Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
734/10.1PAPTM.E1
Relator: MARIA LEONOR ESTEVES
Descritores: CO-ARGUIDO
VALORAÇÃO DAS DECLARAÇÕES DO CO-ARGUIDO
FURTO
Data do Acordão: 07/14/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: As declarações do coarguido podem ser suficientes para incriminar o outro arguido, desde que sejam credíveis (por inexistir, nas relações entre arguidos, ressentimento, inimizade ou tentativa de exculpação do declarante), sejam verosímeis (havendo corroborações através de factos objetivos), sejam persistentes e idênticas (ao longo do processo), e se apresentem sem ambiguidades ou contradições.
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora

1. Relatório

No 2º juízo criminal do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Portimão, em processo comum com intervenção do tribunal colectivo, foram submetidos a julgamento, além de outro[1], os arguidos FMSO e PFSF, devidamente identificados nos autos, tendo no final sido proferido acórdão que condenou cada um deles pela prática de 8 crimes de furto, ps. e ps. pelo art. 203º nº 1 do C. Penal, o primeiro em penas parcelares de 1 ano e 3 meses por cada um dos crimes e, em cúmulo, na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão, cuja execução foi suspensa por igual período de tempo sob a condição de depositar 3.550€ nos autos ( de forma faseada e para posterior repartição entre os proprietários dos automóveis ), e o segundo em penas parcelares de 1 ano e 6 meses de prisão por cada um dos crimes e, em cúmulo, na pena única de 5 anos e 8 meses de prisão.
Na procedência do pedido indemnizatório deduzido por MPP contra os (três) arguidos, foram estes condenados solidariamente a pagar ao demandante a quantia de 550€.
Inconformados com o acórdão, dele interpuseram recurso os arguidos.
O arguido FMSO, pretendendo que o acórdão seja revogado e lhe seja aplicada “UMA PENA NÃO PRIVATIVA DA LIBERDADE OU AINDA QUE PRIVATIVA, SUSPENSA NA SUA EXECUÇÃO” (sic), apresentando as seguintes conclusões:

I- Vem o presente Recurso interposto da douta decisão que condenou o ora recorrente, como Autor material do crime previsto e punido pelo art.º86.º, n.º l al c) da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redação dada pela Lei n.º12/2011, de 24 de Abril, nomeadamente Detenção de Arma Proibida na pena de l ano de prisão efetiva a cumprir em setenta e dois períodos correspondentes a fins de semana, com a duração de quarenta e oito horas cada período.
O douto Acórdão julgou adequada a pena aplicada ao arguido, com os seguintes fundamentos
Do crime de que vem acusado nomeadamente detenção de arma proibida
II- Atenta a aprova produzida em audiência de julgamento, concluiu o tribunal a quo que o arguido detinha, na data dos autos, no interior da sua viatura, um revolver, de calibre 22, que constitui urna arma de fogo curta, de repetição que integra a classe B das armas.
III- Concluiu ainda o Tribunal que o arguido sabia que detinha tal arma, sem possuir qualquer licença ou autorização, não podendo desconhecer que tal detenção era, nestas circunstâncias PROIBIDA
IV- Justificou ainda, o Tribunal QUE O Arguido agiu em conformidade com a sua vontade, a qual foi livre e esclarecidamente formada, tendo o mesmo agido dolosamente e que por estariam reunidos todos os elementos constitutivos deste tipo de crime impondo-se a condenação do arguido pela sua prática.
D) DA MEDIDA CONCRETA DA PENA
V- Considerou o Tribunal para além das considerações supra mencionadas que o arguido regista já um impressionante historial criminoso, incluindo pela prática de crimes de ofensa à integridade física, sofrendo já condenações em penas de prisão ainda que suspensas na sua execução;
VI- Mais considerou o Tribunal a quo que seria também importante ter em consideração a periodicidade com que vem praticando crimes desde 2009 até 2012, tendo o arguido praticado crimes todos os anos e mais do que um por ano;
VII- Sendo que as exigências de prevenção especial são prementes acabando por suplantar elevadas exigências de prevenção geral;
VIII- Considerou também o tribunal a quo que considerando todo o exposto nunca uma pena de multa seria adequada e suficiente para a realização das finalidades das penas;
IX- Pelo que se decidiu pela aplicação de uma pena de prisão
X- O Tribunal a quo considerou que o grau de ilicitude no caso dos autos é médio “( apesar de se tratar de uma mera detenção e de a arma não estar carregada, encontrava-se a mesma no interior de uma viatura automóvel na porta do lado do condutor facilmente acessível)”.
XI- Foi ainda considerado pelo Tribunal a quo que o carater doloso é de intensidade média
XII- O arguido tem antecedentes criminais, PESE EMBORA PELA PRÁTICA DE CRIMES DE OUTRA NATUREZA (sendo certo que o arguido revela uma propensão para atingir a integridade física de terceiros, o que teria particularmente censurável a detenção desta arma)”.
XIII- Considerou o Tribunal que a favor do arguido estava o fato de o mesmo ter sido primário no tipo de crime em causa;
XIV- E de o mesmo ter confessado os fatos assumindo a responsabilidade pelos seus atos.
XV- Em face de tudo o exposto decidiu o Tribunal a quo, aplicar ao arguido uma pena efetiva de prisão com a duração de um ano.
XVI- Porém, tendo em consideração o significativo percurso criminal do arguido e, sobretudo, o fato de as anteriores suspensões de execução de penas de prisão o não demoverem da prática de novos crimes (revelando a ineficácia das mesmas, já que o arguido não aproveitou as várias oportunidades de ressocialização que as penas de prisão suspensas lhe têm dado), resultado, à saciedade, que a simples censurado fato e a mera ameaça da prisão, não realizam de forma adequada as finalidades da punição, nem qualquer outra pena privativa da liberdade;
XVII- Pelo que entendeu o Tribunal a quo, ser de aplicar uma pena de prisão efetiva;
XVIII- Todavia, entendeu ainda o Tribunal a quo que, uma vez que o ora arguido não cumpriu ainda qualquer pena privativa da liberdade e que está a revelar um esforço de inserção (tendo constituído família, vive numa casa arrendada e iniciou trabalho remunerado;
XIX- Justifica-se, segundo o entendimento do Tribunal a quo, ao abrigo do disposto no artigo 45.º do C.P. determinar que o cumprimento de tal pena seja realizado em regime de dias livres, por se mostrar que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidade da punição.
XX- Porém, ainda que todas as circunstâncias ponderadas pelo Tribunal se verificassem, sempre se poderá entender que a pena que a pena de prisão efetiva aplicada ao arguido, no caso dos autos á manifestamente excessiva e violadora dos critérios de determinação da medida da pena previstos no Código Penal.
XXI- De fato, salvo o devido respeito, não se pode aceitar que no caso aos autos em apreço seja de aplicar ao arguido uma pena de prisão efetiva pelos motivos explanados no Douto Acórdão,
XXII- Na verdade, o ora Recorrente e aqui arguido adotou uma conduta em Tribunal de colaboração absoluta com a justiça, assumindo a totalidade dos fatos que lhe foram imputados, mesmo sabendo que por detrás de si tinha um impressionante historial criminosos o que certamente já não pode levar a concluir, salvo o devido respeito, que o mesmo já interiorizou a censurabilidade da sua conduta e como tal se não for preso da sua liberdade não irá certamente continuar a cometer o mesmo tipo de ilícitos.
XXIII- Por outro lado também não podemos ignorar, é um fato, o passado criminal do arguido;
XXIV- Porém o que depõe a favor do arguido é que o mesmo é primário neste tipo de crimes;
XXV- Também não podemos concordar com o entendimento do Tribunal a quo, salvo melhor opinião, quando dá uma importância quase nula ao fato de o arguido começar á dar resultados do seu empenho na integração social, começando por constituir família, responsabilizar-se por arrendar uma casa e trabalhar com contrato de trabalho.
XXVI- O arguido é primário no presente tipo de crime, pelo que a ilicitude e a culpa na prática do mesmo são diminutas e não média salvo o devido respeito.
XXVII-Terá ainda de se ter em consideração que o passado criminal do arguido é passado, e segundo a nova legislação, a valoração dada ao mesmo reveste carater diminuto, salvo o devido respeito.
XXVIII- O arguido é um jovem de 23 anos, que teve um passado muito rebelde, relacionado com uma fase bastante conturbada da sua vida, em que sequer tinha colocada a hipótese de ter um filho nos braços e de ter de lutar pelo seu sustento.
XXIX- Encontra-se, por isso, familiarmente bem integrado.
XXX- Assim em face de todas as circunstâncias que depõem a favor do Arguido, designadamente a diminuta ilicitude do facto, o facto de estarem em causa a mera detenção de uma arma proibida e descarregada, a ausência de antecedentes criminais nos tipos de crime em apreço, o fato de o arguido ter um filho menor; o fato de o arguido estar a trabalhar com contrato, o fato de o mesmo se mostrar familiarmente inserido
XXXI- É manifestamente exagerada a aplicação ao arguido de uma pena de Prisão efetiva, quando ao contrário, nesta primeira vez poderia ser a mesma suspensa na sua execução, por todas as razões expostas.
XXXII- Nesta conformidade, incorre o Acórdão recorrido de vício de erro notório na apreciação da prova, nos termos do disposto no artigo 410.º n.º 2 als c), violando o disposto nos artigos 71. º n.º l a 3 do C.P e bem assim, como o disposto no artigo 50. e 51.º do Código Penal.

