Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1650/06.7TBLLE.E2
Relator: RUI MACHADO E MOURA
Descritores: EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
AVALIAÇÃO FISCAL
Data do Acordão: 03/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Existindo elementos nos autos que permitam utilizar, na avaliação da parcela expropriada, o critério primordial ou preferencial fixado pela nossa lei – critério fiscal – deverá ser, com base em tal critério, que haverá de ser fixada a justa indemnização a pagar pela entidade expropriante aos expropriados.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: P. 1650/06.7TBLLE.E2

Acordam no Tribunal da Relação de Évora:

Nos presentes autos de expropriação por utilidade pública em que é expropriante E.P. – Estradas de Portugal, E.P.E. e expropriados (…) e (…), na qualidade de proprietários do imóvel expropriado (adjudicado aquela), denominado parcela nº 117, com a área de 4.609m2, a destacar do prédio rústico, sito na freguesia da Quarteira, concelho de Loulé, inscrito na matriz predial rústica sob o art. (…) da 2ª Repartição de Finanças de Loulé e descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o nº …/260692, daquela freguesia e concelho, encontrando-se o mencionado prédio registado na dita Conservatória a favor dos expropriados, após ter sido instruído e tramitado o processo, veio a ser proferida decisão judicial que fixou em € 9.725,45 o montante a pagar a título de indemnização pela entidade expropriante aos expropriados, devendo tal quantia ser actualizada, à data da decisão final, nos termos do artigo 23º do Código das Expropriações.
Inconformados com tal decisão dela apelaram os expropriados para esta Relação, na qual veio a ser proferido acórdão que anulou a decisão recorrida e ordenou a ampliação da matéria de facto, a fim de possibilitar nova avaliação da parcela expropriada, com a aplicação preferencial do método fiscal ou comparativo, no cálculo do valor do solo (ou comprovando-se documentalmente nos autos a impossibilidade total e manifesta da sua aplicação, ser usado, supletiva ou subsidiariamente, o critério do rendimento).

No seguimento do determinado pelo Tribunal da Relação de Évora foi realizada nova avaliação à parcela expropriada, na qual foi entendido, maioritariamente, que não havia a possibilidade de recurso ao método fiscal e, posteriormente, foi proferida uma nova sentença pelo tribunal “a quo”, na qual foi fixada a indemnização a pagar pela entidade expropriante aos expropriados no montante de € 9.725,45, acrescida da quantia correspondente à actualização daquela, de acordo com os índices de preços ao consumidor, contada desde a data da declaração de utilidade pública, descontando-se as quantias que já lhes tenham sido atribuídas.

Novamente inconformados com tal decisão dela apelaram os expropriados para este Tribunal Superior, tendo apresentado para o efeito as suas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões:
A. No presente processo, esse Venerando Tribunal proferiu o douto Acórdão datado de 12 de Maio de 2011 que os apelantes dão como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, com particular importância, os critérios que V. Exas. decidiram ser relevantes para a determinação do valor da parcela expropriada em apreço nos autos.
B. O tribunal a quo, apesar de agora munido da documentação necessária, que permitiu concluir pela resposta dos pontos 7., 8., 11., 12., 13., 16., 18., 19. e 27. a 32. dos factos provados, decidiu não aderir às normas legais aplicáveis e desrespeitar os fundamentos do mencionado Acórdão, atribuindo novamente uma indemnização de € 9.725,45 pela parcela expropriada.
C. Mais grave, o colectivo discordou dos três peritos do tribunal, sendo certo que não tem poderes para alterar o auto pericial, o qual é inatacável por não apresentar qualquer obscuridade.
D. Uma das novas conclusões dos Senhores Peritos é a de que «deve ser considerado um critério que melhor reflicta uma correcta avaliação (não especulativa) pelo mercado, e, nessa medida, deve ser considerado, no cálculo da indemnização, o prejuízo causado à edificabilidade possível no terreno em causa» – (cfr. ponto 23 dos factos provados), justificando ainda em sede de “Esclarecimento Adicional” que «o terreno é juridicamente apto para outros fins, mas outros factores influenciam o mercado para chegar a este valor», motivo pelo qual concluem pelo valor da justa indemnização de € 23.109,45.
E. Decidindo o colectivo, no ponto 16 dos factos provados, que «Naquela zona de (…) existem prédios com construções licenciadas em Reserva Agrícola Nacional (RAN)» incorre num notório erro de julgamento dos factos e da sua subsunção ao Direito, quando decide no sentido de que «no que tange à parcela expropriada, de nada releva a excepcional possibilidade de construção em RAN», o que contraria o relatório pericial e a jurisprudência pacífica do STJ, designadamente, vertida no Acórdão 275/04, sobre o princípio da “justa indemnização”.
F. Ao contrário do que o tribunal a quo pretende fazer crer, resultou provado e os expropriados alegaram e demonstraram documentalmente as razões ponderosas para a excepcional edificação em área de RAN.
G. O colectivo incorre novamente em erro de julgamento ao rejeitar o critério fiscal, agora que o tribunal a quo estava munido da informação dos Serviços de Finanças, dos valores constantes das declarações de Sisa e do valor das indemnizações oferecidas pela entidade expropriante, factos dados como provados nos pontos 18., 19., e 27. a 32., aliás, como sempre defenderam os expropriados, donde se extrai uma média aritmética de € 15,95/m2.
H. Pelo que, sendo a área expropriada de 4.609 m2 (cfr. ponto 6 dos factos provados), do critério fiscal resulta um valor de indemnização de € 73.513,55 (setenta e três mil, quinhentos e treze euros e cinquenta e cinco cêntimos).
I. Relativamente à parcela sobrante a norte após a expropriação, concluíram os peritos do Tribunal pela depreciação da mesma nunca inferior a 40%, muito prejudicado que fica com a amputação de 0,237ha (cfr. ponto 22 dos factos provados).
