Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1511/16.1T8EVR.E1
Relator: TOMÉ RAMIÃO
Descritores: CAUSA PREJUDICIAL
DENÚNCIA DO ARRENDAMENTO PELO SENHORIO
DIREITO DE PROPRIEDADE
ACESSÃO IMOBILIÁRIA
Data do Acordão: 09/10/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
1. Uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela pode prejudicar a decisão desta, isto é, quando a procedência da primeira tira razão de ser à existência da segunda.
2. Porque nesta ação o Autor/recorrente formulou vários pedidos, entre eles o de condenação da Ré/recorrida a reconhecer a denúncia do contrato de arrendamento rural e reconhecer o seu direito de propriedade sobre o prédio rústico identificado e a restituí-lo completamente livre de pessoas e bens, e num outro processo pendente, anterior a esta ação, a aí Autora, aqui Ré, peticiona que seja decretada a seu favor a aquisição, por acessão industrial imobiliária, o direito real de propriedade sobre o mesmo prédio rústico, ocorre o nexo de prejudicialidade, pois a decisão a proferir na ação prejudicial, a ser favorável à ora Ré, tornará inútil o julgamento neste processo. (sumário do relator)
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Évora

I- Relatório.
1. B…a, em 6 de setembro de 2016, intentou contra Cooperativa Agropecuária do …, CRL, ambos com os demais sinais dos autos, a presente ação declarativa comum, pedindo a condenação da Ré, a:
a) Reconhecer a denúncia e cessação do contrato de arrendamento para 07/12/2013, e subsequentemente a declarar-se que a denúncia é válida e eficaz para produzir os seus efeitos a partir de 7/12/2017;
b) Reconhecer o direito de propriedade do Autor sobre o prédio identificado no art.º 1.º da p. i., e a o restituir completamente livre de pessoas e bens;
c) Levantar, retirar e demolir todas as edificações referidas no art. 30 da P.I. ou em alternativa a pagar à Ré todas as despesas e custos demolição, remoção e transporte dos respetivos inertes e entulhos para aterros sanitários, a apurar em execução de sentença;
d) Pagar ao A. a quantia de € 100.000,00 referente à ocupação do prédio de 08/12/2013 a 8/12/2015 e partir dessa data a quantia diária de € 137,00 a título de indemnização pela ocupação indevida e perda do uso e fruição do prédio, até à data da sua devolução.
Alegou, em síntese, ser dono e legítimo proprietário do prédio rústico denominado Herdade da …, identificado no art.º 1.º da p.i., que adquiriu por sucessão testamentária, como único e universal herdeiro de M…, prédio que foi expropriado por despacho da Ministra da Agricultura de 16/11/1994, durante a sujeição do prédio às medidas de expropriação o Estado celebrou com a Ré um contrato de arrendamento com início em 27/12/1984, pelo prazo de 6 anos, renovável por 3 anos, e como condição para a entrega da reserva, nos termos da Lei de Bases da Reforma Agrária 46/90, de 22/08, a anterior possuidora M… viu-se obrigada a celebrar com a Ré em 25/10/1994 um contrato de arrendamento ao abrigo do art.º 29.º/3 da lei n.º 46/90, com o início da entrega da reserva em 7/12/1994, pelo prazo inicial de 10 anos, com 3 renovações obrigatórias de 3 anos, tendo terminado em 7/12/2013 a última renovação a anterior possuidora denunciou o contrato em 16/03/2011 com efeitos a partir de 7/12/2013.
Contestou a Ré, invocando a ilegitimidade do Autor para intentar a presente ação e pediu a suspensão da instância, alegando encontrar-se registada uma ação intentada pela ora A. Cooperativa Agropecuária do … contra a anterior proprietária, M…, cujo pedido é que seja decretada a favor da Autora, ora Ré Cooperativa, por acessão imobiliária, a aquisição do prédio em causa, que corre termos pelo tribunal da comarca de Évora sob o nº 189/14.1 TBMMN secção cível J3, ação que constitui causa prejudicial geradora de suspensão da instância nos termos do disposto e já citado art.º 272.º, n. º 1 do C. P. Civil.
Em 16 de novembro de 2016 foi proferido o seguinte despacho, do qual não foi interposto qualquer recurso:
“Cumpre apreciar:
Resulta do preceituado no artigo 272.º n.º 1 do Código de Processo Civil que o Tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado. E do n.º 2 que, não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens.
Da certidão constante de fls. 377 e segs. extraída do processo 24194/15.1TT8LSB que corre termos na Comarca de Lisboa, Instância Central, 1ª Secção Cível, J2 resulta que A, C…, J… e F… intentaram ação declarativa de condenação contra B… e CA…, notária, visando obter a declaração de nulidade ou a anulação do testamento, outorgado perante Notária em 11.03.2012, por M…a favor de B…, por alegadamente aquela não possuir então «capacidade para dispor, com consciência, do seu património» (artigo 24º da petição inicial), e ter agido «sob coação do ora Requerido» (artigo 39º da petição inicial).
Os autos em questão, têm julgamento agendado para 14 e 16 de fevereiro de 2017.
No despacho saneador do processo em causa foi fixado como objeto do litígio o seguinte:
“Pedido principal – ser declarada a nulidade, ou anulado, o testamento outorgado em 11 de março de 2012, por M…, condenando-se o réu a restituir à herança daquela os bens, os valores e os rendimentos respetivos;
Pedido subsidiário – ser o réu reconhecido (mercê da validade e eficácia do testamento outorgado em 11 de março de 2012, por M…), herdeiro apenas do remanescente da sua herança, face aos bens por ela legados por meio do testamento por si outorgado em 24 de agosto de 2010”.
Da certidão constante de fls. 280 e segs. extraída do processo 189/14.1TBMMN, que corre termos na Comarca de Évora, Instância Central Mista, J3 resulta que a Cooperativa Agropecuária do …, CRL, intentou contra M…, ação declarativa na qual pretende ver reconhecida a propriedade do imóvel identificado nestes autos, alegando aquisição do mesmo por acessão imobiliária.
Neste processo 189/14.1TBMMN foi proferido despacho, em 27-04-2016, já transitado em julgado, no qual se decidiu ser a ação 24194/15.1TT8LSB, causa prejudicial em relação ao incidente de habilitação de herdeiros no qual B…promoveu a respetiva habilitação como sucessor da Ré falecida M… a fim de a substituir na causa, por vocação testamentária.
Estando a qualidade de proprietário do imóvel identificado nos autos dependente das decisões finais que serão proferidas no âmbito dos identificados processos e, sendo essa qualidade, determinante para o sucesso das pretensões do autor neste processo, entendo, efetivamente, serem aquelas ações, causas prejudiciais em relação ao presente processo.
Consequentemente, ocorrem as condições definidoras duma verdadeira e própria prejudicialidade ou dependência entre esta causa e as outras duas identificadas.

Por outro lado, ainda que o testamento em causa seja considerado válido e, em
consequência, o ora autor seja reconhecido como sucessor de M…, se a ora ré, obtiver provimento na ação pendente na Comarca de Évora sob o nº 189/14.1TBMMN, o direito de propriedade do imóvel em discussão nos autos ser-lhe-á atribuído e, por conseguinte, a presente ação estará condenada ao insucesso.
Não se verifica nenhum dos obstáculos à suspensão da instância a que alude o
n.º 2 do artigo 272.º do Código de Processo Civil.
Assim e com os fundamentos supra expostos, considera-se justificado suspender a presente ação até ao trânsito em julgado das decisões a proferir no processo 24194/15.1TT8LSB que corre termos na Comarca de Lisboa, Instância Central, 1ª Secção Cível, J2 e no processo 189/14.1TBMMN, que corre termos na Comarca de Évora, Instância Central Mista, J3.
Notifique”.
E, em despacho proferido em audiência prévia, em 24/02/2020, após audição das partes, exarou-se o seguinte:
"Os presentes autos encontram-se suspensos por duas razões:
1. A aguardar decisão proferida no processo que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, ao tempo Instância Central - 1.ª Secção Cível - J2, sob o n.º 24194/15.1T8LSB; e

