Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
82/20.9T8BJA.E1
Relator: MOISÉS SILVA
Descritores: ASSÉDIO
CONTRATO DE TRABALHO
RETRIBUIÇÃO
ALTERAÇÃO DO CONTRATO
FUNÇÕES DE CHEFIA
RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
JUSTA CAUSA
Data do Acordão: 07/14/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
i) a trabalhadora que passa a exercer funções às quais corresponde retribuição mais elevada, tem direito ao pagamento dessa retribuição se for superior àquela que auferia antes do início das novas tarefas.
ii) o assédio moral implica comportamentos continuados, praticados diretamente pelo empregador ou através de superiores hierárquicos ou colegas de trabalho, que sejam humilhantes e atinjam a dignidade do trabalhador, em que este resultado tem como causa adequada aquela conduta assediante, tendo associado um objetivo final ilícito ou eticamente reprovável.
iii) constitui assédio moral a conduta da superior hierárquica, por si e através de outra trabalhadora, consistente em desautorizar continuada e diariamente as competências funcionais da trabalhadora perante os subordinados desta, dizendo-lhe que “tinha de calar-se, ouvir e baixar as orelhas como os burrinhos”, que teve como resultado que esta se sentisse desprezada, humilhada, e deprimida, com crises de choro frequentes quer no trabalho, quer em casa, com grande dificuldade em diariamente ir para o trabalho, e que a levou a decidir resolver o contrato de trabalho com justa causa. (sumário do relator).
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO

Apelante: V… (autora).
Apelada: Bribeja – Sociedade Distribuidora de Bricolage, Lda (ré).

Tribunal Judicial da Comarca de Beja, Juízo do Trabalho.

1. A autora veio propor ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra a ré, pedindo que:
1. Seja declarada a licitude da resolução do contrato por parte da A.; e
2. Seja a R. condenada a pagar à A. as quantias reclamadas, a título de prestações retributivas e indemnização por justa causa de resolução, no montante global de € 15 445,50, acrescido de juros, à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
Alegou, em síntese que trabalhava por conta da R. e que foi humilhada e se viu forçada a cessar a relação laboral, devido a comportamentos reiterados da entidade patronal, através de atitudes e iniciativas de seus representantes, que inviabilizou de todo e definitivamente a relação laboral, por violação dos direitos da trabalhadora e a levaram a rescindir o contrato com justa causa. Assim sendo tem a autora direito a uma indemnização por justa causa bem como a créditos laborais relacionados com diferenças remuneratórias, por não receber como chefe de secção, cargo que ocupava, assim como férias e subsídio de férias do ano de cessação do contrato.
Juntou documentos e arrolou testemunhas.
Teve lugar a audiência de partes a que alude o artigo 54.º, do Código de Processo Trabalho, não se tendo logrado a conciliação entre as partes, pelo que foi desde logo designada data para realização da audiência de discussão e julgamento.
A ré contestou, alegando, em síntese serem falsos os factos articulados pela autora e, consequentemente, não se verificar qualquer justa causa para a resolução do contrato por parte da autora.
Foi proferido despacho de saneamento, no qual foi fixado o objeto do litígio e dispensada a enunciação dos temas de prova.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento, como consta da ata respetiva.

2. Foi proferida sentença com a decisão seguinte:
Em face de tudo quanto se deixou exposto, julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência;
a) Condeno a ré a pagar à autora a quantia de € 1 280 (mil duzentos e oitenta euros) a título de retribuição dos proporcionais de férias respeitantes ao ano de cessação do contrato e respetivo subsídio, a que acrescem juros de mora à taxa civil desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.
b) Absolvo a ré do demais peticionado.
Custas a cargo de autora e ré, na proporção do decaimento, que se fixa em 92% para a autora e 8% para a ré (artigo 527.º n.º 1 do Código de Processo Civil).
O valor da ação foi fixado no despacho saneador (€15 445,50 (quinze mil, quatrocentos e quarenta e cinco euros e cinquenta cêntimos).