J. Destarte, a depreciação é avaliada em € 15.126,98 (quinze mil, cento e vinte e seis euros e noventa e oito cêntimos), resultante do cálculo aritmético por multiplicação da área depreciada pelo preço/m2 e pela desvalorização de 40% (2.371m2 x 15,95€ x 40% = 15.126,98€).
K. Conclui-se, assim, que o tribunal a quo incorreu em vários erros de julgamento que os ora recorrentes supra discriminaram, em função dos quais, por aplicação do estatuído nos arts. 662º, nº 1 e 665º, nº 1, do CPC, esse Venerando Tribunal da Relação de Évora pode revogar o acórdão recorrido, conhecer do objecto da apelação e proferir acórdão sobre o mesmo, que atribua aos expropriados, ora recorrentes, como justo, adequado e cumpridor dos critérios aludidos por V. Exas. no douto Acórdão de12-05-2011, o valor indemnizatório total pela parcela expropriada de € 88.640,53 (oitenta e oito mil, seiscentos e quarenta euros e cinquenta e três cêntimos).
L. Nestes termos, nos melhores de Direito e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser considerado procedente por provado e, em consequência, nos termos do disposto nos arts. 662º, nº 1 e 665º, nº 1, do CPC, revogada a douta sentença recorrida, e substituída por outra que atribua aos expropriados a indemnização pela expropriação da parcela sub judice em valor nunca inferior a € 88.640,53 (oitenta e oito mil, seiscentos e quarenta euros e cinquenta e três cêntimos). Decidindo desta forma farão V. Exas. a costumada Justiça.

Pela entidade expropriante foram apresentadas contra alegações de recurso, nas quais pugna pela manutenção da sentença recorrida.
Atenta a não complexidade das questões a dirimir foram dispensados os vistos aos Ex.mos Juízes Adjuntos.

Cumpre apreciar e decidir:
Como se sabe, é pelas conclusões com que os recorrentes rematam a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 639º, nº 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem [1] [2].
Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável aos recorrentes (art. 635º, nº 3, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 4 do mesmo art. 635º) [3] [4].
Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação dos recorrentes, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso.
No caso em apreço emerge das conclusões da alegação de recurso apresentadas pelos expropriados, ora apelantes, que o objecto do mesmo está circunscrito à apreciação das questões de saber se foi adequada a classificação do solo da parcela de terreno expropriada e se foi correctamente fixado o quantum indemnizatório relativo à expropriação de tal parcela.

Antes de nos pronunciarmos sobre as questões supra referidas importa ter presente qual a factualidade que foi dada como provada na 1ª instância e que, de imediato, passamos a transcrever:
1. Por despacho do Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações, com o n° 16201-A/2005 (2a Série) de 06/07/2005, publicado no Diário da República, II Série, de 25/0712005, no uso de competência delegada por despacho do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, foi declarada a utilidade pública com carácter de urgência da expropriação dos bens imóveis e direitos a eles inerentes necessários à execução da obra da ligação do nó de Loulé 1 da VIS às Quatro Estradas - 2° Troço, entre outras, da parcela de terreno n°. 117, com a área de 4.609 m2, do prédio rústico sito na freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo (…) da freguesia de Quarteira, e com a descrição predial n° (…) na Conservatória do Registo Predial.
2. A parcela indicada, designada pelo número 117 na planta parcelar anexa ao referido Despacho, tem a área de 4.609 m2, e destina-se a ser integrada na obra "ligação do nó de Loulé 1 da V.I.S. às Quatro Estradas - 2° troço".
3. A parcela acima indicada integrava o prédio sito em (…), descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o n° (…), como tendo a área de 6.980 m2, com o valor patrimonial de 7.865$00, a confrontar a Nascente com (…), a Norte com (…) e outros, a Poente com (…), e a Sul com caminho.
4. Pela Ap. (…) de …/0112002, foi inscrita na Conservatória do Registo Predial de Loulé, sobre aquele prédio ali descrito com o n° (…), a aquisição em comum e sem determinação da parte ou direito, a favor de (…) e (…), por sucessão e dissolução da comunhão conjugal de (…) , casado que foi com a referida (…) em comunhão geral.
5. A entidade Expropriante é a EP - Estradas de Portugal, EPE, e a mesma tomou posse administrativa da referida parcela a 21/09/2005.
6. A 23/08/2005 foi realizada a Vistoria "ad perpectuam rei memoriam", em cujo auto ficou a constar que a área da parcela a expropriar é de 4.609 m2, com uma configuração trapezoidal irregular, e que de acordo com a Carta de Solos de Portugal a parcela localiza-se numa mancha de solos argilo-arenosos, apresentando-se o terreno com uma vegetação infestante "táguedas", sem ocupação cultural.
7. No Auto da Vistoria "ad perpectuam rei memoriam" ficou também a constar que o prédio a que pertence a parcela a expropriar é servido por rede de esgotos, de água ao domicílio, energia eléctrica e telefone.
8. No Auto da Vistoria "ad perpectuam rei memoriam" ficou ainda a constar que a parcela a expropriar só dispõe de acesso através da área sobrante do prédio a Sul.
9. No Auto da Vistoria "ad perpectuam rei memoriam" ficou, finalmente, a constar que, a Planta de Ordenamento do PDM de Loulé incluí a área da parcela a expropriar em Espaços Agrícolas – Reserva Agrícola Nacional (RAN), e a Planta de Condicionantes em Servidões e Restrições de Utilidade Pública – Reserva Agrícola Nacional (RAN).
10. Na Carta de Ordenamento do PDM de Loulé, o referido prédio está parcialmente inserido em "Espaço Canal – Outras Vias Previstas e respectivos corredores de protecção".
11. O referido prédio tinha boa localização perto da Vila de Quarteira, boa qualidade ambiental, e tinha boa localização em relação às vias principais do Algarve por estar a um quilómetro da Via do Infante, confrontando com via pública, e a duzentos metros da EN 125, e perto da praia.
