Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
882/05.0TAOLH-C.E1
Relator: ANA BACELAR CRUZ
Descritores: ASSISTENTE EM PROCESSO PENAL
TAXA DE JUSTIÇA
ISENÇÃO
Data do Acordão: 09/18/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário:
I - Das diversas redações dadas ao artigo 517.º do Código de Processo Penal resulta o entendimento persistente de que a isenção do pagamento da taxa de justiça pelo assistente tem lugar quando ocorra não pronúncia ou absolvição, por razões supervenientes à acusação – particular que formulou ou pública com que se conformou – que não lhe sejam imputáveis.

II - As razões supervenientes consagradas pelo legislador, não imputáveis ao assistente – entre as quais se contam a descriminalização dos factos imputados, a amnistia, a reparação do crime, a desistência de queixa, a prescrição, a absolvição do arguido a quem é imposta medida de segurança – hão-de ocorrer em momento anterior ao conhecimento de mérito da causa ou ser dele contemporâneas, isto é, conhecidas e declaradas na decisão [sentença ou acórdão] proferida após realização do julgamento.

III - Considerando que a decisão definitivamente proferida nos autos é de absolvição do Arguido da prática do crime de burla agravada e qualificada por apropriação ilegítima de bens do sector cooperativo e do pedido de indemnização civil contra si formulado pela CCAM do Algarve, não se verifica a previsão do artigo 517.º do Código de Processo Penal.

Porque a eventual prescrição do procedimento criminal ocorreu após a absolvição do Arguido, na sequência do julgamento, e esta é a primeira e a única causa de extinção do procedimento criminal. E a única que pode afirmar-se, sob pena da prática de atos inúteis que a lei expressamente proíbe.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora


I. RELATÓRIO

No processo comum nº 882/05.0TAOLH, do 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Olhão, datada de 26 de maio de 2011, foi proferida decisão que indeferiu requerimento formulado pela Assistente “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Algarve, C.R.L.”, com vista à declaração de extinção do procedimento criminal, por prescrição, e de que não há lugar a custas.

Inconformada com tal decisão, a Assistente dela interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões [transcrição]:

«1ª) Dispondo o art. 517º do CPP que o assistente em processo penal é isento de custas quando o arguido não deva ou não possa ser condenado por razões supervenientes à acusação, é mister aí enquadrar a hipótese de sobre o procedimento em causa terem decorrido todas as necessárias condições para o ter de considerar prescrito.

2ª) E isso por força das características próprias desta excepção: o ser peremptória, injuntiva e até de conhecimento oficioso.

3ª) E por força, também, da verificação de todas as condições de que depende: do decurso de prazo determinado desde a data dos factos (termo a quo) até ao trânsito em julgado do processo (termo ad quem), com atenção às causas de suspensão e de interrupção e ao limite máximo injuntivamente imposto quanto a esta última.

4ª) Tudo o que, em aplicação ao presente caso, tem de determinar que, devendo o presente processo ser considerado extinto por incidência peremptória, oficiosa e obrigatória da prescrição, não deve nem pode haver lugar a custas, razão esta que, também legal e logicamente, se estende ao pedido cível cujo regime é, como sempre foi no presente processo, de conexão (artigos 71º e seguintes do CPP) com o processo crime.

5ª) Deve, pois, o despacho que não atendeu a esta reclamação por considerar que a mesma pretenderia reabrir o processo no respectivo mérito ou fundo ser substituído pela ordem de aplicação do artigo 517º do Código de Processo Penal e respectiva extensão ao pedido cível conexo, isentando-se de custas a assistente ora reclamante e recorrente.

Assim se fará o que se Vos pede: JUSTIÇA!»

O Ministério Público, junto do Tribunal recorrido, respondeu, formulando as seguintes conclusões [transcrição]:

«1. por acórdão de fls. 1914 a 1935 foi o referido recurso rejeitado e, ainda mais uma vez condenada a Recorrente, desta feita, no pagamento de 9 UCs de taxa de justiça e 8 UCs nos termos do n.º 3 do art. 420.º do CPP.