3. Inconformada, veio a A. interpor recurso de apelação que motivou e com as conclusões que se seguem:
1 - A recorrente viu os seus direitos mais fundamentais violados de forma inadmissível;
2 – Foi-lhe criado um ambiente de trabalho hostil;
3 - Foi humilhada pela sua entidade patronal.
4 - Nas relações laborais há claramente uma obrigação recíproca de respeito (de parte a parte) e não há lugar para tratamentos injuriosos, nem discriminatórios, que ataquem a dignidade do trabalhador ou mesmo que o humilhem e rebaixem como pessoa.
5 - Não foi feita justiça a uma trabalhadora vítima de assédio moral.
6 - Que foi tratada de forma humilhante e que foi injuriada e diminuída por parte da sua entidade patronal:
7 –“Você está a ser insolente! Você está a ser insolente! Você tem que baixar as orelhas, assim como os burrinhos e ouvir e calar!
E aí para mim foi, foi o cair no fundo!”
8 - A apelante não se pode conformar com a Sentença proferida nestes autos;
9 - O Tribunal a quo desvalorizou e menorizou situações gravíssimas e inadmissíveis em qualquer contexto, ademais no âmbito das relações laborais.
10 - Os factos e considerados como provados impõem a procedência in totum do seu pedido.
11 – E devem ser severamente censurados e jamais admitidos.
12 – A atuação diária de perseguição, perpetrada pela Chefe de Loja causaram na autora grande desconforto;
13 – Mal-estar, tristeza;
14 – Fê-la sentir-se desautorizada, preterida;
15 – Desprezada, humilhada;
16 – Tinha frequentes crises de choro;
17 – Fê-la sentir-se desconfortável, insegura, nervosa;
18 – Os seus dias de trabalho eram cada vez mais penosos, em constante stress;
19 – Tinha dificuldades em dormir;
20 – Precisou apoio médico;
21 – Na organização dum jantar da empresa viu-se discriminada e humilhada pela gerência;
22 – Fruto disso ainda foi alvo de chacota dos colegas;
23 - A autora ascendeu à categoria profissional de Chefe de Secção;
24 - Com as novas funções tinha mais responsabilidades, passando a gerir fornecedores e funcionários do seu setor;
25 - Tais funções não lhe trouxeram aumento na remuneração, o que se impunha ter ocorrido;
26 - E provadas que se mostram as diferenças salariais que existiam entre a autora/recorrente e a retribuição que era paga à trabalhadora que a autora substituiu quando foi promovida, deve proceder o pedido da recorrente aduzido nessa parte.
27 – O efeito jurídico a extrair dos factos provados deve impor a procedência da pretensão da recorrente.
28 – Deve ser declarada a licitude da resolução do contrato por parte da A. e a R. condenada a pagar à A. as quantias reclamadas, a título de prestações retributivas e indemnização por justa causa de resolução, no montante global de € 15 445,50, acrescido de juros, à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
29 - Os factos alegados pela autora são verídicos, por terem resultado provados;
30 - Nem na contestação nem nos depoimentos do casal gestor, a R. admitiu os factos que vieram a ser dados como provados.
31 - Ana Cordeiro ao ser questionada quanto aos factos de 19/11, convocou para julgamento o que já vinha dito na contestação e que se veio a verificar não corresponder à verdade.
32 - Os factos elencados sob as letras D, F e I, considerados não provados na Sentença, devem ser considerados provados;
33 - Ao constatar-se provado que haviam salários inferiores e superiores ao da apelante, mas que esta foi substituir uma trabalhadora que auferia remuneração superior, o Tribunal a quo devia ter feito constar nos factos provados que a trabalhadora, foi empossada num lugar de chefia que era remunerado com € 705;
34 – Alteração nos factos não provados na Sentença sob as alíneas D, F e I;
contradição com os factos provados:
- D:
“A funcionária S… alterasse os planos de trabalho elaborados pela autora diariamente.”
Este facto resulta claramente provado até por acordo das partes, dado que provado por acordo o facto n.º 14, para termos uma decisão coerente e não contraditória, o facto D deve ser considerado provado por acordo das partes e ser aditado aos provados. Se a funcionária S… não estava afeta à secção da A., dava ordens de serviço aos funcionários e estes os cumpriam em detrimento da sua chefe, por receio da dona da Loja, então, a funcionária Sara alterava os planos de trabalho elaborados pela autora.
- I:
“A Sra. A… é uma pessoa que trata os trabalhadores de forma altiva, agressiva e insultuosa.”
Este facto pugna por ser considerado provado, face ao teor da prova produzida, mormente os depoimentos das testemunhas A… (12m48s a 14m30s), L… (19m06s a 23m), conjugados com as declarações da Autora (43m48 a 46m48s).
- F
“Os chefes de secção da ré auferem a quantia de e 690.”
Tendo resultado provado que a A. foi empossada em funções remuneradas de forma superior ao que auferia, à A. deveria ter sido o atribuído o salário de € 705 e a Sentença deveria condenar a ré na satisfação das diferenças salariais, por uso do disposto no art.º 74.º do CPT – Condenação extra vel ultra petitum.
Deve, pois ser aditado um novo facto ao elenco dos provados:
“A Autora passou a desempenhar funções de chefe de secção, substituindo a trabalhadora M… que auferia a remuneração de € 705 desde agosto de 2019.”
35 - Pontos de facto incorretamente julgados:
 Os factos indicados no elenco “não provados” sob as letras D e I, devem ser considerados provados.
 Deve ser aditado um novo facto com a seguinte redação: “A Autora passou a desempenhar funções de chefe de secção, substituindo a trabalhadora M… que auferia a remuneração de € 705 desde agosto de 2019.”
36 - Concretos meios de prova constantes do processo que impõem decisão diversa:
Facto D
Acordo das partes e coerência com o facto 14
Facto I
Depoimento de A… - 12m48s a 14m30s; depoimento de L… – 19m06s a 23m; depoimento da autora, em especial na passagem entre os 43m48 e os 46m48s
Facto novo a aditar
Deve ser aditado um novo facto com a redação indicada em 36, parte final
- Listagens remuneratórias constantes dos autos e que evidenciam a remuneração de M….
37 - A Sentença recorrida viola o disposto nos art.º 13.º, 25.º e 59.º da CRP, 70.º, do Código Civil, 29.º, 74.º e 127.º, do CT e 74.º, do CPT.
38 - Uma correta aplicação das normas indicadas deve levar à procedência dos pedidos deduzidos pela autora/recorrente.
39 – E deve ser efetuada a comunicação a que alude o art.º 78-A, do CPT ao ISS, IP.
40 - A Sentença recorrida deve ser substituída por Acórdão que considere resolvido com justa causa por parte da trabalhadora o contrato de trabalho e que condene a ré na satisfação das quantias peticionadas.
TERMOS EM QUE,
Deve o presente recurso ser recebido e ser a sentença recorrida substituída por Acórdão que evidencie a razão da autora/recorrente, considere lícita a resolução do contrato com justa causa por parte da apelante e condene a ré no pagamento das quantias peticionadas.