12. À data da declaração de utilidade pública, o prédio em causa era servido por rede de esgotos, água, energia eléctrica, e telefone.
13. O prédio em causa tinha acesso, pelo Sul, a estrada.
14. No referido prédio, os solos eram de textura areno-argilosa, e de capacidade de uso CID.
15. A área sobrante, à parcela expropriada, do referido prédio, é constituída por duas parcelas, uma a Sul da parcela expropriada e com 1000 m2, e a outra a Norte da parcela expropriada.
16. Naquela zona de (…) existem prédios com construções licenciadas em Reserva Agrícola Nacional (RAN).
17. Porque incluído em Espaços Agrícolas – Reserva Agrícola Nacional (RAN), solo Rural, o prédio em causa encontra-se, no Regulamento do PDM de Loulé, sujeito à regra da proibição de edificação em solo rural.
18. Esta regra admite a excepcional possibilidade de autorização de construção em RAN, para efeito de construção de edificação isolada para habitação própria e permanente, com a área máxima de construção de 250m2 ou 20% da área do terreno, não podendo exceder o máximo de 400 m2.
19. O Serviço de Finanças de Loulé 1 remeteu listagens relativas às freguesias de Almancil, Boliqueime, S. Clemente, e S. Sebastião, com informação do apuramento da média aritmética de € 15,95 do preço por m2, para os melhores três anos do quinquénio de 2000 a 2004 relativa aos terrenos aptos para outros fins que não a construção que, tendo sido avaliados ou inscritos na matriz nesse período também foram objecto de transmissão.
20. O serviço de finanças Loulé 2 (Quarteira) informou não existirem listas das transacções, e das avaliações fiscais que corrijam os valores declarados, efectuadas na zona.
21. Na avaliação realizada no presente recurso do acórdão arbitral, entenderam os peritos do tribunal e da entidade expropriante que a parcela em causa deve ser classificada como "solo apto para outros fins", dado que por se encontrar em Reserva Agrícola Nacional (RAN) e incluída em "Espaço Canal", não pode ser avaliada de acordo com o art. 26º do Cód. Expropriações.
22. Entenderam os três peritos do Tribunal que, tendo em conta a potencialidade agrícola do prédio em causa, e baseando-se no n° 3 do art. 27° do Cód. Expropriações, o cálculo da indemnização seria de € 9.725,45, respeitantes:
- Ao terreno
- € 8.065,75 (4.609 m2 x € 1,75), e
- À depreciação
- € 1.659,70 (2.371 m2 x € 1,75 x 0,4)
Para o que consideraram:
- que o tipo de solos calcários vermelhos admitem culturas de sequeiro de rentabilidade mais elevada que o habitual, designadamente as de fava e ervilha, e que, assim, com um rendimento de 1.400€/ha e despesa de 50%, a uma taxa de capitalização de 4%, o valor por ha será de 1.400 x 0,5 : 0,04 = 17.500 € ha, ou seja, de 1,75 € por m2.
- que o prédio em causa fica muito prejudicado com a amputação de 0,237ha, sofrendo forte desvalorização, nunca inferior a 40%.
23. Entenderam, todavia, os peritos do tribunal que deve ser considerado um critério que melhor reflicta uma correcta avaliação (não especulativa) pelo mercado, e, nessa medida, deve ser considerado, no cálculo da indemnização, o prejuízo causado à edificabilidade possível no terreno em causa, pelo que o valor da justa indemnização será de € 23.109,45, assim calculado com os seguintes dados:
- Área equiparada a "apto para construção"
2.400 m2
- Parte expropriada
1.400 m2
- Máximo de construção permitida
250 m2
- Preço da construção para habitação por m2 de área útil estabelecido na Portaria n° 1425-B/2007, de 31 de Outubro
€ 630,50
- Consequente preço estimado da construção por m2 de área bruta
€ 567,00
- Coeficiente a aplicar resultante da consideração do art. 26° do Cód. Expropriações
- Face ao estabelecido no n° 6 do art. 26°
14,0%
- Face ao estabelecido no n° 7 do art. 26°
Acesso rodoviário pavimentado em betão betuminoso 1,5%
Rede de abastecimento domiciliário de água 1,0 %
Rede de esgotos domésticos 1,0%
Rede de distribuição de energia eléctrica 1,0%
Rede telefónica 1,0%
Total 20%
Vt = 250 m2 x € 567,00 x 0,20 = € 28.350,00
Valor por m2 = E 28.350,00/2.400 m2 = E 11,81/m2
Pelo que o valor da justa indemnização será de € 23.109,45, referente a:
- Terreno agrícola
(4.609 m2 - 1.400 m2 x E 1,75) = E 5.615,75
- Depreciação
(1.371 m2 x E 1,75 x 0,4) = E 959,70
- Equiparado a apto para construção para 250 m2 (1.400m2 x 11,81 m2) = E 16.534
24. Na avaliação realizada no presente recurso do acórdão arbitral, entendeu o perito da entidade Expropriante que deverá aplicar-se o n° 3 do art. 27° do Cód. Expropriações, obtendo-se um valor indemnizatório total de € 10.360,00, referente à soma dos seguintes valores:
- valor da parcela expropriada € 9.402,36
- desvalorização da parte remanescente do prédio € 967,37
- Arredondamento € 0,73
Considerando para tanto o cálculo do valor do solo, tendo em conta o rendimento com base em culturas tradicionais na região, na produção de: Alfarroba (E 2.000,00 Kg/ha), Amêndoa (E 120,00 Kg/ha), Forragem (680 UF/ha), Cujos valores médios ao produtor são: Alfarroba - E 0,36/Kg; Amêndoa - E 0,73/kg; Forragem E 0,15/kg, Em que: V (Valor do terreno) = R (Rendimento fundiário ou rendimento líquido) x 1/t (taxa de juro), e R (Rendimento fundiário ou rendimento líquido) = (2.000,00 Kg x € 0,36 + 120,00 Kg x € 0,73 + 680 DF x € 0,15) x 0,75 = € 682,20/há.