O arguido PFSF, pretendendo a revogação do acórdão e a sua absolvição ou, assim se não entendendo, a repetição do julgamento, concluindo como segue:

1) No dia 17 e 19 de Abril de 2010, o OPC procedeu a buscas em estabelecimento industrial de sucata, ao abrigo da al. a) do art. 251º, do CPP, mas não estão, no entanto, verificados os pressupostos legais:
- Desde logo, os suspeitos não se encontravam no local: apenas o, ainda, suspeito SB, acompanhou (diga-se “forçadamente”) o OPC, em viatura policial e devidamente algemado;
- Depois, os objetos apreendidos não estavam “ocultos”: estavam livremente acessíveis, à vista pública de quem entrasse no estabelecimento;
-Ainda, não se verificava qualquer “caso de urgência ou perigo na demora” ou risco de perda dos objetos apreendidos que legitimasse a busca: foi o OPC que ao decidir proceder a diligências num estabelecimento localizado a cerca de 30 Km do local da detenção dos suspeitos que, eventualmente, pôs em risco a prova do inquérito, pois se os deteve às 10h20, tinha o tempo suficiente para requer o respetivo mandato de busca;
2) Para além destes pressupostos, exige a lei ainda um outro, de natureza formal, que é o de que a busca realizada nestas circunstâncias seja imediatamente comunicada ao juiz de instrução e por este apreciada com vista à sua validação (n.°6 do art. 174.°, aplicável por força do n.°2 do art. 251° CPP), mas tal pressuposto, não foi igualmente, cumprido. Não houve qualquer comunicação ao Juiz de Instrução, nem por qualquer meio ao mesmo foi levado o conhecimento da busca, muito menos, houve apreciação e validação da mesma pelo Juiz de Instrução
3) Esta nulidade foi arguida, tempestivamente (al. c) do n.º3 art. 120.º CPP) pelo co-arguido CR (não pronunciado), e a nulidade das buscas não ficou, de qualquer modo e para qualquer efeito, sanada. Pelo que o presente recurso tem, inter alia, como fundamento os termos e os efeitos do art. 410.º, n.º 3 CPP
4) A nulidade da busca tem como consequência a anulabilidade da prova, e esse efeito comunica a todos os meios de prova – as apreensões – tornadas possíveis por recurso às buscas inquinadas. Outra interpretação das normas processuais e sua conjugação aos factos sub judice seria, salvo melhor opinião, violadora dos preceitos constitucionais do art. 18.º, n.º2 e art. 32.º, nomeadamente os n.º 1 e 5 da Constituição.
5) Estando em causa um crime de furto, p. no artigo 203.º do CP, que assume natureza semi-pública, o procedimento criminal está dependente da apresentação de queixa (vide n.º3) por parte do titular do respetivo direito, considerado no artigo 113º, nº 1 CP. A queixosa NB ao apresentar queixa de furto do veículo do qual não é proprietária não tem legitimidade, mas nem mesmo a sua «detenção ou mera posse» da coisa furtada tinha representação legal, nada se prova sobre a necessária «representação jurídica» da «disponibilidade material da coisa». Será a mesma lícita? Ou ilícita? E se lícita, é um comodato? Ou será compra e venda não titulada?
6) Decidir no caso sub judice que a queixosa NB tem legitimidade, não obstante não ser a proprietária do veículo furtado, sendo alegadamente detentora ou mera possuidora, sem prova do título ou sequer da origem (lícita ou ilícita) da posse/detenção, seria alargar a tutela do bem jurídico para além dos limites admitidos pela Constituição por violação do princípio da legalidade, concreta e nomeadamente do princípio nullum crimen, nulla poena sine lege, do princípio nullum crime nulla poena sine lege strica; do princípio nullum crimen nulla poena sine lege certa e do princípio nullum crimen nulla poena sine lege scripta.
7) Face ao exposto outra conclusão a retirar não poderia deixar de ser de concluir pela ilegitimidade do MP para acusar, o que ditaria a absolvição do arguido quanto a esse crime em particular.
8) O queixoso WW não apresentou, nem no inquérito se apurou, qualquer prova idónea da sua legitimidade e não existindo qualquer prova da propriedade do veículo identificado, não está provada a legitimidade do queixoso e dependendo o procedimento criminal de queixa validamente apresentada por quem tenha legitimidade, o MP carece de legitimidade para acusar pelo que o arguido deveria ser absolvido do furto desse veículo em particular.
9) A Sentença é nula por ter conhecido de questão de que não podia tomar conhecimento, nos termos e para os efeitos do art. 379.º, n.º1, al. c) CPP, porquanto a acusação não indica o valor do veículo furtado (matrícula W-7959P, Citroen, queixa apresentada por WW), e apesar da acusação omitir alegação do elemento objetivo essencial do tipo, não deveria a mesma ser recebida pelo Tribunal a quo, nem esta irregularidade suprima ex officio pelo Tribunal a quo como este o fez.
10) O Tribunal a quo ao ter agido deste modo, suprindo a irregularidade da acusação quanto a esse crime em particular, violou o art. 32.º, n.º 5 da CRP: isto é, violou o princípio do acusatório e as suas implicações de inadmissibilidade de investigação inicial por parte do Tribunal e a imputação pelo MP dos factos ao arguido, pelo que o arguido não pode ser condenado por crime do qual nem devia estar acusado, pelo que a absolvição seria a opção mais acertada.
11) O Juiz a quo, violou as formalidades de advertência e informação dos art. 342.º, n.º2 e 343.º, n.º1 CPP, pelo que as declarações do arguido FMSO não podiam ser utilizadas para fundamentar a decisão, nem ter qualquer eficácia na condenação ou na determinação da pena.
12) Esta alegação apesar de colidir com o teor da ata a fls. 1295, a verdade é que tal ata não é genuína, tendo por isso o arguido apresentado um requerimento escrito a requerer, nos termos do n.º 3 do art. 100.º CPP, a retificação da ata, sob pena de ter de deduzir incidente de falsidade de documento.
Mesmo que assim, não se entenda:
13) As declarações do co-arguido FMSO, sobre factos desfavoráveis ao co-arguido PFSF, ora recorrente, só podem fundamentar a prova de um facto criminalmente relevante quando existe alguma prova adicional a tornar provável que a história do co-arguido é verdadeira e que é razoavelmente seguro decidir com base nas suas declarações. Ora o Tribunal a quo na fundamentação da sua convicção não menciona qualquer “prova adicional” para o ter decidido com base nas suas declarações. Deste modo, estamos perante prova insuficiente para a decisão da matéria de facto provada e erro na apreciação da prova, o que habilita o presente recurso, nos termos do art. 410.º, n.º2, al. a) e c) CPP.
Mas ainda,
14) O Tribunal a quo ao formar a sua convicção “somente” com as declarações do co-arguido FMSO, não podia extrapolar a ação do mesmo (e extensíveis ao co-arguido PFSF) aos 8 furtos, mas apenas em 4 furtos, as suas declarações dizem isso mesmo «quando me acusaram eu fui dizer quais os carros para que eu ajudava», deste modo estamos perante prova insuficiente para a decisão da matéria de facto provada e erro na apreciação da prova, o que habilita o presente recurso, nos termos do art. 410.º, n.º2, al. a) e c) CPP
Sem prejuízo,
15) O Tribunal a quo ao aplicar ao arguido uma pena de 1 ano e 6 meses de prisão por cada um dos oito crimes, não considerou que cada crime de furto tem de ter uma autonomia própria (atendendo ao valor comercial / valor de mercado de cada uma das viaturas, que varia entre os €200 e €2000), nem fundamentou sobre o critério na determinação de uma pena igual para todos os crimes, nestes termos, as penas de prisão são desnecessárias, desadequadas e desproporcionais, e como tal violadoras das regras do art. 71.º CP.
16) De igual forma a fixação da pena única de prisão de 5 anos e 8 meses é desadequada e desproporcional, mostrando-se justa por adequada uma pena única não superior a 3 anos de prisão, nos termos do art. 78.º CP e assim e além de outros, estariam preenchidos os requisitos para suspender a execução da pena de prisão.
17) O Tribunal a quo funda a determinação da medida concreta da pena em factos não provados, que não passam de conclusões sem qualquer verisimilhança, sem atender que o arguido, apesar de ser reincidente, já ter decorrido um hiato temporal no qual adotou a sua conduta de vida conforme ao direito e os factos dos autos terem ilicitude reduzida, porque as coisas furtadas tinham um valor reduzido de mercado e pela própria natureza das coisas (veículos automóveis em final de vida), com sinais de abandono na via pública.