4. A ré não respondeu.

5. O Ministério Público junto desta Relação emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento, pelo que deve ser mantida a sentença recorrida.

6. Dispensados os vistos, por acordo, em conferência, cumpre apreciar e decidir.

7. Objeto do recurso

O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das alegações formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso.
As questões a decidir são as seguintes:
1 – Reapreciação da matéria de facto impugnada;
2 – Justa causa para a resolução do contrato de trabalho e demais créditos reclamados.

II - FUNDAMENTAÇÃO
A) DE FACTO
A sentença recorrida deu como provados os factos seguintes:
1) Em 8 de outubro de 2002, A e R acordaram que a primeira prestava a sua atividade profissional de operadora ajudante de supermercado, passando posteriormente a Operadora de supermercado especializada, na Loja Bricomarché de Beja, mediante a contrapartida do pagamento por parte da ré de uma retribuição mensal que, atualmente, ascendia a € 640, a que acrescia € 4 de subsídio de almoço, por cada dia de trabalho efetivo.
2) A A. esteve ininterruptamente ao serviço da R. e sempre sob as ordens, autoridade e direção daquela até 19 de dezembro de 2019, data em que a A. comunicou à R. que se despedia com justa causa, por carta cujo teor se dá por reproduzido e que consta de fls. 11 a 14 dos autos:
3) A esta carta a ré respondeu, refutando os factos relatados pela trabalhadora.
4) Em março de 2018 a R. passou a ter nova gerência, composta pelo Sr. J…, casado com a Sra. A…, que passou a exercer funções de Chefe de Loja.
5) Estes têm formas de atuação diferentes no trato humano, sendo o primeiro mais atencioso e a segunda mais reservada.
6) Por suspeitarem de irregularidades no comportamento do então Chefe de Loja e da irmã deste M…, acordaram com estes a cessação dos respetivos contratos de trabalho.
7) A Sra.ª A… presença diária na loja, trabalha ao lado dos funcionários, e, enquanto chefe de Loja, emite diretrizes e atribui diretamente tarefas aos funcionários.
8) Em julho de 2019, o Sr. J…, representante da ré, comunicou à A. que passaria a desempenhar funções de Chefe da Secção de Decoração, substituindo nas funções uma colega que estava de baixa e posteriormente saiu da empresa.
9) Com estas novas funções passou a A. a ter mais responsabilidades, nomeadamente na gestão e distribuição de tarefas entre os colegas, na gestão de fornecedores, de encomendas, bem como no contacto com clientes nas situações de reclamações e passou a ter um cartão com o nome de “Supervisor”, que lhe permitia, entre outras, anular ações e efetuar trocas.
10) No início do desempenho das novas funções a autora sentia-se animada.
11) Porém, a partir do início de setembro, começou a sentir dificuldades em organizar o seu trabalho e o trabalho dos trabalhadores da equipa que chefiava.
12) Na realidade à autora era pedido que elaborasse planos de trabalho, os quais continham a distribuição de tarefas diárias e semanais a realizar pelos trabalhadores do seu setor.
13) Porém, quer a autora quer os colegas da sua equipa tinham dificuldade em cumprir tais tarefas e ainda as tarefas que a Chefe de Loja, D.ª A…, lhes ia atribuindo diariamente e que não estavam contempladas nesses planos.
14) Para além disso a trabalhadora S…, que não estava afeta à secção de decoração, atuando em nome da Chefe de Loja, dava ordens de serviço quer à autora quer aos demais trabalhadores do sector de decoração e estes, antes de acatar qualquer indicação da autora, certificavam-se que a funcionária S… estava de acordo, pois agia em nome da Chefe de Loja.
15) Esta situação causou grande desconforto, mal-estar e tristeza à A., que se sentia desautorizada, preterida, com dificuldades em impor regras aos colegas da equipa que chefiava e em organizar o seu trabalho, realizando todas as tarefas: aquelas que se tinha proposto e as que lhe eram entregues pela Chefe de Loja.
16) A autora começou a sentir-se desprezada, humilhada e passou a andar deprimida e era frequente ter crises de choro, quer no trabalho, quer em casa e era com grande dificuldade que diariamente ia para o trabalho.
17) Cada vez sentia-se mais desconfortável, nervosa e insegura, as crises de choro agravaram-se e só a muito custo as disfarçava no trabalho.
18) Os seus dias de trabalho eram cada vez mais penosos, em constante stress e a autora passou a ter dificuldade em dormir, desabafando com alguns colegas mais próximos e com a família.
19) Em outubro de 2019 foi organizado um jantar da empresa e a gerência afixou uma lista com os nomes dos trabalhadores para que estes confirmassem a sua presença, porém, o nome da A. não constava da lista.
20) O que sucedeu porque a listagem estava organizada por ordem alfabética e o nome da autora era o último e passou para outra página, a qual, por lapso, não foi impressa.
21) Apesar de ter feito chegar tal informação à gerência, a lista não foi aditada com o seu nome.
22) A propósito desse jantar a A. foi alvo de brincadeira por parte dos colegas, os quais lhe perguntavam se não ia ao jantar.
23) A Chefe de Loja telefonou à A. dizendo-lhe que sabia que o nome da V… não estava na lista, mas que queria que a autora fosse porque se tinha tratado de um equívoco.
24) A A. foi ao jantar, mas, no dia seguinte alguns colegas brincaram com ela dizendo-lhe: “ela não te queria lá e tu foste?” e a autora sentiu-se humilhada.
25) Os problemas de stress e as dificuldades em dormir agravaram-se e a autora acabou por procurar ajuda médica.
26) Em 19/11/2019, pelas 17h00, A. dirigiu-se à Chefe de Loja que se encontrava a etiquetar produtos da secção com a trabalhadora S… para lhe mostrar um papel de parede que chegara.
27) O referido papel havia sido encomendado pela Chefe de Loja, com o conselho da funcionária S…, sem o conhecimento da autora.
28) A Chefe de Loja olhou o material e perguntou à S… se tinha sido aquele o papel de parede que tinham escolhido ao que aquela respondeu que não.
29) Com tal situação a autora sentiu-se preterida, menorizada e indesejada por parte da gerência, o que a levou a pedir para falar com a gerente em particular.
30) Nesse dia, pelas 18h30m a Sra. A… recebeu a A. no seu gabinete.
31) A A. disse-lhe que não conseguia trabalhar e gerir a secção daquela forma, com as constantes intromissões no seu trabalho, em especial por parte da S… que não era do seu setor, tendo aquela dito que era assim porque a A. estava “à experiência e não estava a atingir os objetivos.”
32) A A. respondeu que assim preferia não ser chefe e entregar o cartão supervisor.
33) A determinada altura a gerente da R. chamou à atenção da autora para o facto de ter ido de férias sem que tivesse realizado uma tarefa relacionada com a remodelação dum linear expositor, tendo a autora acabado por pedir desculpa por esse facto.
34) Porém, a Chefe de Secção da R. chamou várias vezes “insolente” à A., o que levou a A. às lágrimas e disse à D.ª A... que já não aguentava mais, que já nem conseguia dormir e que certamente estava a entrar em depressão, tendo esta respondido que se não conseguia dormir devia aproveitar o tempo para organizar melhor o trabalho.
35) A A. disse que não admitia que a tratassem assim, e que a continuar dessa forma, o seu tempo no Brico estava a chegar ao fim, ao que a Sra. A… lhe respondeu que não aceitava ameaças e que ela tinha de calar-se, ouvir e baixar as orelhas como os burrinhos.
36) Nessa tarde a A. saiu do trabalho completamente abatida e agastada, nada dormiu durante a noite e não conseguia parar de chorar.
37) No dia seguinte foi ao médico e meteu baixa até apresentar a carta de rescisão.
38) A ré pagou à autora uma gratificação no valor de € 420 no ano de 2019, relativamente ao seu desempenho, sendo um dos mais altos pagos aos funcionários, tendo em conta a sua antiguidade e desempenho.

