Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
69/25.5T8SNS.E1
Relator: EMÍLIA RAMOS COSTA
Descritores: CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL
TACÓGRAFO
APRESENTAÇÃO
RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR
MEDIDA DA COIMA
Data do Acordão: 11/27/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL - CONTRA-ORDENAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO RECORRIDA
Área Temática: SOCIAL
Sumário: Sumário elaborado pela relatora:

I – Nos termos conjugados dos arts. 25.º, n.º 1, als. a) e b), da Lei n.º 27/2010, de 30-08, e 36.º, n.º 1, i), do Regulamento (EU) 165/2014, de 04-02, constitui contraordenação muito grave a não apresentação, quando solicitada por agente encarregado da fiscalização, das folhas de registo utilizadas e de qualquer registo manual e impressão efetuados, que o condutor esteja obrigado a apresentar.


II – Nos termos do art. 36.º, nºs. 1, i), e 3, do Regulamento (EU) 165/2014, de 04-02, os condutores de veículo equipado com tacógrafo analógico estão obrigados a apresentar, quando os agentes de controlo autorizados o solicitem, as folhas de registo do dia em curso e as utilizadas pelo condutor nos 28 dias anteriores ou, na falta destas, de qualquer outro documento comprovativo que permita justificar o incumprimento dessas disposições.


III – A mera não apresentação dos registos relativos ao dia da fiscalização e aos 28 dias que antecedem essa ação de fiscalização ou de documento justificativo para essa não apresentação preenche os elementos objetivos da contraordenação prevista no art. 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27/2010, de 30-08, com referência ao art. 36.º, n.º 1, do Regulamento (EU) 165/2014, de 04-02.


IV – Não é injusta, nem desproporcional, a condenação da arguida na coima de 35 UC quando se demonstrou que não foram apresentados registos referentes a 13 dias e que quem incumpriu o dever objetivo de cumprimento da norma legal foi o próprio sócio gerente da arguida, a quem incumbia um acrescido dever de cuidado.

Decisão Texto Integral: Proc. n.º 69/25.5T8SNS.E1

Secção Social do Tribunal da Relação de Évora1





Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:


I – Relatório


A arguida “AA, Cortiças e Madeiras, Unipessoal, Lda.”2 impugnou judicialmente a decisão da Autoridade para as Condições de Trabalho (doravante designada ACT) que aplicou à arguida uma coima de 35 UC, no valor de €3.570,00, com a sanção acessória de publicidade, pela prática de uma contraordenação muito grave, a título de negligência, prevista pelo art. 25.º, n.º 1, al. a), da Lei n.º 27/2010, de 30-08, com referência ao disposto no n.º 7 do art. 15.º do Regulamento CEE n.º 3821/85, de 20-12, na redação dada pelo art. 26.º do Regulamento (CE) n.º 561/2006, atualmente prevista no art. 36.º, n.º 1, do Regulamento (EU) 165/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 04-02; e ainda pelo art. 562.º, n.º 1, do Código do Trabalho.





O Tribunal de 1.ª instância, proferiu sentença, em 15-05-2025, com o seguinte teor decisório:

Em face do exposto, o tribunal julga totalmente improcedente o presente recurso de impugnação judicial interposto e, em consequência, condena a arguida AA – Cortiças e Madeira Unipessoal, Lda. na coima de €3.570,00 (três mil quinhentos e setenta euros), pela prática de uma contra-ordenação muito grave por negligência, prevista e punida pelo artigo 36.º, n.º 2 do Regulamento (UE) n.º 165/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Fevereiro e art.º 25.º, n.º 1 al. a), da Lei n.º 27/2010, de 30 de Agosto.

*

Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC (cfr. artigos 94.º, n. os 1 a 3 do RGCO, 59.º da Lei 107/09 e 8.º, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro e Tabela III anexa ao mesmo diploma).

*

Comunique à autoridade administrativa - artigo 45.º, n.º 3, da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro.

*

Oportunamente proceder-se-á ao depósito da presente sentença (artigo 372.º, n.º 5, Cód. Proc. Penal).