Os recursos foram admitidos.
O MºPº respondeu a ambos os recursos
Quanto ao recurso do arguido FMSO, entende que o mesmo deve ser rejeitado por ser manifesta a sua improcedência em virtude de o teor das respectivas conclusões nada ter a ver cm o objecto do processo, nem quanto à idade do recorrente ( que à data dos factos tinha quase 38 anos, não sendo o “jovem de 23 anos” aludido na conclusão XXVIII), nem quanto ao(s) crime(s) por que foi condenado (foi-o pela prática de 8 crimes de furto, e não por um crime de detenção de arma proibida como vem referido na conclusão I ), nem mesmo quanto à pena aplicada ( o recorrente foi condenado em pena de prisão cuja execução foi suspensa sob condição, e não em pena de prisão efectiva como referido na conclusão XXXI ).
Em relação ao recurso do arguido PFSF, considera que não deve ser provido, antes confirmando o acórdão recorrido, sustentando-se nas seguintes conclusões:

1ª –
Os Agentes da PSP limitaram-se a proceder a uma apreensão cautelar nos termos e para os feitos previstos no artigo 249°, nºs 1 e 2, alíneas a) por referência ao artigo 171°, nº 2 e alínea c) ambos do CPP atendendo à urgência e com o objetivo de evitar que muitas outras viaturas que tinham sido furtadas da mesma forma e levadas pelo mesmo reboque tivessem o fim que o veículo objeto da denúncia de fls. 3, que já se encontrava enfardado e prensado.
2ª –
Não se tratando de uma busca nunca teria aplicação o nº 6 do artigo 174°, aplicável por força do nº 2 do artigo 251º, ambos do CPP, logo não há qualquer nulidade.
3ª –
Sem prejuízo, qualquer eventual nulidade sempre estaria sanada por não ter sido arguida até ao encerramento do debate instrutório, nos termos do art. 120º, n.º 3 alínea c) do CPP dado que tal questão não foi suscitada nos pedidos de abertura de Instrução, onde foi requerida a “nulidade da validação da apreensão efetuada e não a nulidade da busca o que são realidades distintas com implicações também distintas e, assim, nenhum efeito se reflete na prova.
4ª –
A queixosa NB sendo a possuidora do veículo ligeiro de passageiros com a matrícula UG-87-46, tinha legitimidade para apresentar a queixa conforme o Acórdão de Fixação de Jurisprudência nº 7/2011, daí ter o MºPº legitimidade para o procedimento criminal por estar satisfeita a condição de procedibilidade estatuída no artigo 49º do CPP, como igualmente o tinha WW que era o dono do veículo de matrícula W-7959P como resulta da denúncia de fls. 528.
5ª –
O Tribunal não está limitado pela prova aduzida pela acusação, antes sobre os fatos da acusação é obrigado, se for caso disso, a recolher as provas necessárias à boa decisão da causa nos termos do disposto no artigo 340º nº 1 do CPP, o que aconteceu relativamente ao valor do carro de WW.
6ª –
O princípio da verdade material ou da investigação está em consonância com a estrutura acusatória do processo penal e de acordo com a CRP (cfr. Acórdão do TC nº 137/2002).
7ª –
O arguido está obrigado a responder e a fazê-lo com verdade sobre os antecedentes criminais nos termos do disposto no artigo 342º do CPP, jamais poderia o arguido ser advertido que sobre o objeto do processo era obrigado a falar com verdade, sob pena de incorrer em responsabilidade criminal, situação em que haveria uma violação flagrante do direito às garantias de defesa do arguido consagrado no artigo 32º nº 1 da CRP.
8ª –
O artigo 343º nº 1 do CPP refere-se ao objeto do processo e não existe qualquer divergência substantiva do texto respetivo e o que consta da Ata de Julgamento, havendo tão-só uma fórmula diferente de exprimir o respetivo conteúdo, não havendo, pois, fundamento para se proceder a qualquer alteração da Ata.
9ª –
Do texto do Acórdão por si ou conjugado com as regras da experiência comum não resulta o vício de erro notório na apreciação da prova.
10ª -
O recorrente esteve representado pelo seu Defensor que pôde e efetivou de facto o contraditório pelo que as declarações incriminatórias de co-arguido FMSO são um meio de prova válido.
11ª –
O arguido FMSO referiu todas as viaturas tal como constava na acusação, como resulta da forma inequívoca das respostas que deu a perguntas do Senhor Juiz Presidente, pelo que não há nenhum reparo a fazer à forma de convicção do Tribunal.
12ª –
Tendo em conta que é elevada a culpa e o dolo é intenso, sendo elevado o grau de ilicitude do crime, assim como as suas consequências, o recorrente não se dignou comparecer a Julgamento, não mostrando, assim, qualquer arrependimento confessado os factos, não mostrando qualquer arrependimento, não interiorizando assim o desvalor da sua conduta, sendo fortíssimas as exigências de prevenção geral, tendo em conta o alarme social que este tipo de crime causou nas populações, as penas parcelares aplicadas, bem como a pena aplicada em cúmulo jurídico, tendo em conta todas as circunstâncias elencadas no artigo 71º do Código Penal, que depõem contra e a favor do recorrente, são justas, adequadas e proporcionais, como igualmente a pena única.
7ª –
A pena é insuscetível de ser suspensa por força do disposto no artigo 50º nº 1 do Código Penal.

Nesta Relação, a Exmª Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer no qual - considerando que a decisão recorrida “não esclarece em que medida a prova produzida em audiência contribuiu para alicerçar a sua convicção relativamente a vários aspectos com relevância jurídico criminal, designadamente como chegou à conclusão de que o arguido SB se constituiu autor (coautor) material dos crimes de furto descritos, em que medida as indicações do arguido PFSF determinaram os ouros dois arguidos à execução dos factos descritos e, ainda, já em sede de determinação da medida da pena, porque considera que a actuação dos arguidos indicia clara pertença a rede dedicada a semelhante actividade”, mostrando-se deficientes a análise da prova e a fundamentação da decisão “porquanto não permitem aferir o raciocínio lógico dedutivo trilhado pelo tribunal que conduziu à fixação da matéria provada a fls. 1311 sendo que a matéria de facto provada a fls. 1307 é manifestamente insuficiente para a condenação dos três arguidos pelos 8 (oito) crimes de furto”, razão pela qual não cumpre o dever de fundamentação imposto no art. 374º nº 2 do C.P.P. relativamente a cada uma das situações descritas e responsabilidade jurídico-criminal de cada um dos arguidos, que é individual – se pronunciou no sentido de que deve o acórdão recorrido deve ser declarado nulo nos termos estatuídos no art. 379º nº 1 al. a) do C.P.P. e reenviado o processo para prolação de novo acórdão que expurgue o vício, com o que fica prejudicado o conhecimento dos recursos, com a procedência parcial dos mesmos, embora por razão diferente das neles invocadas.
Foi cumprido o art. 417º nº 2 do C.P.P., sem que tivesse sido apresentada resposta.
Colhidos os vistos, foram os autos submetidos à conferência.
Cumpre decidir.


2. Fundamentação
No acórdão recorrido foram considerados como provados, para o que aqui interessa, os seguintes factos (sendo nossa a respectiva numeração):

