Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
330/18.5PAENT.E1
Relator: NUNO GARCIA
Descritores: CRIME DE NATUREZA SEMI-PÚBLICA
EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO CRIMINAL
Data do Acordão: 06/26/2020
Votação: DECISÃO SUMÁRIA
Texto Integral: S
Sumário: 1 - Tendo o arguido sido acusado pela prática de um crime de natureza pública (violência doméstica), mas entendendo o tribunal que, perante a não prova de determinados factos e por razões de direito, afinal o crime praticado pelo arguido tem natureza semi-pública (ofensa à integridade física simples), deve, em vez de o condenar por esse crime, homologar anterior declaração da vítima de não desejar procedimento criminal contra o arguido e, em consequência, declarar extinto o procedimento criminal.
2 – Não existindo no processo manifestação do arguido de aceitação das consequências dessa declaração da vítima, tendo o mesmo recorrido com o fundamento, entre o mais, de que essa declaração deveria ter conduzido à sua absolvição, deve tal atitude ser entendida como não oposição à “desistência da queixa”.
Decisão Texto Integral:
O recurso foi adequadamente admitido.

DECISÃO SUMÁRIA (proferida ao abrigo do disposto no artº 417º, nº 6, al. c), do C.P.P.)

RELATÓRIO

O arguido PFLT foi acusado pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º n.º 1, alínea b), n.º 2, alínea a) e nºs. 4, 5 e 6, do Código Penal (em concurso aparente com um crime de injúria, p.p. pelo artigo 181.º n.º 1, do Código Penal e com um crime de ofensa à integridade física qualificada, p.p. pelo artigo 145.º n.º 1, alínea a) e n.º 2, do Código Penal, com referência aos artigos 143.º, n.º 1 e 132.º, n.º 2, alíneas b) e e) do Código Penal).

Realizado que foi o julgamento, foi proferida sentença na qual se absolveu o arguido da prática do referido crime de violência doméstica e se condenou o mesmo pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artº 143º, nº 1, do Cód. Penal.

Inconformado com tal condenação, o arguido recorreu e terminou a sua motivação de recurso com as seguintes conclusões:

“1ª Em sede de sentença, considerou a Mmª Juiz a quo que a actuação do arguido não preencheu o tipo objectivo de crime de violência doméstica, crime pelo qual vinha acusado.

2ª Absolveu-o do referido crime e subsumiu a sua conduta ao crime de ofensa à integridade física simples, condenando-o a uma pena de multa.

3ª Neste conspecto, inscrevendo-se alegadamente o evento delituoso no campo da actuação do crime de ofensa à integridade física simples, falecia legitimidade ao Ministério Público para deduzir acusação, por desistência de queixa expressamente manifestada nos autos. falecia legitimidade ao Ministério Público para deduzir acusação, por desistência de queixa expressamente manifestada nos autos. E, não podendo a omissão supra descrita ser suprida, resta concluir que a responsabilização criminal do arguido a esse título não é admissível, impondo-se, sem mais, a sua absolvição.

4ª- O tribunal a quo violou o disposto nos art. 113º, n.º 1, 116º, n.ºs 1 e 2 e 143º, n.º 2 do Código Penal e artigos 49º, n.º 1, 51º, n.º 1 do CPP.

5ª- O Tribunal a quo interpretou os citados normativos, no sentido de que o Ministério Público tinha legitimidade para deduzir acusação sem necessidade da existência da queixa pela ofendida.

6ª- Deveria tê-las interpretado no sentido contrário. Precisamente, no sentido de que a desistência de queixa ocorrida nos autos é relevante e elemento essencial para a responsabilização criminal do arguido pela prática de um crime semi-público.

7ª A sentença recorrida deve ser revogada, determinando-se a sua substituição por uma outra que, na procedência do recurso, absolva o arguido pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples.

8ª Na pretensão da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, e ao analisarmos as gravações efectuadas em sede de audiência de discussão e julgamento, verificou-se que o depoimento da ofendida é inaudível e/ou imperceptível. Tal deficiência inviabiliza o recurso e respectiva motivação.

