Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1728/22.0T8STR.E1
Relator: ALBERTINA PEDROSO
Descritores: PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
ACTO INÚTIL
Data do Acordão: 01/11/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I - O princípio do contraditório, previsto no art. 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, não é de aplicar em casos de manifesta desnecessidade, ou seja, em questões cuja resolução é simples e incontroversa, representando a audição das partes, nessas situações, um verdadeiro acto inútil.
II - Quando o valor da causa não permite a interposição de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, a convolação de um requerimento de reclamação de indeferimento de um recurso que nunca foi interposto numa alegação de recurso consubstancia a prática de um acto inútil, pelo que proibido nos termos do art. 130.º do Código de Processo Civil.
(Sumário elaborado pela relatora)
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[1]:
*****
I – RELATÓRIO
1. AA e mulher BB, réus melhor identificados nos autos acima referidos, notificados do despacho proferido em 2 de novembro de 2023, no qual foi proferida a seguinte decisão «ao abrigo do disposto nos artigos 6.º, n.º 1, e 652.º, n.º 1, alínea f), do CPC, incumbindo à ora relatora recusar o que for impertinente ou meramente dilatório, e constituindo a apresentada “reclamação” para o Supremo Tribunal de Justiça de um inexistente despacho de indeferimento do recurso, um incidente impertinente e dilatório, indefere-se a Reclamação apresentada.
Custas pelos Reclamantes, que se fixam em 2UC´s», vieram nos termos do artigo 652.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC), apresentar RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA, concluindo a pedir a prolação de «acórdão que a julgue procedente,
a) declarando a nulidade da decisão reclamada, por constituir uma decisão surpresa, em violação dos princípios do contraditório e da cooperação e, subsequentemente, ordenando a notificação dos Reclamantes para se pronunciarem sobre a sanação da nulidade processual, nos termos do art. 193..º, n.º 3 do CPC,
subsidiariamente,
b) procedendo à convolação do requerimento apresentado como reclamação em recurso, interposto ao abrigo do art. 672.º, n.º 1, alínea b) ou c) do CPC, ordenando a notificação dos Reclamantes para aperfeiçoarem o recurso».

2. Em fundamento da sua pretensão aduziram os seguintes fundamentos[2]:
«1. No douto despacho reclamado, a Veneranda Desembargadora Relatora indeferiu a reclamação apresentada, ao abrigo do disposto no art. 643 do CPC, porque não foi interposto qualquer recurso do acórdão da Relação de 28.09.2023 e, consequentemente, não foi proferido qualquer despacho de indeferimento do mesmo.
2. Os Reclamantes reconhecem a correção desta decisão, mas não a de não convolar a putativa reclamação em recurso. (…)
6. E, pese embora, a Veneranda Desembargadora Relatora tenha feito menção destas situações de admissibilidade de recurso, a verdade é que não cuidou de aferir se a reclamação indeferida, por não ser o meio processual adequado poderia ser convolada em recurso ao abrigo de uma das alíneas do n.º 2 do art. 629.º ou do n.º 1 do art. 672.º do CPC, tendo-se limitado a, de uma forma infundada e precipitada, a concluir, em sede de nota de rodapé, que tais normas não são aplicáveis à situação presente.
7. Ora, salvo o devido respeito, a decisão em crise, no que concerne à não convolação da nulidade processual é nula, por constituir uma decisão-surpresa, incorrendo, assim, em violação do princípio do contraditório.
8. Com efeito, a decisão viola, assim, nos termos e para os efeitos do artigo 3.º, n.º 3 do CPC, o princípio do contraditório na vertente proibitiva da decisão-surpresa. (…)
18. A essência do princípio do contraditório é justamente a oportunidade de as partes influenciarem a decisão final seja através da produção de prova, seja através do debate jurídico sobre a solução da causa. (…)
23. Consequentemente, a proibição da decisão-surpresa surge em virtude da salvaguarda da posição das partes no processo e dos direitos que o princípio do contraditório lhes confere. (…)
29. Ora conforme resulta do princípio do contraditório e da proibição da decisão-surpresa, estes princípios são transversais a todas as fases do processo, e aplicáveis mesmo em situações do conhecimento oficioso do tribunal, como é o caso.
30. livre aplicação do direito pelo Tribunal não pode ser arbitrária, sem que às partes tenha sido dada a oportunidade de se pronunciarem.
