorismo (Convenção de Varsóvia), constituindo uma preocupação constante da política criminal dos Estados a salvaguarda da recuperação das vantagens e bens produto do crime visando assegurar que “o crime não compensa”.
17- Daí que se considere que para além de infirmar os desideratos da figura e pôr em causa o poder do Estado enquanto titular da ação penal, na sua integralidade, a decisão da M.ª Juiz impondo desde já a partilha do bem arrestado preventivamente, condiciona a eficácia da medida e vai contra as indicações, normativos e tendências do direito internacional e europeu, fazendo perigar a garantia de execução de eventual condenação na perda de vantagens decorrente da atividade criminosa, conduzindo à frustração dos interesses que aquela medida visa garantir.
18- A interpretação e aplicação do direito ao caso concreto deve ser ajustada num sentido mais atualista e conforme às melhores orientações e práticas internacionais a que aliás o Estado português está juridicamente vinculado, reconhecendo a proeminência desta figura e dando plena aplicação à mesma, desarticulando do regime civilista, obviamente limitador e desadequado.
19- Sentido decisório esse que deve dar preponderância e a relevância aos interesses de ordem pública subjacentes ao confisco das vantagens e da sua garantia de liquidação, sobrepondo-os aos interesses puramente civilistas que possam advir da titularidade total (formal) do registo ou de uma reserva de propriedade em face da real posse e disponibilidade.
20- Nomeadamente quando se trata de fazer reconhecer eficácia registal face a posteriores onerações do mesmo bem, impondo que o arresto incida exclusivamente sobre bens cuja propriedade e integral seja do arguido, algo que não está na lei processual penal nem se alcança impor-se de forma absoluta ao abrigo do invocado princípio do trato sucessivo.
21- Dir-se-á que estamos perante um conflito entre um hipotético interesse particular e o interesse do Estado refletido numa eventual e futura decisão judicial de confisco das vantagens do facto ilícito, mas onde o Estado assume uma veste impositiva, o Ius Imperii em exercício de autoridade veiculado através do poder judicial, sobrepondo-se à esfera particular, para garantir o pagamento do valor em que o arguido seja condenado a título de perda de vantagens do ato criminoso, prevalecendo um critério de public policy doctrine, situação secundarizada erradamente pela M.ª Juiz na sua decisão em recurso e que a decisão da Conservadora já atentava.
22- Entendeu ainda a M.ª Juiz que a decisão da Conservadora do Registo salvaguardou a plena eficácia do princípio registal do trato sucessivo porquanto devendo o registo do arresto preventivo seguir as normas da legislação registal, a ele se deve submeter igualmente, sob pena de se gerar um registo nulo.
23- Entende-se que seguiu errado entendimento, na esteira da Conservadora do Registo dado que constitui uma desajustada aplicação e interpretação do direito registal ao caso, concretamente invocando genericamente importante princípio registal para colocar condicionalismos à plena eficácia de uma medida de garantia patrimonial processual penal.
24- No limite, o entendimento da M.ª Juiz leva a considerar que o registo de uma garantia patrimonial (arresto preventivo) sobre um bem contraria, por natureza, o princípio registal do trato sucessivo exceto se aquele bem pertencer integralmente a arguido no processo penal quando essa condição não existe na lei e o registo daquela medida de garantia patrimonial não tem quaisquer efeitos constitutivos de direito de propriedade sobre o bem (a garantia pode até nunca vir a ser acionada).
25- O registo do arresto preventivo não tem a almejada implicação no princípio do trato sucessivo uma vez que o arresto preventivo é um ónus que recai sobre o próprio bem independente da sua titularidade, salvaguardando a sua transmissibilidade e subsequentes onerações, ficando a sua operacionalidade dependente de um conjunto de circunstâncias processuais penais sendo que uma vez na fase executiva o cotitular não arguido poderá operar a separação ou deduzir defesa, não se nos afigurando que a linearidade registal fique em causa à luz do principio do trato sucessivo.
26- O eventual acionamento desta garantia está dependente de uma multiplicidade de fatores que escapam por ora a um juízo de certeza que justifique assegurar a inexistência de qualquer corte na linha registal, havendo previamente que se proceder, numa fase executiva, à conversão de tal medida de garantia numa penhora, sempre garantindo a intervenção de todos os titulares do bem arrestado.
27- Em síntese, estando garantido que qualquer agressão por acionamento de tal medida envolve a intervenção de todos os titulares inscritos no bem arrestado, não se vislumbra em que termos poderá considerar-se estar em causa a ofensa àquele princípio do trato sucessivo, como a M.ª Juiz entendeu.
28- Na verdade, a continuidade das inscrições está garantida uma vez que tal bem não poderá ser alienado, com reflexo na sua situação registal, sem a intervenção de todos os titulares inscritos, ou seja, nunca qualquer registo de efetiva transmissão subsequente do bem será possível sem a intervenção de todos os titulares inscritos e concretamente sem ser citado (no momento preciso) o cônjuge do ora arguido BB, assim se assegurando o ingresso e a continuidade registal.
29- O que significa que quaisquer subsequentes inscrições naquele registo se apoiarão e assentam, de forma ininterrupta, no histórico de titularidades, assegurando-se que nenhum registo ocorrerá estando desligado de tal corrente sucessiva de inscrições, encadeadas logicamente.
30- Não se vê por isso onde possa ocorrer qualquer violação do princípio do trato sucessivo com a inscrição registal do arresto preventivo daquele imóvel.
