Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2068/10.2TASTB.E1
Relator: FERNANDO RIBEIRO CARDOSO
Descritores: REQUERIMENTO PARA A ABERTURA DA INSTRUÇÃO
VINCULAÇÃO TEMÁTICA
REJEIÇÃO
APERFEIÇOAMENTO
Data do Acordão: 11/15/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: 1. Perante a notificação do arquivamento do inquérito que concluiu pela inexistência de crime, no qual não foram constituídos arguidos ou recolhidas outras provas para além do relatório da autópsia, a solução correcta passaria por uma reclamação fundamentada para o imediato superior hierárquico do Ministério Público, nos termos do art. 278.º do CPP, visando o prosseguimento das investigações pelos factos e provas aportadas e não pela instauração de processo autónomo ou pela formulação de requerimento de abertura da instrução, como foi feito.

2. Deve ser rejeitado, por inadmissibilidade legal, o requerimento de abertura da instrução em que não se indica cabalmente quem deve ser pronunciado, qual o crime ou crimes, as disposições legais aplicáveis e os elementos fácticos referentes ao dolo ou negligência.
Decisão Texto Integral: Acordam, precedendo conferência, na 2.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:


MF, DF e PL, melhor identificados nos autos, inconformados com o arquivamento do inquérito, vieram em simultâneo requerer a sua admissão como assistentes e a abertura da instrução, requerendo a final que, produzida a prova que indicam, seja proferido despacho de pronúncia, nos termos e com os fundamentos que invocam a fls.59 a 87.

O Senhor Juiz de Instrução admitiu a intervenção dos requerentes como assistentes, mas, por seu despacho de 13 de Maio de 2011, veio a rejeitar a abertura a instrução, nos termos e com os fundamentos seguintes:

“No requerimento que apresentaram a fls. 149, vêm os assistentes requerer a abertura de instrução.

Compulsado o seu longo e algo confuso arrazoado, detecta-se que, apesar de ter enunciado um acervo factual pelo qual o Ministério Público não deduziu acusação, não qualificam jurídico-penalmente a conduta daquele que parece ser o acusado (Dr. P, se bem que se menciona a conduta de outros clínicos, não se percebe se se pretende que sejam também pronunciados). De facto, não se vislumbra no referido requerimento uma única alusão a uma qualquer disposição legal penalmente relevante.

E menos ainda se detecta no requerimento em causa a alusão ao elemento subjectivo de qualquer crime.

Releva, nesta fase, invocar o disposto no artigo 287º, número 2, do Código de Processo Penal: “O requerimento não está sujeito a formalidades especiais, mas deve conter, em súmula, as razões de facto e de direito de discordância relativamente à acusação ou não acusação, bem como, sempre que disso for caso, a indicação dos actos de instrução que o requerente pretende que o juiz leve a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que, através de uns e de outros, se espera provar, sendo ainda aplicável ao requerimento do assistente o disposto nas alíneas b) e c) do n.º 3 do artigo 283.º Não podem ser indicadas mais de 20 testemunhas.” (sublinhado meu).

No artigo 283º, número 3, do diploma, pode-se ler o seguinte:

“3 - A acusação contém, sob pena de nulidade:
(…)
b) A narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção que lhe deve ser aplicada;

c) A indicação das disposições legais aplicáveis;
(…)”.

Importa também, desde já relembrar o disposto no número 3 do supra referido artigo 287º, número 2, do Código de Processo Penal: “O requerimento só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução.”.

No presente caso, o requerimento não é extemporâneo, e o tribunal é competente.

Porém, há que levar em conta que, conforme refere Paulo Pinto de Albuquerque, obra citada, pág. 750, anotação 2. n., constitui um caso de inadmissibilidade legal da instrução aquele em que há um requerimento do assistente que não indica as disposições legais violadas.

O que se verifica no caso concreto.

Além do mais, após a entrada em vigor das alterações ao artigo 287º do Código de Processo Penal, operadas pela Lei número 59/98 de 25/08, o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente está sujeito ao formalismo prescrito nas alíneas b) e c) do número 3 do artigo 283º do mesmo diploma.

Quer isto dizer que deve conter sob pena de nulidade, a narração dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança (incluindo se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação do agente)[1].

De facto, “não compete ao juiz perscrutar os autos para fazer a enumeração e descrição dos factos que se poderão indiciar como cometidos pelo arguido, pois, se assim fosse, estar-se-ia a transferir para o juiz o exercício da acção penal, com violação dos princípios constitucionais e legais vigentes. Após o arquivamento pelo M.P., o requerimento de abertura de instrução do assistente equivalerá em tudo à acusação, definindo e limitando o objecto do processo a partir da sua apresentação."[2]

É uma consequência da estrutura acusatória do processo a definição do seu thema decidendum pela acusação. Quando esta não existe, é o requerimento de abertura de instrução que tem que fixar tais limites.

E esclareça-se, a instrução não tem por finalidade directa a fiscalização ou complemento da actividade de investigação e recolha de prova realizada no inquérito. A instrução é actualmente uma actividade materialmente judicial e não de investigação ou materialmente policial ou de investigações[3].

Como consequência, a insuficiência da investigação realizada pelo Ministério Público no inquérito é sindicada hierarquicamente por via de reclamação[4] e a errada valoração dos indícios colhidos na investigação é sindicada judicialmente por via da abertura de instrução[5].

Nos casos de decisão de arquivamento, como sucede aqui, o juiz de instrução, quando aceite as razões aduzidas pelo assistente, e discordando da decisão de não acusação do Ministério Público, não ordena a este órgão que proceda em conformidade com a sua decisão, antes recebe a acusação implícita no requerimento do assistente, pronunciando, se for o caso disso, o arguido pelos factos constantes dessa acusação.

O acusador, no caso, o assistente, requer ao tribunal a submissão a julgamento do acusado (relativamente ao qual o processo foi arquivado) pela prática dos factos que obrigatoriamente tem que descrever na acusação, em conformidade com as disposições legais aplicáveis, que também deve (obrigatoriamente) indicar.

No caso presente, nem se percebe muito bem quem são, desde logo, os acusados (sendo que a sua conduta não é sequer jurídico-criminalmente qualificada)

No caso do requerimento de abertura de instrução apresentado nos autos, verifica-se, além da já apontada, outra deficiência assinalável: omissão de imputação de qualquer ilícito a qualquer dos acusados por falta de menção do elemento subjectivo de um qualquer tipo criminal.

É que a prática de um ilícito criminal importa o preenchimento não só do elemento objectivo, mas também do elemento subjectivo, este que por sua vez se subdivide nos elementos cognitivo e volitivo.

Ou seja, num primeiro passo, o agente tem que ter conhecimento das obrigações que a lei para si impõe, o que se traduz no elemento cognitivo (e os factos correspondentes têm que ser levados aos factos imputados, o que não aconteceu, no caso presente). Num segundo passo, o agente há-de, dolosamente ou negligentemente, não ter conformado a sua vontade com as obrigações legais, o que se traduz no elemento volitivo (e os factos correspondentes têm que ser levados aos factos imputados, o que também não aconteceu, no caso presente).