31. Acresce ainda que a par da violação do princípio do contraditório e do princípio da proibição da decisão-surpresa, está-se, também, perante a violação do princípio da cooperação, conforme disposto nos termos do artigo 7.º, n.º 1 do CPC. (…)
36. Revertendo ao caso em apreço, verifica-se que estamos perante uma decisão do conhecimento oficioso do tribunal, uma vez que dita o mencionado o n.º 3 do artigo 193.º do CPC, que “o erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando-se que se sigam os termos processuais adequados” (sublinhado nosso).
37. Contudo, conforme sobejamente demonstrado, mesmo no caso de decisões do conhecimento oficioso deve-se dar oportunidade às partes para se pronunciarem, em observância do princípio do contraditório e do princípio da cooperação.
38. Pelo que no caso sub judice, deveria a Veneranda Desembargadora Relatora notificado as partes para se pronunciarem sobre a possibilidade de convolação da reclamação apresentada no meio processual adequado.
39. Ao decidir como fez, sem ter dado essa oportunidade, proferiu uma decisão-surpresa.
44. Nestes termos, e por tudo o exposto, deve a decisão reclamada ser considerada nula por excesso de pronúncia, por violação do disposto nos artigos 3.º, n.º 3, artigo 7.º, artigo 615.º, n.º 1, alínea d), artigo 613.º, n.º 3 e artigo 666.º, n.º 1, todos do CPC, devendo ser substituída, por outra que ordene a notificação das partes para se pronunciarem sobre a possibilidade de convolação da reclamação no meio processual adequado.
45. Até porque se tivesse sido ordenada a notificação das partes para se pronunciarem antes da prolação da decisão aqui em crise, os Reclamantes estariam em tempo de adaptar, adequar, melhorar ou retificar o requerimento apresentado.
46. Recorde-se que o acórdão da Relação foi notificado por ofício de 28.09.2023, logo o prazo de interposição de recurso do mesmo terminaria a 02.11.2023, ou seja, na mesma datada prolação da decisão reclamada e da sua notificação às partes,
47. O que teria permitido aos Reclamantes adequarem ainda o requerimento apresentado ao meio processual próprio.
48. Deste modo, em face de todo o exposto, a interpretação e aplicação da norma contida no n.º 3 do art. 193.º do CPC no sentido de que pode o tribunal corrigir o erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte, sem a prévia notificação às partes para se pronunciarem e sem puderem adequar o referido meio processual ao próprio, quando ainda estão em tempo, é inconstitucional por limitar de forma inadmissível os direitos dos requeridos constitucionalmente consagrados nos artigos 13º nº. 1 e 20º nº. 1 da Constituição, de exercício do contraditório e de acesso aos Tribunais, enquanto direito de ação e de defesa.
49. Mais, a interpretação e aplicação da norma contida no n.º 3 do art. 193.º do CPC no sentido de que pode o tribunal corrigir o erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte, sem a prévia notificação às partes para se pronunciarem é também inconstitucional por limitar de forma inadmissível os direitos dos requeridos constitucionalmente consagrados nos artigos 13º nº. 1 e 20º nº. 1 da Constituição, de exercício do contraditório e de acesso aos Tribunais, enquanto direito de ação e de defesa.
50. Sem prejuízo do exposto, acresce ainda o seguinte:
51. Contrariamente ao decidido pela Veneranda Desembargadora Relatora, a reclamação apresentada, enquanto meio processual desadequado e nos termos constantes da mesma, poderia ter sido convolada em recurso do acórdão da Relação de 28.09.2023.
DEMONSTRANDO:
52. Como já referido supra, o requerimento em causa foi apresentado dentro do prazo de interposição de recurso.

II. TRAMITAÇÃO PROCESSUAL
1. Notificados do acórdão proferido nestes autos, os ora requerentes apresentaram a “reclamação” do despacho de indeferimento do recurso – que, por não o poder ser, já que não havia sido interposto qualquer recurso, veio a ser considerada incidente e indeferida pelo despacho da relatora que fundou o requerimento da presente conferência –, fazendo-o com o seguinte intróito: «não se conformando com o douto acórdão proferido por V/Exa. vêm, nos termos do n.º 1 do artigo 643.º do CPC apresentar Reclamação contra o indeferimento do recurso dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça.
Por estar em tempo e ter legitimidade, requer a V. Ex.ª que se digne admiti-la.».