1. Entre 1.3 e 5.5.2010, em Portimão, os arguidos SB e FMSO, por indicação do arguido PFSF e de acordo com este, apossaram-se de oito veículos automóveis, com bastante uso e que valiam entre os 200 e os 2.000 euros, rebocando-os para as instalações de uma sucateira (em Algoz), onde os mesmos foram vendidos e depois desmantelados;
2. O arguido FMSO recebeu do arguido PFSF 10 a 15 euros por cada uma daquelas viaturas;
3. Agiram os arguidos de forma livre, deliberada e consciente, sabendo a sua conduta proibida, mas querendo apoderar-se daqueles veículos, para posterior venda;
(…)
6. O arguido FMSO foi condenado em 5.3.2009, em pena de multa, pela prática de crime de furto, cometido em 18.10.2007. Em 13.11.2012 foi condenado em pena de multa, pela prática de crime de falsidade de depoimento, cometido em Novembro de 2010;
7. Em audiência reconheceu ter colaborado no reboque das viaturas;
8. Cresceu em contexto de família natural, junto aos pais e irmãos, no Baixo-Alentejo (Relíquias), em contexto socioeconómico baixo. Veio para o Algarve em 1991, com 18 anos, para a Escola de Hotelaria e Turismo, onde fez o curso de empregado de mesa de 2ª e barman. A experiência de trabalho tem sido basicamente nesta área, marcado por alguma instabilidade;
9. Reside na zona de Portimão desde 1998, quando iniciou a vida marital com Paula Santos, situação que manteve durante cerca de 9 anos, com uma filha em comum, actualmente com 10 anos. A separação ter-se-á dado com a saída de casa da companheira e filha, basicamente por stress derivado da instabilidade económica e adição ao jogo que o arguido admite ter tido durante algum tempo, mas permitiu-se o restabelecimento de uma relação funcional. Manteve sempre a colaboração nas responsabilidades parentais, mesmo que em determinadas alturas não lhe tivesse sido possível contribuir na prestação de alimentos;
10. À data dos factos, como agora, vive sozinho. Trata-se de um apartamento com uma renda mensal de 300 euros, que o próprio nem sempre consegue assegurar, mas dada a boa relação que tem com a senhoria, conta com compreensão desta e a troco assegura-lhe trabalhos diversos de manutenção;
11. Contrariamente à data dos factos, em que se encontrava a passar um período de maiores dificuldades económicas, pelo desemprego, no presente encontra-se activo no mercado de trabalho, contratado como empregado de mesa no Hotel Júpiter, auferindo um vencimento base de cerca de 500 euros;
12. Evidencia uma evolução positiva, em termos da organização pessoal e gestão dos recursos, designadamente por ter agora uma situação laboral mais favorável e ter aparentemente ultrapassado a compulsão ao jogo;
13. Este confronto com o sistema de justiça tem um impacto importante, pela ansiedade com que sente o receio das consequências. Atribui-o à situação de vulnerabilidade que à data dos factos se encontrava, pelo desemprego, o que terá facilitado o seu envolvimento na situação.
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14. O arguido PFSF foi condenado em 18.11.2003, na pena única de 3 anos de prisão, suspensa na execução, pela prática de dois crimes de furto, cometidos em Agosto de 2002. Foi condenado em 7.7.2004, em pena de multa, pela prática de crime de emissão de cheque sem provisão, cometido em 8.4.1999;
15. Faltou injustificadamente à audiência;
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16. A viatura pertença do demandante MPP, levada pelos arguidos, valia cerca de 400 euros e tinha no seu interior ferramentas no valor aproximado de 150 euros, que desapareceram com aquela;
17. Outra daquelas viaturas, pertença de Norberto Sebastião valia cerca de 2.000 euros, tendo no seu interior materiais de construção;
Mais se considerou como provado, embora “Sem grande interesse para a decisão, atendendo ao que antecede, mas com os mesmos fundamentos” que:
18. Em data não concretamente apurada, mas seguramente no período compreendido entre 1 de Março de 2010 e 5 de Maio de 2010, os arguidos PFSF, SB, funcionário da sociedade comercial “RU, Lda.” e FMSO congeminaram e executaram o seguinte plano: os arguidos SB e FMSO apropriaram-se de veículos antigos, rebocando-os para as instalações da sucateira sita em Algoz, propriedade da referida sociedade comercial, sob a indicação do arguido PFSF;
19. Em contrapartida, este arguido pagava ao arguido FMSO quantias que oscilavam entre os dez a quinze euros por cada viatura subtraída;
Assim, a 1 de Março de 2010, pelas 10h45m, os arguidos SB e FMSO abeiraram-se do veículo ligeiro de passageiros da marca Renault, modelo 19, de cor branca, com a matrícula (…), corn o valor de cerca de €400, que se encontrava estacionado na Avenida Guanaré, em Portimão e que pertencia a MPP;
20. Em acto contínuo e sem autorização do seu legítimo proprietário, os arguidos, em conjugação de esforços e de acordo com o plano previamente traçado com o arguido PFSF, rebocaram a dita viatura para as instalações da sucateira “RU”, sita em Algoz-Silves, utilizando para o efeito o reboque da dita sociedade;
21. A 5 de Abril de 2010, no período compreendido entre as 10 e as 20h00, na Avenida V3, junto ao parque de estacionamento do Aparthotel “Club Praia da Rocha”, em Portimão, os arguidos SB, FMSO e apropriaram-se do veículo ligeiro de passageiros da marca Citroen, modelo BX, de cor cinzenta, com a matrícula W-79597P, pertencente a WW e, sem autorização deste, rebocaram-no para as instalações da dita sucateira;
22. No período compreendido entre os dias 6 de Abril de 2010, pelas l5h00m e 14 de Abril de 2010, pelas 13h50m, na Avenida V3, junto a uma casa de estilo árabe, em Portimão, os arguidos SB, funcionário da sociedade comercial “RU, Lda.”, FMSO abeiraram-se, desta feita, do veículo ligeiro de passageiros da marca Lancia, modelo Dedra 1 .6 IE, de cor cinza, com a matrícula UG-87-46, avaliado em €1 000 (mil euros), pertencente a NB, sua legítima possuidora;
23. De seguida, sem autorização desta, os arguidos rebocaram-no para as instalações da referida sucateira, sita em Algoz;
24. No dia 7 de Abril de 2010, pelas 11h, na Urbanização das Romanzeiras, em Portimão, os arguidos SB, FMSO, rebocaram o veículo ligeiro de passageiros da marca Fiat, modelo Uno 60 SL, de cor branca, com a matrícula QB-36-28, com o valor de 500 (quinhentos euros), pertencente a MNC e, sem autorização deste, rebocaram-no para as instalações da sucateira pertencente àquela sociedade comercial, sita em Algoz- Silves, utilizando para o efeito o reboque da dita sociedade;
25. No período compreendido entre 14 de Abril de 2010, pelas 13h50m e 15 de Abril de 2010, pelas l8h, nas traseiras do lote 62 da Urbanização Quinta do Rodrigo, em Portimão, os arguidos SB e FMSO fracturaram o vidro lateral traseiro esquerdo do veículo ligeiro de passageiros da marca Toyota, modelo Starlet, com a matrícula QN-36-13, com o valor estimado de €500 (quinhentos euros), pertencente a JMJJ, rebocando-o, sem autorização deste, para as instalações da sucateira pertencente àquela sociedade comercial, sita em Algoz- Silves;
26. No interior da dita viatura estavam depositadas diversas ferramentas, nomeadamente martelos e rebarbadoras, cujo valor global não foi possível, em concreto, apurar, mas que seguramente era superior a €102;
27. No dia 16 de Abril de 2010, pelas 15h58m, na Pedra Mourinha, em Portimão, os arguidos SB, FMSO, dirigiram-se a um terreno particular pertencente ao Iote 5 da Urbanização Algarvesol;
28. Aí chegados, os arguidos SB e FMSO rebocaram, sem autorização dos legítimos proprietários, as seguintes viaturas:
- o veículo ligeiro misto da marca Bedford, modelo WFR53D, de cor branca, com a matrícula JT-44-10, pertencente a VF e
- o veículo ligeiro de passageiros da marca Rover, modelo 214 GS1, de cor vermelha, com a matrícula XX-18-90, pertencente a EMF, quebrando, para tanto, o vidro lateral dianteiro direito deste veículo;
29. O veículo de matrícula JT-44-10, com o valor estimado de €1500 (mil e quinhentos euros), foi entretanto enfardado nas instalações da “RU”, o mesmo não sucedendo com os martelos, um carro de mão, duas pás, uma enxada e um rolo de manga de canalização e documentos da viatura, que estavam depositados no seu interior e cujo valor global, em concreto, não foi possível apurar, mas que seguramente era superior a €l02;
30. Por seu turno, a viatura XX-l8-90, entretanto enfardado nas instalações da antedita sucateira, tinha o valor estimado de € 1000 (mil euros), bem como no interior da bagageira estavam depositados dois pára-quedas de emergência novos, acondicionados nas respectivas bolsas de cor preta com o valor de €300 (trezentos euros) cada, um carregador de baterias avaliado em €50 (cinquenta euros) e os documentos da viatura, não tendo estes objectos e documentos da viatura sido recuperados;
31. No período compreendido entre o dia l de Abril de 2010 e as 8h30m do dia 19 de Abril de 2010, no terreno junto ao edifício Cedipraia, em Portimão os arguidos SB, funcionário da sociedade comercial “RU, Lda.”, FMSO e PFSF rebocaram o veículo ligeiro de passageiros da marca Mercedes, modelo MB 100D, de cor branca, com a matrícula 20-19-EI e o valor de cerca de 2.000 euros, pertencente a NS e sem autorização deste, para as instalações da sucateira pertencente àquela sociedade comercial, sita em Algoz-Silves, utilizando para o efeito o reboque da dita sociedade;
32. Estavam depositadas no interior do referido veículo alguns materiais de construção, bem como os documentos da viatura (livrete e título de propriedade) e documentos pessoais, como certificados de habilitações, fotografias e facturas de materiais de construção;
33. O antedito veículo foi encontrado, a 21 de Abril de 2010, no interior das instalações da sucata “RU”, sita no Sítio dos Vales, no Algoz, mas não foram recuperados os materiais de construção, cujas caixas estavam vazias, nem os aludidos documentos;
34. Pelo que, os arguidos SB, FMSO e PFSF actuaram, em conjugação de esforços e de acordo com um plano previamente traçado, com o propósito concretizado de se apoderarem daqueles veículos, não obstante saberem que não lhes pertenciam e que agiam contra a vontade dos seus legítimos donos;

A convicção do tribunal, também na parte que para aqui interessa, foi explicada nos seguintes termos:

A convicção do tribunal quanto aos factos provados relativos ao objecto deste processo (factos penalmente relevantes, bem como os que fundam responsabilidade civil) e que em primeira-mão se prendem com a caracterização da actividade dos arguidos formou-se com base nas declarações do arguido FMSO que em audiência admitiu ter colaborado no reboque das viaturas a que se refere a acusação, ajudando o motorista do reboque, por indicação e contra o pagamento efectuados pelo arguido PFSF, tal como apurado. Prestou as suas declarações de forma a não deixar dúvida sobre a ocorrência daqueles factos, ainda que se tivesse escudado num suposto desconhecimento sobre a forma de obtenção das mesmas, pois, segundo começou por afirmar, estava convencido de que se tratava de bens previamente adquiridos.
Interrogado acerca da sua concreta ajuda e entendendo onde se pretendia chegar com o esclarecimento, tentou continuar a tergiversar, repetindo o que já havia dito, até que reconheceu o inevitável.
Como resulta de regras de experiência comum e depois de se examinar a primeira fotografia do reboque patente nos autos, aquela ajuda passaria sempre pela orientação da viatura para cima da correspondente plataforma, para o que era essencial o manuseamento do volante enquanto outrem manobrava o guincho. Confrontado com semelhante situação, o arguido, então, reconheceu que nalguns dos casos tiveram de quebrar o vidro dos veículos a rebocar (o assistente Norberto Sebastião, atestou em audiência que a viatura que os arguidos lhe rebocaram para uma sucateira, tinha as portas rebentadas quando ali se deparou com a mesma. Sem dúvida, o método alternativo à quebra dos vidros).
Ou seja, este arguido sabia perfeitamente que as viaturas estavam a ser retiradas aos donos e contra a vontade dos mesmos. Logo, atendendo à sua posição claramente subalterna relativamente aos demais, também estes o sabiam.
Das declarações deste arguido, relativamente às indicações que recebia e ao pagamento que auferia, resulta também claro que o alvo da cobiça de todos eram as viaturas, para depois serem vendidas e desmanteladas, não fazendo parte da sua actividade o que quer que estivesse no seu interior, pois relativamente a tanto é patente que nada acordaram, desinteressando-se completamente. São levadas apenas porque ali se encontram, desconhecendo o destino das mesmas. Não tinham pois qualquer intenção de as fazerem suas.
O valor de duas das viaturas (um desconhecido para a acusação e a outra a de Norberto Sebastião) resulta de consulta a sítios da Internet dedicados à venda de carros usados.
O valor do veículo de MPP (para além da admissão feita pelo arguido), a que se junta o das ferramentas que estavam no interior daquele, resulta ainda do testemunho prestado em audiência por FPP que deu pormenores congruentes, adiantando até o preço de compra daquela e o tipo de ferramentas desaparecido.
O mais apurado resulta dos C.R.C. dos arguidos e do relatório social.
(…)


3. O Direito
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar[2], sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no art. 410º nº 2 do C.P.P.[3].
No caso dos autos, face às conclusões da motivação do recurso, as questões essenciais que foram suscitadas são as seguintes:

Recurso do arguido FMSO:
- medida e suspensão da execução da pena

Recurso do arguido PFSF:
- nulidade da busca e apreensão;
- ilegitimidade dos queixosos NB (Lancia Dedra UG-87-46) e WW (Citröen BX W-79597P):
- nulidade por excesso de pronúncia na parte relativa ao valor da viatura de matrícula W-79597P;
- omissão das advertências dos arts. 342º nº 2 e 343º nº 1 do C.P.P.;
- vícios do art. 410º nº 2 als. a) e c) do C.P.P.;
- medida das penas parcelares e única;
- suspensão da execução da pena.

Questão prévia
Começando pela análise do recurso do arguido FMSO, a sua leitura evidencia, tal como também já foi salientado pelo MºPº da 1ª instância na resposta que apresentou, uma absoluta falta de correspondência com a situação dos autos. De facto, não obstante o recorrente vir correctamente identificado pelo nome nesse recurso, toda a argumentação que veio oferecer se reporta a crime ( de detenção de arma proibida ) que não constitui objecto dos presentes autos e a condenação em pena ( prisão por dias livres ) que não corresponde à que lhe aplicada no acórdão recorrido, vindo ademais alegados antecedentes criminais ( pela prática de crimes de ofensas à integridade física, pelos quais teria sido condenado em penas suspensas na sua execução ) e características pessoais e de vida ( é um jovem de 23 anos e tem um filho nos braços ) que não batem certo com o que relativamente ao recorrente se apurou nos autos. Na verdade, o recorrente foi julgado e condenado pela prática de crimes de furto de viaturas, em pena de prisão que foi suspensa na sua execução sob condição de proceder ao pagamento de uma determinada quantia, nasceu em 12/9/72 e não há qualquer referência a filhos, nomeadamente no relatório social que foi junto aos autos.
Assim, e porque também o efeito jurídico que constitui a pretensão do recorrente – a suspensão da execução da pena – não faz sentido desde logo porque a que lhe foi aplicada foi suspensa na sua execução, a ininteligibilidade da mesma acarreta necessariamente a manifesta improcedência deste recurso, conduzindo à sua rejeição.

Iremos, assim, conhecer apenas do recurso do arguido PFSF, sem prejuízo dos eventuais reflexos que da sua decisão possam decorrer para os demais co-arguidos ( al. a) do nº 2 do art. 402º do C.P.P. ).

3.1. O recorrente sustenta que não se verificavam os pressupostos legais para a busca a que o OPC procedeu no estabelecimento comercial de sucata na medida em que os suspeitos não se encontravam no local ( o então ainda suspeito SB foi forçado a acompanhar o OPC em viatura policial e algemado ), os objectos apreendidos não estavam ocultos ( estavam livremente acessíveis, à vista de quem entrasse no estabelecimento ), e não se verificava qualquer caso de urgência ou perigo na demora ( o OPC deteve os suspeitos pelas 10,20 horas e teve tempo suficiente para requerer o mandado de busca antes de decidir proceder a diligências num estabelecimento localizado a cerca de 30 km do local da detenção ), para além não ter havido qualquer comunicação ao JIC nem apreciação e validação da busca pelo mesmo, ao arrepio do disposto no nº 6 do art. 174º, aplicável por força do nº 2 do art. 251º, ambos preceitos do C.P.P. Considera, por isso, ter sido cometida nulidade, que foi tempestivamente arguida por co-arguido que não foi pronunciado, a qual não foi sanada e tem como consequência a anulabilidade da prova, comunicando-se a todos os meios de prova, em concreto às apreensões tornadas possíveis através da busca inquinada.