B) APRECIAÇÃO

B1) Reapreciação da impugnação da matéria de facto

A apelante pretende que se deem como provados os factos dados como não provados nas alíneas D), I) e F) da sentença, e que se acrescente aos factos provados o seguinte: “a autora passou a desempenhar funções de chefe de secção, substituindo a trabalhadora M… que auferia a remuneração de € 705 desde agosto de 2019.” Tudo conforme prova fundamentação e prova que indica.
Os factos dados como não provados são os seguintes:
D)- “A funcionária S… alterasse os planos de trabalho elaborados pela autora diariamente.”
I) - “A Sra. A… é uma pessoa que trata os trabalhadores de forma altiva, agressiva e insultuosa.”
F) - “Os chefes de secção da ré auferem a quantia de e 690.”
O facto dado como não provado na alínea I), e que a autora pretende que seja dado como provado, é conclusivo. São precisos factos concretos para podermos ajuizar se a Sr.ª A… era altiva, agressiva e insultuosa. Neste particular, o tribunal recorrido poderia, se o tivesse entendido necessário para a boa decisão da causa e se tal tivesse resultado da discussão, ter usado o poder/dever previsto no art.º 72.º do CPT e aditado factos concretizadores daqueles conceitos, sempre sujeitos ao contraditório. Não o fez, nem tal foi sugerido pelas partes, e em sede de recurso tal não é admissível. É uma competência do tribunal de primeira instância e se não for concretizada durante a discussão da causa, já não o poderá ser posteriormente com a impugnação da matéria de facto no recurso interposto para o Tribunal da Relação.
Assim, a alínea I) dos factos provados, pelas razões expostas, não poderá considerar-se como um facto que possa ser dado como provado.
Em relação à alínea D), a A. fundamenta a alteração do modo seguinte:
“Este facto resulta claramente provado até por acordo das partes, dado que provado por acordo o facto n.º 14, para termos uma decisão coerente e não contraditória, o facto D deve ser considerado provado por acordo das partes e ser aditado aos provados. Se a funcionária S… não estava afeta à secção da A., dava ordens de serviço aos funcionários e estes os cumpriam em detrimento da sua chefe, por receio da dona da Loja, então, a funcionária S… alterava os planos de trabalho elaborados pela autora”.
O facto 14, dado como provado é o seguinte: “14) Para além disso a trabalhadora S…, que não estava afeta à secção de decoração, atuando em nome da Chefe de Loja, dava ordens de serviço quer à autora quer aos demais trabalhadores do sector de decoração e estes, antes de acatar qualquer indicação da autora, certificavam-se que a funcionária S… estava de acordo, pois agia em nome da Chefe de Loja”.
A apelante tem razão. Se a funcionária S… dava ordens de serviço à autora e aos demais trabalhadores do setor de decoração e estes atuavam só depois de se certificarem que a funcionária C… estava de acordo, tais ordens só poderiam dizer respeito à realização de tarefas concretas do dia-a-dia, resultando daqui uma manifesta alteração dos planos de trabalho elaborados pela autora. Os trabalhadores deixavam de executas as tarefas distribuídas pela autora para realizarem as ordenadas pela S…. Resulta do facto provado sob o n.º 14, que a S… funcionava, de facto, como superior hierárquica da autora, sobrepondo-se as suas diretivas de trabalho às desta, que eram seguidas pelos trabalhadores da secção de decoração.
Refira-se que os depoimentos das testemunhas não colidem com a convicção no sentido da prova do facto em causa. Assim, dá-se como provado que:
D)- “A funcionária S… alterava os planos de trabalho elaborados pela autora diariamente.”
Em relação ao facto da alínea F), consta do ficheiro enviado pela Segurança Social, a pedido do tribunal, por sugestão da parte, que a chefe de secção M…, que a autora foi substituir, auferia o vencimento mensal de € 705, em maio de 2019. Este documento não foi impugnado pelas partes.
A autora iniciou o exercício das funções, anteriormente exercidas pela trabalhadora M…, em junho de 2019.
Em face da informação fornecida pela segurança social, a ausência de pronúncia das partes sobre o documento e a sua data, relativa ao mês imediatamente anterior àquele em que a A. iniciou as funções anteriormente executadas pela trabalhadora M…, formamos a convicção no sentido de que a trabalhadora M… auferia o vencimento € 705. Em relação aos demais trabalhadores chefes de secção, tal é inócuo para o caso concreto, tendo em conta que a A. foi substituir a M… e não outros colegas de trabalho
Assim damos como provado, em relação à alínea F): provado apenas que “a trabalhadora M…, que a A. foi substituir, auferia a quantia mensal de € 705”.
Termos em que a impugnação da matéria de facto fica definitivamente fixada nos termos que deixamos referidos.