Com efeito, na apreciação do requerimento apresentado, constatou a ora relatora, conforme então enunciado, que:
«2. Compulsados os autos verifica-se que, em 28 de setembro de 2023, foi proferido neste Tribunal da Relação acórdão, por unanimidade, julgando improcedente a apelação interposta pelos réus da sentença que declarou cessado o contrato de arrendamento, condenando-os a restituírem à autora o locado e a pagarem a quantia mensal de 800,00€, desde a data da mora na restituição do locado, até à sua efetiva entrega, acrescida dos juros que se vençam desde a data do trânsito em julgado da sentença e até integral pagamento.
3. Acontece que, desse acórdão não foi apresentado recurso de revista e, consequentemente, não foi proferido qualquer despacho de indeferimento do recurso.
Com efeito, não obstante os reclamantes refiram que apresentam «ao abrigo do artigo 643 do CPC a devida RECLAMAÇÃO CONTRA O INDEFERIMENTO do recurso proferido nos autos acima mencionados», basta ver os fundamentos apresentados para que se evidencie que dissentem do acórdão prolatado nos autos e visam junto do Supremo Tribunal de Justiça (sic):
«a) A reconsideração da decisão que indeferiu o recurso, determinando o seu processamento e análise pelo Tribunal;
b) A intimação das partes, para que se manifestem sobre o recurso;
c) A realização de todos os atos necessários para o prosseguimento do recurso, inclusive a designação de data para julgamento;
d) Outras providências que Vossa Excelência entender cabíveis para a justa apreciação deste pedido».
Poderia cogitar-se, pelos fundamentos expostos, que os apresentantes queriam afinal interpor recurso de revista e denominaram indevidamente “reclamação” a sua peça processual, caso em que seria de apreciar se estaríamos perante a existência de uma nulidade processual manifestada pelo uso de um meio processualmente inadequado, a ser sanada oficiosamente, como se dispõe expressis verbis no n.º 3 do artigo 193.º do CPC, nos termos do qual “o erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando-se que se sigam os termos processuais adequados”.
Porém, na situação concreta em presença, e independentemente da existência de dupla conforme[3], a possibilidade de convolação do requerimento apresentado é manifestamente inviável, já que, atento o valor da causa (16.400,00€), os presentes autos não admitem recurso de revista (cfr. artigos 629.º, n.ºs 1 e 3 do CPC).
4. Assim, na espécie, e como é muito evidente, não tendo sido apresentado perante este Tribunal recurso de revista cujo requerimento haja sido indeferido – única situação a que se aplicaria o disposto no artigo 643.º do CPC, já que a “reclamação contra o indeferimento” não se confunde, como fazem os reclamantes, com a improcedência do recurso de apelação –, atenta a inexistência de despacho de indeferimento do recurso, a “Reclamação contra o indeferimento do recurso dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça”, que constitui o presente apenso, não tem objeto, uma vez que, pura e simplesmente não podia ter havido rejeição (por intempestividade, irrecorribilidade, etc.) de peça processual que não foi apresentada!
Nestes termos, ao abrigo do disposto nos artigos 6.º, n.º 1, e 652.º, n.º 1, alínea f), do CPC, incumbindo à ora relatora recusar o que for impertinente ou meramente dilatório, e constituindo a apresentada “reclamação” para o Supremo Tribunal de Justiça de um inexistente despacho de indeferimento do recurso, um incidente impertinente e dilatório, indefere-se a Reclamação apresentada.
Custas pelos Reclamantes, que se fixam em 2UC´s».

III. APRECIAÇÃO
Como resulta expresso dos pontos 1 e 2 acima transcritos da reclamação apresentada para a conferência do mencionado despacho da ora relatora, os requerentes reconhecem a correção da decisão na parte em que «a Veneranda Desembargadora Relatora indeferiu a reclamação apresentada, ao abrigo do disposto no art. 643 do CPC, porque não foi interposto qualquer recurso do acórdão da Relação de 28.09.2023 e, consequentemente, não foi proferido qualquer despacho de indeferimento do mesmo», mas dissentem do facto de não ter convolado «a putativa reclamação em recurso».
Porém, salvo o devido respeito, não lhes assiste qualquer razão.