Comecemos por conferir as ocorrências, factuais e processuais, que os autos espelham:
- os autos iniciaram-se a partir de suspeitas de furtos de vários veículos, com a detecção e intercepção, no dia 17/4/10 ( sábado ) de uma viatura de reboque, com a matrícula OF-78-74 e características idênticas às visíveis em fotografia, tirada ao reboque e alguns dos veículos furtados e fornecida pelo lesado Eduardo Mota Ferreira ( auto de denúncia apresentada em 16/4/10, a fls. 7-8 ), viatura à qual foi dada ordem de paragem, tendo, na sequência da confirmação feita pelo concutor e pelo ocupante da mesma, respectivamente SB e FMSO, de que tinham efectuado diversos reboques de viaturas a mando do seu patrão, que lhes indicava o local onde as mesmas se encontravam, sido feita a condução da viatura e daqueles indivíduos, para as instalações policiais;
- prosseguindo de seguida as diligências para recuperar a viatura do referido lesado ( Rover de matrícula XX-18-90 ), os agentes policiais deslocaram-se, na companhia do SB, ao estabelecimento de sucata da RU, que se encontrava em pleno funcionamento, com uma prensa a empacotar viaturas e uma grua a colocá-las sobre um camião no seu interior;
- questionada a responsável pelo espaço, SCC, acerca do paradeiro daquela viatura, por ela foi respondido que a mesma se encontrava no parque da sucata e já tinha sido enfardada/empacotada, não possuindo qualquer documento a ela referente, acrescentando que tinha sido o PFSF que tinha dado ordens para proceder ao reboque dessa e de outras viaturas, indivíduo esse que compareceu no local e referiu ter comprado as viaturas ao FMSO, desconhecendo se ele contactava os respectivos proprietários;
- indagado o paradeiro de duas outras viaturas que constavam como tendo sido furtadas e que ali haviam sido depositadas no dia anterior, os indivíduos que se encontravam a operar com uma grua responderam que haviam sido enfardadas momentos antes;
- localizados tais fardos, foram os mesmos apreendidos, assim como várias chapas de matrículas de veículos que ali haviam sido recentemente enfardados ( auto de apreensão a fls. 22-25 ), por se revelarem de interesse para a identificação de outros veículos que pudessem ter sido ilegitimamente destruídos;
- dado conhecimento do sucedido à magistrada do MºPº de turno, pela mesma foi indicado o procedimento a seguir, em concreto, a apreensão dos artigos susceptíveis de ligação a ilícitos criminais e a identificação e catalogação dos demais para ulterior verificação da sua origem;
- foram constituídos como arguidos SB e FMSO, realizada com o consentimento ( fls. 133 ) do segundo busca à sua residência, e referido o interesse na emissão de mandados de busca às partes reservadas do estabelecimento de sucata, nomeadamente ao respectivo escritório, para verificação da documentação relacionada com as viaturas furtadas e respectivas guias de transporte;
- no dia 19/4/10 ( 2ª f. ), a titular do inquérito proferiu despacho ( fls. 165-166 ) no qual, além do mais, validou a apreensão efectuada, nos termos do art. 178º nºs 1, 3 e 5 do C.P.P., e ordenou a emissão e entrega ao OPC de mandado de busca ao estabelecimento de sucata, nomeadamente aos escritórios e anexos, ao abrigo do disposto nos arts. 264º, 174º nºs 1, 2 e 3, conjugados com o art. 176º, todos do C.P.P., delegando no OPC a competência “para proceder a todas as diligências de inquérito úteis e necessárias à descoberta da verdade material”;
- na mesma data, a RU apresentou requerimento ( fls. 167-168 ) no qual, na sequência de um outro datado de 17/4/10 ( fls. 169 ), em que se insurgia contra o comportamento dos agentes policiais que se encontravam nas instalações da empresa por entender que não dispunham de autorização de permanência e busca, veio arguir a violação de “normas de legalidade determinadas pelo Código de Processo Penal” por parte daqueles agentes;
- emitido e entregue o mandado de busca às instalações da RU e para apreensão de todos os elementos que pudessem esclarecer a investigação em curso nos autos ( fls. 172 e 174 ), o OPC limitou-se a notificar a responsável pelo espaço para preservar as imagens registadas pelo sistema de videovigilância da sucateira e a recolher as chapas de matrícula já anteriormente apreendidas ( fls. 175 ), bem como a proceder à apreensão de um outro veículo denunciado como furtado e respectiva guia de transporte ( Mercedes de matrícula 20-19-E1, fls. 156 e 183 ) e a constatar que o selo de inspecção periódica de outro veículo também denunciado como furtado se encontrava num amontoado de pára-brisas já destruídos, mais propondo que fosse autorizada a leitura de dados existentes num computador portátil, apreendido naquelas instalações, que tudo indicava suportar o registo de fluxo de veículos para aquele local e dessa forma permitir detectar outras viaturas furtadas e imediatamente destruídas ( fls. 194-196 );
- por fax, enviado em 23/4/10, a RU apresentou novo requerimento ( fls. 202-203 ), no qual, alegando que o seu gerente não se encontrava presente aquando da realização das diligências e delas só teve conhecimento a posteriori, veio arguir a nulidade da busca e apreensão do reboque e da busca às suas instalações, no dia 17/4/10, bem como de todos os actos delas dependentes, por não terem sido exibidos nem entregues os competentes mandados;
- e, por novo fax, enviado em 26/4/10, a RU veio arguir a nulidade de novas buscas realizadas em 19/4/10 e 21/4/10 às suas instalações, assim como dos actos delas dependentes, com remoção de um caixote contendo várias matrículas não identificadas, um computador portátil e pastas com vária documentação, da primeira vez sem lhe ter sido pedida autorização nem ter sido exibido mandado para o efeito, e da segunda com a exibição de um mandado de busca, que não emitido por juiz e do qual não constavam os respectivos fundamentos nem a delimitação do objecto da busca ( fls. 205-206 );
- em 11/5/10 foi proferido pela magistrada titular do inquérito despacho que, na parte que para aqui interessa, tem o seguinte teor:
III - Através do seu requerimento de fls. 163 veio o Ilustre Mandatário suscitar a falta de cumprimento dos pressupostos da actividade dos Senhores Agentes da P.S.P. de Portimão levada a efeito no dia 17 de Abril de 2010, no interior das instalações do Estabelecimento Industrial “RU, Unipessoal, Lda,”.
Invoca para o efeito o facto dos Senhores Agentes terem entrado nas referidas instalações sem autorização, invadindo as instalações da referida empresa e passado busca à mesma, sem estarem munidos do respectivo mandado de busca, retendo os funcionários presentes nas instalações desde as 13horas, hora de encerramento, até às 15 horas e 24m (hora correspondente ao envio do referido requerimento, via fax).
Foram informados telefonicamente da falta de cumprimento dos pressupostos da sua actividade e da consequente falta de autorização de permanência e busca.
Cumpre, pois, apreciar:
Antes de mais, cumpre referir que, de acordo com o relatório de diligências externas consta a informação de que, no dia 16 de Abril de 2010, cerca das 20h15, na PSP de Portimão foi apresentada uma denúncia por furto do veículo automóvel de matrícula XX-18-90, de marca Rover, 214 GSI, de cor vermelha, onde o seu proprietário informa que presenciou e fotografou um reboque, a carregar o seu veículo sem a sua autorização, retirando-o do local onde o tinha deixado.
Após a descrição do veículo, sendo do conhecimento da PSP de Portimão aquela forma de actuação, na sequência das várias denuncias apresentadas e apercebendo-se da circulação do referido reboque, na via pública, aborda o condutor e o passageiro, confrontando-os com os factos, ou seja, com o transporte do veículo de matrícula XX-18-90, naquele reboque e no dia anterior.
Aqueles confirmam o transporte da referida viatura nos termos indicados na respectiva queixa-crime, indicando como local de destino da mesma a “RU, Unipessoal, Lda.”, sita em Algoz.
Na sequência de tal informação, os Senhores Agentes acompanharam o condutor e o passageiro do reboque, com a matrícula OF-78-74 ao referido local e entraram acompanhados dos mesmos e com a sua permissão.
Entraram em espaço aberto ao público e foi a acompanhar o condutor e o passageiro do referido reboque e com o conhecimento de que naquele local existia um veículo furtado que foram confrontados com meios de prova, constatando que tais meios se encontravam em espaço público, tendo constatado que o veículo XX-18-90 se encontrava já “enfardado” e “prensado”.
Mais, actuaram depois de terem conhecimento de que através de um reboque, que se apurou ser aquele, tinham sido carregadas várias viaturas que tinham sido retiradas aos seus proprietários e sem o seu consentimento.
Nesta conformidade, os Agentes da PSP de Portimão actuaram de forma cautelar (apreendendo coisas, não efectuaram buscas), nos termos e para os feitos previstos no artigo 249.°, n.° l e n.° 2, alíneas a) - por referência ao artigo 171.°, n.° 2 e alínea c) e ainda do artigo 251.°, n.° l, alínea a), todos do Código de Processo Penal, atendendo à urgência e ainda à possibilidade de se “dissiparem” as provas tendo os referidos Agentes contactado, no mesmo dia e naquele momento a autoridade judiciária que dirige o inquérito e dela recebido instruções sendo comunicada e validada a apreensão dos objectos.
Assim, por tudo o que se deixou exposto, entendemos que não foram violadas as normas dos artigos 174.°, 176.°, 178.°, n.° l e n.° 3, 99.°, todos do Código de Processo Penal e, em consequência não se verifica a nulidade dos actos prevista no art. 120.°, n.° 2, alínea d) do citado diploma legal.
IV — No seu requerimento de 205 e 206 o Ilustre Mandatário veio suscitar a nulidade da actividade dos Senhores Agentes da PSP levada a efeito no dia 19 de Abril de 2010, pela manhã, uma vez que o Gerente, representante legal da “RU, Unipessoal Lda.” não esteve presente nas alegadas diligências, onde os referidos agentes apresentando-se nas instalações do referido Estabelecimento, procederam a buscas, sem lhes ter sido concedida autorização para o efeito e sem que estivessem munidos do respectivo mandado de busca.
Também nesta parte não nos merece censura a actuação policial, uma vez que no dia 19 de Abril de 2010, pelos Senhores Agentes da PSP não foi realizada qualquer busca, a visita às referidas instalações ficou a dever-se apenas à necessidade de procederem a notificação para preservação das imagens registadas pelo sistema de videovigilância do referido estabelecimento, por revestir importância para o objecto dos presentes autos e ainda para recolher as chapas de matrícula, apreendidas cautelarmente no dia 17 de Abril, uma vez que os responsáveis pelo estabelecimento se recusaram a assinar, naquela data, o auto de apreensão e de nomeação de fiel depositário, encontrando-se as mesmas num espaço aberto do recinto.
Por último, no que ao dia 21 de Abril de 2010 diz respeito, quando o Ilustre Mandatário se refere à exibição do “alegado” mandado de busca, cumpre referir que os Senhores Agentes da PSP procederam a urna busca num Estabelecimento Industrial, munidos do respectivo mandado de busca e apreensão acompanhado do despacho que o determinou e que se encontrava suficientemente fundamentado e fora emitido pelo Autoridade Judiciária competente, conforme resulta do disposto no art, 174.°, n.° 3, do Código de Processo Penal.
Do referido despacho que acompanhou os mandados resulta a informação de que há indícios da prática do crime de furto, p. e p. pelo art. 203.°, n.° l, do Código Penal, uma vez que se constatou que eram transportados para o referido Estabelecimento veículos automóveis sem o consentimento dos seus proprietários e que depois eram “enfardados”. Tal situação era do conhecimento da PSP de Portimão face à apresentação de várias queixas por parte dos proprietários das referidas viatura e ainda do que foi possível constatar no dia 17 de Abril de 2010.
Na realidade, para além do mais, os indícios resultam de todos os elementos que constam do processo com os quais, no dia 17 de Abril de 2010, também foram confrontados os arguidos e onde consta a informação sobre a relevância para a investigação daquele meio de obtenção de prova como seja a apreensão de documentos (matrículas, motores, selos de inspecção periódica, guias de transporte) e outros objectos, como sejam viaturas “enfardadas”, para-brisas que foram de determinado veículo, sobre o qual foi apresentada a respectiva queixa — crime por furto e que teve o seu fim nas instalações da “ RU, Unipessoal, Lda.”, ocorrendo a respectiva destruição — “enfardamento”, no dia imediatamente após ao furto do mesmo.
No que respeita ao facto do Gerente não ter estado presente às alegadas diligências ocorridas, tendo tomado conhecimento dos factos ocorridos, à posteriori, sempre se dirá que as mesmas foram acompanhadas desde o seu início por SCC, funcionária da referida empresa sendo esta a pessoa responsável, na altura, pelo estabelecimento, face à impossibilidade do Gerente se apresentar naquele instante nas referidas instalações (art. 176.°, n.° l, do Código de Processo Penal).
Cumpre ainda referir que foram elaborados os respectivos autos de apreensão de todos os materiais, não tendo sido assinados pelo responsável ali presente, por se ter recusado, tendo-lhe sido entregue as respectivas cópias.
Assim, por tudo o que se deixou exposto, mais uma vez entendemos que não foram violadas as normas dos artigos 174.°, 176.°, 178.°, n.° l e n.° 3, 99.°, todos do Código de Processo Penal e, em consequência não se verifica a nulidade dos actos prevista no art. 120.°, n.° 2, alínea d) do citado diploma legal.
Notifique.
- posteriormente, por despacho de 28/5/10 e na sequência de promoção do MºPº nesse sentido, o JIC autorizou a análise do conteúdo do computador apreendido ( fls. 356 )
- deduzida que foi acusação contra os arguidos e também contra CMR, este na qualidade de gerente da RU, foi requerida a abertura da instrução por este último e também pelo arguido SB, sem que nesses requerimentos tenham posto em causa a validade das buscas e apreensões realizadas nos autos ( fls. 914-919 e 953-956 );
- ainda assim, na decisão instrutória, que não pronunciou o referido Cirilo e pronunciou os demais arguidos, o JIC, no segmento dedicado ao saneamento dos autos, pronunciou-se expressamente sobre a questão, nos seguintes termos:
Não se vislumbra qualquer invalidade. Os actos que antecederam a constituição como arguido, actos espelhados no relatório de fls. 3 e s. e aditamento de fls. 11, têm a sua norma de permissão no âmbito das medidas cautelares e de polícia, ps. nos artigos 248º a 253º do Código de Processo Penal.
A busca efectuada ao estabelecimento industrial, autorizada pelo Ministério Público e precedida de mandados para o efeito nos termos do artigo 174.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Penal, está perfeitamente justificada, em sede de indícios, pelo que foi recolhido em sede cautelar, como se antolha do despacho proferido a fls. 165 e 166, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
Improcedem estas questões.