31- No reverso, considerar que assim não seja, redundará numa solução artificial e injustificada, impondo uma constituição como arguido de alguém em relação à qual inexistem fundamentos para tal (no caso o cônjuge cotitular do bem não suspeito da prática de crimes, o que é inadmissível) ou a imposição de uma citação para operar uma obrigatória separação de bens numa fase não executiva (o que se revela uma desmesurada intervenção na esfera privada), sob pena de nunca se poder registar definitivamente tal arresto preventivo determinado judicialmente por despacho transitado em julgado.
32- Por tal motivo também se considera que o registo definitivo do arresto preventivo em causa não viola qualquer norma e concretamente o princípio registal do trato sucessivo, considerando-se por isso que a sentença ora proferida e impugnada fez errada interpretação do art.º 34 do Código do Registo Predial, devendo ser substituída por outra que determine a retificação do registo requerido, removendo-se quaisquer dúvidas, tornando-se definitivo.»

Na foi apresentada resposta ao recurso.

II- FUNDAMENTAÇÃO
A- Objeto do Recurso
Considerando as conclusões das alegações, as quais delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC), não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC), no caso, impõe-se apreciar se o registo do arresto preventivo deve ser lavrado como definitivo ou, como foi, provisório por dúvidas.

B- De Facto
A 1.ª instância proferiu a seguinte decisão de facto:
« Dos elementos documentais disponíveis nos autos e com relevância para a decisão a proferir resultam provados os seguintes factos:
1. Na Conservatória do Registo Predial ... encontra-se descrito, sob o n.º ...37, da ..., o prédio urbano composto de casa de rés-do-chão, 1.º andar e logradouro sito na Rua ..., inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo ...16, da aludida freguesia, encontrando-se registada, pela Ap. ...60 de 2019/07/01, a aquisição, por compra, a favor de BB e AA, casados entre si no regime da comunhão de adquiridos.
2. Por apenso ao inquérito que corre os seus termos na ... Secção do DIAP ... sob o NUIPC 309/20...., onde é investigada a prática dos crimes de burla informática qualificada, p. e p. pelo artigo 221.º, n.os 1 e 5, al. b), por referência ao artigo 202.º, al. b), todos do Código Penal (C.P.), de falsidade informática, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 109/2009, de 15 de Setembro, e de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, al. c), do C.P.C., Ministério Público instaurou contra BB, ali constituído arguido, procedimento cautelar de arresto preventivo, o qual veio a correr termos no Juízo Local Criminal ... sob processo n.º 309/20.....
3. No âmbito do procedimento cautelar referido em 2., foi decretado, por decisão judicial proferida em 01-10-2022, o arresto do prédio melhor identificado em 1. e determinado o seu registo, em conformidade com o disposto no artigo 228.º, n.º 6, do Código d Processo Penal (C.P.P.).
4. Em 04-10-2022, foi lavrada certidão judicial da referida decisão e apresentado a registo (Ap. ...54 de 2022/10/04) a providência de arresto ali decretado.
5. Da certidão judicial referida em 3., consta o seguinte:
«(…) CC, Escrivão Adjunto, do tribunal acima identificado:
CERTIFICA que nos autos supra identificados foram arrestados preventivamente o(s) imóvel(eis) adiante descrito(s) pertencente(s) ao(s)
Bens arrolados:
O arresto do prédio urbano para habitação situado na ..., concelho ..., correspondente ao artigo matricial n.º ...13 (...), correspondente à matriz n.º ...16, composto por casa de rés-do-chão, 1º andar e logradouro (desanexado do n.º ...98/...13), sito na Rua ..., em ....
cujo registo se solicita.
MAIS CERTIFICA NARRATIVAMENTE: que o valor do processo é de €: 324.096,96;
que é/são requerente(s)
Autor: Ministério Público,
Arguido: BB, NIF: ...41, Identificação Civil: ...08 NISS: ...03, filho de DD e de EE, nascido a ../../1985. (…)»
6. Do ofício dirigido à Conservatória do Registo Predial ... para envio da certidão judicial referida em 3. (Ofício n.º ...29), consta o seguinte:
«(…) Assunto: Registo de Procedimento Cautelar de Arresto
Junto tenho a honra de enviar a V. Ex.ª Certidão extraída dos autos supra identificados, para efeitos de registo de arresto, nos termos do art.º 228.º nº 6, do C.P. Penal. (…)».
7. Em 10-11-2022, a Sr.ª Conservadora proferiu despacho intitulado «Despacho de Qualificação», nos seguintes termos:
«(…) Lavra-se o registo de PROCEDIMENTO CAUTELAR DE ARRESTO requerido sobre o prédio descrito nesta Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...37 da ... como PROVISÓRIO POR NATUREZA e POR DÚVIDAS, sendo:
1) PROVISÓRIO POR NATUREZA nos termos do artigo 92.º, n.º 1, al. a) do Código do Registo Predial (abreviadamente designado CRP) em virtude de as inscrições de ação e de procedimentos cautelares só poderem ser efetuados como provisórios por natureza.
2) PROVISÓRIO POR DÚVIDAS ao abrigo do disposto nos artigos 68.º, 70.º, e 34.º, n.º 4, todos do CRP e com os fundamentos seguintes:
Nos termos dos registos em vigor sobre o prédio a sua titularidade (propriedade) não pertence em exclusivo a BB.