2. Pela decisão a proferir no processo 189/14.1TBMMN, deste Juízo Central Cível e Criminal de Évora.

Enquanto que nos autos que correram termos pelo Tribunal de Lisboa já foi proferida decisão que julgou da qualidade de herdeiro do Autor nestes autos, nos autos que correm termos por este Juízo Central Cível e Criminal de Évora apenas foi proferida decisão julgando habilitado nesses autos, enquanto Réu, o ora Autor.
Nos presentes autos o Autor formulou vários pedidos, entre eles o de condenação da Ré a reconhecer o direito de propriedade do Autor sobre o prédio identificado no artigo 1.º da petição inicial e a restituí-lo completamente livre de pessoas e bens.
Nos autos que correm termos sob o n.º 189/14.1TBMMN, em que é Autora a aqui Ré e Réu o aqui Autor, formula a Autora o pedido que seja decretada a seu favor a aquisição do prédio rústico denominado Herdade da …, melhor identificado no artigo 1.º da petição inicial na presente ação.
Entendemos, salvo melhor opinião, que os pressupostos que determinaram a suspensão da presente ação se mantêm válidos, já que a decisão a proferir naqueles autos poderá de algum modo ser prejudicial à decisão a proferir nos presentes autos, devendo, em consequência, manter-se a suspensão destes autos até ao trânsito em julgado da decisão que venha a ser proferida nos autos que correm termos sob o n.º 189/14.1TBMMN.
Por consequência, e não obstante a audiência prévia designada nestes autos ter um objeto mais abrangente do que a simples tentativa de conciliação, entendemos dever aproveitar tal diligência para a realização da tentativa de conciliação, mais se mantendo a suspensão da instância, conforme anteriormente ordenado.
Notifique".
Inconformado com este despacho veio o Autor interpor o presente recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1ª – Não existe qualquer nexo de prejudicidade, uma vez que o objeto, causa de pedir e pedidos formulados em ambas as ações são diferentes.
2ª – A decisão que vier a ser proferida nesta ação não modifica ou afeta o julgamento e a decisão que vier a ser proferida nessa ação, uma vez que os pedidos concretamente formulados nesta ação e os seus efeitos jurídicos são diversos da outra ação.
3ª – A decisão que vier a ser proferida nesta ação não vai assim influir na decisão que vier a ser proferida na ação prejudicial, cujo objeto processual nada tem a ver com o objeto desta ação.
4ª – Não há nesta ação lugar à suspensão da instância, por não resultar uma relação de prejudicialidade entre a ação a correr termos no Proc. 189/14.1 TBMMN e a presente causa.
5ª – A suspensão do processo requerida pela Ré, que se encontra a ocupar o prédio desde 2013, destina-se a protelar a decisão do mérito sobre a denúncia do contrato de arrendamento, para continuar a manter-se na exploração do prédio, sem pagar qualquer contraprestação à A., o que lhe vem causando graves prejuízos que se agravam com o decurso do tempo.
6ª – A decisão recorrida por erro de interpretação da lei, violou entre outras disposições legais o art.º 272.º, n. º 1 do CPC, o qual deveria ser aplicado no sentido da não suspensão da instância.
Nestes termos, deverá a decisão recorrida ser revogada, ordenando-se o prosseguimento dos termos da presente ação.