Dispõe o nº 2 do art. 171º do C.P.P[4]. que “Logo que houver notícia da prática de crime, providencia-se para evitar, quando possível, que os seus vestígios se apaguem ou alterem antes de serem examinados, proibindo-se, se necessário, a entrada ou o trânsito de pessoas estranhas no local do crime ou quaisquer outros actos que possam prejudicar a descoberta da verdade.”, estabelecendo o nº 4 do mesmo preceito que “Enquanto não estiver presente no local a autoridade judiciária ou o órgão de polícia criminal competentes, cabe a qualquer agente da autoridade tomar provisoriamente as providências referidas no n.º 2, se de outro modo houver perigo iminente para obtenção da prova.
Complementarmente, no tocante a “Providências cautelares quanto aos meios de prova”, dispõe o art. 249º que:
“1 - Compete aos órgãos de polícia criminal, mesmo antes de receberem ordem da autoridade judiciária competente para procederem a investigações, praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova.
2 - Compete-lhes, nomeadamente, nos termos do número anterior:
a) Proceder a exames dos vestígios do crime, em especial às diligências previstas no n.º 2 do artigo 171º, e no artigo 173.º, assegurando a manutenção do estado das coisas e dos lugares;
b) Colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime e a sua reconstituição;
c) Proceder a apreensões no decurso de revistas ou buscas ou em caso de urgência ou perigo na demora, bem como adoptar as medidas cautelares necessárias à conservação ou manutenção dos objectos apreendidos.
3 - Mesmo após a intervenção da autoridade judiciária, cabe aos órgãos de polícia criminal assegurar novos meios de prova de que tiverem conhecimento, sem prejuízo de deverem dar deles notícia imediata àquela autoridade.
Especificamente quanto a revistas e buscas, e no que para aqui interessa, dispõe o art. 251º que:
1 - Para além dos casos previstos no n.º 5 do artigo 174.º, os órgãos de polícia criminal podem proceder, sem prévia autorização da autoridade judiciária:
a) À revista de suspeitos em caso de fuga iminente ou de detenção e a buscas no lugar em que se encontrarem, salvo tratando-se de busca domiciliária, sempre que tiverem fundada razão para crer que neles se ocultam objectos relacionados com o crime, susceptíveis de servirem a prova e que de outra forma poderiam perder-se;
(…)
2 - É correspondentemente aplicável o disposto no n.º 6 do artigo 174.º

A lei confere ao OPC uma competência cautelar própria, pré-ordenada para os fins do processo, que lhe permite, sem prejuízo do dever de comunicação “imediata” ( no sentido de no mais breve prazo possível[5] ) à autoridade judiciária competente, proceder aos actos cautelares urgentes e que se revelem necessários para assegurar a preservação dos meios de prova. Competência esta que “pode ser exercida mesmo antes de instaurado o inquérito”, tratando-se de actividade que “não tem natureza processual, dependendo de uma convalidação que a incorpore no processo”, convalidação que “tem uma imprescindível componente de prognose póstuma que atende ao circunstancialismo fáctico específico em que actuou o órgão de polícia criminal (…), mas que não se esgota nela” e que “compete, consoante os casos, ao Ministério Público ou ao juiz de instrução.[6]
A exigência de intervenção do JIC, na fase de inquérito, e excepção feita ao caso previsto no nº 6 do art. 174º, deve restringir-se às buscas domiciliárias:
“Durante o inquérito, não se vislumbram razões para que não deva ser o Ministério Público - também autoridade judiciária competente nos termos dos arts. 1º alínea b) e nº 2 alínea d), do CPP - a proceder à apreciação e validação das revistas (e a buscas não domiciliárias), uma vez que tem competência para as autorizar (art. 174º, , do CPP) e tal acto não consta do elenco dos que competem exclusivamente ao juiz de instrução em sede de inquérito (arts. 268º e 269°, do CPP), ao contrário estabelecem os artigos 177º, nº1 e 187º, nº1, do CPP, a propósito das buscas domiciliárias e escutas telefónicas, respectivamente, que fazem depender tal autorização do juiz de instrução.
A distinção tem um fundamento relacionado com os direitos protegidos. Na verdade, no que toca às revistas e buscas não domiciliárias, como não estão directamente em causa alguns dos direitos fundamentais constitucionalmente consagrados, o legislador autorizou que estas possam ser ordenadas não pelo juiz de instrução, mas sim pelo MP, que é, no âmbito do inquérito, a autoridade judiciária competente (arts. 53º, nº 2, alínea b), 263º, nº l, e 267º do CPP). Significa o exposto que o poder de revistas e buscas não domiciliárias será da competência do MP, com uma reserva de intervenção do Juiz de Instrução. De facto verifica-se apenas a excepção no nº 6 do art. 174º que determina nos casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, que os órgãos de polícia criminal ao efectuarem e buscas não domiciliárias, sem para tal estarem devidamente autorizados, comuniquem ao juiz de instrução.[7],[8].
Para além dos poderes cautelares que a lei expressamente prevê, o OPC também pode exercer os de natureza cautelar e urgente que lhe sejam delegados pelo MºP na pendência do inquérito ( ou pelo JIC na da instrução ), sujeitos a validação a posteriori. Só lhe “está vedada a prática cautelar e urgente dos actos que pertencem à reserva de competência exclusiva do juiz da instrução e do Ministério Público (artigos 268, 269, 270, n.° 2, e 290, n.º 2), cabendo todos os demais actos no âmbito da cláusula geral de competência cautelar fixada no artigo 249, n.° l, de que o elenco do n.° 2 é meramente exemplificativo (“Compete-lhes, nomeadamente”).” Assim, só padecerão de nulidade insanável, prevista nas als. b) e e) do art. 119º, os “actos que não tenham natureza cautelar e urgente (…), quando eles tenham tido lugar antes da comunicação da notícia do crime ou, tendo ocor­rido depois dela, tenham extravasado dos termos da delegação feita pelo MP.[9]
A sindicância (…) da busca não domiciliária pertence ao MP quando estes actos cautelares tenham lugar numa fase “pré-processual” ou no inquérito e ao juiz de instrução quando tenham lugar na instrução. O sentido da remissão do n.º 2 [do art. 251º] para o artigo 174, n.º 5, que é “correspondentemente aplicável”, é apenas o de fixar a obrigatoriedade da sindicância pela autoridade judiciária competente, o requisito temporal dessa sindicância e a sanção para o caso da falta dessa sindicância. Não se compreenderia que o legislador impusesse a competência para o juiz sindicar as diligências do artigo 251, n.º 1, quando a competência para ordenar essas diligências pertence ao MP no inquérito[10].

