Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | PAULA DO PAÇO | ||
Descritores: | CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA CONCLUSÕES REJEIÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 03/13/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL EM CONTRAORDENAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO RECORRIDA | ||
Área Temática: | SOCIAL | ||
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Sumário: | Sumário elaborado pela relatora: I. A impugnação judicial em processo de contraordenação laboral deve ser dirigida ao tribunal competente e deve conter alegações, conclusões e indicação dos meios de prova a produzir. II. O ónus de concluir satisfaz-se pela enunciação abreviada dos fundamentos do recurso no final da impugnação. III. Não constituem conclusões a reprodução praticamente total das alegações do recurso. IV. Tendo a arguida sido convidada a aperfeiçoar as conclusões que apresentou, sob pena de rejeição da impugnação judicial, e tendo nas conclusões aperfeiçoadas voltado a repetir os argumentos da motivação do recurso, numa versão ainda mais extensa, não se pode considerar que a mesma cumpriu o ónus de concluir, tanto mais que na concreta situação dos autos o cumprimento desse ónus não revelava especial complexidade nem se traduzia numa exigência injusta ou excessiva. V. O incumprimento do ónus de concluir, que representa um desrespeito pelas exigências de forma a que deve obedecer a impugnação judicial, tem como consequência a rejeição da impugnação. | ||
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Decisão Texto Integral: | P. 6505/23.8T8STB.E1
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora1 I. Relatório AUTO TÁXIS SERRA D’ARGA, Lda. impugnou judicialmente a decisão da Autoridade Para As Condições de Trabalho (ACT) que lhe aplicou uma coima de 3 UC pela prática de uma contraordenação leve, nos termos do artigo 216.º, n.º 5, do Código do Trabalho (não publicidade do horário de trabalho). O Ministério Público apresentou os autos ao juiz, ao abrigo do artigo 37.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro. A Meritíssima Juíza da 1.ª instância proferiu o seguinte despacho: «Considerando que as conclusões apresentadas consubstanciam na sua quase totalidade as alegações, nos termos do disposto no art. 33.º n.º 1 da Lei n.º 107/2009, de 14.09, o tribunal convida a Recorrente a aperfeiçoar o articulado apresentado, formulando conclusões, sob pena de rejeição da impugnação judicial apresentada. Notifique.» Respondendo ao convite, a impugnante apresentou novas conclusões (cf. requerimento com a ref.ª 48729944). Foi, então, proferida a seguinte decisão: «Na sequência da impugnação judicial apresentada, foi proferido despacho convidando a arguida a formular conclusões. Efetivamente, dessa impugnação judicial resulta a reprodução integral, em sede de conclusões, dos factos alegados. Na senda do despacho proferido, a arguida juntou requerimento sendo que, não reproduzindo a factualidade alegada, têm a mesma extensão, quer de forma quer de substância, que as alegações. Nos termos do disposto no art. 33.º da Lei n.º 107/2009, de 14.09: “1 - A impugnação judicial é dirigida ao tribunal de trabalho competente e deve conter alegações, conclusões e indicação dos meios de prova a produzir.” As conclusões consubstanciam uma síntese da argumentação expendida, de forma a que seja possível a apreensão de questões de facto ou de direito que o recorrente pretende suscitar na impugnação que deduz e que o tribunal cumpre solucionar. Da subsunção da factualidade supra com a norma supra referida, e a sua ratio legis, constata-se não ter sido dado cumprimento ao normativo legal, apesar do convite formulado. Em face do exposto, com fundamento na violação das exigências de forma, o tribunal rejeita a impugnação judicial. Custas a cargo da arguida. Registe e Notifique.» - A impugnante interpôs recurso, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: «a) Vem a Recorrente interpor recurso para o Venerando Tribunal da Relação de Évora de um douto despacho do tribunal “a quo” que rejeitou a impugnação judicial apresentada pela Recorrente; b) A Recorrente não se conformando com esse douto despacho vem, dele, interpor o competente recurso; c) A rejeição da impugnação judicial, por parte do tribunal “a quo”, teve como fundamento o facto de a Recorrente ter violado o Artigo 33º do RPCLSS; d) Concretamente, refere o tribunal “a quo” que, após o convite para afeiçoar as suas conclusões, as mesmas “…não reproduzindo a factualidade alegada, têm a mesma extensão, quer de forma quer de substância, que as alegações…”; e) A verdade é que, tal argumento invocado pelo tribunal “a quo”, salvo o devido respeito, e melhor entendimento, não corresponde à verdade; Vejamos: f) As conclusões devem emergir do arrazoado feito na alegação, ou seja, são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação; g) Na verdade, as conclusões, como