Notifique.




Inconformada, veio a arguida “AA, Lda.” interpor recurso da sentença, apresentando as seguintes conclusões:

1 - Dos factos assentes (pontos 8; 9 e 10) não se retira a previsão da alínea a), do no 1, do arto. 25 0 da Lei 27/2010, de 30/8. Ao agente fiscalizador foram apresentados os documentos que o legal representante da Recorrente trazia consigo. Não foi recusada a exibição dos documentos quanto solicitados. Os registos em falta, naquele momento, correspondiam a períodos de não circulação ou a dias de descanso semanal (como se verá abaixo, podiam nem existir);

2 - A norma contida no no 2, do arto. 36 do Regulamento EU 165/2014 só se mostra preenchida se não forem apresentadas as folhas de registo do dia, e dos últimos 28 dias, sendo excluída a ilicitude da conduta se houver qualquer outro meio de prova que permita justificar o incumprimento;

3 - Da Nota de Orientação 5 ao Regulamento EU 561/2006 constam os casos em que a declaração escrita pode ser utilizada (nenhum é coincidente com o caso em apreço), assim como resulta o entendimento de que não deve ser exigido qualquer formulário ou documento no caso dos períodos normais de repouso diário ou semanal (ponto 9 dos factos assentes);

4 - Acresce que a declaração de atividade, prevista na Decisão da Comissão no 2009/959/EU, com referência ao artº. 11.º, n.º 3, da Diretiva 2006/22/CE, de 15/3, não é obrigatória em Portugal uma vez que a Lei 27/2010, de 30/8, que transpôs para o direito interno tal Diretiva é omissa quanto à mesma;

5 - Resulta dos factos assentes que a Recorrente provou que o veículo fiscalizado não circulou nos dias correspondentes a falta de registo de tacógrafo, o que é suficiente para excluir a ilicitude resultante de, momento da fiscalização, não terem sido exibidos todos os últimos 28 dias;

6 - Considerando o espírito da norma, o bem jurídico em causa é a prevenção da segurança rodoviária (através da obrigatoriedade de respeitar os tempos de repouso) e não a punição do ato de simples não exibição, no momento da fiscalização, de um mero papel (como se de infração autónoma se tratasse). Em face dos factos assentes, verifica-se que os dias em que não há registo de tacógrafo (dentro do período de 28 dias) correspondem a dias de não circulação e/ou a dias de descanso semanal. Logo, a Recorrente logrou provar a exclusão da ilicitude da falta de exibição, no momento da fiscalização, de todos os 28 dias pois não resultam provas (consubstanciadas em factos assentes) de condução durante mais horas do que as legalmente permitidas nem de que a Recorrente tenha pretendido furtar-se ou iludir o controlo das autoridades;

7 - A punição por uma infração que, na prática, não ocorreu, por uma conduta que não infringiu o espírito da norma e que não implicou risco ou prejuízo para quem quer que seja, nomeadamente, mediante a imposição de uma coima de valor consideravelmente elevado para uma pequena sociedade familiar unipessoal (3.570€), revela-se injusta e desproporcional.

Termos em que deve conceder-se provimento ao presente recurso, com as legais consequências.




O Ministério Público apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso, devendo ser mantida a sentença recorrida





Tendo o Tribunal de 1.ª instância admitido o recurso nos termos legais, após a subida dos autos a este Tribunal da Relação, a Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, pugnando pela improcedência do recurso, devendo ser mantida a sentença recorrida.


Não houve resposta a tal parecer, pelo que colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.





II – Objeto do recurso


Nos termos dos arts. 403.º e 412.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal, ex vi do art. 41.º, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27-10 (RGCO) e arts. 50.º, n.º 4 e 60.º da Lei n.º 107/2009, de 14-09, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da recorrente, ressalvada a matéria de conhecimento oficioso (art. 410.º, nºs. 2 e 3, do Código de Processo Penal).