2. Tal decisão transitou, na íntegra, em julgado a 07.02.2011, cfr. Fls. 1940.

3. Emitidas e liquidadas que foram as custas dos autos veio, mais uma vez, a Recorrente insurgir-se quanto ao pagamento das mesmas, mesmo tendo já sido condenada em TODAS as instâncias nesse mesmo pagamento.

4. Ora atendendo a que qualquer uma das decisões proferidas nos autos transitaram, máxime na data do trânsito em julgado constante de fls. 1940 – 07.02.2011, somos de considerar ter igualmente transitado em julgado a decisão condenatória quanto ao segmento de custas, segmento de custas esse que havia sido já o objecto principal dos recursos anteriormente interpostos pela Assistente/demandante civil.

5. Assim, a Recorrente não vem, senão, de uma decisão que:

a) se encontra já transitada em julgado, pelo que irrecorrível, e

b) foi já apreciada nos autos pelas referidas decisões transitadas em julgado pelo que assume a força de caso julgado.

Termos em que se conclui sufragando a posição adoptada pela Mmª Juiz “a quo” no douto despacho sindicado, julgando-se o recurso interposto pela recorrente Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Algarve, C.R.L. improcedente, como é de toda a

JUSTIÇA.»

v
O recurso foi admitido.
Enviados os autos a este Tribunal da Relação, a Senhora Procuradora Geral Adjunta, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Entende que a pretensão da Recorrente contende com o trânsito em julgado da decisão que a condenou no pagamento de custas. E que a liquidação da conta de custas se limita a efetuar os cálculos devidos nos termos e por força dessa decisão.

E apelidando a Recorrente de verdadeira vítima da desproteção das vítimas consagrada pelo artigo 517.º do Código de Processo Penal, afirma que o despacho recorrido não enferma de qualquer ilegalidade, nem viola qualquer disposição legal pertinente.

v
Observou-se o disposto no artigo 417.º, nº 2, do Código de Processo Penal.

Na resposta que apresentou, a Recorrente acentua que isenção e prescrição são coisas distintas.

Regista a crítica feita pelo Ministério Público, nesta Instância, ao disposto no artigo 517.º do Código de Processo Penal no que ele possa conter de “desprotecção das vítimas”, invoca o disposto no artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa e a necessidade da interpretação e aplicação daquele preceito em conformidade com a Lei Fundamental.

E insiste que o cerne da questão é a imperatividade do efeito prescritivo – tendo a prescrição sido alcançada antes do trânsito em julgado, não pode haver lugar a custas.

Efetuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência.

Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.


II. FUNDAMENTAÇÃO

De acordo com o disposto no artigo 412.º do Código de Processo Penal e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de Outubro de 1995[[1]], o objeto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respetiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.

O objeto do recurso, face ao teor das conclusões da sua motivação, reconduz-se a determinar se ocorre a previsão do artigo 517.º do Código de Processo Penal.

v
Com interesse para a decisão, os autos fornecem os seguintes elementos:

1. Nos autos, o Ministério Público acusou JC pela prática, em coautoria, de um crime de burla agravada e qualificada por apropriação ilegítima de bens do sector cooperativo, previsto e punível pelos artigos 313.º, 314.º, alínea c), e 332.º, n.º 1, do Código Penal (na redação do Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro), e pelos artigos 217.º, 218.º, n.º 2, alínea a), e 234.º do Código Penal (na redação do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março).

A Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Algarve (doravante CCAM do Algarve) pediu, com base em factos idênticos aos constantes da acusação, o pagamento dos prejuízos que suportou.

Por acórdão do Tribunal Coletivo do Círculo Judicial da Faro, datado de 3 de junho de 2008, concluindo-se que não se provaram os factos que poderiam sustentar a responsabilização criminal e civil, foi o Arguido absolvido da prática do crime pelo qual se encontrava acusado e do pedido de indemnização contra si formulado.

2. A CCAM do Algarve, em 23 de junho de 2008, requereu «a prolação, nos autos, do esclarecimento de que não são devidas custas cíveis em razão do carácter não autónomo do pedido em causa

Pretensão que foi indeferida, por decisão (coletiva) datada de 7 de julho de 2008.