A falta de preenchimento do elemento subjectivo radica na falta de punibilidade da conduta.

A imputação tem que ser absoluta em si, com efeito, se se imputam factos donde resulte a existência do elemento subjectivo, na sua integralidade, esses factos tem que vir claramente discriminados, para que o acusado deles se possa defender.

Como se referiu, não existe no requerimento de abertura de instrução qualquer referência factual relativa ao elemento cognitivo, nem ao elemento volitivo de qualquer tipo criminal. Doutr’arte, não identifica de forma inequívoca os acusados, nem qualifica jurídico penalmente a sua conduta.

Sempre defendi todavia, que sendo possível, deve o tribunal convidar a parte a aperfeiçoar as suas posições. É a justiça material que deve nortear a actuação dos tribunais.

Porém, no presente caso tal, possibilidade não se verifica.

É que caso o tribunal se substituísse ao assistente, estaria a proceder a uma alteração substancial de factos, inadmissível in casu, pondo em causa os princípios da imparcialidade do julgador, do contraditório e da estrutura acusatória do processo penal (artigo 32°, número 5, da Constituição da República Portuguesa)[6].

Relembre-se a conclusão a que se chegou no Acórdão de Fixação de Jurisprudência número 7/2005 (in DR. I-A, número 212, de 4 de Novembro de 2005): Não há lugar a convite ao assistente para aperfeiçoar o requerimento de abertura de instrução, apresentado nos termos do artigo 287.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, quando for omisso relativamente à narração sintética dos factos que fundamentam a aplicação de uma pena ao arguido.”.

E se assim é relativamente à matéria de facto, também o será relativamente ao enquadramento jurídico-penal. Para chegarmos a esta conclusão, atentemos nalguma da fundamentação expendida no douto aresto:

“Recentemente, o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 358/2004, de 19 de Maio, processo n.º 807/2003, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 150, de 28 de Junho de 2004, pronunciou-se a dado passo:

«A estrutura acusatória do processo penal português, garantia de defesa que consubstancia uma concretização no processo penal de valores inerentes a um Estado de direito democrático, assente no respeito pela dignidade da pessoa humana, impõe que o objecto do processo seja fixado com rigor e a precisão adequados em determinados momentos processuais, entre os quais se conta o momento em que é requerida a abertura da instrução

E, mais adiante:

«Assim, o assistente tem de fazer constar do requerimento para a abertura de instrução todos os elementos mencionados nas alíneas referidas no n.º 3 do artigo 283.º do Código de Processo Penal. Tal exigência decorre [. . .] de princípios fundamentais de processo penal, nomeadamente das garantias de defesa e da estrutura acusatória.»

E, ainda, que tal exigência é suficientemente justificada e legitimada, «sendo a mesma que é feita ao Ministério Público no momento em que acusa».

E integrando a decisão recorrida da 1.ª instância um segmento em que se afirmava não dever ser convidado o assistente a apresentar novo requerimento, completo factualmente, por, entretanto, se ter exaurido o prazo normal de requerimento de abertura de instrução, o Tribunal Constitucional, frisando a contrariedade à lei de tal requerimento e a obrigação de dele constar aquela descrição factual, sem lesão de norma da lei fundamental, implicitamente arreda a possibilidade daquele convite.

XII - De consignar, ainda, a valia incontornável de que se revestem os trabalhos preparatórios na temática da interpretação da lei, cumprindo, no dizer de Heck, op. cit., p. 117, que cumprem uma função fungível ou geral e específica ou ontogénica, neste último âmbito permitindo compreender o sentido e alcance da lei, segundo o pensamento dos fautores e pessoas coevas da sua elaboração, tão dignas de relevo quanto como a de outras pessoas igualmente qualificadas que não intervieram na sua formulação (função fungível ou geral).

A Assembleia da República na discussão da alteração ao CPP, que culminou com a Lei n.ª 59/98, de 25 de Agosto, rejeitou, com toda a nitidez, a proposta do Conselho Superior da Magistratura no sentido de dever o juiz convidar o requerente da instrução a aperfeiçoar o pedido de instrução e disse as razões dessa rejeição. Trata-se, disse, «de uma regra civilista, sem aplicação no processo penal. Dificultaria o acesso à instrução, criava espaços para discussões formais, sem qualquer necessidade» —cf. Código de Processo Penal—Processo Legislativo, vol. II, t. II, Assembleia da República, 1999, p. 169”.

Marquei a negrito as conclusões mais significativas donde se pode retirar que o convite de aperfeiçoamento do requerimento de abertura de instrução é inadmissível, não só quando o mesmo é omisso quanto à matéria fáctica, mas também quanto ao enquadramento jurídico dos factos invocados.

Pelo exposto, outra solução não existe que, ao abrigo do disposto no artigo 287º, número 3, do Código de Processo Penal, rejeitar o requerimento de abertura de instrução, por, atento o conteúdo do mesmo (e dele se extrair a violação do comando dos artigos 287º, número 2, e 283º, número 3, als. b) e c) do mesmo diploma), se verificar uma inadmissibilidade legal da instrução.

O que vai decidido.
Notifique e dê baixa. (…)”

Inconformados, os assistentes vieram interpor recurso, nos termos constantes de fls.266 a 293 [7], pugnando pela revogação do despacho recorrido e sua substituição por outro que ordene a abertura da instrução, ou, caso assim não for entendido, a sua substituição por outro que determine a reparação/aperfeiçoamento do requerimento de abertura da instrução.

Concluíram a motivação do recurso nos seguintes termos:

A) O requerimento de abertura de instrução só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução, (cfr. artigo 287. °, n.º 3 do CPP).

B) O despacho recorrido rejeitou o requerimento de abertura de instrução por inadmissibilidade legal, considerando-o nulo.

C) A rejeição por inadmissibilidade legal reporta-se aos casos em que aos factos não corresponde infracção criminal, ou seja, casos de falta de tipicidade, de existência de obstáculo impeditivo de procedimento criminal e de abertura de instrução, como por exemplo a ilegitimidade do requerente ou os casos relativos a crimes particulares e processos especiais, (vide a este propósito Meia Gonçalves, Código de Processo Penal, anotado, Almedina, 1994 pág. 445.)

D) O que não acontece no caso vertente.

E) O despacho recorrido violou o disposto no n.º 3 do art.º 287.° do CPP.

F) A cominação aplicável a eventual(is) falta(s)/deficiências de elementos do requerimento de abertura de instrução é a prevista no artigo 123.°, n.º 2 do CPP.

G) Caso se verificasse — que não se verifica - a existência de deficiências no requerimento de abertura de instrução da recorrente, teria de ser ordenada oficiosamente a sua reparação/aperfeiçoamento, o que in casu não aconteceu.

H) Contrariamente ao aludido no despacho sob crítica, os Recorrentes descreveram factos passíveis de incriminação no requerimento de abertura de instrução.

I) Entendem também que foi feita uma errónea interpretação e aplicação da lei, designadamente, quanto ao entendimento das finalidades da instrução.