Efetivamente, resulta da inscrição lavrada a coberto da apresentação n.º ...60 de 2019/07/01 que o imóvel pertence a BB e a AA, ainda no seu anterior estado de casados entre si, por terem adquirido o imóvel a título oneroso (compra) e o regime de bens do seu casamento ser o da comunhão de adquiridos – artigo 1724.º - conjugado com o artigo 1722.º, ambos do Código Civil.
Atualmente, BB é divorciado conforme se extrai do seu assento de nascimento n.º ...08, desta Conservatória de Registo Civil (consulta realizada à base de dados ao abrigo do artigo 73.º CRP).
Porém, no registo predial o prédio ainda integra o património comum do dissolvido casal dele BB e AA (nomeadamente, não consta do registo predial que o imóvel tenha sido objeto de partilha subsequente a divórcio e que nesta, o imóvel tenha sido adjudicado a BB).
Nos termos do artigo 34.º, n.º 4, do CRP (que consagra o princípio do trato sucessivo) no caso de existir sobre os bens registo de aquisição ou reconhecimento de direito suscetível de ser transmitido ou mera posse, é necessária a intervenção do respetivo titular para poder ser lavrada nova inscrição definitiva sobre o prédio.
O que se exige no artigo 34.º, n.º 4 CRP é que cada registo constitua um elo de uma cadeia e só é definitivamente acolhido nessa cadeia se, quem nele figura como transmitente, réu, eventualmente autor, etc, estiver inscrito no registo predial como titular do direito transmitido, penhorado, arrestado, etc
Nisto consiste o princípio do registo predial conhecido como do trato sucessivo. Como efeito deste princípio, o registo apresenta uma sucessão de factos interligados pelos sujeitos que neles intervêm. Daí a ideia de trato sucessivo ou contínuo.
No que respeita a este princípio, que é um princípio meramente formal, ele é aplicável a todos os factos submetidos a registo, inclusive aos atos e às decisões judiciais.
É certo que o conservador não se pode nunca pronunciar se sobre o mérito das decisões judiciais (proferidas sobre o mérito do pedido e transitadas em julgado), estando obrigado a dar lhes cumprimento (desde que versem sobre direitos sujeitos a registo predial).
Porém, se na ação não foi demandado ou teve intervenção o titular inscrito no registo predial, ao registo da decisão e de qualquer outro ato judicial (penhora, arresto) deve ser oposto o não cumprimento do princípio do trato sucessivo consagrado no artigo 34.º, n.º 4 do Código do Registo Predial, lavrando-se o registo como provisório por dúvidas.
É o que sucede no caso do procedimento cautelar agora submetido a registo.
Efetivamente, não consta da certidão judicial que AA (ex-cônjuge) seja arguida ou que no processo tenha sido citada para requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência da ação em que a separação já tenha sido requerida, conforme dispõe o artigo 740.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 391.º, n.º 2 do mesmo código.
Em face do acima exposto, não estando comprovado nos documentos apresentados a registo que a titular inscrita AA interveio no processo, lavra-se o registo do procedimento cautelar também como provisório por dúvidas – artigo 34.º, n.º 4 CRP.
As dúvidas agora opostas ao registo podem ser removidas desde que seja comprovada a intervenção do ex-cônjuge nos termos acima referidos ou, caso tenha sido realizada a partilha por divórcio entre os ex-cônjuges BB e AA (partilha que necessariamente tem de ser anterior ao procedimento cautelar e em que o imóvel tenha sido adjudicado a BB) que seja promovido o seu ingresso no registo predial. (…)».

C- Do Conhecimento das questões suscitadas no recurso
A principal questão a decidir no presente recurso, resume-se a saber se o registo do arresto preventivo decretado ao abrigo do artigo 228.º do Código de Processo Penal (CPP) sobre um imóvel que se encontra registado a favor do arguido e da ex-mulher (não arguida), correspondendo a um bem comum do casal, que foi casado em comunhão de adquiridos, deve ser lavrado como provisório por dúvidas (como sucedeu) ou se deve ser lavrado como definitivo, como defende o Recorrente.
Como resulta dos autos, por sentença proferida no apenso ao inquérito que corre os seus termos na ... Secção do DIAP ... sob o NUIPC 309/20...., onde é investigada a prática de vários crimes pelo arguido BB, o Ministério Público instaurou contra o arguido procedimento cautelar de arresto preventivo, ao abrigo do artigo 228.º do CPP, o qual veio a correr termos no Juízo Local Criminal ... sob o proc. n.º 309/20...., e que foi decretado por sentença proferida em 01-10-2022, em relação ao imóvel identificado no ponto 1 dos factos provados, tendo sido ordenado o respetivo registo, nos termos do n.º 6 do normativo acima citado.
No que ora releva para o presente recurso, por Despacho de Qualificação da Sr.ª Conservadora do Registo Predial, datado de 10-11-2022, foi lavrado o registo do referido arresto como provisório por dúvidas ao abrigo dos artigos 68.º, 70.º e 34.º, n.º 4, todos do C.R.Predial.
A motivação exarada no despacho prende-se, por um lado, com o facto de, apesar do arguido já se encontrar divorciado de AA, o imóvel arrestado continua a integrar o património comum do casal, encontrando-se a aquisição do imóvel registada ainda a favor de ambos; e, por outro lado, por dessa circunstância, aliada ao facto da ex-mulher do arguido não ser arguida no referido processo, o princípio do trato sucessivo previsto no artigo 34.º, n.º 4, do C.R.Predial determinar que, no caso de existir sobre os bens registo de aquisição ou reconhecimento de direito suscetível de ser transmitido ou mera posse, ser necessária a intervenção do respetivo titular para poder ser lavrada nova inscrição definitiva sobre o prédio.