No caso em apreço, as questões que importa decidir são:


1) Se os factos dados como provados preenchem os elementos objetivos e subjetivos do tipo da contraordenação imputada à arguida; e


2) Se a coima aplicada é injusta e desproporcional.





III. Matéria de Facto


O tribunal da 1.ª instância deu como provados os seguintes factos:

1.A arguida dedica-se à actividade de comércio por grosso de cortiça em bruto, com o CAE 46213.

2. No dia 9 de Junho de 2021, pelas 09:50 horas, a arguida tinha a circular no IC 1, ao Km 607,700, o veículo pesado de mercadorias, com a matrícula ..-..-BD, equipado com tacógrafo.

3. O referido veículo era conduzido pelo sócio-gerente da arguida, BB.

4. Naquelas circunstâncias de tempo e lugar, no acto da fiscalização, o condutor identificado não se fazia acompanhar dos registos utilizados no tacógrafo, respeitantes à totalidade dos 28 dias anteriores ao da fiscalização, já que apenas tinha consigo os discos dos dias 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 24, 25, 26, 28 e 31 de Maio de 2021 e 4 e 7 de Junho de 2021.

5. O condutor não apresentou qualquer documento idóneo que justificasse a inexistência dos demais registos, nomeadamente Declaração de Actividade referente aos dias em falta.

6. A arguida não cuidou de organizar a sua actividade de modo a permitir a fiscalização pelas autoridades competentes dos tempos de condução e repouso do seu sócio-gerente e motorista.

7. Sobre a arguida impendia a obrigação de acautelar que o motorista e seu sócio-gerente se fizesse acompanhar dos registos referentes aos vinte e oito dias anteriores ao dia da fiscalização ou documento idóneo que justificasse a inexistência dos registos referentes aos vinte e oito dias anteriores, todavia, não actuou em conformidade.

8. Aquando da fiscalização, o condutor referiu que nos dias para os quais não apresentava disco do tacógrafo, não tinha conduzido qualquer veículo.

9. Nos dias 1, 2, 3, 5, 6 e 8 de Junho de 2021, o condutor não conduziu o veículo identificado e nos dias 5 e 6 de Junho de 2021 não fez também quaisquer cargas, por se tratarem respectivamente de Sábado e Domingo.

10. O condutor possui discos de tacógrafo do veículo identificado, referentes aos dias 3, 4, 5, 6, 7 e 8 de Maio de 2021.

11. Com data de 12 de Maio de 2021, a arguida, na pessoa do seu sócio-gerente, emitiu declaração de actividade, constando da mesma que nos dias 9 a 10, 30 e 8 a 12 de Maio de 2021, o condutor BB, gerente “estava disponível”.




E deu como não provados os seguintes factos:

A. No acto da fiscalização, o sócio gerente e motorista da arguida, BB tivesse apresentado os discos de tacógrafo referentes aos dias 3, 4, 5, 6, 7 e 8 de Maio de 2021.

B. No acto da fiscalização, o sócio gerente e motorista da arguida, BB tivesse apresentado a declaração de actividade datada de 12 de Maio de 2021.




IV – Enquadramento jurídico


1) Se os factos dados como provados preenchem os elementos objetivos e subjetivos do tipo da contraordenação imputada à arguida


Considera a recorrente que os factos imputados à arguida não preenchem a al. a) do n.º 1 do art. 25.º da Lei n.º 27/2010, de 30-08, visto que ao agente fiscalizador foram apresentados os documentos que o motorista e representante legal da arguida trazia consigo, não tendo sido recusada a exibição de quaisquer dos documentos solicitados, uma vez que os registos em falta correspondiam a períodos de não circulação ou a dias de descanso semanal.


Considera ainda que não deve ser exigido qualquer documento no caso dos períodos normais de repouso diário ou semanal.


Conclui, por fim, que, não havendo circulação nos dias em que não foram apresentados registos, está excluída a ilicitude.


Considera também que a Declaração de Atividade prevista na Decisão da Comissão n.º 2009/959/EU, com referência ao art. 11.º, n.º 3, da Diretiva 2006/22/CE, de 15-03, não é obrigatória em Portugal, uma vez que a Lei n.º 27/2010, de 30-08, que transpôs para o direito interno tal Diretiva, é omissa quanto à mesma.