3. Em 21 de julho de 2008, a CCAM do Algarve dirigiu novo requerimento ao processo, solicitando esclarecimento relativamente à decisão tomada sobre o pedido de indemnização civil.

Pretensão que foi indeferida, por decisão (coletiva) datada de 23 de julho de 2008.

4. Dos acórdãos supra referido, a CCAM do Algarve interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora.

Nesta Instância, em 26 de janeiro de 2010, decidiu-se:

- rejeitar o conhecimento do recurso respeitante aos acórdãos proferidos no âmbito dos pedidos de esclarecimento indeferidos;

- declarar improcedente o recurso interposto do acórdão absolutório;

- condenar a Recorrente, nas custas da parte civil.

5. Desta decisão, a CCAM do Algarve apresentou reclamação, invocando omissão de pronúncia e necessidade de correção de lapsos e pretendendo a correção do acórdão.

Por acórdão datado de 16 de março de 2010, foi indeferida «a mencionada pretensão de reclamação, com exclusão da correcção dos lapsos apontados.»

6. Inconformada com tal decisão, a CCAM do Algarve interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

Recurso que não foi admitido, por ter sido interposto fora do prazo.

Na sequência de reclamação apresentada, pela CCAM do Algarve, ao abrigo do disposto no artigo 405.º do Código de Processo Penal, o mencionado recurso foi admitido.

No Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão datado de 19 de janeiro de 2011, julgada procedente a questão prévia da sua não admissibilidade, por intempestividade, foi o recurso rejeitado.

7. Na 1.ª Instância, liquidadas as custas e notificada a CCAM do Algarve para proceder ao seu pagamento, em 19 de maio de 2011, foi por esta apresentado o seguinte requerimento [transcrição]:

«A assistente Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Algarve, C.R.L., vem reclamar da conta/liquidação que lhe foi notificada pelo Ofício em referência e nos seus próprios termos (que são os indicados nas linhas 4 a 6 desse mesmo Ofício).

Pelo seguinte:

1. Os últimos factos imputados ao Arguido no processo em causa foram os seguintes: o Arguido a solicitar a JF que estivesse presente na realização de uma escritura a 14 de Dezembro de 1994 e a elaboração de uma acta de uma «assembleia fantasma», por CL, com conhecimento do Arguido, a 25 de Julho de 1995.

2. Por aplicação do artigo 118º do Código Penal (CP), verificou-se a prescrição ainda antes de o presente processo ter atingido o trânsito em julgado ou o caso julgado.

3. Prescrição que, nos termos injuntivos da lei, é uma excepção peremptória e de conhecimento oficioso.

4. A fazer com que, portanto, valha aqui o disposto no artigo 517º do Código de Processo Penal (CPP), de cujos termos resulta que o assitente seja isento de custas quando o encerramento do processo se deva a razões supervenientes à acusação, como é o caso, naturalmente, da prescrição.

4. Razão essa que, também legal e logicamente, se estende ao pedido cível cujo regime é, como sempre foi no presente processo, de conexão (artigos 71º e seguintes do CPP) com o processo crime.

Termos em que , devendo o presente processo ser considerado extinto por incidência peremptória, oficiosa e obrigatória da presecrição, não deve nem pode haver lugar a custas

8. A decisão recorrida tem o seguinte teor [transcrição]:

«Fls. 1956 e seguintes: Veio a assistente e demandante “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Algarve, C. R. L.” reclamar da liquidação da conta de custas, a seu cargo, alegando que os factos imputados ao arguido no processo em causa foram, síntese, a circunstância de ter solicitado a JF que estivesse presente na realização de uma escritura a 14 de Dezembro de 1994 e a elaboração de uma acta de uma “assembleia fantasma”, por CL com conhecimento do arguido, a 25 de Julho de 1995.