Não tendo tido a referida AA intervenção no procedimento cautelar de arresto, encontra-se, assim, quebrada a continuidade dos elos da cadeia que tem de existir entre os factos registados e os sujeitos que neles intervêm, donde o registo não pode ser lavrado como definitivo, mas provisório por dúvidas, sem prejuízo das dúvidas serem removidas com junção de documentação donde resulte que a mesma foi citada para requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência da ação em que a separação já tenha sido requerida, conforme dispõe o artigo 740.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 391.º, n.º 2, do CPC.
A sentença recorrida confirmou este entendimento, contra o qual o ora Recorrente se insurge, defendendo que o registo deve ser lavrado como definitivo.
Para o efeito, e em síntese, alega:
(i) O Estado ao obter o decretamento de arresto preventivo previsto na legislação processual penal, age ao abrigo do ius imperii, o que afasta na fase de inquérito, e antes da fase executiva da medida condenatória na perda da vantagem por facto ilícito, a aplicação do regime processual civil previsto no artigo 740.º, n.º 1, do CPC, o regime da penhora, bem como o princípio registral do trato sucessivo, os quais, aplicados sem se atentar no interesse público em presença, colocam em causa a eficácia da garantia patrimonial obtida no processo penal;
(ii) O n.º 6 do artigo 228.º do CPP ao determinar o registo do arresto, teve por base a conformação de instrumentos jurídicos de direito internacional e europeu sobre o congelamento e a perda de instrumentos e produtos do crime, visando, em última análise, dar efetivação à ideia que o «crime não compensa», pelo que a imposição da partilha do bem arrestado preventivamente condiciona a eficácia da medida e vai contra esses instrumentos jurídicos internacionais, fazendo perigar a execução da garantia;
(iii) A intervenção de todos os titulares inscritos apenas deve ocorrer na fase executiva quando o arresto for convertido em penhora, não ocorrendo, por conseguinte, violação do referido princípio do trato sucessivo.
Vejamos, então, se assiste razão ao Recorrente.
Começando por, sinteticamente, delimitar os contornos jurídicos-processuais do arresto preventivo previsto no artigo 228.º do CPP.
O Título III do CPP, sob a epígrafe «Das medidas de garantia patrimonial» prevê nos artigos 227.º e 228.º, respetivamente, a caução económica e o arresto preventivo.
Sendo que não são as únicas garantias processuais previstas na lei processual penal, uma vez que no ordenamento interno por motu proprio e também por decorrência de obrigações internacionais, o legislador estabeleceu um conjunto de garantias processuais que visam a efetivação da perda ou confisco de bens em resultado de determinada atividade criminosa.
Assim, para além das garantias processuais penais referentes à perda de bens que consistem na apreensão stricto sensu (artigo 178.º do CPP), na caução económica (artigo 227.º do CPP) e no arresto preventivo (artigo 228.º do CPP), também a lei prevê outras garantias mais robustas, como seja, o arresto alargado (artigos 7.º e 10.º da Lei n.º 5/2002, de 11-01, que cessa se for prestada caução económica - art.º 11.º da referida Lei), a perda de vantagem económica (artigo 111.º do Código Penal), bem como a apreensão de acordo com a previsão dos artigos 4.º e 12.º da Lei n.º 25/2009, de 5-06, e a apreensão efetuada pelo GRA (Gabinete de Recuperação de Ativos), nos termos do artigo 3.º, da Lei n.º 45/2011, de 24-07).
Donde resulta que o legislador nacional criou um sistema de mecanismos processuais que visam dar exequibilidade à decisão final condenatória, mormente aquela que determina a perda ou confisco das vantagens da prática do crime.
Porém, cada uma desses instrumentos processuais tem requisitos próprios e convoca uma solução processual determinada, em conformidade com o disposto no artigo 2.º, n.º 2, do CPC[1].
O que releva no caso em apreço é o arresto preventivo previsto no artigo 228.º do CPP, que dispõe do seguinte modo:
«1 - Para garantia das quantias referidas no artigo anterior, a requerimento do Ministério Público ou do lesado, pode o juiz decretar o arresto, nos termos da lei do processo civil; se tiver sido previamente fixada e não prestada caução económica, fica o requerente dispensado da prova do fundado receio de perda da garantia patrimonial.
2 - O arresto preventivo referido no número anterior pode ser decretado mesmo em relação a comerciante.
3 - A oposição ao despacho que tiver decretado arresto não possui efeito suspensivo.
4 - Em caso de controvérsia sobre a propriedade dos bens arrestados, pode o juiz remeter a decisão para tribunal civil, mantendo-se entretanto o arresto decretado.
5 - O arresto é revogado a todo o tempo em que o arguido ou o civilmente responsável prestem a caução económica imposta.
6 - Decretado o arresto, é promovido o respetivo registo nos casos e nos termos previstos na legislação registal aplicável, promovendo-se o subsequente cancelamento do mesmo quando sobrevier a extinção da medida.
7 - O arresto preventivo é aplicável à pessoa coletiva ou entidade equiparada.»