B2) O direito à retribuição das funções de chefe de secção

Está provado que a autora foi exercer, por ordem da ré, as funções de chefe da secção de decoração, anteriormente exercidas pela trabalhadora M…, a qual auferia a quantia mensal de € 705. A autora auferia a quantia mensal de € 640 pelas funções primitivas.
O art.º 120.º do CT prescreve:
1. O empregador pode, quando o interesse da empresa o exija, encarregar o trabalhador de exercer temporariamente funções não compreendidas na atividade contratada, desde que tal não implique modificação substancial da posição do trabalhador.
2. As partes podem alargar ou restringir a faculdade conferida no número anterior, mediante acordo que caduca ao fim de dois anos se não tiver sido aplicado.
3. A ordem de alteração deve ser justificada, mencionando se for caso disso o acordo a que se refere o número anterior, e indicar a duração previsível da mesma, que não deve ultrapassar dois anos.
4. O disposto no n.º 1 não pode implicar diminuição da retribuição, tendo o trabalhador direito às condições de trabalho mais favoráveis que sejam inerentes às funções exercidas.
Resulta expressamente do n.º 4 do art.º acabado de citar que a autora tem direito às condições de trabalho mais favoráveis decorrentes das novas funções como chefe da secção de decoração, entre elas a retribuição.
As novas funções eram remuneradas com a quantia de € 705, pelo que a autora tem direito a auferir este montante desde o seu início, em julho de 2019.
Tendo em conta que entrou de baixa médica em 20.11.2019, as diferenças salariais são devidas até 19.11.2019.
A este título a autora pede a quantia de € 300.
A diferença salarial é de € 65/mês (€ 705 – 640).
Assim, a autora tem direito às diferenças salariais peticionadas no montante de € 300. (quatro meses e 19 dias), a que acrescerão os juros legais, desde a citação, até pagamento, como pedido.