Com efeito, discorrendo longamente e com judiciosas citações, sobre a necessidade de cumprimento do princípio do contraditório e do direito das partes a influenciarem qualquer decisão do tribunal, ainda que prolatada em questão de conhecimento oficioso, entendem ser nula por excesso de pronúncia a decisão recorrida, por constituir uma decisão surpresa, em virtude de não lhes ter dado previamente a possibilidade de se pronunciarem sobre a parte do despacho em que afirmou não ser caso de convolação da reclamação em recurso.
Ora, se abstratamente as considerações tecidas nos merecem concordância estando, aliás, por nós afirmadas em diversos arestos proferidos designadamente neste Tribunal da Relação[4], a verdade é que não se aplicam à situação em presença.
Com efeito, casos existem em que tal audição prévia não é necessária, tendo o legislador excecionado precisamente os casos de manifesta desnecessidade.
Com interesse a este respeito do funcionamento da exceção ao dito princípio, a que alude o n.º 3 do artigo 3.º do CPC, afirmou-se no Acórdão deste Tribunal da Relação de 28.03.2019[5] que «impõe-se afinar o conceito de “manifesta desnecessidade” tendo presente que casos existem em que, não obstante se tratar de questões processuais ou de mérito, de facto ou de direito, não suscitadas pelas partes, estas tinham obrigação de prever que o tribunal podia decidir tais questões em determinado sentido, como veio a decidir, pelo que se não as suscitaram e não cuidaram em as discutir no processo, sibi imputet, não podendo razoavelmente considerar-se que, nesses casos, a decisão proferida pelo tribunal configure uma decisão-surpresa”.
A referida disposição legal limitou a imperiosa observância do contraditório aos casos em que a considerou justificada, dispensando-a nos casos de “manifesta desnecessidade” isto é “quando – nomeadamente por se tratar de questões simples e incontroversas – tal audição se configure como verdadeiro ‘acto inútil’(…) só deverá ter lugar quando se trate de apreciar questões jurídicas susceptíveis de se repercutirem, de forma relevante e inovatória, no conteúdo da decisão e quando não fosse exigível que a parte interessada a houvesse perspectivado durante o processo, tomando oportunamente posição sobre ela”. (…)
São, pois, proibidas as decisões surpresa, isto é, as decisões baseadas em fundamento que não tenha sido previamente analisado pelas partes. A surpresa que se visa evitar não se prende com o conteúdo, com o sentido, da decisão em si mas com a circunstância de se decidir uma questão não prevista. Visa-se evitar a surpresa de se decidir uma questão com que se não estava legitimamente a contar. (…)
Assim, o exercício do contraditório é, sempre, justificável e desejável se puder gerar o efeito que com ele se pretende – permitir que a pronúncia das partes possa influenciar a decisão do Tribunal».
Ora, a questão que se coloca in casu é precisamente a de saber se o indeferimento de uma reclamação a despacho inexistente configura na espécie uma questão não prevista com a qual os ora reclamantes não podiam legitimamente contar.
Adiantando a resposta, cremos que a mesma não pode deixar de ser negativa, o que, aliás, os mesmos aceitam. Donde, e do mesmo modo, não pode considerar-se necessária a prévia audição dos recorrentes quanto ao segmento do qual verdadeiramente dissentem, em que a relatora expressou que «Poderia cogitar-se, pelos fundamentos expostos, que os apresentantes queriam afinal interpor recurso de revista e denominaram indevidamente “reclamação” a sua peça processual, caso em que seria de apreciar se estaríamos perante a existência de uma nulidade processual manifestada pelo uso de um meio processualmente inadequado», porquanto os mesmos omitem o que vem afiançado em seguida.
Com efeito, a ora relatora afirmou seguidamente a razão pela qual não haveria que cogitar aquela possibilidade: é que o valor da causa pura e simplesmente não admite recurso de revista, donde a desnecessidade de apreciação da possibilidade de convolação. Tal consta expressamente afirmado no segmento em que, após aquela afirmação, foi referido «Porém, na situação concreta em presença, (…) a possibilidade de convolação do requerimento apresentado é manifestamente inviável, já que, atento o valor da causa (16.400,00€), os presentes autos não admitem recurso de revista (cfr. artigos 629.º, n.ºs 1 e 3 do CPC).
Consequentemente, o caso em presença é um caso óbvio de manifesta desnecessidade de audição prévia porquanto os requerentes, patrocinados que se encontram por Ilustre Advogado, não desconhecem que o recurso de revista, mesmo nos casos em que é admissível a revista excecional, depende da verificação dos demais pressupostos de admissibilidade, e concretamente de que o valor da causa admita recurso de revista.