A remissão inserta no n.º 1 do artigo 228.º do CPP para os termos da lei processual civil significa que importa levar em conta o regime previsto nos artigos 391.º a 396.º do CPC que regulam a providência cautelar especificada denominada arresto.
Arresto que consiste numa apreensão judicial de bens, à qual são aplicáveis as regras da penhora (artigo 391.º, n.º2, do CPC), apresentando-se, assim, como instrumento de garantia de direitos de crédito, ou seja, uma garantia patrimonial, que assegura que os bens apreendidos se mantêm na esfera jurídica do devedor (sendo ineficazes os atos de alienação ou de oneração em relação ao credor, sem prejuízo das regras de registo – artigo 622.º do Código Civil) até que haja condições para, em sede executiva, se operar a conversão do arresto em penhora em ordem a permitir a satisfação do crédito e, dessa forma, o efeito útil da sentença condenatória (artigo 619.º do Código Civil).
Sem descurar a finalidade do arresto estritamente civilista, o arresto preventivo previsto na lei processual penal tem as suas especificidades.
Desde logo, tem natureza autónoma, mantêm-se até haver decisão final do processo penal (principal), mesmo quando, por via da controvérsia sobre a titularidade dos bens arrestados, o juiz remete a decisão sobre o arresto para os tribunais civis (n.º 5 do artigo 228.º do CPP), podendo ser substituído a todo o tempo, quando seja prestada caução económica pelo arguido ou civilmente responsável (n.º 6 do mesmo preceito), revelando, assim, a natureza subsidiária em relação à caução económica.
Consequentemente, não se pode perder de vista que o arresto preventivo penal tem caraterísticas e finalidades próprias, que correspondem a condicionantes processuais prévias, e que a remissão para o processo civil é subsidiária, pelo que só serão aplicáveis as normas que se harmonizem com o processo penal (artigo 4.º do CPP).[2]
Uma das especificidades do arresto preventivo previsto no artigo 228.º do CPP, enquanto garantia patrimonial, é a sua adstrição à garantia do cumprimento efetivo de obrigações patrimoniais que constem da decisão condenatória (tal como o arresto civil), mas apenas as que correspondem a «(…) determinados pagamentos que são devidos ao Estado (pagamento da pena pecuniária, das custas do processo, de qualquer outra dívida para com ele relacionada com o crime ou do valor dos instrumentos, produtos e vantagens do facto ilícito típico) ou que são devidas ao lesado (pagamento da indemnização ou de outras obrigações civis derivadas do crime).»[3]
No que concerne ao registo da decisão que decreta o arresto preventivo, estipula o n.º 6 do artigo 228.º do CPP, que após ser decretado é promovido o registo «nos casos e nos termos previstos na lei registal aplicável, promovendo-se o subsequente cancelamento do mesmo quando sobreviver a extinção da medida».
A norma remete, assim, para o C.R. Predial, sem fazer qualquer restrição à aplicação do regime registal vigente no nosso ordenamento jurídico, limitando-se a prever o impulso processual oficioso do Ministério Público caso cesse a razão do decretamento do arresto preventivo.
Como decorre do artigo 1.º do C.R.Predial, o regime predial destina-se essencialmente a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário.
Com vista a cumprimento desse desiderato, existem princípios próprios inerentes ao registo predial, de cariz estruturante, como sejam, o princípio da instância, da legalidade, da prioridade e do trato sucessivo, também designado por princípio da inscrição prévia ou da continuidade das inscrições (cfr. artigos 4.º, 67.º, n.º 1, 34.º, n.º 4, do C.R. Predial).
Em relação ao princípio do trato sucessivo, estipula o artigo 34.º, n.º 4, do referido diploma legal do seguinte modo: « 4 - No caso de existir sobre os bens registo de aquisição ou reconhecimento de direito suscetível de ser transmitido ou de mera posse, é necessária a intervenção do respetivo titular para poder ser lavrada nova inscrição definitiva, salvo se o facto for consequência de outro anteriormente inscrito.»
Reporta-se este segmento do normativo às situações em que já existe um registo de aquisição do direito (sendo essa a situação que releva no caso sub judice) e determina que a inscrição da aquisição do direito ou a oneração do direito já inscrito, torne «necessária a intervenção do respetivo titular para poder ser lavrada nova inscrição definitiva», ressalvando, contudo, as situações de dispensa de inscrição intermédia, como ocorre na situação prevista no artigo 35.º do mesmo Código (situação inaplicável aos presentes autos).
O trato sucessivo significa que entre os factos inscritos no registo tem de existir um nexo ininterrupto entre os vários sujeitos que aprecem investidos de poderes sobre a coisa.[4]
Assim, e em regra[5], o direito do adquirente deve apoiar-se no do transmitente e o encargo só pode ser constituído por, ou contra, o respetivo titular.
Deste modo, o princípio do trato sucessivo garante que o registo de aquisição de direito suscetível de ser transmitido, ou de mera posse, à revelia do titular inscrito, seja lavrado uma nova inscrição definitiva sobre o prédio.[6]
O trato sucessivo deve ser verificado em face dos títulos e manifestado na ficha de registo através do encadeado de factos jurídicos que compõem a situação jurídica do prédio, patenteando a história jurídica do bem, sem hiatos ou interrupções, com a titularidade atual a fundar-se na anterior e a constituir o alicerce que suporta qualquer registo ulterior de aquisição ou encargo.