Acrescentando a esse valor de € 682,20/ha uma taxa de capitalização de 4%, e concluindo que V (Valor do terreno) = € 17.055,00/ha = € 1,70/m2
E, atendendo ainda a que no caminho marginal ao prédio existem algumas infraestruturas urbanísticas, considerou ainda uma valorização de mais 20% relativamente ao preço unitário calculado com base no rendimento do prédio rústico com a actividade exclusivamente agrícola, pelo que o seu cálculo do valor do terreno foi de € 9.402,36, com base em 4.609,00 m2 x € 1,70 x € 1,20. Finalmente, na atribuição da desvalorização da parte remanescente do prédio, o perito da entidade expropriante atendeu a que a área expropriada representa 66,03% da área do prédio (4.609,00 x 100/6.980), e a área remanescente ficou dividida em duas partes. Pelo que atendendo à redução e divisão da propriedade, considerou uma desvalorização de 20%, a incidir sobre o custo unitário encontrado para a parcela expropriada e incluindo toda a parcela sobrante, obtendo o referido valor de € 967,37 da seguinte forma: 6.980 m2 - 4.609 m2 = 2.371 m2 x € 1,70 x 1,20 x 0,20 = € 967,37 25. Na avaliação realizada no presente recurso do acórdão arbitral, o perito dos Expropriados entendeu que o valor total da indemnização deverá ser de € 104.933,55, calculado com base na soma de:
- valor de indemnização do terreno agrícola € 67.133,55
- valor de indemnização do terreno para construção € 37.800,00
E no abatimento de um:
- arredondamento
- € 0,55
Para tanto considerou este perito que, porque a parcela está integrada em zona afecta a Espaços Agrícolas – Reserva Agrícola Nacional (RAN), parte do terreno deve ser classificado como "apto para outros fins".
Considerou, ainda, que, porque o prédio margina com via pavimentada, dotada de rede de saneamento, água e electricidade, isso confere a parte da parcela a classificação de "apto para construção". E que essa possibilidade (de construção) tem como área máxima de construção os 400 m2, ao abrigo dos nºs 2 e 3 do art. 88°, do Regulamento do PDM de Loulé.
Entendeu o perito dos Expropriados que, com base nos valores fornecidos pelo Serviço de Finanças de Loulé 1, relativos às freguesias de Almancil, Boliqueime, S. Clemente, e S. Sebastião, é de considerar a média aritmética de € 15,95 do preço por m2, apurada para os melhores três anos dos quinquénio de 2000 a 2004 relativa aos terrenos aptos para outros fins que não a construção que, tendo sido avaliados ou inscritos na matriz nesse período também foram objecto de transmissão.
Considerou, assim, finalmente, que à parcela expropriada deve ser atribuído um valor indemnizatório do terreno agrícola, que é de € 67.133,55, calculado do seguinte modo:
4.609 m2 - 400 m2 (construção) = 4.209 m2;
4.209 m2 x € 15,95 = € 67.133,55
E, por outro lado, um valor indemnizatório do terreno para construção, tendo em conta aquela área máxima de 400 m2,e que é de E 37.800,00, calculado do seguinte modo:
- o preço da construção para habitação por m2 de área útil estabelecido na Portaria n° 1425-B/2007, de 31 de Outubro, para o concelho de Loulé, é de € 630,50; - porque de acordo com o n° 6 do art. 26° do Cód. Expropriações, "Num aproveitamento economicamente normal, o valor do solo apto para a construção deverá corresponder a um máximo de 15% do custo da construção", o preço estimado da construção por m2 de área bruta é de € 94,50 (€ 630,50 x 15% = € 94,50) - pelo que, 400 m2 x € 94,5 = € 37.800,00
26. Relativamente ao prédio em causa, referido em 3, não foi liquidado qualquer Imposto Municipal de Transmissões Onerosas de Imóveis, nem foi realizada qualquer avaliação fiscal para efeitos de Imposto Municipal sobre Imóveis.
27. Foi emitido o termo de declaração de Sisa de 17 de Maio de 1999, no qual foi declarada a compra pelo preço global de 30.000.000$00 (trinta milhões de escudos) de três prédios rústicos sitos em (…) – Quarteira, um inscrito na matriz sob o artigo (…) com a área de 5.400 m2, outro inscrito na matriz sob o artigo (…) com a área de 2470 m2, e outro inscrito na matriz sob o artigo (…) com a área de 2800 m2, cada qual pelo preço parcial de 10.000.000$00 (dez milhões de escudos).
28. Foi emitido o termo de declaração de Sisa de 3 de Maio de 2000, no qual foi declarada a compra pelo preço de 26.000.000$00 (vinte e seis milhões de escudos) de dois prédios rústicos sitos em (…), freguesia de Quarteira, um inscrito na matriz sob o art. (…) com a área de 950 m2, e o outro inscrito na matriz sob o artigo (…) com a área de 4.500 m2, o primeiro pelo preço parcial de 8.000.000$00 (oito milhões de escudos) e o segundo pelo preço parcial de 18.000.000$00 (dezoito milhões de escudos).
29. Foi emitido o termo de declaração de Sisa de 22 de Novembro de 2000, no qual foi declarada a compra pelo preço de 5.000.000$00 (cinco milhões de escudos) do prédio rústico sito em (…), freguesia de Quarteira, inscrito na matriz sob o n° (…) com a área de 0,1200 ha. 30. Foi emitido o termo de declaração de Sisa de 16 de Dezembro de 2002, no qual foi declarada a compra pelo preço de € 43.895,00 (quarenta e três mil oitocentos e noventa e cinco euros) do prédio rústico sito em (…), freguesia de Quarteira, inscrito na matriz sob o artigo (…) com a área de 950 m2, e a compra pelo preço de € 98.762,00 (noventa e oito mil setecentos e sessenta e dois euros) do prédio rústico sito em (…), freguesia de Quarteira, inscrito na matriz sob o artigo (…) com a área de 4500 m2.