***
Não foram juntas contra-alegações.
O recurso foi admitido como de apelação, a subir nos próprios autos e com efeito devolutivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
***
II. Âmbito do Recurso.
Perante o teor das conclusões formuladas pelo recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso - arts. 608.º, nº2, 609º, 620º, 635º, nº3, 639.º/1, todos do C. P. Civil, constata-se que a única questão a decidir consiste em saber se existe fundamento legal para manter a decisão de suspensão da instância.
***
III. Fundamentação fáctico-jurídica.
1. A matéria de facto relevante para responder à questão colocada consta do antecedente relatório e teor do despacho recorrido.
Vejamos, pois, se a razão está do lado do recorrente.
Nos termos do vigente artigo art.º 272.º/1 do C. P. Civil (anterior art.º 279º, n.º 1), “O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta, ou quando ocorrer outro motivo justificado.”
De acordo com esta disposição legal, invocada no despacho recorrido para a manutenção da suspensão da instância, o tribunal pode ordenar a suspensão da instância quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta, isto é, quando pender causa prejudicial.
Sobre o nexo de prejudicialidade ou de dependência, já ensinava o saudoso Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, a pág. 384: “estão pendentes duas ações e dá-se o caso de a decisão duma poder afetar o julgamento a proferir na outra. Aquela ação terá o caráter de prejudicial em relação a esta”
E ensinava também, em Comentário ao Código de Processo Civil, 3.º, pág. 206, “uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela pode prejudicar a decisão desta, isto é, quando a procedência da primeira tira razão de ser à existência da segunda”.
Entende-se por causa prejudicial aquela que tenha por objeto pretensão que constitui pressuposto da formulada na causa “prejudicada”, nas palavras do Prof.º Lebre de Freitas, in “Código de Processo Civil Anotado”, volume 1.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, pág. 544. E esclarece que “A decisão de uma causa depende do julgamento de outra quando na causa prejudicial esteja a apreciar-se uma questão cuja sentença possa modificar uma situação jurídica que tem que ser considerada para a decisão de outro pleito”.
Assim, é entendimento unânime, quer pela jurisprudência quer da doutrina, que a verdadeira prejudicialidade ou dependência só existe quando na primeira causa se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da outra causa (cf., entre outros, Acs. do S. T. J. de 18/2/1982, BMJ 314.º-267 e de 18/2/1993, BMJ 424.º-587).
Caminho também seguido pelo S. T. J., no seu Acórdão de 26/5/1994, Col. Jur./STJ, T-2.º, pág. 116, onde se escreveu “uma causa depende do julgamento de outra quando na causa prejudicial se esteja a apreciar uma questão cuja resolução por si só possa modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a decisão de outro pleito”.
Ou, como se escreveu no Ac. do STJ de 27/01/2010, Proc. n.º 594/09.5YFLSB, disponível em www.dgsi.pt/jstj, “uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela pode prejudicar a decisão desta, isto é, quando a decisão daquela pode destruir o fundamento ou a razão desta”.
No mesmo sentido se pronunciam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. I, 2018, págs. 314/315, afirmando que apenas podem motivar a suspensão com esse motivo ações que tenham sido instauradas anteriormente à ação em causa, devendo comprovar-se “uma efetiva relação de dependência, de tal modo que a apreciação do litígio esteja efetivamente condicionada pelo que venha a decidir-se na ação prejudicial, a qual constitui, pois, um pressuposto de outra decisão”.
E acrescentam, citando Alberto dos Reis: “O nexo de prejudicialidade define-se assim: estão pendentes duas ações e dá-se o caso de a decisão de uma poder afetar o julgamento a proferir noutra; a razão de ser da suspensão, por pendência de causa prejudicial é a economia e a coerência de julgamentos; uma causa é prejudicial à outra quando a decisão da primeira possa destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda”.
Ora, no caso concreto, como salientado é, e bem, na decisão recorrida, nesta ação o Autor/recorrente formulou vários pedidos, entre eles o de condenação da Ré/recorrida a reconhecer o seu direito de propriedade sobre o prédio identificado no artigo 1.º da petição inicial e a restituí-lo completamente livre de pessoas e bens, sendo que no processo pendente, anterior a esta ação (instaurada dois anos antes), que corre termos sob o n.º 189/14.1TBMMN, em que é Autora a aqui Ré e Réu o aqui Autor, formula a Autora o pedido que seja decretada a seu favor a aquisição, por acessão imobiliária, do direito real de propriedade sobre prédio rústico denominado Herdade da …, melhor identificado no artigo 1.º da petição inicial da presente ação.