Trata-se de jurisprudência sedimentada do Supremo Tribunal de Justiça, da qual se cita exemplificativamente e por ser o mais recente aresto proferido que se encontra publicado, o acórdão de 19.12.2023, proferido no processo n.º 6457/20.6T8STB-A.E1.S1, «Da decisão proferida no âmbito de embargos de executado com o valor de € 13.960,00 não é admissível recurso de revista excepcional, uma vez que, situando-se a alçada da Relação, em matéria cível, no valor de € 30 000,00, faltam os pressupostos gerais de recorribilidade, atinente ao valor da causa».
Na fundamentação desse aresto, em que a parte tinha interposto recurso de revista excecional, afirmou-se claramente que:
«Não está em causa a existência de dupla conformidade entre a decisão da 1ªinstância e a da Relação.
Também não está em causa que a revista excepcional pressupõe o preenchimento dos pressupostos gerais do recurso, como decorre,, aliás do despacho do relator. Essa é, aliás, a jurisprudência corrente do Supremo (cfr. Ac. STJ de 22.2.2018, proc. 2219/13.5T2SVR.P1.S1, Ac. STJ de 22.6.2017, proc. 1804/15.5T8CBR-A.C1-A.S1, Ac. STJ de 21.1.2016, proc. 12410/12.7YIPRT-A.L1-A.S, todos em www.dgsi.pt; Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, págs. 378, 387 e 389)
Sucede, no entanto, que o relator não atentou no valor da causa – € 13.960,00- que é inferior à alçada do Tribunal da Relação, que é de € 30.000,00 (art. 44º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013, de 26.8, que aprovou a Lei de Organização do Sistema Judiciário).
Como assim, e por força do disposto no art. 629º, nº 1 do CPC, aqui aplicável, também, por força do art. 854º do mesmo diploma, o acórdão não admite o recurso de revista».
Assim, atento o valor da causa, a revista não é admissível in casu, em qualquer uma das suas modalidades possíveis, donde a pretendida convolação consubstanciaria a prática de um ato inútil, vedado pelo artigo 130.º do CPC.
Nestes termos, e sem necessidade de maiores considerações, improcede não apenas a nulidade arguida como a pretensão veiculada pelos requerentes de verem convolado o requerimento apresentado para recurso de revista.

IV. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta conferência, na improcedência da reclamação, em confirmar o despacho da relatora que, atento o valor da causa, julgou não ser de convolar para requerimento de recurso de revista, mesmo excecional, a “reclamação” apresentada para o Supremo Tribunal de Justiça de um inexistente despacho de indeferimento do recurso, considerando-o um incidente impertinente e dilatório, e consequentemente, indeferindo-o.
Sendo agora decisão da conferência, as custas devidas pelos Reclamantes, fixam-se em 3UC´s.
*****
Évora, 11 de janeiro de 2024
Albertina Pedroso [6]
José António Moita
Ana Pessoa


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[1] Relatora: Albertina Pedroso; 1.º Adjunto: José António Moita; 2.ª Adjunta: Ana Pessoa.
[2] Que se transcrevem apenas na parte relevante para a compreensão da respetiva pretensão, expurgando as citações doutrinárias e jurisprudenciais.
[3] Sob a epígrafe Decisões que comportam revista dispõe o artigo 671.º, n.º 3, do CPC que, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvos os casos em que o recurso é sempre admissível a que alude o artigo 629.º, n.º 2, ex vi n.º 2 do citado artigo 671.º, não aplicáveis à situação presente, e os que admitem revista excecional, que também não se colocam no caso.
[4] Cfr., a título meramente exemplificativo dessas considerações genéricas, o acórdão de 25.01.2023, proferido no processo n.º 2444/20.2T8STB.E1, disponível em www.dgsi.pt.
[5] Proferido no processo n.º 208/10.0TBRDD-B.E1, seguindo o entendimento já vertido no citado Acórdão do TRG de 19.04.2018, proferido no processo n.º 533/04.0TMBRG-K.G1, que se louvou na doutrina expressa por LEBRE DE FREITAS, JOÃO REDINHA e RUI PINTO, in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1º, 1999, págs. 10, 33 e 34.
[6] Texto elaborado e revisto pela ora Relatora, e assinado eletronicamente pelos 3 desembargadores que compõem esta conferência.