9ª Dispõe o artigo 363° do Código de Processo Penal que as declarações prestadas oralmente na audiência são sempre documentadas na acta, sob pena de nulidade – que, nesta sede expressamente se argui.

10ª A perceptibilidade do testemunho proferido pela ofendida, única pessoa que assistiu às alegadas agressões, é essencial à análise da imputação criminal do arguido.

11ª A deficiência nas gravações áudio inviabiliza o recurso sobre a matéria de facto e, consequentemente, a decisão sobre a matéria de direito.

12ª Deve, pelas razões supra aduzidas, ser julgada a nulidade invocada.”

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O Ministério Público respondeu ao recurso, tendo terminado a sua motivação de recurso com as seguintes conclusões:

“1 – No domínio do Código de Processo Penal vigente a omissão ou deficiência da documentação das declarações orais na audiência (gravação) constitui nulidade, sanável, sujeita ao regime de arguição e de sanação dos art.º 105º n.º 1, 120º, n.º1 e 121º do referido diploma.

2 - Esta nulidade sana-se se não for tempestivamente arguida, contando-se o prazo de dez dias (artº 105º, n.º 1 do Cód. Proc. Penal) a partir da audiência, acrescido do tempo que mediou entre a entrega do suporte técnico pelo sujeito processual interessado ao funcionário e a entrega da cópia do suporte técnico ao sujeito processual que a tenha requerido.

3 - O termo inicial do prazo de 10 dias do art.º 153º do CPC ocorre no dia em que os suportes técnicos com o registo das gravações ficam à disposição dos sujeitos processuais, visto que só nesta data poderão os interessados tomar conhecimento da omissão ou deficiência da gravação do registo da prova, estando a partir desta data habilitados a arguir o respectivo vício.

4 – Assim se fixou jurisprudência no ACSTJ n.º 13/2014, publicado no Diário da República n.º 183/2014, Série I de 2014-09-23: a nulidade prevista no artigo 363.º do Código de Processo Penal deve ser arguida perante o tribunal da 1.ª instância, em requerimento autónomo, no prazo geral de 10 dias, a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, acrescido do período de tempo que mediar entre o requerimento da cópia da gravação, acompanhado do necessário suporte técnico, e a efectiva satisfação desse pedido pelo funcionário, nos termos do n.º 3 do artigo 101.º do mesmo diploma, sob pena de dever considerar-se sanada.

5 – Ora, no caso dos autos as gravações foram entregues ao recorrente no dia 21 de Janeiro de 2020, vindo a nulidade a ser invocada, em sede de recurso, o qual deu entrada no dia 10 de Fevereiro de 2020, e, nesta medida, de forma extemporânea.

6 - Tendo o processo tido início para investigação de um crime de natureza pública (ofensa à integridade física qualificada) e assim prosseguido até à fase de julgamento, qualificação jurídica essa suportada pelos elementos então disponíveis nos autos, constatando-se, em consequência da prova produzida em audiência, que a conduta do arguido integra antes o crime de ofensa à integridade física simples (de natureza semipública), para o condenar por este crime não é necessário que o ofendido tenha exercido o direito de queixa, por aquela alteração da qualificação jurídica não ter qualquer efeito sobre o procedimento criminal que foi iniciado de forma válida e eficaz.

7 - O que sucedeu é que, em sede de julgamento e em consequência da conformação probatória que teve lugar, a Mma. Juiz a quo concluiu que os factos apurados integram antes um crime de natureza semipública.

8 – Valorar-se, em sede de sentença, uma manifestação de vontade, sobre a qual o Ministério Público já se havia pronunciado, não a atendendo como juridicamente relevante, sem que o arguido reagisse a tal posição, aceitando-a, mais não seria que surpreender a ofendida com uma decisão jurídica que, no entender do Ministério Público não é legitima, nem serve a justiça, principalmente quando estamos perante este tipo de ilícitos, de violência doméstica ou relacionados com este crime.