31. A entidade Expropriante ofereceu a quantia de € 23.824,15 (vinte e três mil oitocentos e vinte e quatro euros, e quinze cêntimos) pela expropriação da parcela 90, com a área de 648 m2, e considerando na sua oferta benfeitorias identificadas no projecto de expropriações.
32. A entidade Expropriante ofereceu, mediante escrito datado de 03/08/2005, a quantia de € 24.280,67 (vinte e quatro mil duzentos e oitenta euros, e sessenta e sete cêntimos), aos ora Expropriados (…) e (…), como proposta de indemnização pela expropriação amigável da referida parcela 117 que aqui está em causa.

Apreciando, de imediato, a primeira questão suscitada pelos expropriados, aqui recorrentes – relativa à classificação do solo da parcela expropriada – importa, desde já, referir a tal propósito que, nos termos do nº 3 do art. 25º do Cód. Expropriações, os solos para outros fins determinam-se per exclusionem. Daqui resulta que, na delimitação dos solos, há que apurar em primeiro lugar, se se trata de solo apto para construção. Em caso negativo, então o solo será para outros fins. O nº 2 do citado art. 25º estabelece quatro modalidades de solo apto para construção, não com base no critério abstracto da aptidão edificatória, mas sim com base no critério de potencialidade edificativa. A classificação do solo como apto para construção pode resultar, antes de mais, dos planos municipais. Na verdade, a alínea c) do nº 2 do referido art. 25º considera como solo apto para construção o que está destinado, de acordo com o instrumento de gestão territorial, a adquirir as características descritas na alínea a), ou seja, a dispor de infra-estruturas, a adquirir expressão de aglomerados urbanos. O regime de uso do solo é definido mediante a qualificação e classificação do solo (art. 15º, nº 1, da Lei 48/98, de 11/8: Lei das bases da política de ordenamento do território). A classificação do solo em rural e urbano é estabelecida em instrumentos de planeamento territorial (art. 15º, nºs 2 e 3, da Lei 48/98). Estes são os planos municipais de ordenamento do território – que têm natureza regulamentar (art. 69º, nº 1, do Dec. Lei n.º 380/99, de 22/9: Regime de coordenação de âmbitos, nacional, regional, municipal do sistema de gestão territorial, o regime geral de uso do solo e regime de elaboração, aprovação e execução e avaliação dos instrumentos de gestão territorial) – que compreendem as seguintes figuras: PDM (Plano Director Municipal), PU (Plano de Urbanização) e PP (Plano de Pormenor) [art. 9º, nº 2, alíneas a] a c], da Lei 48/98] que são elaborados pelas câmaras municipais envolvidas e, após parecer da junta regional, aprovados pelas assembleias municipais respectivas (art. 20º, nº 3, da Lei 48/98 e arts. 74º e segs. do Dec.-Lei nº 380/99, de 22/9) e são ratificados pelo governo (art. 80º do Dec.-Lei nº 380/99, de 22/9).
De acordo com a alínea c) do nº 2 do art. 25º do Cód. Expropriações não é necessário que o plano reconheça potencialidades construtivas ao terreno em causa, mas que este possa vir a dispor das infra-estruturas referidas em a) do mesmo número e artigo. Para além destes instrumentos existem outros que condicionam, limitam ou excluem a possibilidade edificativa, como sejam os regimes jurídicos que definem e regulam a Reserva agrícola nacional (RAN) e a Reserva ecológica nacional (REN).
Assim sendo, e voltando ao caso em apreço, importa agora classificar o solo da parcela expropriada, atenta a factualidade apurada nos autos.
Ora, resultou provado que, no Auto da Vistoria "ad perpectuam rei memoriam" ficou a constar que, a Planta de Ordenamento do PDM de Loulé incluí a área da parcela a expropriar em Espaços Agrícolas - Reserva Agrícola Nacional (RAN), e a Planta de Condicionantes em Servidões e Restrições de Utilidade Pública – Reserva Agrícola Nacional (RAN) – cfr. ponto 9 dos factos provados.
Na Carta de Ordenamento do PDM de Loulé, o referido prédio está parcialmente inserido em "Espaço Canal – Outras Vias Previstas e respectivos corredores de protecção" – cfr. ponto 10 dos factos provados.
E, porque incluído em Espaços Agrícolas – Reserva Agrícola Nacional (RAN), solo Rural, o prédio em causa encontra-se, no Regulamento do PDM de Loulé, sujeito à regra da proibição de edificação em solo rural – cfr. ponto 17 dos factos provados.
Esta regra admite a excepcional possibilidade de autorização de construção em RAN, para efeito de construção de edificação isolada para habitação própria e permanente, com a área máxima de construção de 250m2 ou 20% da área do terreno, não podendo exceder o máximo de 400 m2 – cfr. ponto 18 dos factos provados.
Na avaliação realizada no presente recurso do acórdão arbitral, entenderam os peritos do tribunal e da entidade expropriante que a parcela em causa deve ser classificada como "solo apto para outros fins", por se encontrar em Reserva Agrícola Nacional (RAN) e incluída em "Espaço Canal" – cfr. ponto 21 dos factos provados.
Como se vê – da factualidade supra transcrita – a parcela expropriada está integrada na RAN e, o regime da RAN (Reserva Agrícola Nacional), encontra-se estabelecido no Dec. Lei nº 196/89, de 14/6, sendo que as zonas RAN são áreas que, por virtude das suas características morfológicas, climatéricas e sociais, apresentam maiores potencialidades para a produção agrícola (art. 3º do Dec.-Lei nº 196/89, de 14/6). Nos termos das alíneas b) e c) do art. 9º do Dec.-Lei n.º 196/89, pode ser possível a construção nos solos da RAN após parecer prévio favorável das comissões regionais de reserva agrícola. Os requisitos impostos pela alínea b), para o efeito, “residência habitual”, “explorações agrícolas viáveis”, “não existam alternativas viáveis”, “não existam alternativas válidas”; ou os requisitos da alínea c) “utilização própria e exclusiva”, “situação de necessidade”, “sem alternativa viável de habitação condigna”, “não resultem inconvenientes para os interesses tutelados”.