J) O requerimento de abertura de instrução, rejeitado pelo despacho recorrido, contém os requisitos necessários para ser admitido (cfr. artigo 287. °, n.º 3 do CPP), a saber:

• razões de facto e de direito da discordância relativamente à acusação ou não acusação, (vide artigos 1.° a 109.° e mais concretamente 110.° a 118.° do Requerimento de Abertura de Instrução)

• indicação dos actos de instrução que o requerente pretende que o juiz leve a cabo. (vide requerimentos probatórios A), B), C), D), E) e F) do mesmo Requerimento de Abertura de instrução)

• meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito (vide 108.° e 109.° e requerimentos probatórios A), D), E) e F) do mesmo Requerimento de Abertura de instrução)

• e dos factos que, através de uns e de outros, se espera provar, (vide artigos 117.° e 118.° do Requerimento de Abertura de Instrução)

K) O requerimento de abertura da instrução rejeitado, contém as exigências a que alude o artigo 283. °, alíneas b) e c) ex vi o artigo 287.° do CP.

L) Contrariamente ao que refere o despacho sob crítica, a factualidade encontra-se perfeitamente delimitada.

M) Os Recorrentes descreveram as condutas passíveis de incriminação para cada um dos arguidos, a indiciação do preenchimento dos elementos subjectivos e objectivos dos crimes imputados, as circunstâncias de tempo e lugar, e indicou as normas aplicáveis.

N) A descrição da factualidade nos moldes supra descritos permite ao arguido saber exactamente quais os factos que lhe são imputados,

O) Contrariamente ao referido no despacho recorrido, os factos descritos no requerimento de abertura de instrução possibilitam aos arguidos efectiva e eficaz elaboração da defesa.

P) A descrição factual mostra-se suficientemente descrita de modo a possibilitar a prolação de decisão instrutória.

Q) O requerimento de abertura de instrução não está sujeito a formalidades especiais (cfr. artigo 287. °, n.º 2 do CPP).

R) Não é exigível que o requerimento de abertura de instrução contenha todos os requisitos formais de uma acusação, mas apenas os requisitos a que aludem as alíneas b) e c) do artigo 283.° do CPP,

S) Esses requisitos, "in casu", encontram-se preenchidos.

T) A acusação é distinta do requerimento de abertura de instrução: naquela indicam-se, necessária e unicamente, factos precisos que se reputam já indiciados, neste podem indicar-se factos hipotéticos que se deseja sejam averiguados em sede instrutória.

U) A instrução compreende, para além do mais, actos de investigação e de recolha de provas, de debate sobre os factos probatórios recolhidos durante a instrução e do inquérito, formulação e debate sobre questões de direito de que depende o sentido da decisão instrutória e de decisão judicial sobre se a causa deve ou não ser submetida à fase de julgamento.

V) Cabe ao juiz analisar os factos descritos no requerimento instrutório e se os julgar indiciados pronunciará os arguidos por esses factos, (artigo 308. ° do CPP)

W) A indiciação de factos pelo assistente no requerimento de abertura de instrução pode resultar somente dos actos de instrução requeridos, sendo que a instrução não é apenas uma mera actividade de comprovação judicial.

X) Com o despacho proferido pelo Tribunal a quo foram violadas as normas contidas nos seguintes preceitos do Código de Processo Penal:

• Artigo 287.°, n.° 3;
• Artigo 287.°, n.° l, alínea b);
• Artigo 287.°, n.° 2;
• Artigo 286.°, n.° 1;
• Artigo 283.°, n.° 3, alíneas b) e c);
• Artigo 123.°, n° 2.

Y) Sendo correctamente aplicáveis as normas contidas nos mesmos artigos, desde que interpretadas de acordo com o seu elemento literal e a jurisprudência e a doutrina dominantes, de que é exemplo a citada.”

O Ministério Público junto do tribunal a quo veio responder ao recurso nos termos constantes de fls.326 a 335, pugnando pela manutenção do despacho recorrido, referindo, nessa sede, o seguinte:

- Em sede de questão prévia importa referir que sobre a matéria versada com esta abertura de instrução corre processo de inquérito, com o nº ---/10.5 TASTB, nestes serviços, que se encontra pendente;

- Ora, sendo a fase de instrução uma fase posterior à fase de inquérito que se encontra, ainda, em curso no âmbito do inquérito nº ---/10.5 TASTB, consideramos, salvo o devido respeito por opinião contrária, que o requerimento de abertura de instrução/fase de instrução é legalmente inadmissível, se não por outros, por este fundamento;

- A instrução visa a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento – art. 286.º n.º 1, do Código de Processo Penal -, no sentido de que não se está perante um novo inquérito, mas apenas perante um momento processual de comprovação;

- Tratando-se de instrução requerida pela assistente, que visa sempre a pronúncia do arguido, o requerimento para abertura de instrução deve conter a narração própria de uma acusação, mediante a descrição dos factos integradores do ilícito que se pretende imputar, na sua plenitude, com referência aos elementos objectivo e subjectivo, bem como com indicação do sujeito visado e ainda das normas (enquadramento) jurídicas aplicáveis;

- Dúvidas não subsistem, pois, que do RAI deverá constar a narração dos factos que se pretendem ver imputados a um agente em concreto, acompanhados da descrição do elemento subjectivo (sem cuja verificação seria inviável uma condenação), bem como as normas jurídicas que sustentam a relevância penal de tal conduta. O que não aconteceu in casu;

- A atender, ainda, que tal como profusamente fundamentado na decisão em crise, não há, no caso dos presentes autos, lugar ao convite ao aperfeiçoamento, já que o RAI apresentado é completamente omisso quanto às normas jurídicas aplicáveis.

- Nesta conformidade, é nosso entendimento que não existe qualquer censura a fazer ao despacho recorrido, bem tendo andado a decisão em crise, que não violou qualquer disposição legal.”

O recurso veio a ser admitido na instância recorrida por despacho de 13 de Junho de 2011.

Nesta Relação a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta teve vista dos autos e emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, dizendo, em resumo que estando em curso um inquérito, o requerimento para abertura da instrução apresentado é legalmente inadmissível pelo que bem foi rejeitado.

Cumprido o disposto no n.º2 do art. 417.º do CPP, foi apresentada resposta pelos assistentes que reiteraram as conclusões apresentadas, bem como o pedido nelas formulado.

Colhidos os vistos legais, o processo foi à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

Delimitação do objecto do recurso.

O recurso é um meio processual que visa provocar uma reapreciação de uma decisão judicial de forma a corrigi-la de imperfeições, que pela sua importância não consentem uma forma de remédio menos solene (cf. Simas Santos e Leal - Henriques in Recursos em Processo Penal - 2ª edição - Rei dos Livros pág. 19).

Os fundamentos dos recursos constam do art. 410.º do C.P.P. e a formulação da motivação e respectivas conclusões, do art. 412.º do mesmo diploma.

Sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, são as conclusões do recurso que delimitam o âmbito do conhecimento do mesmo, pois são estas que habilitam o tribunal superior a conhecer as pessoais razões de discordância do recorrente em relação à decisão recorrida (art. 402.º, 403.º e 412.º n.º1, todos do C. P. Penal).