9 - Por conseguinte, salvo melhor e mais avisada apreciação de V.Exª.s, deverá negar-se provimento ao recurso, por infundado, mantendo-se na íntegra a douta decisão recorrida.

Mas certos estamos de que V. Exªs. decidireis como for de JUSTIÇA.”

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Neste tribunal da Relação, o Exmº P.G.A. emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, pelas razões referidas na resposta ao mesmo, invocando em favor, para além do acórdão referido nesta última, os Acs. da Rel. do Porto de 24/10/2007 e da Rel. de Coimbra de 12/3/2014 e 12/3/14

Cumprido que foi o disposto no artº 417º, nº 2, do C.P.P., não foi apresentada qualquer resposta.

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APRECIAÇÃO

Há duas questões a apreciar no presente recurso, sendo que se a primeira for procedente, o conhecimento da segunda fica prejudicado.

Assim:

1ª - Há que apreciar se a desistência da queixa apresentada pela vítima do crime de ofensa à integridade física pelo qual o arguido foi condenado deve levar à extinção do procedimento criminal;

2ª - Caso a resposta a essa questão seja negativa, há que apreciar se ocorreu a alegada nulidade de impossibilidade de audição da gravação do depoimento da referida vítima e, em caso afirmativo, se a mesma se encontra, ou não sanada.

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Para além do que já se deixou acima referido no relatório, há que ter em conta mais o seguinte:

- A fls. 66 dos autos, FR, vítima do crime de ofensa à integridade física pelo qual o arguido foi condenado, declarou não desejar procedimento criminal contra o arguido.

Quanto a isso, previamente à acusação, referiu-se:

“III. Da desistência de queixa manifestada por FAAR

Nos presentes autos investigam-se factos perpetrados por PFLT contra FAAR.

Tais factos ocorreram no interior da residência que ambos partilhavam, quando residiam em união de facto, e na presença da filha menor de ambos.

Foram ambos constituídos arguidos e interrogados nessa qualidade, tendo sido inquirida a testemunha que se encontrava presente na data dos factos e que terá assistido aos mesmos.

Consideramos que os factos perpetrados pelo arguido PFLT, contra a arguida FAAR são suscetíveis de consubstanciarem a prática de um crime de violência doméstica, p.p. pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea a) do Código Penal (e mais se diga, caso assim não se entenda de pelo menos um crime de ofensa à integridade física qualificado, p.p. pelo artigo 145.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 do Código Penal, com referência aos artigos 143.º, n.º 1 e 132.º, n.º 2, alíneas b) e e) do Código Penal).

Por essa razão, atenta a natureza do ilícito em causa, não revela nos autos o desejo manifestado por FAAR que declarou não desejar procedimento criminal, por falta de fundamento legal.”

- Como já se referiu, o arguido foi absolvido da prática do crime de violência doméstica e foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples.

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Entente o recorrente que atenta a natureza semi-pública do crime que afinal se considerou que o mesmo praticou, face à manifestação anteriormente demonstrada pela vítima do mesmo de não desejar procedimento criminal, deveria ele ter sido absolvido.

Tem o mesmo razão, com o devido respeito por opinião contrária.

Nos termos do artº 143º, nº 2, do Cód. Penal o crime de ofensa à integridade física simples depende de queixa.

Significa isto que nos termos do artº 116º, nº 2, do Cód. Penal, o queixoso pode desistir da queixa, desde que não haja oposição do arguido até à publicação da sentença na 1ª instância.

Ora, a vítima do crime pelo qual o arguido foi condenado, queixosa para este efeito, no decurso do inquérito demonstrou vontade de não ocorrer procedimento criminal contra o arguido, sendo tal declaração equivalente a desistência da queixa.

Só que, e bem, atenta a natureza pública do crime de violência doméstica então em causa, o Ministério Público considerou irrelevante tal declaração.