Ora, de tudo o que fica exposto, resulta claro que o legislador não pretendeu atribuir aptidão construtiva a estes solos, e, embora a construção seja possível nas condições expostas, ela só existe a título meramente excepcional e mediante certas e apertadas condições.
Como é evidente estes regimes restringem o aproveitamento possível do solo, designadamente quando proíbem a construção, fora dos casos dos desvios excepcionais acima apontados, constituindo assim uma restrição legal ao jus ædificandi, e que, naturalmente se repercute e de sobremaneira, no valor venal do solo.
Ora, não estando apurado nos autos que exista uma expectativa razoável de que tal terreno venha ser desafectado da RAN e destinado à construção não se pode invocar o princípio da justa indemnização, de modo a valorizar-se o solo com base numa potencialidade edificativa legalmente inexistente, ao menos nos casos em que – como o presente – tal expropriação não tem como fim a edificação de um prédio urbano, mas sim a construção de vias de comunicação (auto-estradas).
Neste sentido, a jurisprudência quase unânime do Tribunal Constitucional vai sustentando que a desafectação dos terrenos da RAN/REN, para efeitos de expropriação com vista à construção de vias de comunicação, não traz a tais terrenos uma maior potencialidade edificativa (vejam-se entre outros os acórdãos nºs 20/2000, 247/2000, 219/2001, 243/2001, 121/2002, 172/2002 do Tribunal Constitucional), pelo que a sua classificação como “solo para outros fins” não constitui violação dos princípios constitucionais da igualdade, da proporcionalidade ou da justa indemnização.
Com efeito, a proibição de edificar em terreno integrado na RAN, imposta como é pela própria natureza intrínseca da propriedade, mais não é, pois, do que uma manifestação da hipoteca social que onera a propriedade privada do solo.
Por isso, quando se expropria uma parcela de terreno integrado na RAN, não tem que tomar-se em consideração no cálculo do valor da indemnização, a pagar ao expropriado, a potencialidade edificativa dessa parcela: é que – repete-se – essa potencialidade edificativa não existe, nem a expropriação a faz nascer. E, só assim não será – devendo, então, levar-se em conta a aptidão edificativa do terreno expropriado no cálculo do valor da indemnização a pagar – quando a expropriação for acompanhada da desafectação da Reserva, e aquele terreno destinado a nele se levantarem construções urbanas, o que, como vimos, não ocorreu, de todo, no caso em apreço.
E, sobre esta mesma questão, não podemos também olvidar o AUJ do STJ nº 6/2011 (publicado no D.R., I série, de 17/5/2011), no qual foi uniformizada a seguinte jurisprudência:
- Os terrenos integrados, seja em Reserva Agrícola Nacional (RAN), seja em Reserva Ecológica Nacional (REN), por força do regime legal a que estão sujeitos, não podem ser classificados como «solo apto para construção», nos termos do artigo 25.º, nºs 1, alínea a) e 2, do Código das Expropriações, aprovado pelo artigo 1.º da Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, ainda que preencham os requisitos previstos naquele n.º 2.
Deste modo, atentas as razões e fundamentos supra explanados, entendemos que a parcela expropriada (que, à data da D.U.P., estava integrada na RAN) deve ser classificada como solo para outros fins – cfr. art. 25º, nº 3, do Cód. Expropriações.

Analisando, agora, a segunda questão suscitada pelos recorrentes – relativa à incorrecta fixação do quantum indemnizatório da parcela expropriada – haverá, desde já, que dizer a tal respeito que ter-se-á que averiguar se o uso (novamente) pelos peritos do critério do rendimento para avaliação da parcela expropriada, em detrimento do critério fiscal – sendo que este último funciona, afinal, como o critério primordial ou preferencial no sistema de avaliação consagrado no actual Cód. Expropriações, sendo o critério do rendimento aplicável supletivamente (apenas, e só, na total impossibilidade de aplicação daquele outro) – poderá fazer com que tal avaliação não possa ser considerada na fixação do valor da indemnização a atribuir à parcela expropriada.
Ora, a este propósito, convirá referir, previamente, que a indemnização visa ressarcir o prejuízo que para os expropriados advém da expropriação e é medida pelo valor do bem expropriado, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes à data da DUP (declaração de utilidade pública) – cfr. arts. 1310º do Cód. Civil, 1º e 23º do Cód. Exp.
Na verdade, acolheu-se aqui plenamente o princípio constitucional da justa indemnização consagrado no art. 62º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, o qual se traduz num direito fundamental de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias.
Por outras palavras, dir-se-á que o direito à justa indemnização é um direito fundamental, constitucionalmente consagrado, atribuindo ao expropriado um valor que repare a perda do seu bem, ponderando todas as condições e elementos de valorização existentes no prédio expropriado à data da declaração de utilidade pública, relevando para o efeito, nomeadamente, as características do prédio, a sua localização, a sua área, as suas potencialidades específicas, os preços praticados na zona.
De acordo com a mais recente jurisprudência esta justa indemnização deve traduzir a adequada reconstituição da lesão patrimonial infligida (cfr. Ac. T.C. nº 243/2001, publicado no D.R., II Série, de 4/7/2001), atendendo às circunstâncias específicas de cada caso concreto e respeitando os princípios constitucionais da igualdade e proporcionalidade, não podendo conduzir a indemnizações irrisórias ou manifestamente desproporcionadas (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira. Constituição da República Portuguesa Anotada, 2ª ed., I Vol., pág. 331).