O que está em discussão é uma simples questão de direito consistente afinal em saber se instaurado um inquérito para averiguação de um determinado factualismo (causa da morte de MC) e perante o arquivamento deste, nos termos do art. 277.º n.º1 do CPP, por, na sequência da junção do relatório da autópsia, ter sido entendido que a morte se deveu a pneumonia bilateral infecciosa, causa adequada e natural do óbito, pode ser requerida nesse processo a instrução visando a investigação de factos que já foram objecto de denúncia e se encontram a ser averiguados em processo autónomo, movido pelos aqui assistentes, e, na afirmativa, se o requerimento de abertura da instrução que foi apresentado reúne os requisitos legais e, não reunindo, se deve ser formulado aos assistentes convite para reparação/aperfeiçoamento daquele.

Como resulta da resposta do Ministério Público e dos elementos juntos aos autos, nomeadamente com o requerimento de abertura da instrução, os assistentes, em data anterior à apresentação do requerimento de abertura da instrução apresentaram queixa-crime contra um tal Dr. P., médico do Centro Hospitalar de ..., a quem imputam um diagnóstico inicial grosseiramente errado e falta de terapêutica adequada que, segundo alegam, esteve na génese do agravamento do estado de saúde da referida MC (mãe dos assistentes) e foi consequência directa da sua morte. Essa queixa deu origem a um processo de inquérito corre seus termos sob o n.º ----/10.5TASTB.

A solução da questão reconduz-nos à análise do objecto do processo penal, ou seja, à matéria sobre a qual versa.

O objecto do processo penal é o facto humano de que depende a aplicação ao agente de uma pena ou de uma medida de segurança criminais, ou seja, o crime na definição dada pelo art. 1.º n.º1, al. a) do CPP.

O processo, nas suas fases declarativas, recai também sobre a qualificação jurídica dos factos.

A valoração ou qualificação jurídica vai-se progressivamente elaborando no decurso do procedimento, sendo algum tanto fluida (como, aliás, a matéria de facto) até à acusação, mas devendo estabilizar-se nesta (cf. art. 283.º a 285.º) ou no despacho de pronúncia quando tiver lugar a instrução.

O objecto do processo penal é, pois, delimitado nas suas dimensões quantitativa e qualitativa a partir da acusação ou no despacho de pronúncia.

O objecto do processo pode também ser delimitado pela pretensão do queixoso, mesmo na fase do inquérito.

O simples facto de se fixar o objecto do processo e fixá-lo para o futuro, é uma exigência do princípio do contraditório. Daí que só uma perspectiva teleológica permita evitar, que se caiam em soluções que acabem por perder de vista o interesse da defesa.

O facto criminoso é o mesmo, se a desaprovação social for a mesma, pese embora se tenham multiplicado, eventualmente, os juízos de censura jurídico-penal.

Nos crimes, em que a queixa é condição de procedibilidade (cf. art. 49.º do CPP), o objecto do processo é delimitado por ela, mesmo na fase do inquérito, relativamente aos factos praticados, ou seja, à acção, mas não ao esclarecimento dos seus elementos essenciais e acidentais.

A investigação dos factos objecto de queixa não pode ser limitada pelo queixoso, salvo tratando-se de crime particular e desde que a amputação dos factos não implique alteração substancial dos cometidos e dos que são objecto de queixa, devendo no inquérito praticar-se todas as diligências que forem tidas por indispensáveis para o seu pleno esclarecimento, para a descoberta da verdade.

A apresentação da queixa contra um dos comparticipantes no crime torna o procedimento criminal extensivo aos restantes (cf. art. 114.º do CP).

Se o facto noticiado constituir crime público, entre o crime noticiado e o esclarecido no inquérito pode verificar-se profunda alteração, quer no que respeita aos factos, quer à sua qualificação jurídica, quer aos seus agentes. É que, em qualquer caso, o MP terá sempre legitimidade para prosseguir o processo, pois tem legitimidade para proceder por qualquer crime público.

De igual modo, se no decurso do inquérito sobre o crime se vierem a descobrir indícios de outro crime público e entre ambos existir uma relação de conexão processualmente relevante (art. 24.º do CPP), o objecto do inquérito pode alargar-se aos novos crimes.[8]

Em caso de hipótese de arquivamento do inquérito nos termos do art. 277.º do CPP, pode manter-se ainda numa certa indefinição, quanto ao objecto do processo, que tem como consequência que em caso de reabertura do inquérito os factos podem ser ampliados, restringidos ou ser qualificados diversamente. É que o art. 277.º apenas exige a prova de que os factos noticiados, com os desenvolvimentos que o inquérito entretanto propiciou, não constituam crime ou que não se indicie suficientemente que o constituam, mas não que não constituam um determinado crime.

Só não é assim relativamente aos crimes dependentes de queixa ou participação das autoridades em que a decisão de arquivamento por inexistência de crime ou insuficiência de indiciação se há-de reportar ao crime objecto da queixa ou participação.

O arquivamento do inquérito, ao abrigo do disposto no art. 277.º do CPP, não tem efeitos preclusivos, pois o inquérito pode ser reaberto nos termos do art. 279.º n.º1 do mesmo diploma, ou seja, caso surjam novos factos ou elementos de prova que invalidem os fundamentos invocados pelo Ministério Público no despacho de arquivamento.

O despacho de arquivamento neste âmbito é da exclusiva competência do Ministério Público e nele não há qualquer intervenção judicial. A decisão não é, pois, jurisdicional e consequentemente, não é susceptível de recurso, nem de trânsito em julgado.

Em termos conceptuais, entende-se que o despacho de arquivamento produz efeitos extraprocessuais (ao contrário do que sucede com a acusação que produz efeitos endoprocessuais), pois, decorridos os prazos peremptórios para a sua impugnação/revogação (através da abertura da instrução ou intervenção hierárquica), tem a força de caso decidido, apenas mutável e susceptível de reavaliação se surgirem novos elementos que ponham em causa os efeitos da decisão de abstenção, no âmbito do mesmo processo.

A relevância da motivação do despacho de arquivamento propaga-se para além dos momentos da sua sindicabilidade (intra-orgânica ou judicial) aos efeitos futuros do despacho que vale como caso decidido, pois os novos elementos de prova têm de por em causa esses fundamentos e não apenas a bondade da decisão.[9]
O despacho de arquivamento, resultante de não se terem confirmado indícios da comissão de um qualquer crime, ou por concluir que os arguidos não o praticaram, não é uma decisão de mérito. E também assim é em todos os casos de não pronúncia, pois tribunal conhece simplesmente da não verificação dos pressupostos necessários para que o processo prossiga com a acusação deduzida e submetida à comprovação na fase da instrução; trata-se sempre, pois, de uma decisão de conteúdo estritamente processual.

Em processo penal, a não pronúncia, sendo decisão final, determina o arquivamento do processo, pelo que à possibilidade de instauração de novo processo no domínio do processo civil, quando tenha havido absolvição da instância, corresponde no âmbito do processo penal a reabertura do processo arquivado. Esta conclusão impõe-se por analogia com o que determinam os art. 277.º e 279.º para o arquivamento e reabertura do inquérito.