Como sublinha MOUTEIRA GUERREIRO[7], reportando-se ao princípio do trato sucessivo e relacionando-o com o princípio vertido no artigo 7.º do C. R. Predial, que estabelece as presunções derivadas do registo definitivo, o trato sucessivo apesar de ter em si «cariz formal, é um dos mais importantes para que o registo possa alcançar um elevado grau de credibilidade e de certeza. Isto porque é através deste princípio que é possível concretizar-se na ordem tabular a essencial regra jurídica de que o direito já tem de existir em quem transmite visto que, de harmonia com o velho brocardo, ninguém pode transmitir o que não tem (nemo plus iuris ad alium transfere potest quam ipse habet)».
É de tal forma relevante o referido princípio do trato sucessivo que, quando o registo tiver sido lavrado com violação do mesmo, é nulo (artigo 16.º, alínea e), do C.R. Predial).
Decorre da conjugação dos artigos 69.º, 70.º, 71.º e 92.º do C. R. Predial que os registos são qualificados como provisórios por natureza e por dúvidas, sendo qualificados por dúvidas quando existam motivos que obstem ao registo do ato tal como é pedido, mas não sejam fundamento de recusa, nem devam ser qualificados provisórios por natureza.
Se o trato sucessivo não for evidenciado em face do registo existente e dos títulos apresentados, o registo deve ser lavrado por dúvidas, sem prejuízo das mesmas poderem ser removidas (artigo 73.º do C. R. Predial).
Por outro lado, a conversão do registo provisório em definitivo por averbamento à inscrição respetiva, determina que conserve a ordem de prioridade que tinha como provisório.
Sendo estes os pressupostos jurídicos que têm de ser levados em atenção quer em relação ao decretamento do arresto preventivo penal, quer em relação ao registo do mesmo, é tempo de reverter ao caso concreto, analisando de forma mais detalhada as questões colocadas pelo Recorrente.
Não estão em causa os pressupostos do decretamento do arresto preventivo, uma vez que a sentença que o decretou transitou em julgado, desencadeando-se, posteriormente, a fase contraditória (artigos 393.º, n.º 1, 372.º e 376.º do CPC, aplicáveis por via da remissão do artigo 228.º, n.º 1, do CPP).
O que está em causa, como desde logo enunciamos, é se o registo devia ter sido lavrado como definitivo e não como provisório por dúvidas como sucedeu.
Analisada a questão, adiantamos, desde já, que não nos suscita qualquer dúvida que o registo apenas poderia ser lavrado como provisório por dúvidas, porquanto resulta do título apresentado (sentença que decretou o arresto preventivo) e do que manifesta a ficha de registo do imóvel arrestado, que foi decretado como medida de garantia patrimonial apenas em relação às obrigações patrimoniais que venham a ser assacadas ao arguido em sede de sentença final penal condenatória, encontrando-se a titularidade do imóvel inscrita a favor de dois titulares: o arguido e a sua ex-mulher, que o adquiriram por compra registada pela Ap. ...60 de 2010/07/01, enquanto se encontravam casados no regime de comunhão de adquiridos.
Decorre dos artigos 1717.º a 1734.º do Código Civil as regras sobre o regime da comunhão de adquiridos, verificando-se, em face dos seus artigos 1722.º, 1723.º e 1726.º, que neste regime existem essencialmente duas massas patrimoniais: a dos bens próprios e a dos bens comuns.
Sendo que os bens adquiridos pelos cônjuges na constância do matrimónio, que não sejam excetuados por lei, fazem parte da comunhão, ou seja, são bens comuns (artigo 1724.º, alínea b), do Código Civil).
Por outro lado, e como prescreve o artigo 1695.º, n.º 1, do Código Civil, pelas dívidas que são da responsabilidade comum dos cônjuges respondem os bens comuns do casal, e, na falta ou insuficiência deles, solidariamente, os bens próprios de qualquer dos cônjuges.
Sublinhando-se, contudo, que o artigo 1692.º, alínea b), do Código Civil, determina que são da responsabilidade do cônjuge a que respeitam as dívidas provenientes de crimes, bem como as demais obrigações ali previstas se decorrerem de facto imputáveis a cada um dos cônjuges e que não correspondam a factos que implicam responsabilidade meramente civil.
Nesse caso, e como prescreve o artigo 1696.º, n.º 1, do Código Civil, pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem os bens próprios do cônjuge devedor e, subsidariamente, a sua meação nos bens comuns.
Estas regras mantêm-se enquanto os ex-cônjuges não procederem à partilha dos bens, pois a dissolução do casamento tem como consequência a cessação das relações patrimoniais entre os cônjuges (artigos 1688.º do Código Civil), mas apenas a partilha permite a cada um dos cônjuges receber os seus bens próprios e a sua meação no património comum, conferindo cada um deles o que dever a este património (artigos 1689.º, n.º 1, e 1697.º,n.º 2, do Código Civil).
Efetivamente, a natureza de propriedade coletiva da comunhão conjugal, assenta basicamente no facto de antes de dissolvido o casamento ou de se decretar a separação judicial de pessoas e bens entre os cônjuges, nenhum deles poder dispor da sua meação nem lhes ser permitido pedir a partilha dos bens que a compõem antes da dissolução do casamento.
Aos titulares do património coletivo não pertencem direitos específicos - designadamente uma quota - sobre cada um dos bens que integram o património global, não lhes sendo lícito dispor desses bens ou onerá-los, total ou parcialmente.