Apreciemos.


Dispõe o art. 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27/2010, de 30-08, que:

1 - Constitui contra-ordenação muito grave a não apresentação, quando solicitada por agente encarregado da fiscalização:

a) De folhas de registo e impressões, bem como de dados descarregados do cartão do condutor;

b) De cartão de condutor, das folhas de registo utilizadas e de qualquer registo manual e impressão efectuados, que o condutor esteja obrigado a apresentar;

c) De escala de serviço com o conteúdo e pela forma previstos na regulamentação comunitária aplicável.

Estipula, por sua vez, o art. 36.º do Regulamento (EU) 165/2014, de 04-02, que:

1. Se conduzirem um veículo equipado com tacógrafo analógico, os condutores devem apresentar, quando os agentes de controlo autorizados o solicitem:

i) As folhas de registo do dia em curso e as utilizadas pelo condutor nos 28 dias anteriores;

ii) O cartão de condutor, se o possuir; e

iii) Qualquer registo manual e impressão efetuados durante o dia em curso e nos 28 dias anteriores, tal como previsto no presente regulamento e no Regulamento (CE) n.º 561/2006.

2. Se conduzirem um veículo equipado com tacógrafo digital, os condutores devem apresentar, quando os agentes de controlo autorizados o solicitem:

i) O seu cartão de condutor;

ii) Qualquer registo manual e impressão efetuados durante o dia em curso e nos 28 dias anteriores, nos termos do presente regulamento e no Regulamento (CE) n.º 561/2006;

iii) As folhas de registo correspondentes ao período referido na alínea ii), no caso de terem conduzido um veículo equipado com tacógrafo analógico.

3. Os agentes autorizados de controlo podem verificar o cumprimento do Regulamento (CE) n.o 561/2006 através da análise das folhas de registo ou dos dados, visualizados, impressos ou descarregados registados pelo tacógrafo ou pelo cartão de condutor ou, na falta destes meios, da análise de qualquer outro documento comprovativo que permita justificar o incumprimento de quaisquer disposições, como as do artigo 29.º , n.º 2, e do artigo 37.º, n.º 2, do presente regulamento.

Ora, da conjugação destes dois artigos resulta, em primeiro lugar, que constitui contraordenação muito grave a não apresentação, quando solicitada por agente encarregado da fiscalização, (a) de folhas de registo e impressões, bem como de dados descarregados do cartão do condutor, (b) de cartão de condutor, das folhas de registo utilizadas e de qualquer registo manual e impressão efetuados, que o condutor esteja obrigado a apresentar; e (c) de escala de serviço com o conteúdo e pela forma previstos na regulamentação comunitária aplicável.


No caso em apreço, releva essencialmente as obrigações constantes das alíneas a) e b), ou seja, as folhas de registo, sendo obrigatória tal apresentação relativamente ao dia em curso e às utilizadas pelo condutor nos 28 dias anteriores.


Deste modo, e sem distinção do que tenha ocorrido nos 28 dias anteriores ao da fiscalização, designadamente se o condutor exerceu, ou não, a atividade da condução, se esteve, ou não, em gozo de folga ou de férias ou se esteve, ou não, em ações de formação, de acordo com o teor do disposto no ponto i) do n.º 1 do art. 36.º do Regulamento (EU) 165/2014, de 04-02, é sempre exigível ao condutor daquele tipo de veículos, quando solicitado por agentes de fiscalização, a apresentação das folhas de registo do dia em curso e das utilizadas nos 28 dias anteriores.