O dano material suportado pelos expropriados deverá corresponder ao valor de mercado do bem expropriado, ou seja, ao seu valor comum (cfr. Ac. R.P. de 14/2/89, C.J. 1989, Tomo I, pág. 190), ou ainda ao seu valor de compra e venda (cfr. Fernando Alves Correia, in “As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública, pág.129).
Ora, no caso em apreço, resulta claro da factualidade apurada nos autos, que a qualificação da parcela expropriada foi classificada (e bem) pelo tribunal “a quo” como solo apto para outros fins – cfr. nº 3 do art. 25º do Cód. Expropriações.
Assim sendo, importa apreciar se a indemnização que foi fixada na decisão sob censura teve, como sua base de cálculo, os critérios estipulados no art. 27º do Cód. Expropriações, a qual, para esse efeito, seguiu de perto o que consta do relatório de avaliação elaborado pelos peritos indicados pelo tribunal (quando classificam o terreno como “apto para outros fins”) – cfr. fls. 703 a 707.
A este propósito, dispõe o nº 1 de tal preceito legal que “o valor do solo apto para outros fins será o resultante da média aritmética actualizada entre os preços unitários de aquisições ou avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuadas na mesma freguesia e nas freguesias limítrofes nos três anos, de entre os últimos cinco, com média anual mais elevada, relativamente a prédios com idênticas características, atendendo aos parâmetros fixados em instrumento de planeamento territorial e à sua aptidão específica”.
Por sua vez acrescenta o nº 2 do citado art. 27º que “para os efeitos previstos no número anterior, os serviços competentes do Ministério das Finanças deverão fornecer, a solicitação da entidade expropriante, a lista das transacções e das avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuadas na zona e os respectivos valores”.
Estipula, de seguida, o nº 3 do preceito em causa que “caso não se revele possível aplicar o critério estabelecido no n° 1, por falta de elementos, o valor do solo para outros fins será calculado tendo em atenção os seus rendimentos efectivo ou possível no estado existente à data da declaração de utilidade pública, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influir no respectivo cálculo”.
Deste modo, da análise do disposto nos aludidos nºs 1 e 3 do citado art. 27º, conclui-se que o legislador optou, no âmbito do Cód. Exp., por não considerar o critério do rendimento, em situação de normalidade económica do mercado, como sendo o critério de aplicação preferencial, relegando a sua aplicação para segundo plano, assumindo, assim, tal aplicação um carácter meramente supletivo, ou seja, só deverá ser tida em consideração caso se demonstre – de todo – não ter sido possível, no caso concreto, fazer a aplicação do critério fiscal referenciado no mencionado nº 1 do art. 27º – sublinhado nosso.
Por outro lado impõe o nº 2 do mencionado art. 27º que sejam fornecidos pelos serviços competentes do Ministério das Finanças a lista das transacções e das avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuados na zona e os respectivos valores com vista à aplicação do critério ou método comparativo previsto no nº 1 do referido preceito (certamente que na redacção desta norma o legislador terá levado em linha de conta que, regra geral, os serviços do Ministério das Finanças têm plena capacidade para fornecer tais elementos em tempo útil, desde que para tal sejam solicitados, quer pela entidade expropriante, quer pelos peritos, quer mesmo pelo próprio tribunal recorrido).
Assim, da tramitação dos presentes autos, constata-se que os Serviços de Finanças forneceram aos peritos uma listagem de transacções de prédios rústicos na freguesia das parcelas expropriadas e nas limítrofes, a qual, porém, não foi seguida pelos peritos por terem entendido que a aplicação do método comparativo implica o conhecimento das condições reais e efectivas de cada um dos prédios a servir de termo de comparação, o que, dada a diversidade de explorações agrícolas existentes na freguesia e nas freguesias envolventes e o facto de se desconhecerem as características próprias que cada um dos prédios constantes da referida listagem possuía à altura da transacção, não permite a comparação, pelo que concluíram pela impossibilidade de aplicação do nº 1 do art. 27º do Código das Expropriações – cfr. relatório de avaliação a fls. 704/705.
E, com base em tal fundamentação, os peritos aplicaram, na avaliação da parcela expropriada, o critério do rendimento a que alude o nº 3 do citado art. 27º, tendo-se aceite tal metodologia sem mais…
Ora, e salvo o devido respeito, se tal raciocínio fosse seguido pelos peritos em todas as avaliações por si efectuadas, relativas aos processos de expropriação, facilmente estava encontrado o caminho para “se fazer entrar pela janela o que não podia entrar pela porta”!!!
Na verdade, e dito por outras palavras, estava assim encontrada a forma de se contornar definitivamente a lei e para nunca ser aplicado, nas avaliações respeitantes a expropriações, o critério fiscal a que alude o citado nº 1 do art. 27º (passando este a ser mera “letra morta”) e aplicando-se sempre, como critério geral ou primordial da avaliação, o critério do rendimento previsto no nº 3 do dito art. 27º, o que o nosso legislador – de todo em todo – não quis que ocorresse, atenta a redacção dos vários números de tal preceito legal, pois, não será demais repetir que, este último critério do rendimento é, no actual Cód. Expropriações de 1999, meramente supletivo e excepcional (ao contrário do que sucedia no anterior Cód. Expropriações, datado de 1991, em que o critério do rendimento era, afinal, o critério geral de avaliação dos prédios a expropriar).
Por isso, no acórdão da R.E. de 5/7/2007, proferido no P. 1291/07, é afirmado o seguinte:
- Do cotejo dos n.ºs 1 e 3 do artº 27º do CE, conclui-se que o legislador optou, no que se refere ao solo classificado como apto para outros fins, por não considerar o critério ou método do rendimento fundiário como de aplicação preferencial, relegando a sua aplicação para segundo plano, assumindo, assim, tal aplicação um carácter meramente supletivo, ou seja, só deverá ser tido em consideração caso se demonstre ter sido, de todo em todo impossível, ao caso concreto, fazer a aplicação do método comparativo – sublinhado nosso.