Acontece que a partir do momento em que o tribunal considera que, perante a não prova de determinados factos (e também por razões de direito), afinal o crime praticado tem natureza semi-pública, a declaração anteriormente prestada pela vítima passa a ter relevância, sob pena de ocorrer, como ocorreu, uma condenação do arguido contra a sua (da vítima) vontade.

Não se trata, como alega o recorrente, de falecer “legitimidade ao Ministério Público para deduzir acusação, por desistência de queixa expressamente manifestada nos autos”.

Quando acusou o Ministério Público tinha legitimidade para acusar como acusou, ao abrigo do artº 48º do C.P.P..

Como já se referiu, a desistência da queixa, ou demonstração de não desejo de procedimento criminal, pode ocorrer em várias fases do processo, até à publicação da sentença em 1ª instância e terá relevância, ou não, conforme a natureza do crime que esteja em causa, incluindo na sentença.

O que se pretende evitar é que o arguido seja condenado contra a vontade da vítima/queixosa por um crime em que essa vontade, ou falta dela, tem relevância jurídico-penal.

Nem há aqui qualquer surpresa para a vítima, ao contrário do que alega o Ministério Público na resposta ao recurso. Qual surpresa se ela própria tinha demonstrado vontade de não ocorrer procedimento criminal? A extinção do procedimento criminal é a sua vontade, sendo até certo que essa vontade nem pode ser alterada, conforme resulta da 2ª parte do nº 2 do artº 116º do Cód. Penal, nem tem que ser renovada, como refere o Exmº P.G.A. no seu parecer, face à nova natureza do crime que, afinal, se entendeu que o arguido praticou. A demonstração anterior de não desejo de procedimento criminal é “aproveitada” logo que seja possível, ou seja, a partir do momento em que o crime em causa tem natureza semi-pública.

O acórdão da relação de Guimarães de 9/12/19, referido na resposta ao recurso, e de onde certamente se “extraiu” a questão da surpresa, tem que ver com situação inversa à dos presentes autos.

Aí não havia queixa, o arguido foi acusado por crime com natureza pública e afinal foi condenado por crime com natureza semi-pública. Entendeu-se, nesse caso, não ser necessário que existisse queixa. Mas aqui não é isso que está em causa; é o contrário: o que há é demonstração e vontade de não procedimento criminal, equivalente a desistência de queixa.

Aliás, se bem se ler o conteúdo do referido acórdão, a determinado passo refere-se:

“Tendo-se o processo iniciado legitimamente, deve entender-se que assim permanece, sob pena de se surpreender agora a ofendida com uma exigência que não é razoável, ou seja, que prefigurasse e antecipasse a necessidade de satisfação uma condição de procedibilidade que, ao tempo em que podia ser exigida, enquanto pressuposto para a promoção do processo, não o era.

Sem prejuízo, claro está, de uma eventual desistência de queixa por parte da ofendida já constituir, ela sim, um obstáculo ao prosseguimento do processo.” (realce meu)

Ou seja: aí (e noutros acórdãos também aí referidos em nota de rodapé) entendeu-se que não era necessária a queixa para ocorrer condenação, mas se houvesse desistência da queixa, então sim, ela constituiria “um obstáculo ao prosseguimento do processo”.

Significa isto que, independentemente de se concordar, ou não, com o decidido no referido acórdão da relação de Guimarães (curiosamente proferido em apreciação de um recurso interposto pelo Ministério Público em benefício do arguido), não só não pode o mesmo ser invocado para sustentar a tese defendida pelo Ministério Público na resposta ao recurso, como no segmento acima realçado vem ao encontro do entendimento aqui expresso.