B3) A justa causa de resolução do contrato de trabalho

O art.º 394.º n.º 1 do CT prescreve que ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato.
O n.º 2 do mesmo artigo, enumera exemplificativamente comportamentos do empregador que constituem justa causa para o trabalhador fazer cessar o contrato de trabalho.
No caso concreto está em causa a conduta referida na alínea b): violação culposa de garantias legais ou convencionais do trabalhador, designadamente a prática de assédio praticada pela entidade empregadora ou por outros trabalhadores;
A justa causa é apreciada tendo em conta o quadro de gestão da empresa, o grau de lesão dos interesses do trabalhador, o caráter das relações entre as partes e as demais circunstâncias que sejam relevantes no caso (art.º 351.º n.º 3, aplicável ex vi do art.º 394.º n.º 4 do CT, com as necessárias adaptações).
A apelante configura a causa de resolução do contrato de trabalho como sendo de assédio moral.
O art.º 29.º n.º 2 do CT prescreve: entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em fator de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.
Como se escreveu no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11.09.2019[1]:
“I. O assédio moral implica comportamentos, real e manifestamente, humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador, aos quais estão em regra associados mais dois elementos: certa duração; e determinadas consequências.
II. De acordo com o disposto no artigo 29.º, n.º 1, do CT, no assédio não tem de estar presente o “objetivo” de afetar a vítima, bastando que este resultado seja “efeito” do comportamento adotado pelo “assediante”.
III. Apesar de o legislador ter (deste modo) prescindido de um elemento volitivo dirigido às consequências imediatas de determinado comportamento, o assédio moral, em qualquer das suas modalidades, tem em regra associado um objetivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável”.
Concordamos com esta jurisprudência, a qual, aliás tem sido seguida pela doutrina e jurisprudência citadas no douto acórdão do STJ, cujo sumário transcrevemos.
Sobre esta questão está assente que:
7) A Sra.ª A…, presença diária na loja, trabalha ao lado dos funcionários, e, enquanto chefe de Loja, emite diretrizes e atribui diretamente tarefas aos funcionários.
8) Em julho de 2019, o Sr. J…, representante da ré, comunicou à A. que passaria a desempenhar funções de Chefe da Secção de Decoração, substituindo nas funções uma colega que estava de baixa e posteriormente saiu da empresa.
9) Com estas novas funções passou a A. a ter mais responsabilidades, nomeadamente na gestão e distribuição de tarefas entre os colegas, na gestão de fornecedores, de encomendas, bem como no contacto com clientes nas situações de reclamações e passou a ter um cartão com o nome de “Supervisor”, que lhe permitia, entre outras, anular ações e efetuar trocas.
10) No início do desempenho das novas funções a autora sentia-se animada.
11) Porém, a partir do início de setembro, começou a sentir dificuldades em organizar o seu trabalho e o trabalho dos trabalhadores da equipa que chefiava.
12) Na realidade à autora era pedido que elaborasse planos de trabalho, os quais continham a distribuição de tarefas diárias e semanais a realizar pelos trabalhadores do seu setor.
13) Porém, quer a autora quer os colegas da sua equipa tinham dificuldade em cumprir tais tarefas e ainda as tarefas que a Chefe de Loja, D.ª A…, lhes ia atribuindo diariamente e que não estavam contempladas nesses planos.
14) Para além disso a trabalhadora S…, que não estava afeta à secção de decoração, atuando em nome da Chefe de Loja, dava ordens de serviço quer à autora quer aos demais trabalhadores do sector de decoração e estes, antes de acatar qualquer indicação da autora, certificavam-se que a funcionária S… estava de acordo, pois agia em nome da Chefe de Loja.
15) Esta situação causou grande desconforto, mal-estar e tristeza à A., que se sentia desautorizada, preterida, com dificuldades em impor regras aos colegas da equipa que chefiava e em organizar o seu trabalho, realizando todas as tarefas: aquelas que se tinha proposto e as que lhe eram entregues pela Chefe de Loja.
16) A autora começou a sentir-se desprezada, humilhada e passou a andar deprimida e era frequente ter crises de choro, quer no trabalho, quer em casa e era com grande dificuldade que diariamente ia para o trabalho.
17) Cada vez sentia-se mais desconfortável, nervosa e insegura, as crises de choro agravaram-se e só a muito custo as disfarçava no trabalho.