Mais alegou que por aplicação do artigo 118.° do Código Penal, verificou-se a prescrição ainda antes de o presente processo ter atingido o trânsito em julgado ou caso julgado, pelo que se configura como excepção peremptória, de conhecimento oficioso, pelo que não deverá ser responsabilizada pelas custas do processo.

Atento o teor do requerimento é manifesto que a assistente e demandante “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Algarve, C. R. L.” se insurge, não contra a liquidação da conta de custas, em si mesma, mas contra o mérito das decisões que determinaram a sua responsabilização pelas custas.

Ora, conforme bem faz notar a Senhora Procuradora-Adjunta na vista que antecede, sobre as custas devidas pela assistente se pronunciou já o Supremo Tribunal de Justiça no acórdão proferido no autos em 19 de Janeiro de 2011, decidindo rejeitar o recurso interposto pela assistente e condenando-a “em 9 UCs de taxa de justiça” e “na importância do 8 UCs nos termos do n.º 3 do art. 420”.º do CPP”.

Tal acórdão foi proferido na sequência de acórdão do Tribunal da Relação de Évora, documentado a fls. 1862 e seguintes, datado de 10 de Janeiro de 2010, que condenou a demandante civil nas custas devidas pelo enxerto cível (fls. 1849).

E o acórdão do Tribunal Colectivo datado de 3 de Junho de 2008 de fls. 1621 a 1636 havia já decidido, quanto ao enxerto cível, declarar improcedente o pedido de indemnização civil deduzido e condenar a demandante no pagamento das custas cíveis.

Todas aquelas decisões transitaram já em julgado.

Atento o supra exposto, carece, assim de fundamento o ora invocado pela assistente e demandante “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Algarve, C. R. L.”, uma vez que a conta de custas/liquidação foi efectuada nos precisos termos da sua condenação, pelo que se deverão manter vigentes as guias já emitidas com vista ao pagamento.

Notifique

v
Conhecendo.

O requerimento que deu origem à decisão recorrida – intitulado, por quem o formulou, de reclamação da conta/liquidação notificada – visava obter a declaração de que não há, nem pode haver, lugar a custas.

É assim evidente – tal como consta da decisão recorrida –, que o requerente se insurgiu, não contra a liquidação da conta de custas, em si mesma, mas contra o mérito das decisões que determinaram a sua responsabilização pelas custas.

Podemos, então, concluir que a ora Recorrente não utilizou o mecanismo processual adequado a atingir o fim que pretendia. Todavia, porque explicitou o entendimento que o conduz a concluir aquilo que pretende, vejamos se lhe assiste razão.

Encontrando-se transitada a decisão que condenou o ora Recorrente no pagamento das custas cíveis, importa ponderar se, não obstante, ocorre qualquer circunstância que possa evitar esse pagamento.

Invoca o Recorrente a prescrição do procedimento criminal, a sua extensão ao pedido cível, cujo regime é de conexão com o processo crime, e o disposto no artigo 517.º do Código de Processo Penal.

Interessa-nos, desde logo, o disposto no artigo 517.º do Código de Processo Penal, que se reporta aos casos de isenção do assistente, nos seguintes termos:

i) na redação do Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro

«O assistente é isento do pagamento de imposto de justiça nos casos em que o arguido não for pronunciado ou for absolvido por razões supervenientes à acusação que houver deduzido ou com que se tiver conformado e que lhe não sejam imputáveis

ii) na redação da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto

«O assistente é isento do pagamento de taxa de justiça nos casos:
a) Em que, por razões supervenientes à acusação que houver deduzido ou com que se tiver conformado e que lhe não sejam imputáveis, o arguido não for pronunciado ou for absolvido; ou
b) Do n.º 3 do artigo 287.º»

iii) na redação de Decreto-lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro

«O assistente é isento do pagamento de taxa de justiça quando, por razões supervenientes à acusação que houver deduzido ou com que se tiver conformado e que lhe não sejam imputáveis, o arguido não for pronunciado ou for absolvido.»

Das diversas redações dadas ao artigo 517.º do Código de Processo Penal resulta o entendimento persistente de que a isenção do pagamento da taxa de justiça pelo assistente tem lugar quando ocorra não pronúncia ou absolvição, por razões supervenientes à acusação – particular que formulou ou pública com que se conformou – que não lhe sejam imputáveis.

