Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1967/04-2
Relator: BERNARDO DOMINGOS
Descritores: RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
FAZENDA NACIONAL
TAXA DE JUSTIÇA
MINISTÉRIO PÚBLICO
Data do Acordão: 11/11/2004
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário:
I – O novo regime das custas judiciais introduzido pelo DL n.º 324/2003, é aplicável a todos os processos instaurados a partir da sua entrada em vigor e no que toca aos montantes e formas de pagamento das taxa de justiça é desde logo aplicável aos processos pendentes.
II - Um incidente de reclamação de créditos embora ligado umbilicalmente a uma acção executiva, previamente instaurada, não deixa de ser uma nova e verdadeira acção declarativa autónoma e nessa medida é sem dúvida um novo processo.
III – Assim são-lhe aplicáveis desde logo as normas de custas respeitantes ao pagamento da taxa de justiça inicial.
IV – A fazenda nacional não está isenta de tal pagamento, devendo o magistrado do MP providenciar, junto do organismo que representa, o pagamento atempado da referida taxa, sob pena de recusa da petição inicial.
Decisão Texto Integral:
Acordam em Conferência os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

Proc.º N.º 1967/04-2
Agravo
2ª Secção
Tribunal de Família e Menores de Setúbal – 2º Juízo - proc. n.º 53-D/94

Recorrente:
MP, em representação da Fazenda Nacional.
Recorrido:
João ………..

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Por apenso aos autos de execução por custas n.º 53-D/94, veio o MP em representação da Fazenda Nacional, apresentar em 28 de Junho de 2004, petição inicial de reclamação de créditos, que foi recusada pela secretaria, nos termos do disposto na al. f) do art.º 474º do CPC, por não se encontrar junto o documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial.
Reclamou o Magistrado do MP, pedindo a liquidação da taxa de justiça!
Apresentada a reclamação ao Sr. Juiz, este proferiu despacho, onde, indeferindo a reclamação, afirma que ao incidente de reclamação de créditos é aplicável o novo regime do CPC e consequentemente indefere a reclamação.
Inconformado veio o MP interpor recurso de agravo. Apresentou alegações que rematou com as seguintes
conclusões:

«ART. 1 ° - As normas jurídicas violadas foram invocadas no despacho judicial " a quo ".
ART. 2° - O Tribunal recorrido interpretou e aplicou as normas que fundamentam o DESPACHO JUDICIAL, SOB RECURSO, por forma a considerar imperativa a aplicação imediata do novo CÓDIGO das CUSTAS JUDICIAIS e o pagamento imediato da TAXA DE JUSTIÇA e deveria ter aplicado o regime jurídico anterior em bloco para a ACÇÃO EXECUTIVA pendente. O novo regime jurídico só deveria aplicar-se aos processos executivos novos, instaurados após a entrada em vigor das alterações legislativas como a LEI manda. Não sendo expressa a aplicação da nova lei i.e. do novo CÓDIGO das CUSTAS JUDICIAIS e alterações processuais civis quanto aos procedimentos declaratórios enxertados deverá manter-se a aplicação do regime jurídico no qual a acção executiva foi instaurada.
ART. 3° - A norma jurídica a aplicar é assim o ART.865° do CÓD. PROC. CIVIL.»
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O Sr. Juiz sustentou e manteve o despacho recorrido.
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Os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil) [1] salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).
Das conclusões acabadas de transcrever resulta que são duas as questões a decidir:
1º - Se é aplicável ao caso a norma da al. f) do art.º 474º do CPC, com referência ao novo regime de custas decorrente da reforma operada pelo DL n.º 324/2003, designadamente quando retira isenção subjectiva à Fazenda Nacional.
2º - E na afirmativa se foi correcto o despacho confirmativo da recusa.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
Quanto à primeira questão não há dúvidas que o disposto no art.º 474º do CPC é aplicável ao presentes autos. Com efeito, a redacção em vigor à data do despacho recorrido e que é ainda a actual, foi introduzida na reforma operada pelo DL n.º 183/2000 e nas disposições finais e transitórias, não foi excepcionada a sua aplicação aos processos pendentes (cfr. art.º 7º do diploma citado).
É consensual, atenta a natureza do objecto a que se dirige – o processo, visto como uma sucessão de actos...- que as normas processuais são, em regra, de aplicação imediata aos processos pendentes, pois visam apenas actos futuros [2] .
O despacho recorrido em parte alguma faz referência à aplicação do “novo” Código das Custas Judiciais na redacção dada pelo DL n.º 324/2003, no entanto não há dúvida que, implicitamente, acolhe o entendimento decorrente da aplicação do regime de pagamento de taxas de justiça e de isenções subjectivas decorrente da referida reforma de custas.
É fundamentalmente contra este acolhimento que se rebela o recorrente.
Ora também quanto este aspecto da questão o recorrente não tem razão. Com efeito resulta claro do disposto no art.º 14º do DL n.º 324/2003, que regula a aplicação no tempo da reforma de custas, designadamente no seu n.º 2 e 3, que em matéria de montantes e de formas de pagamento de taxas ou outros pagamentos e depósitos, o regime decorrente deste diploma se aplica aos processos pendentes. Mas ainda que se entenda que o problema não será tanto relativo ao “pagamento” de taxas mas sim à existência ou não dessa obrigação por parte da Fazenda Nacional ou seja à manutenção ou não do regime de isenção de que a mesma gozava em matéria de custas antes desta alteração, sempre se dirá que também aqui não lhe assiste razão. Na verdade o incidente de reclamação de créditos embora ligado umbilicalmente a uma acção executiva, previamente instaurada, não deixa de ser uma nova e verdadeira acção declarativa autónoma e nessa medida é sem dúvida um novo processo - uma acção executiva ou declarativa, pode ter e muitas vezes tem, mais do que um processo [3] .
O n.º 1 do art.º 14º do DL 324/2003, estabelece que o novo regime se aplica aos processos instaurados após a sua entrada em vigor, assim é óbvio que tal regime, na totalidade, se aplica ao processo de reclamação de créditos onde foi proferido o despacho recorrido e consequentemente, por força deste novo regime, a Fazenda Nacional deixou de gozar de isenção de custas estando por isso obrigada ao pagamento da taxa de justiça nos termos e formas previstas no referido “novo” Código das Custas Judiciais. Aliás, a PGR, para prevenir percalços fez circular instruções no sentido de os Exmºs Magistrados do MP adoptarem procedimentos céleres, junto das entidades devedoras das taxas, para as autoliquidar, pagar e posteriormente fazerem chegar, em tempo útil, ao magistrado competente o comprovativo desse pagamento [4] .
Deste modo e pelo exposto a resposta à segunda questão, é óbvia. O despacho recorrido aplicou correctamente o direito, confirmando a recusa da petição inicial efectuada pela secretaria, nos termos do disposto na al. f) do art.º 474º do CPC, por não se mostrar junta a prova do pagamento prévio da taxa de justiça devida [5] .
Assim a decisão recorrida não merece censura.
Consequentemente nega-se provimento ao agravo e confirma-se o despacho recorrido.
Custas a cargo do recorrente
Registe e notifique.

Évora, em ........................


(Bernardo Domingos – Relator)
(Pedro Antunes – 1º Adjunto)
(Sérgio Abrantes Mendes– 2º Adjunto)




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[1] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56.
[2] Cfr. por todos, Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Ed. 1979, pag 41 a 49.
[3] Veja-se o sucede com as acções declarativas seguidas execução da respectiva sentença. Não há dúvidas de que estamos sempre em presença de dois processos distintos que só por razões funcionais e de conveniência se mantêm “juntos”.
[4] Cfr. Circular da PGR n.º 10/2004 de 7 de Julho de 2004.
[5] O MP, após a notificação do indeferimento da reclamação, podia lançar mão do benefício previsto no art.º 476º do CPC, apresentando nova petição acompanhada do comprovativo do pagamento, nos dez dias seguintes, sem multa de qualquer espécie e beneficiando do privilégio de a acção ser considerada proposta na data de entrada da primitiva petição. Não o fez . Preferiu optar pelo recurso ...!