Acresce que a verificação do cumprimento do Regulamento (CE) n.º 561/20063 e do Regulamento (EU) 165/2014 pode ser efetuado pelos agentes de fiscalização através da análise das folhas de registo ou dos dados, visualizados, impressos ou descarregados registados pelo tacógrafo ou pelo cartão de condutor ou, na falta destes meios, da análise de qualquer outro documento comprovativo que permita justificar o incumprimento de quaisquer disposições, ou seja, inexistindo registos no tacógrafo, como será o caso dos dias em que o condutor não exerça a atividade da condução, essa inexistência de registo pode sempre ser comprovada por qualquer tipo de documento, desde que este seja adequado a atestar a razão dessa inexistência de registo no tacógrafo.


Dir-se-á, por fim, se a intenção do legislador fosse a de dispensar a apresentação de qualquer documento comprovativo por parte do condutor relativamente aos dias em que não tivesse exercido a condução, bastar-lhe-ia ter feito constar no art. 36.º, n.º 1, i), do Regulamento (EU) 165/2014, de 04-02, que os condutores deviam apresentar, quando os agentes de controlo autorizados solicitassem, as folhas de registo do dia em curso e as utilizadas pelo condutor nos 28 dias anteriores em que tivesse havido condução, o que manifestamente não fez.


Cita-se, a este propósito, o acórdão desta Relação, proferido em 24-05-2018:4 5

I – Constitui contraordenação muito grave a não apresentação, quando solicitada por agente encarregado da fiscalização, de cartão de condutor, das folhas de registo utilizadas e de qualquer registo manual e impressão efetuados, que o condutor esteja obrigado a apresentar.

II – Por isso, a não apresentação ao agente encarregado da fiscalização rodoviária das folhas de registo dos 28 dias anteriores, com ausência de justificação imediatamente apresentada, preenche objetivamente o tipo de ilícito que a lei consagra;

Fazendo parte do tipo objetivo da contraordenação imputada à arguida a não apresentação aos agentes de fiscalização das folhas de registo relativas ao dia da fiscalização e ainda as relativas aos 28 dias anteriores, sem qualquer distinção de ter ou não havido condução nesses dias, a simples não apresentação de determinadas folhas de registo apenas por, nesses dias, não ter havido condução, não permite, só por si, afastar a ilicitude do comportamento adotado.


Na realidade, tendo a arguida agido com negligência, competia-lhe ter cuidado de organizar a sua atividade de modo a permitir a fiscalização pelas autoridades competentes dos tempos de condução e repouso do seu sócio-gerente e motorista nos dias impostos pela lei. Não o tendo feito, o seu comportamento é ilícito por violação de um dever objetivo legalmente imposto.


Por fim, e quanto à não obrigatoriedade em Portugal da Declaração de Atividade prevista na Decisão da Comissão n.º 2009/959/EU, com referência ao art. 11.º, n.º 3, da Diretiva 2006/22/CE, de 15-03, é efetivamente verdade que tal Declaração de Atividade não se mostra obrigatória em Portugal, porém, não é pela não apresentação dessa Declaração que a contraordenação imputada à arguida se mostra verificada. Essa contraordenação mostra-se verificada porque não foram apresentados aos agentes de fiscalização as folhas de registo relativas ao dia da fiscalização e as relativas aos 28 dias anteriores, sendo que, inexistindo condução nalguns desses dias, deveria o motorista ter na sua posse, não necessariamente a Declaração de Atividade nos termos previstos na referida Diretiva, mas sim documento idóneo que justificasse tal não apresentação.6 Não tendo o referido motorista apresentado qualquer documento que fosse suscetível de justificar tal não apresentação, mostram-se preenchidos os elementos objetivos e subjetivos da imputada contraordenação.


Pelo exposto, apenas nos resta concluir pela improcedência, nesta parte, da pretensão recursiva da arguida.


2 – A coima aplicada é injusta e desproporcional


Considera a recorrente que a coima é injusta e desproporcional, uma vez que se reporta a uma infração que na prática, não ocorreu, visto não ter infringido o espírito da norma; por não ter implicado risco ou prejuízo para quem quer que seja, sendo a coima de valor consideravelmente elevado para uma pequena sociedade familiar unipessoal.