enunciado sintético das questões que integram o objeto do recurso, definindo o preciso âmbito da impugnação deduzida, são o resumo/condensação das razões ou argumentos contidos nas alegações; h) In casu, não estamos perante uma a mera reprodução integral, em sistema de «copy/paste», do arrazoado do corpo das alegações para o um outro capítulo intitulado de “conclusões “, apenas com inclusão de diferente numeração; i) Com o devido respeito, nas “novas” conclusões apresentadas estamos perante uma síntese das alegações, pelo que não se pode aceitar estarmos perante uma total ausência de conclusões; j) Como tem sido entendido pela nossa jurisprudência, para que se considere verificada a existência de conclusões não basta apenas que o recorrente nas suas alegações de recurso utilize a expressão “conclusões“ para intitular que corresponde, com meras alterações pontuais, textualmente apenas e só às próprias alegações prévias, sendo, ainda, necessário que, de facto, as alegações sejam seguidas de algo que, de algum modo, se assemelhe, ainda que aproximadamente, a um sintetizar das questões por si anteriormente expostas no corpo argumentativo; k) Diga-se, aliás, que duma leitura da jurisprudência conclui-se que só têm decidido pela rejeição do recurso nos casos em que não existe qualquer condensação ou sintetização, por mínima que seja, limitando-se o recorrente a reproduzir ipsis verbis tudo o antes vertido nas alegações, pois que, em ver da jurisprudência, nestas hipóteses, não existem verdadeiras conclusões; l) Não é o que acontece com o recurso de impugnação rejeitado, com o devido respeito. m) Assim, e com todo o respeito por opinião em contrário, a conduta da Recorrente não pode enquadrar-se no simples copy/paste, que permita justificar a rejeição do recurso, antes se deve considerar que existiu verdadeira condensação ou síntese de conclusões, ainda que o português usado seja semelhante ao das alegações, a forma de escrita segue uma linha de raciocínio exposta e colocada no papel, mas obedecendo a um verdadeiro espírito de síntese, apresentando as conclusões uma verdadeira súmula das alegações/motivação. n) Assim, inexiste, portanto, qualquer violação do art.º 33º do Regime Processual das Contraordenações Laborais e da Segurança Social, pelo que deve o recurso de impugnação judicial de decisão administrativa por contraordenação laboral ser aceite. o) Por outro lado, ao interpretar o Artigo 33º do RPCLSS como o tribunal “a quo” aplicou aos presentes autos, salvo o devido respeito, essa interpretação viola o artigo 32º n.º 10 da Constituição da República Portuguesa (“CRP”). p) Pelo que, invoca-se a inconstitucionalidade da norma do Artigo 33º do RPCLSS na forma como foi aplicada aos presentes autos. q) Nesta conformidade, deve o despacho recorrido ser substituído por outro que admita a impugnação judicial apresentada pela Recorrente, e o processo seguir os seus ulteriores termos processuais. Nestes termos e demais de Direito aplicáveis, deverá ser dado total provimento ao recurso, revogando-se assim o douto despacho recorrido e, em consequência, ser o mesmo substituído por outro que admita e a aceite a impugnação judicial apresentada pela Recorrente.» - A 1.ª instância admitiu o recurso, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. - O Ministério Público respondeu, propugnando pela improcedência do recurso. - O processo subiu à Relação e a Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seu parecer em sentido favorável à procedência do recurso. A recorrente respondeu, reiterando a posição anteriormente assumida. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. * II. Objeto do recurso A questão que importa dilucidar e resolver é a de saber se a impugnação judicial não deveria ter sido rejeitada. * III. Matéria de Facto A matéria de facto a atender é a que consta do relatório supra, para a qual remetemos, sem necessidade da sua repetição, tendo-se, ainda, em consideração os elementos relevantes que resultem do processo. * IV. Enquadramento jurídico Conforme já referimos a única questão que importa dilucidar e resolver é a de saber se a impugnação judicial não deveria ter sido rejeitada. A 1.ª instância, depois de ter convidado a recorrente a aperfeiçoar as conclusões da impugnação judicial deduzida, e depois do oferecimento de novas conclusões, decidiu, ainda assim, rejeitar a impugnação judicial, por entender que a recorrente não observou o ónus de concluir. A recorrente não se conforma com esta decisão e requer que a mesma seja reapreciada por este tribunal superior. Analisemos a questão. De harmonia com o disposto no artigo 32.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, a decisão da autoridade administrativa de aplicação de coima é suscetível de impugnação judicial. Prescreve o artigo 33.º da mesma Lei, o seguinte: 1 - A impugnação judicial é dirigida ao tribunal de trabalho competente e deve conter alegações, conclusões e indicação dos meios de prova a produzir. 