18) Os seus dias de trabalho eram cada vez mais penosos, em constante stress e a autora passou a ter dificuldade em dormir, desabafando com alguns colegas mais próximos e com a família.
19) Em outubro de 2019 foi organizado um jantar da empresa e a gerência afixou uma lista com os nomes dos trabalhadores para que estes confirmassem a sua presença, porém, o nome da A. não constava da lista.
20) O que sucedeu porque a listagem estava organizada por ordem alfabética e o nome da autora era o último e passou para outra página, a qual, por lapso, não foi impressa.
21) Apesar de ter feito chegar tal informação à gerência, a lista não foi aditada com o seu nome.
22) A propósito desse jantar a A. foi alvo de brincadeira por parte dos colegas, os quais lhe perguntavam se não ia ao jantar.
23) A Chefe de Loja telefonou à A. dizendo-lhe que sabia que o nome da V… não estava na lista, mas que queria que a autora fosse porque se tinha tratado de um equívoco.
24) A A. foi ao jantar, mas, no dia seguinte alguns colegas brincaram com ela dizendo-lhe: “ela não te queria lá e tu foste?” e a autora sentiu-se humilhada.
25) Os problemas de stress e as dificuldades em dormir agravaram-se e a autora acabou por procurar ajuda médica.
26) Em 19/11/2019, pelas 17h00, A. dirigiu-se à Chefe de Loja que se encontrava a etiquetar produtos da secção com a trabalhadora S… para lhe mostrar um papel de parede que chegara.
27) O referido papel havia sido encomendado pela Chefe de Loja, com o conselho da funcionária S…, sem o conhecimento da autora.
28) A Chefe de Loja olhou o material e perguntou à S… se tinha sido aquele o papel de parede que tinham escolhido ao que aquela respondeu que não.
29) Com tal situação a autora sentiu-se preterida, menorizada e indesejada por parte da gerência, o que a levou a pedir para falar com a gerente em particular.
30) Nesse dia, pelas 18h30m a Sra. A… recebeu a A. no seu gabinete.
31) A A. disse-lhe que não conseguia trabalhar e gerir a secção daquela forma, com as constantes intromissões no seu trabalho, em especial por parte da S… que não era do seu setor, tendo aquela dito que era assim porque a A. estava “à experiência e não estava a atingir os objetivos.”
32) A A. respondeu que assim preferia não ser chefe e entregar o cartão supervisor.
34) Porém, a Chefe de Secção da R. chamou várias vezes “insolente” à A., o que levou a A. às lágrimas e disse à D.ª A… que já não aguentava mais, que já nem conseguia dormir e que certamente estava a entrar em depressão, tendo esta respondido que se não conseguia dormir devia aproveitar o tempo para organizar melhor o trabalho.
35) A A. disse que não admitia que a tratassem assim, e que a continuar dessa forma, o seu tempo no Brico estava a chegar ao fim, ao que a Sra. A… lhe respondeu que não aceitava ameaças e que ela tinha de calar-se, ouvir e baixar as orelhas como os burrinhos.
36) Nessa tarde a A. saiu do trabalho completamente abatida e agastada, nada dormiu durante a noite e não conseguia parar de chorar.
37) No dia seguinte foi ao médico e meteu baixa até apresentar a carta de rescisão.
Facto acima dado como provado: a funcionária S… alterava os planos de trabalho elaborados pela autora diariamente.”
Os factos provados mostram que a partir do início de setembro de 2019 e até 19/11/2019, a autora viu-se desautorizada nas suas funções pela sua superior hierárquica, sem qualquer justificação. A ré ordenou à autora o exercício de novas funções, correspondentes às de chefe da secção de decoração, em julho de 2019, mas a partir do início do mês de setembro seguinte, viu-se permanentemente desautorizada pela sua superior hierárquica, por si e através de outra funcionária, S…. A desautorização era de tal ordem, que “a trabalhadora S…, que não estava afeta à secção de decoração, atuando em nome da Chefe de Loja, dava ordens de serviço quer à autora quer aos demais trabalhadores do sector de decoração e estes que os trabalhadores que dependiam hierarquicamente de si não antes de acatar qualquer indicação da autora, certificavam-se que a funcionária S… estava de acordo, pois agia em nome da Chefe de Loja” .
Este facto e aquele em que a superior hierárquica diz à autora que “ela tinha de calar-se, ouvir e baixar as orelhas como os burrinhos”, juntamente com as outras circunstâncias dadas como provadas, evidenciam um comportamento continuado por parte da superior hierárquica, manifestamente hostil, com intenção imediata de exercer pressão moral sobre a autora, causando-lhe o efeito psicológico pretendido: a servidão. Com efeito, para a superior hierárquica da autora, esta não era mais do que um burrinho, tinha que baixar as orelhas e calar.