Perante o arquivamento do presente inquérito que concluiu pela inexistência de crime, no qual não foram constituídos arguidos ou recolhidas outras provas para além do relatório da autópsia, a solução correcta passaria, a nosso ver, por uma reclamação fundamentada para o imediato superior hierárquico do Ministério Público, nos termos do art. 278.º do CPP, visando o prosseguimento das investigações pelos factos e provas aportadas e não pela instauração de processo autónomo ou pela formulação de requerimento de abertura da instrução, como foi feito.

Na verdade, o que os denunciantes/assistentes originaram com a sua actuação foi uma duplicação de processos.

Mas constituirá essa actuação dos assistentes obstáculo a que se conheça do mérito do recurso interposto?

Parece-nos que não.

Situação diversa da aqui em causa foi por nós apreciada no âmbito do recurso n.º 2846/07 – 1, interposto nos autos de instrução n.º 92/05.6TATVR do JIC do Tribunal Judicial de Faro, onde, por acórdão de 11-03-2008, acessível in www.dgsi.pt, chegámos à conclusão que perante a instauração de processos crimes com o mesmo objecto, o requerimento para a abertura da instrução só podia ser formulado no processo-crime instaurado em 1.º lugar, posto que se lograsse a respectiva reabertura nos termos do art. 279.º do CPP e em face de uma nova abstenção de acusar.

Assim, não se justifica, sem mais, a rejeição do recurso.

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Na fase de instrução o juiz de instrução assume uma posição polifuncional que, embora vinculada tematicamente, não se confunde com a intervenção de um juiz que vai apenas apreciar a actividade indagadora do Ministério Público, pois tem o poder de protagonizar uma actividade inquisitória de recolha suplementar de prova, tendo em atenção as pretensões e contributos constitutivos de outros sujeitos processuais.

A estrutura acusatória do processo exige, porém, que a intervenção do juiz não seja oficiosa e, além disso, que tenha de ser delimitada pelos termos da comprovação que se lhe requer sobre a decisão de acusar do Ministério Público ou, se não tiver sido deduzida acusação, sobre a justificação e a justeza da decisão de arquivamento.

Por isso, e não obstante o juiz investigar autonomamente o caso submetido a instrução, tem de ter em conta e actuar dentro dos limites da vinculação factual fixados pelo requerimento de abertura da instrução: "tendo em conta a indicação constante do requerimento de abertura da instrução", como refere o nº 4 do artigo 288.º do Código de Processo Penal. [10] Não pode, portanto, pretender-se através da instrução alcançar os objectivos próprios do inquérito: outros meios processuais são os adequados para o efeito e aos mesmos podem os sujeitos processuais interessados recorrer (cf., nomeadamente, artigos 279.º e 278.º, n.º2, todos do Código de Processo Penal).

O requerimento de abertura da instrução constitui, pois, o elemento fundamental para a definição e determinação do âmbito e dos limites da intervenção do juiz na instrução: investigação autónoma, mas autónoma dentro do tema factual que lhe é proposto através do requerimento de abertura da instrução. Este requerimento, embora não sujeito a formalidades especiais, deve conter, mesmo em súmula, os elementos que são enunciados no artigo 287.º, n.º2, do mencionado diploma: a indicação das razões de facto e de direito de discordância relativamente à acusação ou não acusação, bem como, sempre que disso for caso, a indicação dos actos de instrução que o requerente pretende levar a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que, através de uns e outros se espera provar. O requerimento, sendo livre de fórmulas, não o é de conteúdo material vinculante.

Porém, não tanto pelas fórmulas, mas pelo conteúdo, o requerimento para abertura da instrução terá de ser necessariamente diverso conforme o arguido pretenda fazer comprovar judicialmente a decisão de acusar, ou o assistente pretenda fazer intervir o juiz de instrução para confrontar a decisão de arquivamento.

Destinando-se o inquérito a investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a responsabilidade deles, e descobrir e recolher as provas, em ordem à decisão sobre a acusação (artigo 262.º, nº 1, do Código de Processo Penal), esta decisão há-de ser tomada quando o Ministério Público considerar encerrado o inquérito e avaliar a existência (ou inexistência) de indícios suficientes de se ter verificado o crime e de quem foi o seu agente. A acusação fixa então doravante no processo os termos da questão submetida a decisão (a vinculação temática), tanto que, mesmo quando requerida instrução pelo arguido, e comprovada judicialmente a decisão de acusar, o despacho de pronúncia não pode pronunciar o arguido por factos que constituam uma alteração substancial dos descritos na acusação.

Mas, sendo assim no que respeita à decisão de acusação, de modo simétrico tem de ser no que respeita ao requerimento do assistente no caso de arquivamento: o pressuposto da vinculação temática do processo só pode ser constituído pelos termos desse requerimento, que há-de definir as bases de facto e de direito da questão a submeter ao juiz.

Na definição do objecto processual que vai ser submetido ao conhecimento e decisão do juiz há, assim, uma similitude processual de função, e por isso, uma assimilação funcional entre a acusação do Ministério Público e o requerimento do assistente para a abertura de instrução no caso de não ter sido deduzida acusação. Deste modo, o requerimento do assistente não pode, em termos materiais e funcionais, deixar de revestir o conteúdo de uma acusação alternativa, de onde constem os factos que considerar indiciados e que integrem o(s) crime(s), de forma a possibilitar a realização da instrução, fixando os termos do debate e o exercício do contraditório: o requerimento de abertura de instrução formulado pelo assistente constitui uma verdadeira acusação, que é a acusação que o assistente entende que deveria ter sido deduzida pelo Ministério Público (cf. GERMANO MARQUES DA SILVA, "Curso de Processo Penal", vol. III, pág, 141).

O requerimento do assistente, não sendo uma acusação em sentido processual-formal, deve, pois, constituir processualmente uma verdadeira acusação em sentido material, que delimite o objecto do processo (da instrução), e por isso, os termos e os limites dos poderes de conhecimento e de decisão do juiz de instrução - artigos 308.º e 309.º do Código de Processo Penal (cf., v. g., o ac. do STJ de 23 de Maio de 2001, proc. 151/01, e de 20 de Junho de 2002, in proc.4250/01, acessíveis in www.dgsi.pt).

Assim, o requerimento do assistente com que pretenda, de modo processualmente necessário, útil e eficaz, fazer abrir a fase de instrução, e definir o seu objecto, tem de conter, ainda que de forma sintética, repetimos, a narração dos factos que fundamentem a aplicação de uma pena, ou seja, de factos que integrem a prática de crimes, incluindo o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, e quaisquer outras circunstâncias relevantes, bem como as disposições legais aplicáveis - artigo 283.º, n.º 3, alin. b) e c) do Código de Processo Penal, tendo em vista o que dispõem os art. 287.º n.º2, 303.º n.º3, 308.º e 309.º n.º 1 do mesmo diploma.

Importa que o juiz, pelo requerimento, saiba claramente que factos estão em causa, quem são os seus agentes e as razões porque o assistente entende que devia ter sido formulada acusação e que justificam a pronúncia e ainda a subsunção jurídico-penal dos factos. Na verdade "não compete ao juiz perscrutar os autos para fazer a enumeração e descrição dos factos que se poderão indiciar como cometidos pelo arguido, pois, se assim fosse, estar-se-ia a transferir para o juiz o exercício da acção penal, com violação dos princípios constitucionais e legais vigentes" (cf. Ac. da R.C. de 24-11-93, Col. Jur. XVIII-5.º-61).