2 - A impugnação judicial é apresentada na autoridade administrativa que tenha proferido a decisão de aplicação da coima, no prazo de 20 dias após a sua notificação. Infere-se desta norma que a impugnação judicial deve seguir determinadas exigências de forma, que são as seguintes: (i) deve ser dirigida ao tribunal competente; (ii) deve conter alegações, conclusões e indicação dos meios de prova a produzir. No que respeita ao ónus de concluir, que é o que agora releva, o mesmo satisfaz-se pela enunciação abreviada dos fundamentos do recurso no final da minuta. As conclusões, como a própria palavra indica, são um resumo dos fundamentos por que se pede a alteração ou a anulação da decisão de que se recorre. Daí que, para serem legítimas e razoáveis, as conclusões devem emergir logicamente do arrazoado feito na alegação. As conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação. O ónus da conclusão sintética deve ser apreciado de uma forma ponderada e equilibrada, de modo a que, por um lado, não se seja demasiado formalista em preterição da questão de fundo; mas, por outro lado, deve-se analisar se o princípio da colaboração subjacente a este ónus foi concretizado, de forma a permitir, o exercício do contraditório e a exposição clara das questões submetidas a um 2.º julgamento. No caso que nos ocupa, verificamos que as conclusões que foram inicialmente apresentadas reproduzem, efetivamente, a quase totalidade das alegações, como é referido no despacho de convite ao aperfeiçoamento da impugnação judicial. Foram apresentadas 14 alíneas de conclusões, nas quais se repetem os argumentos de facto que fundamentam o recurso. Por seu turno, as conclusões aperfeiçoadas, posteriormente apresentadas, desenvolvem-se em 23 alíneas (salienta-se que as alegações da impugnação judicial se desenvolvem em 24 pontos). Na motivação do recurso, a recorrente explica assim o aumento das alíneas das conclusões: «É que, a Recorrente entende que, para uma melhor compreensão do que foi dito nas alegações, teve de, nas conclusões, expandir a explicação do sucedido.» Ou seja, o que se deduz é que a recorrente ao invés de abreviar os fundamentos do recurso, fez, deliberadamente, o inverso. É pois manifesto que a recorrente não tentou, nem inicialmente, nem posteriormente, extrair das alegações qualquer resumo, por forma a facilitar a realização do contraditório e a delimitação do objeto do recurso. E, no caso dos autos, não nos parece que a execução do ónus de concluir revelasse especial dificuldade ou se traduzisse numa exigência injusta ou excessiva. Enfim, o que se conclui é que a recorrente incumpriu, realmente, o ónus de concluir imposto pelo artigo 33.º da Lei n.º 107/2009. Ora, a inobservância das exigências de forma tem como consequência a rejeição da impugnação judicial, de harmonia com o disposto no artigo 38.º da referida Lei. Neste sentido, cita-se o sumário do Acórdão da Relação de Coimbra de 28-04-2023 (Proc. n.º 4797/22.9T8LRA.C1), acessível em www.dgsi.pt: «I – O recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida). II – Não constituem conclusões a repetição dos argumentos constantes das alegações. III – Tendo a arguida sido convidada a corrigir as conclusões que apresentou como tal sob pena de rejeição do recurso e tendo apresentado novo articulado que reproduz os argumentos constantes das alegações, tendo apenas procedido a uma mera aglutinação do texto das alegações, não pode considerar-se este articulado como contendo conclusões, por não respeitar a forma resumida exigida pela lei. IV – Neste caso o recurso deve ser rejeitado.» Em suma, entendemos que o despacho recorrido fez uma correta aplicação da lei, pelo que não nos merece censura. Acresce que o despacho recorrido não viola o artigo 32.º, n.º 10, da Constituição da República Portuguesa, pois o tribunal a quo não impediu a recorrente de exercer o seu direito de defesa, concretamente, de submeter a apreciação do mérito a um julgador. Inclusive, foi facultada à recorrente a possibilidade de emendar o vício de forma suscetível de pôr em causa a apreciação judicial do caso concreto, mas a recorrente optou, novamente, por não formular uma síntese concisa e precisa dos argumentos expostos nas alegações. A rejeição da impugnação encontra, pois, fundamento legal, e a recorrente é a única responsável pela mesma. Em face do exposto, e sem necessidade de mais delongas, resta-nos concluir pela improcedência do recurso, devendo manter-se a decisão recorrida. * V. Decisão Nestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso improcedente, e consequentemente, confirmam a decisão recorrida. Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC. -------------------------------------------------------------------------------------------------------- Évora, 13 de março de 2025 Paula do Paço Filipe Aveiro Marques Emília Ramos Costa
1. Relatora: Paula do Paço; 1.º Adjunto: Filipe Aveiro Marques; 2.ª Adjunta: Emília Ramos Costa↩︎ |