Na partilha dos bens destinada a pôr fim à comunhão, os respetivos titulares apenas têm direito a uma fração ideal do conjunto, não podendo exigir que essa fração seja integrada por determinados bens ou por uma quota em cada bem concreto objeto da partilha.
Consequentemente, o direito a metade do ativo e passivo desse património comum a que se reporta o artigo 1730.º,n.º 1, do Código Civil, não confere a cada cônjuge o direito a metade de cada bem concreto daquele património comum, mas, tão-só, o direito ao valor de metade desse património aquando da dissolução do casamento e da subsequente partilha de bens.
Ora, no caso em apreço, apesar dos titulares do prédio registado se encontrarem divorciados (a fazer fé na consulta do assento de nascimento que a Sr.ª Conservadora menciona no Despacho de Qualificação), o certo é que não existe notícia de já ter ocorrido a partilha do património comum do casal, nem sequer que a mesma tenha sido requerida.
Sendo assim, a situação tabular evidencia que estamos perante um bem comum que responde pelas dívidas da exclusiva responsabilidade do cônjuge arguido, mas que, enquanto o património do casal se encontrar indiviso, é um bem comum, pelo o encargo que sobre o mesmo incide por via do decretamento do arresto preventivo só pode ser registado de forma definitiva se tivesse sido decretado contra os dois titulares inscritos, sob pena de violação do referido princípio do trato sucessivo supra explanado.
A única forma de compatibilizar a situação tabular com o decidido no arresto preventivo decretado passa por o registo ser lavrado como provisório por dúvidas, sob pena do mesmo ser nulo (artigos 16.º, alínea e), 68.º, 70.º e 34.º, n.º 4, alínea e), do C.R.Predial).
Sem prejuízo das dúvidas podem ser afastadas pelo mecanismo processual previsto no artigo 740.º do CPC, aplicáveis à penhora e mutatis mutandis quando o arresto se converte em penhora, uma vez que outras normas não existem no processo penal aplicáveis ao arresto preventivo decretado ao abrigo do artigo 228.º do CPP.
O argumento utilizado pelo Recorrente ao defender que o Estado no âmbito da ação penal age no interesse público, no uso do seu iuris imperii, e que, por essa razão, afasta, pelo menos, em fase de inquérito, as regras processuais civis, mormente o artigo 740.º do CPC e as registais como a do trato sucessivo, não tem qualquer fundamento legal, pois é o próprio artigo 228.º do CPC que remete para as normas processuais civis e registais.
Ainda que, como se disse, o decretamento do arresto preventivo previsto na legislação processual penal tenha pressupostos próprios (que não estão postos em causa), o legislador não foi tão longe ao ponto de negar tutela jurídica aos direitos de terceiros que, em relação a esta garantia de natureza meramente patrimonial, não foram tidos nem achados no processo crime.
Sendo que, e uma vez mais se remete para o acima referido, a tutela conservatória da garantia patrimonial decorrente do arresto preventivo previsto no artigo 228.º do CPPC, encontra-se circunscrita aos pagamentos acima referidos (pena pecuniária, custas do processo, qualquer outra dívida para com ele relacionada com o crime ou do valor dos instrumentos, produtos e vantagens do facto ilícito típico, ou que são devidas ao lesado, como pagamento da indemnização ou de outras obrigações civis derivadas do crime), podendo, a mesma ser substituída por caução económica, apresentando, pois, um perfil jurídico diferenciado das garantias processuais penais acima referidas, como seja, o arresto alargado ou a perda de vantagem económica.
É inquestionável que o Ministério Público, enquanto titular da ação penal, ao enveredar pelo pedido de arresto preventivo ao abrigo do artigo 228.º do CPP, bem sabia que apenas obtinha, caso fosse decretado, uma garantia patrimonial com as inerentes limitações que decorrem da aplicação à mesma do regime processual civil, mormente por se tratar de uma apreensão judicial à qual são aplicáveis as regras da penhora, ou seja, a executoriedade do arresto depende sua conversão em penhora.
Sublinhando-se, ainda, que seguindo o regime processual civil, após o decretamento abre-se uma fase contraditória na qual é facultado ao requerido a faculdade de reagir por via de recurso ou de oposição (artigo 372.º do CPC), facultando-se também a terceiros o direito de reagirem através de embargos de terceiro (artigos 332.º, n.º 1, e 344.º do CPP), sem que seja necessário adquirirem o estatuto de sujeito processual penal.[8]
E, apesar do regime processual penal, determinar que o arresto preventivo se mantém até à decisão final proferida no processo crime, tal não impede que o arguido ou terceiros exerçam o seu direito de oposição ao decretamento colocando em causa o decidido na providência cautelar.
Sendo que também não poderia ignorar que, caso haja sentença condenatória do arguido, segue-se uma fase executiva em que se impõe, antes da venda do bem comum arrestado, a citação do cônjuge ou ex-cônjuge do arguido, nos termos do artigo 740.º do CPC, para requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência da ação em que a separação já tenha sido requerida, sob pena da execução prosseguir nos bens comuns.