O efeito positivo dessa ação assenta numa relação de prejudicialidade: o objeto da primeira decisão (a proferir no proc. n.º189/14.1TBMMN) constitui questão prejudicial na segunda ação, pois admitindo-se que nessa ação é reconhecido o direito de propriedade da ora Ré sobre o prédio rústico em causa, tal decisão colide, prejudica, torna inútil o julgamento da presente ação.

Aliás, o Autor formulou também o pedido de reconhecimento da denúncia apresentada pela anterior proprietária e consequente cessação do contrato de arrendamento, pelo que a procedência do pedido formulado pela ora Ré na ação prejudicial acarreta a extinção do eventual contrato de arrendamento rural por confusão ( art.º 868.º do C. Civil), em consequência da reunião na mesma pessoa das qualidades de credor e devedor.

Neste sentido pode ler-se no Acórdão do STJ de 20/10/2005 (Oliveira Barros), disponível em dgsi.pt: “Impossível a conciliação, em tais condições, das qualidades de credor e devedor, a coincidência dessas qualidades na mesma pessoa, como sucede com a aquisição da propriedade do local arrendado pelo arrendatário, opera a extinção do crédito e da dívida pela forma natural de extinção das obrigações prevista no art.868.º C. Civ., plenamente justificada pela evidência de que ninguém pode ser credor de si mesmo, nem dever a si mesmo”.

Dito de outro modo, a decisão a proferir naquele processo pendente (ação prejudicial), instaurada cerca de dois anos antes da presente ação, a ser favorável à ora Ré, tornará este processo supervenientemente inútil, isto é, a procedência da primeira ação tira razão de ser à existência da segunda.

Assim, é manifesto que o recorrente carece de razão, o que conduzirá á improcedência do recurso.

Mas um outro fundamento justifica essa improcedência.

Na verdade, o despacho recorrido limita-se a manter a suspensão da instância que havia sido decretada por despacho de 16 de novembro de 2016, no qual se pode ler, nomeadamente : Por outro lado, ainda que o testamento em causa seja considerado válido e, em consequência, o ora autor seja reconhecido como sucessor de M…, se a ora ré, obtiver provimento na ação pendente na Comarca de Évora sob o nº 189/14.1TBMMN, o direito de propriedade do imóvel em discussão nos autos ser-lhe-á atribuído e, por conseguinte, a presente ação estará condenada ao insucesso.
Não se verifica nenhum dos obstáculos à suspensão da instância a que alude o
n.º 2 do artigo 272.º do Código de Processo Civil.
Assim e com os fundamentos supra expostos, considera-se justificado suspender a presente ação até ao trânsito em julgado das decisões a proferir no processo 24194/15.1TT8LSB que corre termos na Comarca de Lisboa, Instância Central, 1ª Secção Cível, J2 e no processo 189/14.1TBMMN, que corre termos na Comarca de Évora, Instância Central Mista, J3” (Nosso sublinhado).
E a verdade é que o recorrente não interpôs recurso desse despacho, pelo que transitou em julgado a decisão de suspensão da instância com fundamento na existência de causa prejudicial, ou seja, a pendência da ação n.º189/14.1TBMMN.

Como ensina o Prof.º Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Processo Civil”, pág. 572, o efeito positivo do caso julgado é exercido através da autoridade do caso julgado e resulta da vinculação do tribunal que proferiu a decisão ou outros tribunais ao que nela foi decidido ou estabelecido.

Destarte, essa decisão fez caso julgado formal, tem força obrigatória dentro do processo - n. º1 do art.º 620.º do C. P. Civil.
Resumindo, improcedem todas as conclusões e consequentemente a apelação, devendo ser mantido o despacho recorrido.
Vencido no recurso, suportará o recorrente as custas respetivas – Art.º 527.º/1 e 2 do C. P. Civil.

***
IV. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação e manter a decisão recorrida.
Custas da apelação pelo recorrente.
Évora, 2020/09/10
Este Acórdão vai ser assinado digitalmente, pelos Juízes Desembargadores:
Tomé Ramião (Relator)
Francisco Xavier (1.º Adjunto)
Maria João Sousa e Faro (2.º Adjunto)