Trata-se de um comportamento objetivamente degradante e indigno de existir nas relações laborais. Mais grave ainda no caso concreto, pois a autora era desautorizada perante os seus subordinados.
O empregador, por si ou através das hierarquias, exerce o poder de direção e conformação da prestação de trabalho, mas está sujeito ao dever jurídico de o exercer com respeito pela dignidade da pessoa humana. O trabalhador é uma pessoa humana e não pode estar todos os dias no seu local de trabalho a ser constantemente desautorizado, humilhado e olhado com desprezo como revela a conduta da superior hierárquica da autora.
O comportamento continuado da superior hierárquica para com a trabalhadora, diretamente por si e também através da trabalhadora S…, foi apto a criar na autora um desconforto e mal-estar no trabalho que feriram a sua dignidade profissional e a integridade moral e psíquica.
É um encadeamento de comportamentos e práticas, injustificadas, que criaram conscientemente um ambiente hostil, degradante, humilhante e desestabilizador à trabalhadora, o qual a levou a tomar a decisão de resolver o contrato de trabalho com justa causa.
Os factos provados mostram que a trabalhadora, aqui autora, foi vítima de assédio moral e por isso teve justa causa para resolver o contrato de trabalho. A conduta ilícita e culposamente assediante, ao atingir o núcleo essencial da dignidade pessoal e profissional da trabalhadora, foi a causa adequada à decisão de resolver o contrato de trabalho.
Termos em que se conclui que a autora teve justa causa para resolver o contrato de trabalho.
Prescreve o art.º 396.º do CT de 2009, que em caso de resolução do contrato com fundamento em facto previsto no n.º 2 do artigo 394.º, como é o caso dos autos, o trabalhador tem direito a indemnização, a determinar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau da ilicitude do comportamento do empregador, não podendo ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades (n.º 1) e no caso de fração de ano de antiguidade, o valor da indemnização é calculado proporcionalmente (n.º 2).
Os factos assentes não deixam dúvidas quanto à culpa da empregadora e ao nível elevado de ilicitude da conduta da apelante e as consequências que teve na saúde da trabalhadora.
Neste contexto, a fixação da indemnização em função da antiguidade do trabalhador deve fixar-se acima da média. Considerando o quadro fáctico referido, fixamos em 35 dias a base de cálculo da indemnização devida.
A autora tinha direito ao pagamento da remuneração mensal de € 705, sendo a retribuição base de referência de € 822,5 (35 dias de retribuição base).
Iniciou funções na ré em 08.10.2002 e o contrato de trabalho cessou em 19.12.2019. A sua antiguidade é de 17 anos, dois meses e 11 dias.
Assim, a autora tem direito à indemnização de antiguidade de € 14 144,71.
A autora pede, a este título, a quantia de € 13 765,50.
Assim, tendo em conta que o tribunal está limitado ao valor do pedido (art.º 74.º do CPT) em virtude de não estarmos perante direitos absolutamente indisponíveis (como são, v.g., os que decorrem da reparação de acidentes de trabalho), a ré só é condenada a pagar a título de indemnização de antiguidade a quantia de € 13 765,50, acrescida dos juros legais, a partir da citação e até pagamento.
Nesta conformidade, julgamos a apelação procedente, declara-se a licitude da resolução do contrato de trabalho pela autora e condena-se a ré a pagar-lhe:
a) A quantia de € 300, a título de diferenças salariais; e
b) A quantia de € 13 765,50, a título de indemnização de antiguidade.
Ambas as quantias acrescidas dos juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até pagamento.

III - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção social do Tribunal da Relação de Évora em julgar a apelação procedente e, em consequência, declarar a licitude da resolução do contrato de trabalho efetuada pela autora, e condenar a ré a pagar-lhe:
a) A quantia de € 300 (trezentos euros), a título de diferenças salariais; e
b) A quantia de € 13 765,50 (treze mil, setecentos e sessenta e cinco euros e cinquenta cêntimos), a título de indemnização de antiguidade.
c) Os juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até pagamento, sobre as quantias referidas nas alíneas a) e b).
Custas pela apelada.
Notifique.
(Acórdão elaborado e integralmente revisto pelo relator).
Évora, 14 de julho de 2021.
Moisés Silva (relator)
Mário Branco Coelho
Paula do Paço
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[1] Ac. STJ, de 11.09.2019, processo n.º 8249/16.8T8PRT.P1.S1, www.dgsi.pt/jstj.