Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
5668/11.0TDLSB-E.E1
Relator: ALBERTO BORGES
Descritores: NULIDADE
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE
Data do Acordão: 11/10/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: É o princípio constitucional da igualdade que determina a aplicação de idênticas regras na operação do cúmulo jurídico contemporânea ou posterior à condenação por cada um dos crimes e, igualmente, é ele que justifica que não ocorra em sentido técnico estrito trânsito em julgado em relação à pena única enquanto for possível a realização de novo cúmulo jurídico.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora.

Na sequência do acórdão proferido por este tribunal em 14.07.2020, no qual foi decidido negar “provimento ao recurso interposto pelo arguido recorrente e, consequentemente, em confirmar a decisão recorrida”, vem o arguido JFAS, aí melhor identificado, arguir a nulidade do mesmo, ex vi art.º 379 n.º 1 al.ª c) do CPP, por omissão de quanto à inconstitucionalidade suscitada.

Notificado o Ministério Público junto deste tribunal e os demais intervenientes processuais, cumpre decidir.

É nula a sentença “quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar…” (art.º 379 n.º 1 al.ª c) do CPP), entendendo-se por questões “os problemas concretos a decidir e não as razões, no sentido de simples argumentos, opiniões, motivos ou doutrinas expendidas pelos interessados na apresentação das respetivas posições, na defesa das teses em presença” (acórdão do STJ de 14.05.2009, in www.dgsi.pt).

No caso em apreço alega o recorrente que, “no que tange à eventual violação do princípio da igualdade limita-se a uma mera afirmação tabelar” (e alegara, em sede e motivação do recurso, que a interpretação que foi feita na decisão recorrida do art.º 46 do CP “torna a norma inconstitucional, face ao que decorre do princípio da igualdade plasmado no art.º 13 n.º 1 da Constituição da República, que proíbe, justamente, «desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável.

Essa questão, contrariamente ao alegado, e concorde-se ou não com o decidido, foi apreciada e decidida no acórdão cuja nulidade vem arguida, em termos expressos e bem claros, como se vê a fol.ªs 8 e 9, onde, depois de fundamentar e suportar jurisprudencialmente a posição que veio a ser assumida nesse acórdão, se concluiu, fazendo apelo ao que a esse propósito se escreveu no acórdão da RC de 15.12.2016, in www.dgsi.pt:

1) Que “o pressuposto que está na base das mesmas regras, seja o concurso conhecido integralmente ou não no momento da condenação pela prática de cada um dos crimes, é o de garantir tratamento igual em ambos os casos, sendo precisamente o princípio constitucional da igualdade que determina a aplicação de idênticas regras na operação do cúmulo jurídico contemporânea ou posterior à condenação por cada um dos crimes e, igualmente, é ele que justifica que não ocorra em sentido técnico estrito trânsito em julgado em relação à pena única enquanto for possível a realização de novo cúmulo jurídico… só assim se garante efetivo tratamento igual do que é igual… a pena única final que reúna as penas parcelares aplicadas por cada um dos crimes em concurso não pode ter resultado diferente em função do momento da realização das operações de cúmulo jurídico, posto que tal não constitui circunstâncias que possa e deva influir no doseamento da pena”.

2) E que, por isso – como se infere do que se deitou dito – não se vê que “tal entendimento colida com qualquer preceito constitucional, designadamente com o princípio da igualdade, pelo contrário, como se escreveu neste último acórdão, é exatamente o respeito pelo princípio da igualdade que as regras de concurso – seja no caso de julgamento conjunto pela prática de vários crimes, seja no caso de cúmulo realizado em consequência de conhecimento superveniente do concurso – são as mesmas num e noutro caso, não interferindo na determinação da pena única o facto de alguma das penas de prisão parcelares ter sido (ou não) substituída por uma pena não detentiva…”.

Carece de fundamento, por isso, a invocada nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto nos art.ºs 379 n.º 1 al.ª c) e 374 n.º 2 do CPP, pois que o tribunal – repete-se – apreciou e deixou bem claras as razões pelas quais, no seu entender, a interpretação do art.º 46 do CP acolhida na decisão recorrida não violava o princípio da igualdade.

Assim, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a 1.ª Subsecção Criminal deste tribunal em indeferir a nulidade arguida pelo recorrente.

Custas do incidente pelo arguido requerente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (art.º 8 n.º 9 e Tabela III do Regulamento das Custas Judiciais).

(Este texto foi por mim, relator, elaborado e integralmente revisto antes de assinado)

Évora, 10/11/2020

(Alberto João Borges)

(Maria Fernanda Pereira Palma)