A menção ao n.º 3 do artigo 287.º, na redação da Lei n.º 48/2007, não reveste qualquer interesse para a conclusão acabada de tirar – porque se refere a requerimento para abertura da instrução rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução, parecendo, até tratar-se de lapso.[[2]]

As razões supervenientes consagradas pelo legislador, não imputáveis ao assistente, são as que conduzem, na parte que agora nos importa, à absolvição do arguido – entre elas contam-se a descriminalização dos factos imputados, a amnistia, a reparação do crime, a desistência de queixa, a prescrição, a absolvição do arguido a quem é imposta medida de segurança.

E são razões que hão-de conduzir à não condenação do arguido, ocorrendo em momento anterior ao conhecimento de mérito da causa – à decisão [sentença ou acórdão] proferida após a realização do julgamento – ou sendo dele contemporâneas, isto é, sendo conhecidas e declaradas na decisão [sentença ou acórdão] proferida após realização do julgamento.

De regresso ao processo, e considerando que a decisão neles definitivamente proferida é de absolvição do Arguido JC da prática do crime de burla agravada e qualificada por apropriação ilegítima de bens do sector cooperativo e do pedido de indemnização civil contra si formulado pela CCAM do Algarve, não se verifica a previsão do artigo 517.º do Código de Processo Penal.

Porque a eventual prescrição do procedimento criminal ocorreu após a absolvição do Arguido por, na sequência do julgamento, se ter concluído que não se provaram os factos que poderiam sustentar a responsabilização criminal.

A absolvição do Arguido, na sequência do conhecimento de mérito da causa, é a primeira e a única causa de extinção do procedimento criminal. E a única que pode afirmar-se, sob pena da prática de atos inúteis que a lei expressamente proíbe.

Mas procurando ir um pouco mais longe, não obstante o que acaba de se deixar dito, temos também como certo que não pode nem deve correr a favor da ora Recorrente o tempo que entendeu gastar na afirmação de pretensão que lhe foi negada em todas as Instâncias.

Quase entendemos o esforço da construção jurídica agora elaborada pela Recorrente, quando olhamos para o montante que tem em dívida nos autos – a liquidação da conta de custas efetuada e que lhe foi notificada, para pagamento, ascende a € 46 536,00 (quarenta e seis mil quinhentos e trinta e seis euros).
Mas não lhe assiste razão.

Resta uma palavra para a interpretação do disposto no artigo 517.º do Código de Processo Penal de acordo com a Constituição da República Portuguesa.

As palavras da Recorrente, nesta matéria, estribam-se nas palavras de outrem – da Senhora Procuradora Geral Adjunta no parecer que elaborou nos autos, quando afirma que aquela será «uma verdadeira vítima da desprotecção das vítimas consagrada pelo artº 517º do CPP».

Semelhante afirmação não se encontra explicitada, nem se infere do que consta do aludido parecer. E a Recorrente limita-se a usá-la para convocar a Constituição da República Portuguesa e a proteção que nela se concede às vítimas.

E sendo este o enquadramento dado à questão, não vislumbramos, face ao que os autos exibem e se deixou dito, que a não aplicação do disposto no artigo 517.º do Código de Processo Penal possa brigar ou ferir qualquer preceito consagrado na Constituição da República Portuguesa.

O recurso improcede.

III. DECISÃO

Em face do exposto e concluindo, decide-se negar provimento ao recurso e, em consequência, manter, na íntegra, a decisão recorrida.

Custas a cargo da Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC’s.

v
Évora, 18 de Setembro de 2012

(processado em computador e revisto, antes de assinado, pela relatora)

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(Ana Luísa Teixeira Neves Bacelar Cruz)

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(Maria Cristina Capelas Cerdeira)
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[1] Publicado no Diário da República de 28 de Dezembro de 1995, na 1ª Série A.

[2] Cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Código de Processo Penal”, 3.ª Edição, páginas 1267 e 1268.