Por outro lado, como se afirma no Ac. da R.L., de 25/5/2006, disponível in www.dgsi.pt., embora o julgador aprecie livremente as provas, designadamente a pericial, não pode, sem elementos sólidos, afastar-se do resultado das peritagens, mormente se os peritos foram unânimes ou, não o tendo sido, se constituíram uma maioria e ofereceram garantias de imparcialidade. Todavia, só assim não será, caso seja de concluir que os peritos haviam baseado o seu raciocínio em erro manifesto ou critério legalmente inadmissível – sublinhado nosso.
Ora, “in casu”, constatamos que, na avaliação da parcela expropriada, os peritos indicados pelo tribunal utilizaram um critério “legalmente inadmissível”, uma vez que, pelas razões acima transcritas, deviam antes ter seguido o critério fiscal, com base nos elementos que lhes tinham sido fornecidos pela Autoridade Tributária (cfr. o teor do ofício junto a fls. 592 dos autos).
Na verdade, resultou apurado nos autos que o Serviço de Finanças de Loulé 1 remeteu listagens relativas às freguesias de Almancil, Boliqueime, S. Clemente, e S. Sebastião, com informação do apuramento da média aritmética de € 15,95 do preço por m2, para os melhores três anos do quinquénio de 2000 a 2004 relativa aos terrenos aptos para outros fins que não a construção que, tendo sido avaliados ou inscritos na matriz nesse período, também foram objecto de transmissão – cfr. ponto 19 dos factos provados.
Ora, considerando que a parcela expropriada tem 4.609 m2 (cfr. ponto 2 dos factos provados) e que a média aritmética a que alude o art. 27º, nº 1, do Cód. das Expropriações é de 15,95 m2 (aplicação do critério fiscal), forçoso é concluir que o valor da indemnização a atribuir à parcela expropriada é de € 73.513,55.
Por outro lado, o prédio objecto da expropriação ficou amputado em cerca de 2/3 da sua extensão, sendo que o remanescente do terreno ainda ficou dividido em duas parcelas, sofrendo, por isso, uma forte desvalorização, a qual é justo que seja fixada em 40%.
Assim, a parte sobrante ficou com uma extensão de 2.371 m2 (cfr. pontos 2 e 3 dos factos provados), constituída por duas parcelas, pelo que a respectiva depreciação – resultante do cálculo aritmético por multiplicação da área depreciada pelo preço do m2 e pela desvalorização de 40% – deve ser fixada no montante de € 15.126,98 (2.371 m2 x 15,95/m2 x 40%).
Deste modo, e considerando as razões e fundamentos atrás apontados para a aplicação do critério fiscal na avaliação da parcela expropriada (cfr. nº 1 do citado art. 27º), entendemos que a justa indemnização a atribuir aos expropriados – englobando a área expropriada e a depreciação da parcela sobrante – totaliza a quantia de € 88.640,53 (73.513,55 € + 15.126,98 €).
Nestes termos, resulta claro que a sentença recorrida não se poderá manter, de todo, revogando-se a mesma em conformidade e, em consequência, a indemnização a atribuir aos expropriados, aqui recorrentes, é fixada por este Tribunal Superior no valor global de € 88.640,53, acrescendo a tal quantia o montante correspondente à actualização daquela, de acordo com os índices de preços ao consumidor, contada desde a data da declaração da DUP até efectivo e integral pagamento (cfr. artigo 24º, nº 1, do Código das Expropriações).

***

Por fim, atento o estipulado no nº 7 do art. 663º do C.P.C., passamos a elaborar o seguinte sumário:
- Os terrenos integrados em Reserva Agrícola Nacional (RAN), por força do regime legal a que estão sujeitos, não podem ser classificados como “solo apto para construção”, devendo sê-lo como “solo para outros fins”.
- O julgador pode – e deve – afastar-se do resultado da peritagem quando seja de concluir que os peritos tenham usado, na avaliação da parcela expropriada, um critério legalmente inadmissível (critério supletivo do rendimento).
- Existindo elementos nos autos que permitam utilizar, na avaliação da parcela expropriada, o critério primordial ou preferencial fixado pela nossa lei – critério fiscal – deverá ser, com base em tal critério, que haverá de ser fixada a justa indemnização a pagar pela entidade expropriante aos expropriados.

Decisão:

Nestes termos, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente o presente recurso de apelação e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida, fixando-se em € 88.640,53 o valor global da indemnização devida pela entidade expropriante aos aqui expropriados, acrescendo a tal quantia o montante correspondente à actualização daquela, de acordo com os índices de preços ao consumidor, contada desde a data da declaração da DUP até efectivo e integral pagamento.
Custas pela entidade expropriante, aqui apelada.
Évora, 22 de Março de 2018
Rui Machado e Moura
Eduarda Branquinho
Mário Canelas Brás
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[1] Cfr., neste sentido, ALBERTO DOS REIS in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, págs. 362 e 363.
[2] Cfr., também neste sentido, os Acórdãos do STJ de 6/5/1987 (in Tribuna da Justiça, nºs 32/33, p. 30), de 13/3/1991 (in Actualidade Jurídica, nº 17, p. 3), de 12/12/1995 (in BMJ nº 452, p. 385) e de 14/4/1999 (in BMJ nº 486, p. 279).
[3] O que, na alegação (rectius, nas suas conclusões), o recorrente não pode é ampliar o objecto do recurso anteriormente definido (no requerimento de interposição de recurso).
[4] A restrição do objecto do recurso pode resultar do simples facto de, nas conclusões, o recorrente impugnar apenas a solução dada a uma determinada questão: cfr., neste sentido, ALBERTO DOS REIS (in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, págs. 308-309 e 363), CASTRO MENDES (in “Direito Processual Civil”, 3º, p. 65) e RODRIGUES BASTOS (in “Notas ao Código de Processo Civil”, vol. 3º, 1972, pp. 286 e 299).