Como está consagrado no n.º 5 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, "o processo criminal tem estrutura acusatória, estando a audiência de julgamento e os actos instrutórios subordinados ao princípio do contraditório".

Esta estrutura do processo penal significa que o seu objecto é fixado pela acusação que delimita a actividade cognitiva e decisória do tribunal, tendo em vista assegurar as garantias de defesa do arguido, protegendo-o contra a alteração ou alargamento do objecto do processo.

Também a orientação da Comissão Europeia dos Direitos do Homem é no sentido de que o artigo 6.º, n.º 3, da Convenção impõe que o acusado seja informado de todos os elementos necessários para que possa preparar a sua defesa, isto é, não só os factos materiais que lhe são imputados (causa da acusação), mas também a sua qualificação jurídica (natureza da acusação), o que implica que o acusado seja também informado de toda a alteração da qualificação jurídica (cf. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, I, Editorial Verbo 2000, 4.ª ed., nota de rodapé, pág. 367-368).

O requerimento para a abertura da instrução, no caso de arquivamento do processo pelo Ministério Público, como é o caso dos autos, é que define e fixa o objecto do processo. Tal requerimento deve ser mais que uma forma de impugnar o despacho de arquivamento do Ministério Público (para o qual existe a reclamação hierárquica)[11], consubstanciando uma verdadeira acusação em sentido material, que é dada a conhecer ao arguido, delimitando, por isso, o objecto do processo, em relação ao qual se pode colocar, logo na fase de instrução, o problema da alteração substancial ou não substancial dos factos (artigos 303.º e 309.º, ambos do CPP).

Sem a narração, ainda que sintética, dos factos concretos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, a instrução não tem objecto, ou seja não pode haver instrução. E sem instrução, o debate e a decisão instrutória constituem uma impossibilidade jurídica e os actos instrutórios actos inúteis, sendo que ainda que fossem apurados factos os mesmos se viessem a constar da decisão instrutória esta seria nula, por violação do disposto no art. 309.º do CPP.

É um caso de inadmissibilidade legal de instrução ou, talvez melhor, de impossibilidade da instrução ex natura rerum.

O requerimento formulado pelos assistentes, ora recorrentes, com que pretenderam fazer declarar aberta a fase da instrução, não participa a nosso ver de todas as características de uma acusação em sentido material, não respeitando, por isso, as exigências essenciais de conteúdo impostas pelo artigo 287.º, n.º2 do Código de Processo Penal, pelo que é merecedor das críticas que lhe foram dirigidas no despacho recorrido.

De facto, os assistentes, desde logo, não indicam quem deve ser pronunciado, qual o crime ou crimes e as disposições legais aplicáveis.

Não obstante os assistentes aludirem a violação da legis artis e a diagnóstico flagrante e grosseiramente errado, ficamos sem saber, face ao teor do RAI, se aqueles consideram a existência de indícios suficientes da prática de um crime de homicídio negligente, p. e p. pelo art. 137.º do CP, ou se apenas está em causa o crime, p. e p. pelo art. 150.º, n.º2 do mesmo diploma legal, pois não mencionam em parte alguma do seu requerimento a qualificação jurídica para os factos que descrevem.

Por outro lado, o RAI não é claro ainda em relação às pessoas que devem ser pronunciadas e ao grau de participação de cada uma delas, pois, em concreto, apenas refere o Dr. P., Director do Serviço de Neurologia do Hospital ..., não cabalmente identificado, havendo sinais de que os assistentes pretendem imputar ainda ao restante pessoal médico do Centro Hospital ..., EPE (sem uma identificação completa), uma actuação violadora das boas práticas médicas (cf. art. 115.º do RAI).

Por último, não basta uma mera descrição dos elementos objectivos do tipo de ilícito.

Admitindo, por mera hipótese de raciocínio, que os assistentes visavam a pronúncia do denunciado Dr. P. pela prática de um homicídio negligente, impunha-se alegar não só a violação de um dever de cuidado, mas também a representação do resultado morte ou a omissão da própria representação desse resultado (negligência consciente ou inconsciente) ou ainda o tipo de negligência grosseira.

O requerimento de abertura da instrução tem de valer por si, pois o juiz não pode substituir-se ao assistente na procura de um nexo para tudo o que foi alegado nos autos e descobrir na participação os factos integrantes das diversas realizações típicas (crimes) e oficiosamente proceder à respectiva qualificação jurídica.

Deste modo, o requerimento que os assistentes apresentaram para abertura da instrução não contém os elementos essenciais à função processual que lhe é assinalada, não é processualmente prestável para tal finalidade, o que equivale a dizer que não pode cumprir a função processual a que estaria vocacionado.

Com efeito, tal requerimento, tal como apresentado, nunca podia servir de base a um despacho de pronúncia, pois não se projecta como uma acusação alternativa.

Compreendida a importância da delimitação do objecto através do requerimento de abertura da instrução formulado por quem age na veste de assistente – que consubstancia uma verdadeira acusação alternativa –, tem-se discutido, de há muito, que consequências decorrem da formulação de requerimento que não contenha a indicação dos elementos referidos no artigo 287.º, n.º 2, particularmente os das alíneas b) e c) do n.º 3 do artigo 283.º, do C.P.P. – disposição para a qual remete, como vimos, o referido preceito legal.

Uma corrente maioritária defendeu a tese da nulidade, de conhecimento oficioso, que levava à rejeição, sem convite ao aperfeiçoamento do requerimento, sustentando-se que o convite para o aperfeiçoamento traduzir-se-ia numa intromissão do tribunal, que envolveria, de alguma forma, uma "orientação judicial" reconduzível a procedimento próprio de processo de tipo inquisitório, configuraria violação dos princípios do acusatório e do contraditório e mesmo uma injustificada restrição das garantias de defesa do arguido, para além de violação do prazo peremptório para apresentação de tal requerimento. Neste sentido da rejeição vão, entre outros, os acórdãos da Relação do Porto de 21.01.2001, in proc.11.412/01, de 6.4.2001, in proc.40893/01, de 21.11.2001, in proc.40.772/01, de 14.01.04, in proc.12.932/02 e 16.567/03, entre outros, e da Relação de Coimbra de 5.11.03, in proc.2743/03; da Relação de Lisboa de 3.10.01, in proc.61293/00, de 30.1.02, in proc.57053/00, de 2.10.02, in proc.46543/00, de 8.10.02, in proc.39545/00, de 6.11.02, in proc.22533/00, de 13.03.03, in proc.105039/00, de 19.3.03, in proc.993/00, de 27.5.03, in proc.26885/00, de 12.6.2003, in proc.4499/03, de 16.10.2003, in proc. 2274/03, todos acessíveis in www.dgsi.pt.