Também os restantes acórdãos referidos no parecer do Exmº P.G.A. não têm que ver com o caso dos autos, mas sim com a inversa:

- o acórdão da Rel. do Porto de 24/10/2007 já mereceu acima referência indirecta uma vez que é um dos referidos em nota de rodapé no também acima referido ac. da Rel. de Guimarães de 9/12/2019;

- o ac. da Rel. de Coimbra de 12/3/2014 (consultável em www.dgsi.pt) está sumariado da seguinte forma:

“I - A lei nova que altera a natureza do crime, de semi-público para particular, a menos que o processo ainda esteja em fase de inquérito e a acusação pública ainda não tenha sido deduzida, não assume qualquer relevância, por consubstanciar uma alteração de procedimentos que em nada afecta os direitos do arguido - o ofendido manifestou o desejo de perseguição criminal e o MP detinha, quando deduziu acusação, legitimidade para o efeito -, não sendo, por isso, de aplicar ao caso o disposto no n.º 4 do artigo 2.º do CP.

II - Em conformidade, se, no domínio da lei antiga, o crime era semi-público e o MP requereu, legitimamente, a aplicação de pena ao arguido em processo sumaríssimo - requerimento que, nos termos do disposto nos artigos 395.º, n.º 3, e 398.º, ambos do CPP, corresponde materialmente a uma acusação -, sanção que veio a ser imposta por despacho judicial, a entrada em vigor de nova lei, antes do trânsito em julgado daquela decisão, convertendo o ilícito penal em semi-público, não retira validade e eficácia aos referidos actos processuais.” (o realce é da minha autoria)

Como se vê, do que aí se tratava era de se saber que valor dar a anterior manifestação de desejo de perseguição criminal quando o crime tinha natureza semi-pública, tendo passado depois a ter natureza particular. Esta situação nada tem que ver com a dos autos, em que se trata de saber que valor dar a declaração contrária: não desejo de procedimento criminal quando crime era público, tendo afinal, o arguido sido entendido, após julgamento, que o crime praticado tinha natureza semi-pública.

- a mesma questão (diversa da destes autos, repete-se) era discutida no ac. da Rel. de Coimbra de 15/5/2013 (consultável também em www.dgs.i.pt), referido no texto do acima referido ac. de 12/3/2014 e do qual foi extraído o que consta no parecer como sendo também deste acórdão, mas consultável em www.dgsi.pt e não na C.J., XXXIX, 52.

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Assim sendo, a anterior manifestação de vontade expressa pela vítima, deve levar à extinção do procedimento criminal, e daí a presente decisão sumária nos termos da al. c) do nº 6 do artº 417º do C.P.P..

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Não há nos autos uma declaração expressa do arguido quanto à aceitação da desistência da queixa. Não há porque a questão não se punha.

Sendo certo que o arguido recorreu, pretendendo ser absolvido por virtude da anterior declaração feita pela vítima de não desejar procedimento criminal, parece-me ser evidente que ao incluir esse fundamento no seu recurso, está o mesmo a demonstrar que não se opõe aos efeitos dessa declaração.

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O conteúdo da presente decisão sumária, pode sumariar-se desta forma:

1 - Tendo o arguido sido acusado pela prática de um crime de natureza pública (violência doméstica), mas entendendo o tribunal que, perante a não prova de determinados factos e por razões de direito, afinal o crime praticado pelo arguido tem natureza semi-pública (ofensa à integridade física simples), deve, em vez de o condenar por esse crime, homologar anterior declaração da vítima de não desejar procedimento criminal contra o arguido e, em consequência, declarar extinto o procedimento criminal.

2 – Não existindo no processo manifestação do arguido de aceitação das consequências dessa declaração da vítima, tendo o mesmo recorrido com o fundamento, entre o mais, de que essa declaração deveria ter conduzido à sua absolvição, deve tal atitude ser entendida como não oposição à “desistência da queixa”.

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Face ao referido fica prejudicada apreciação da outra questão suscitada no recurso relativa às deficiências da gravação.

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DECISÃO

Em face do exposto, julgo procedente o presente recurso e, em consequência, revogo a sentença recorrida e, homologando a declaração prestada a fls. 66 pela vitima FR, declaro extinto o procedimento criminal contra o arguido.

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Évora, 26/6/2020