Todo o regime jurídico que vem sendo referido, é, obviamente, incompatível com a existência de um registo definitivo do arresto preventivo sobre os bens comuns decretado apenas em relação a um dos titulares inscritos, que a ser assim lavrado, violaria flagrantemente os princípios registais da legalidade, da fé pública assente na verdade ou exatidão do facto registado, do trato sucessivo e as presunções derivadas do registo (artigos 68.º, 34.º, n.º 4, e 7.º do C. R. Predial)
Bem sabendo o Recorrente que este é o figurino legal aplicável ao arresto preventivo penal por aplicação subsidiária do regime do arresto civil e das regras do registo vigentes no nosso ordenamento jurídico, a invocação da falta de eficácia da garantia patrimonial que desencadeou por a lei determinar que o registo não é definitivo, mas provisório por dúvidas, não tem qualquer fundamento jurídico.
Nem tão pouco serve chamar à colação os instrumentos de natureza nacional e/ou internacional dos quais emerge um conjunto de meios que visam obter garantias processuais quando à apreensão, perda ampliada ou confisco dos instrumentos e produtos do crime ou ainda a perda das suas vantagens de bens obtidos ilicitamente, porquanto a aplicação dos mesmos, não podem coartar, nem coartam, os direitos de defesa dos afetados com tais atos, nem, na verdade, o Recorrente concretiza em que termos os mesmos impõem que o registo do arresto preventivo decretado, nos termos em que o foi abrangendo bens comuns do ex-casal, sem que um deles seja alvo de procedimento criminal, deva ser feito de forma definitiva e não provisória, por dúvidas, como ocorreu.
Também se nos afigura não ter qualquer suporte legal defender-se que o registo deveria ser lavrado de forma definitiva, para em fase de conversão do arresto em penhora, se permitir, então, a intervenção de todos os titulares.
Entendimento que, aliás, colide com a natureza conservatória do arresto que tem a sua razão de ser no decretamento em momento anterior àquele em que se decide a questão substantiva em discussão (seja civil ou penal), caraterizando-se por ter uma natureza mista, simultaneamente declarativa e executiva.
Finalmente, cabe concluir dizendo que, como tem vindo a ser afirmado de forma consistente pelo Instituto de Registos e Notariado, em vários pareceres emitidos pelo seu Conselho Consultivo, mormente quando estão em causa questões relacionadas com o registo de imóveis perdidos a favor do Estado e com a salvaguarda do princípio do trato sucessivo, que o sistema de registo está gizado para publicitar a situação jurídica dos prédios tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário, regendo-se por regras próprias, donde resulta que o referido princípio do trato sucessivo, como tem sido reiterado, «(…) gravita em torno do princípio da prioridade (art. 6º do CRP) e da presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define (art. 7.º do CRP), pelo que a sua aplicação não é, por regra, permeável à génese do facto jurídico a inscrever, à proveniência (judicial ou extrajudicial) do título, à qualidade dos sujeitos ou à natureza dos interesses (públicos ou privados) envolvidos.»[9]
Em face de todo o exposto, improcede a apelação.


III- DECISÃO
Nos termos e pelas razões expostas, acordam em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Sem custas dada a isenção subjetiva do Recorrente (artigo 4.º, alínea a), do RCP).
Évora, 20-02-2024
Maria Adelaide Domingos (Relatora)
José António Moita (1.º Adjunto)
Maria José Cortes (2.ª Adjunta)
_________________________________________________
[1] JOÃO CONDE CORREIA, Anotação ao Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 8 de Outubro de 2014, O arresto preventivo dos instrumentos e dos produtos do crime, in JULGAR on line – 2014, p. 17, consultável em https://julgar.pt/wp-content/uploads/2014/10/Arresto-instrumentos-e-produto-da-atividade-criminosa-Julgar1.pdf
[2] Neste sentido, veja-se Ac. TC. n.º 724/2014, de 28/10/2014, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.; GERMANO MARQUES DA SILVA, Curso de Processo Penal, Verbo, 2ª edição, II vol., pág. 309; JOÃO CONDE CORREIA, Apreensão ou arresto preventivo dos proventos do crime?, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, n.º 25, 2015; SANTIAGO, RODRIGO, Sobre o artigo 4º do Código de Processo Penal, in Scientia Iuridica , 1995, p. 125 e ss; MANUEL DA COSTA ANDRADE e MARIA JOÃO ANTUNES, Da natureza processual penal do arresto preventivo, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 27, Janeiro/Abril 2017, consultável em https://revistas.ucp.pt/index.php/catolicalawreview/article/view/9551.
[3] MARIA JOÃO ANTUNES, Arresto preventivo e apreensão em processo penal e processo de insolvência, Católica Law Review, Vol. IV, n.º 3, novembro de 2020, p. 138.
[4] OLIVEIRA ASCENSÃO, Direito Civil – Reais, 4.ª ed., reimp. Coimbra Editora/1987, p. 337.
[5] Na exceção, incluem-se as situações de aquisição originária e de expropriação por utilidade pública.
[6] Cfr. MOUTEIRA GUERREIRO, Noções de Direito Registral (Predial e Comercial), Coimbra Editora, 1993, p. 75-76.
[7] MOUTEIRA GUERREIRO, Temas de Registos e de Notariado, Almedina, 2010, p. 50.
[8] Cfr. Ac. RL, de 16-05-2018, proc. n.º 324/14.0TELSB-BI.L1-3, em www.dgis.pt
[9] Parecer n.º 15/CC/20018 (C.P. 18/2017STJSR-CC), consultável em
https://irn.justica.gov.pt/Portals/33/Doutrina/Pareceres%20do%20Conselho%20Consultivo/Registo%20Predial%20Casa%20Pronta/2018/15_CC_2018-CP18-2017_STJ_CC.pdf?ver=2019-06-11-095157-037