Outros, nos quais se inclui o ora relator, defenderam que perante a omissão no requerimento de abertura da instrução de factos que se mostrem necessários para a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança, não poderia daí resultar a imediata rejeição desse requerimento dado o apertado regime das causas de rejeição, devendo o juiz de instrução convidar o assistente a apresentar novo articulado, por forma a poder suprir tais omissões e só em caso de não ser sanada deverá ser rejeitada a abertura da instrução, apresentando, entre outros, o argumento de que, por força do art. 4.º do CPP, se aplicam subsidiariamente os preceitos do CPC, nomeadamente os dos artigos 508°, nos 2 e 3 e 265 – vide, Souto Moura, Jornadas de Direito Processual Penal, 120-121; Ac. R.P. de 5.5.93, CJ Ano XVIII, tomo III - pág. 243-245;Ac. RL de 21.3.2001, CJ, ano XXVI, tomo II - pág. 132/133; Ac. Relação do Porto de 7.02.01, in proc.40929/01, de 10.4.02, in proc.10075/02, de 4.12.02, in proc.10290/02; da Relação de Coimbra de 13.01.02, in proc.2441/02; da Relação de Lisboa de 27.6.02, in proc.39529/00, de 2.10.02, in proc.46543/00, de 5/2/03, in proc.93713/00, de 2.6.2004, in proc.3173/04; e, entre outros, os acórdãos da Relação de Évora de 16.12.97, in BMJ n.º472, pag.585, de 27.1.04, in proc. 840/03.1, de 27.4.04, in proc.382/04.1, 25.05.04, in proc.690/04.1, de 7.12.04, in proc.2422/04.1, estes últimos acessíveis in www.dgsi.pt/jtre.

Porém, no dia 12 de Maio de 2005, pelo Plenário das Secções Criminais do STJ, foi proferido um acórdão de fixação de jurisprudência no sentido de que “Não há lugar a convite ao assistente para aperfeiçoar o requerimento de abertura da instrução, apresentado nos termos do art. 287 n.º2 do CPP, quando for omisso relativamente à narração sintética dos factos que fundamentam a aplicação de uma pena ao arguido e não vemos fundadas razões para não acatar tal entendimento.

A falta de tais menções não deve ser entendida restritamente como integrando a falta de condições de procedibilidade ou de perseguibilidade criminal, prevendo os casos em que o processo não podia ter sido instaurado, por não reunir pressupostos processuais para o efeito, mas deve ser equacionada com a função da instrução e a necessidade legal de fixação do objecto do processo na acusação; é que o requerimento de abertura de instrução formulado pelo assistente deve exercer as funções de uma acusação, pelo que a omissão no RAI da subsunção jurídico-penal dos factos deve conduzir à rejeição do mesmo, de modo similar ao que resulta do n.º2, al. a) e n.º3 do art.311º do CPP para a acusação deficiente.

E o Tribunal Constitucional também já teve ocasião de se pronunciar sobre a constitucionalidade de entendimento semelhante no seu aresto n.º 389/2005, de 14.7.2005, em que concluiu no sentido de “não julgar inconstitucional a norma constante dos artigos 287º e 283º do Código de Processo Penal, segundo a qual não é obrigatória a formulação de um convite ao aperfeiçoamento do requerimento para abertura da instrução, apresentado pelos assistentes, que não contenha uma descrição dos factos imputados ao arguido”.

Aí também se concluiu que tal entendimento não viola o art. 20 da CRP, pois “o estatuto do assistente não é equivalente ao do arguido. Desde logo, a Constituição, a par da consagração de todas as garantias de defesa do arguido (artigo 32, nº 1), determina que “o ofendido tem o direito de intervir no processo, nos termos da lei” (artigo 32º, nº 7).

É, pois, constitucionalmente reconhecida uma ampla margem de conformação legislativa da posição processual do assistente (ofendido) que inviabiliza uma abstracta equiparação entre o estatuto do assistente e o do arguido.

Tal diferenciação é naturalmente reconhecida pela jurisprudência constitucional, que reiteradamente tem realçado, a propósito de várias questões relacionadas com o estatuto do assistente, a diferença entre as posições processuais dos dois sujeitos do processo penal (cf., a título meramente exemplificativo, os Acórdãos 27/2001 e 259/2002, que serão de novo referidos infra).
(…)

Aliás, em matéria de recursos, a Constituição consagra um direito de defesa do arguido – de forma expressa após a Revisão Constitucional operada pela Lei Constitucional nº 1/97, de 20 de Setembro, e, segundo a jurisprudência constitucional constante e unânime, de forma implícita já antes disso –, enquanto apenas contempla um direito genérico, que não pode ser suprimido in totum, à impugnação judicial das decisões dos tribunais ou a um duplo grau de jurisdição nos restantes domínios (o que, à luz do nº 1 do artigo 20º da Constituição, não inviabiliza, por exemplo, a fixação de uma alçada para a primeira instância em matéria civil). (…)

Assim sendo, é manifesto que nenhum preceito constitucional (ou de outra natureza) impõe a possibilidade de o assistente praticar de novo um acto que já praticou no respectivo prazo de modo absolutamente inadequado. O requerimento apresentado é pois um requerimentonão aperfeiçoável”.

Cabe ainda realçar que a representação do assistente por advogado (artigo 70º do Código de Processo Penal) visa garantir uma utilização tecnicamente adequada dos mecanismos processuais por esse sujeito.

Na verdade, o direito de acesso à Justiça no contexto destes autos concretiza-se na consagração do direito a requerer a abertura da instrução. Uma vez que é representado por advogado, o assistente dispõe das condições necessárias para o exercício de tal direito. Tais condições são, porém, delimitadas por outros princípios processuais, tais como a celeridade ou a proibição de actos inúteis. A prática de actos (no caso, a apresentação de um requerimento) de modo a não permitir a inteligibilidade do núcleo essencial da peça processual produzida não justifica nem legitima a imposição de um convite ao aperfeiçoamento (que, como se disse, seria antes a concessão da possibilidade de renovação do acto).

Por fim, deve ter-se presente que o reconhecimento da possibilidade de “renovação” do acto em questão implicaria uma compressão dos direitos de defesa do arguido, já que a consagração de um prazo para o assistente requerer a abertura da instrução concretiza a garantia de defesa inerente à fixação da situação processual do arguido que a não pronúncia origina.

Ora, não se vislumbra fundamento legítimo para tal compressão, já que a instrução não teve lugar devido a uma actuação processual dos assistentes manifestamente deficiente (de resto, os próprios assistentes reconhecem nos presentes autos as deficiências do requerimento apresentado). Nessa medida, a aludida compressão não é admissível (cf., em sentido próximo, o Acórdão nº 27/2001, já citado).

(…)
Se se focar, agora, a perspectiva do direito da assistente de deduzir a acusação através do requerimento de abertura da instrução, a não admissibilidade de renovação do requerimento por decurso do prazo não constitui uma limitação desproporcionada do respectivo direito, na medida em que tal facto lhe é exclusivamente imputável, para além de constituir – na sua possível concretização - uma considerável afectação das garantias de defesa do arguido.