Como já se esclareceu supra, a contraordenação imputada mostra-se efetivamente preenchida, tendo a atuação da arguida infringido o espírito e a letra da norma, inexistindo qualquer atenuação da ilicitude ou da culpa, pelo que é atendendo aos limites mínimos e máximos desta contraordenação que se deve averiguar da sua adequação e proporcionalidade.


Ora, nos termos do art. 14.º, n.º 4, al. a), da Lei n.º 27/2010, de 30-08, a referida contraordenação é punida com uma coima entre 20UC a 300 UC.


No caso em apreço, foi a arguida condenada numa coima de 35 UC, o que se afigura ajustado, não só porque não foram apresentados registos referentes a vários dias (13 dias), como quem incumpriu o dever objetivo de cumprimento da norma legal foi o próprio sócio gerente da arguida, a quem incumbia um acrescido dever de cuidado.


Pelo exposto, improcede também aqui a pretensão recursiva da arguida.





Sumário elaborado pela relatora:


I – Nos termos conjugados dos arts. 25.º, n.º 1, als. a) e b), da Lei n.º 27/2010, de 30-08, e 36.º, n.º 1, i), do Regulamento (EU) 165/2014, de 04-02, constitui contraordenação muito grave a não apresentação, quando solicitada por agente encarregado da fiscalização, das folhas de registo utilizadas e de qualquer registo manual e impressão efetuados, que o condutor esteja obrigado a apresentar.


II – Nos termos do art. 36.º, nºs. 1, i), e 3, do Regulamento (EU) 165/2014, de 04-02, os condutores de veículo equipado com tacógrafo analógico estão obrigados a apresentar, quando os agentes de controlo autorizados o solicitem, as folhas de registo do dia em curso e as utilizadas pelo condutor nos 28 dias anteriores ou, na falta destas, de qualquer outro documento comprovativo que permita justificar o incumprimento dessas disposições.


III – A mera não apresentação dos registos relativos ao dia da fiscalização e aos 28 dias que antecedem essa ação de fiscalização ou de documento justificativo para essa não apresentação preenche os elementos objetivos da contraordenação prevista no art. 25.º, n.º 1, da Lei n.º 27/2010, de 30-08, com referência ao art. 36.º, n.º 1, do Regulamento (EU) 165/2014, de 04-02.


IV – Não é injusta, nem desproporcional, a condenação da arguida na coima de 35 UC quando se demonstrou que não foram apresentados registos referentes a 13 dias e que quem incumpriu o dever objetivo de cumprimento da norma legal foi o próprio sócio gerente da arguida, a quem incumbia um acrescido dever de cuidado.





V - Decisão


Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso improcedente, e, consequentemente, confirmar a sentença recorrida.


Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (art. 8.º, n.º 7 e tabela III do Regulamento das Custas Processuais).


Notifique.



Évora, 27 de novembro de 2025

Emília Ramos Costa (relatora)

Mário Branco Coelho

Paula do Paço

________________________________________

1. Relatora: Emília Ramos Costa; 1.º Adjunto: Mário Branco Coelho; 2.ª Adjunta: Paula do Paço.↩︎

2. Doravante “AA, Lda.”.↩︎

3. Que se mantém em vigor.↩︎

4. No âmbito do processo n.º 977/17.7T8PTG.E1, consultável em www.dgsi.pt.↩︎

5. Veja-se, igualmente, entre muitos, os acórdãos, do TRE proferido em 27-06-2019 no âmbito do processo n.º 2276/18.8T8EVR.E1; do TRE proferido em 08-11-2017 no âmbito do processo n.º 1523/15.2T8BJA.E1; do TRP proferido em 05-12-2011 no âmbito do processo n.º 68/11.4TTVCT.P1; do TRG proferido em 20-10-2016 no âmbito do processo n.º 1154/15.7T8BCL.G1; e do TRL proferido em 16-03-2016 no âmbito do processo n.º 196/15.7T8BRR.L1.4; todos consultáveis em www.dgsi.pt.↩︎

6. Veja-se acórdão do TRG proferido em 20-10-2016 no processo n.º 1154/15.7T8BCL.G1, consultável em www.dgsi.pt.↩︎