Dir-se-á, por último, que do ponto de vista da relevância constitucional merece maior tutela a garantia de efectivação do direito de defesa (na medida em que protege o indivíduo contra possíveis abusos do poder de punir), do que garantias decorrentes da posição processual do assistente em casos de não pronúncia do arguido, isto é, em que o Ministério Público não descobriu indícios suficientes para fundar uma acusação e, por isso, decidiu arquivar o inquérito. Este balanceamento dos interesses em causa basta para mostrar que a aceitação da exclusão do direito de renovar um requerimento nulo pelo decurso do prazo peremptório fixado não desencadeia uma limitação excessiva ou desproporcionada do direito de acusar do assistente…”.

Uma instrução que peque por défice enunciativo de factos susceptíveis de conduzir à pronúncia titularia um acto inútil, que a lei não poderia admitir (artigo 137.º do CPC), e a sua inclusão naquela de uma alteração substancial dos factos, levaria à sua nulidade, nos termos do 309.º, n.º l, do CPP. Deve, por isso, ser rejeitado, por falta de objecto, o requerimento de abertura da instrução apresentado por assistente que omita, além do mais, a descrição de factos essenciais, nomeadamente relativos ao dolo ou negligência, bem como as normas legais aplicáveis, pois não cumpre a função processual que lhe é assinalada.

No sentido da rejeição do requerimento de abertura de instrução, por inadmissibilidade do mesmo, por falta de objecto, é v.g., a jurisprudência quer do Tribunal Constitucional (cf. o Ac. n.º 27/2001 - processo n.º 189/2000, D.R. - II Série de 23-03-2001, págs. 5265 e seguintes), quer do STJ (cf. Ac. de 27-2-2002, de24-09-2003, de 25-10-2006, de 7-5-2008 e de 12-03-2009), quer das Relações - cf. os Ac. RL de 2002-10-08 e 2003-05-27, ambos in www.dgsi.pt/jtrl.

Não temos dúvidas de que um requerimento de instrução como o formulado pelos assistentes é inepto para desencadear uma instrução e, por isso, não podia deixar de ser indeferido. Tal indeferimento deve adoptar a forma de rejeição, nos termos do disposto no art. 287.º, n.º3, do CPP. Não nos é indiferente a natureza taxativa das causas de rejeição: extemporaneidade do requerimento, incompetência do juiz ou impossibilidade legal da instrução. Mas entendemos que este último conceito deve abranger não só os casos em que a lei diz que não há lugar à realização de instrução como aqueles, como os dos autos, em que a realização da mesma se mostre inviável, por falta de requisitos legais.

Como se afirma no acórdão do STJ do Plenário das Secções Criminais de 12.5.2005, acima referida, “a manifesta analogia entre a acusação e o requerimento de abertura da instrução pelo assistente postularia, em termos de consequências endoprocessuais, já que não se prevê o convite à correcção de uma acusação estruturada de forma deficiente, quer factualmente, quer por carência de indicação dos termos legais infringidos, dada a peremptoriedade da consequência legal desencadeada: o de ser manifestamente infundadaO recurso à analogia “legis”, de resto, só não é de admitir, sendo vedado em processo penal quando, pelo recurso a ele, derive um enfraquecimento da posição ou diminuição dos direitos processuais do arguido, desfavorecimento do arguido, analogia “in malam partem” (cf. Prof. Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, I, 96-97), este não sendo o resultado negativo a que a rejeição conduz”.

Por tudo se conclui que o requerimento dos assistentes (de abertura de instrução), apesar da sua extensão, não cumpre cabalmente as exigências legais dos art. 283.º, n.º3, alin. b) e c) e 287, n.º2 do CPP, não permitindo a definição do objecto da instrução, o que consubstancia inadmissibilidade legal e fundamenta a rejeição, nos termos do art. 287, n.º3 do CPP, pelo que não merece qualquer censura a douta decisão sob recurso.

Assim, as pretensões visadas pelos assistentes com o presente recurso não podem proceder.

Improcedente o recurso, incumbe aos assistentes - recorrentes o pagamento de taxa de justiça, nos termos previstos nos art. 515 n.º 1 al. b) e n.º 2 do CPP e 8.º, n.º5 do Regulamento das Custas Processuais.

III
Pelo exposto, decide-se negar provimento ao recurso interposto pelos assistentes.., mantendo-se, em consequência, o douto despacho recorrido.

Por terem decaído, pagará cada um dos assistentes-recorrentes a quantia correspondente a 3 UC de taxa de justiça.

(Processado por computador e revisto pelo primeiro signatário - Art.94 n.º 2 CPP).

Évora, 2011-11-15

__________________________________________________
[1] - A este propósito, Maia Gonçalves, in Código de Processo Penal Anotado, defende que o requerimento do assistente deverá mesmo revestir o formalismo da acusação formal e que a falta de indicação dos factos gera o vício da inexistência, por falta de objecto de instrução.

[2] - Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 24.11.93, in CJ, 1993, Tomo V, pag. 61.

[3] - Assim, Germano Marques da Silva in Curso de Processo Penal, Vol. III, págs. 128 e segs.

[4] - Vide, a este propósito, os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 9 de Fevereiro de 2000, in CJ, XXV, 1, pág. 153 e de 25 de Junho de 2002, in CJ, XXVII, 3, pág. 143.

[5] - Neste sentido se pronuncia também de forma inequívoca, Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário ao Código de Processo Penal, Editora Universidade Católica, 2009, pág. 751, anotação 7.

[6] - Vide a este propósito, os acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 26.05.2004, de 16.06.2004 e de 12.01.2005, do Tribunal da Relação de Lisboa de 03.10.2001, 17.12.2002, 10.03.2003 e 27.05.2003 e do Tribunal da Relação de Coimbra de 17.09.2003 e de 05.11.2003, todos in www.dgsi.pt

[7] - Que erroneamente dirigiram ao Tribunal da Relação de Lisboa, o que reiteraram na resposta que apresentaram ao parecer emitido pela Exma. Procuradora-Geral Adjunta nesta instância.

[8] - Vide, a este propósito, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Tomo I, pag.326 e ss.

[9] - Neste sentido Paulo Dá Mesquita, Direcção do Inquérito Penal e Garantia Judiciária, a fls.291 e 292, nota de rodapé n.º 96.

[10] - Neste sentido, o Acórdão do STJ de 24-09-2003, que vimos acompanhando de perto, acessível in www.dgsi.pt .

[11] - Impõe-se dizer que embora a lei não o consagre expressamente no art.278.º do CPP, deve entender-se que os assistentes, ou quaisquer outras pessoas que nisso mostrem um interesse legítimo, podem reclamar, rectius, recorrer hierarquicamente, para o superior hierárquico, dos despachos de arquivamento, deste modo provocando uma intervenção hierárquica. Isto deduz-se dos princípios gerais ainda que se considere o despacho de arquivamento do inquérito um acto administrativo, pois hoje há a possibilidade legal, e mesmo constitucional, de recurso de todos os actos dessa natureza. Se tiver sido requerida a abertura da instrução, não é lícito ao superior hierárquico intervir, nem poderá haver reclamação ou recurso hierárquico (Neste sentido, Maia Gonçalves, in Código de Processo Penal, Anotado e Comentado, 15.ª Edição, a pag.569 e 560). Neste sentido também, o acórdão desta Relação de 24.1.2002, in rec.22139/01, entre outros.