Tendo presentes todas estas considerações, e o sucedido no caso concreto, podemos concluir afoitamente que os actos praticados pelo OPC, em concreto as buscas e apreensões levadas a cabo nos autos, não padecem de qualquer vício. Tratou-se, nuns casos, de medidas cautelares, comunicadas prontamente ao titular do inquérito e por este validadas, noutros de actos por este ordenados e validados. E, contrariamente ao que o recorrente pretende fazer crer, dúvidas não restam de que se tratou de medidas urgentes, destinadas a preservar os meios de prova, que a incrível rapidez com que se processava a compactação dos veículos furtados ( veja-se como exemplo paradigmático o caso do Rover que, furtado na tarde da véspera, na manhã do dia seguinte, e antes mesmo da intervenção do OPC, já se encontrava enfardado ) plenamente justificava, sendo que o retardamento dessa intervenção, com o alerta decorrente da intercepção do reboque e detenção dos indivíduos que nele seguiam, bem poderia redundar na dissipação do acervo de documentos e objectos que vieram a ser apreendidos nas instalações da RU.
Não são necessárias mais alongadas considerações para se ter como demonstrada a improcedência deste fundamento do recurso.

3.2. O recorrente contesta a legitimidade do MºPº para acusar relativamente aos crimes de furto dos veículos UG-87-46 e W-79597P em virtude de, tratando-se de crimes de natureza semi-pública, em relação ao primeiro, não se ter verificado se a queixosa NB dispunha de legitimidade para apresentar queixa, uma vez que não era a respectiva proprietária nem se sabe a que título dispunha do mesmo, e, quanto ao segundo, por o queixoso Wolfgang Wesner não ter apresentado qualquer prova idónea da sua legitimidade e inexistir prova da propriedade do veículo, defendendo que, por isso, deve ser absolvido desses crimes.

Ambos os queixosos apresentaram queixa pelo furto das viaturas acima identificadas, tendo declarado que pretendiam procedimento criminal ( fls. 501-502 e 528 ). Durante o inquérito, apenas foi possível ouvir a ofendida NB, que afirmou que a viatura UG-87-46 foi adquirida por si e por uma colega de trabalho, tendo a mesma ficado em nome desta última, que entretanto se ausentou para a Holanda, sem perspectivas de regressar a Portugal, utilizando a queixosa a referida viatura para se deslocar ( fls. 561-562 ).
Se é certo que dos autos não consta qualquer prova que demonstre o título com que um e outro queixoso se serviam das viaturas furtadas, não é menos certo que nada permite duvidar que o faziam legitimamente e em momento algum, antes da interposição do recurso, se colocou alguma dúvida minimamente consistente a esse respeito, não sendo agora a altura própria para fazer essa indagação que, face à ausência de contestação, nem antes se mostrou necessária. Assim, e nada permitindo duvidar que os queixosos eram, pelo menos, possuidores legítimos de tais viaturas, tanto basta para se mostrar afirmada a sua legitimidade para apresentarem queixa, em face do conceito de ofendido inscrito no nº 1 do art. 113º do C. Penal[11], uma vez que o tipo legal de furto tutela não apenas a propriedade mas também a posse, compreendendo-se esta entre os interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação[12].
Dispunha, pois, o MºPº, em face do disposto no art. 49º do C.P.P., de legitimidade para promover o processo e, consequentemente, de deduzir acusação relativamente aos dois crimes de furto em questão, não assistindo razão ao recorrente na argumentação que ofereceu em contrário.

3.3. O recorrente defende que a sentença enferma de nulidade, nos termos da al. c) do nº 1 do art. 379º do C.P.P., em virtude de a acusação omitir elemento objectivo essencial do crime de furto, não indicando o valor da viatura de matrícula W-7959P, razão pela qual enfermava de irregularidade que devia ter ditado o seu não recebimento e que não podia ter sido oficiosamente suprida. Aponta, por isso, como violado o princípio do acusatório, defendendo que não podia ter sido condenado, nem mesmo devia ter sido acusado, pela prática do crime de furto respeitante a essa viatura.

É certo que na acusação, e no que concerne à referida viatura, se consignou ser desconhecido o seu valor e que, no acórdão recorrido, sem menção especial em relação à mesma, se considerou como provado que os oito veículos furtados tinham bastante uso e “valiam entre os 200 e os 2.000 euros”.
No entanto, e contrariamente ao que o recorrente entende, o preenchimento do crime de furto simples não depende da concretização do valor da coisa furtada, bastando que a mesma tenha indiscutivelmente um valor patrimonial que justifique a tutela penal. Se o nº 4 do art. 204º do C. Penal afasta a qualificação do furto se a coisa furtada for de diminuto valor ( não superior a 1 UC avaliada no momento da prática do facto, portanto, não mais de 102 € ), tal não pode deixar de significar que mesmo abaixo deste valor existe tutela penal. Ora, a experiência comum diz-nos que uma viatura automóvel, por pequeno que possa ser o seu valor, sempre ascenderá a algumas dezenas de euros. Assim, a descrição feita constar da acusação, na parte em que se refere ao furto do “veículo ligeiro de passageiros de marca Citröen, modelo BX, de cor cinzenta, com a matrícula W-79597P”, mesmo sem a indicação do valor por não ter sido possível, até esse momento, apurá-lo, continha todos os elementos imprescindíveis ao seu recebimento. Ou, dito de outra forma, inexistia fundamento para a respectiva rejeição nessa parte.
O facto de o acórdão recorrido ter ido um pouco mais além em termos de situar o valor da viatura furtada entre um intervalo de 200 a 2.000€ em nada viola o princípio do acusatório, como o MºPº já explicou na resposta ao recurso, apoiando-se no Ac. TC nº 137/2002. O disposto no art. 340º do C.P.P., como afloramento do princípio da investigação, permite ao tribunal ordenar, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa. Indagar, dentro da medida do possível, o valor da viatura, compreende-se, pois, dentro dos poderes investigatórios do tribunal, sendo certo que o apuramento do concreto valor não era indispensável para o preenchimento do tipo legal – ponto que, como resulta evidente, a coisa furtada tivesse algum valor patrimonial – nem bule com a qualificação jurídica dos factos, e nem mesmo, no caso e considerado o intervalo de valores acima mencionado, implica um grau de ilicitude mais elevado.
Pelo que, sem necessidade de mais alongadas considerações, se conclui não se verificar a nulidade por excesso de pronúncia que foi arguida.

3.4. O recorrente afirma que, não obstante constarem da acta, cuja rectificação requereu, sob pena de ter de deduzir incidente de falsidade, foram violadas as formalidades de advertência e informação dos arts. 342º nº 2 e 343º nº 1 do C.P.P. e, por isso, não podiam ter sido utilizadas as declarações prestadas pelo co-arguido FMSO para fundamentar a decisão.

O recorrente requereu, efectivamente, a rectificação da acta, a fls. 1349, alegando que, diferentemente do que dela consta, o Sr. Juiz presidente não advertiu o co-arguido FMSO “de que era obrigado a falar com verdade, sob pena de poder incorrer em responsabilidade criminal” e “nem informou que o arguido tinha o direito de prestar declarações em qualquer momento da audiência, nem que o seu silêncio o possa desfavorecer” e, apesar de ter sido ordenada, a fls. 1376, a apresentação dos autos ao Mmº Juiz de círculo, tal despacho não foi cumprido.
Mas, como o recorrente aceita e a gravação da prova também o evidencia, o Sr. Juiz presidente advertiu o referido co-arguido nos seguintes termos: “Apenas a estas perguntas [ as que imediatamente antes lhe foram colocadas sobre a sua identificação ] é que era obrigado a responder; no que diz respeito àquilo que vem acusado não é obrigado a falar e isso quer dizer que pode manter o silêncio, se for essa a sua opção, ou então pode dizer o que tiver por bem em sua defesa sobre esta acusação que lhe é feita”.
Ora, a lei não exige que as advertências contidas nos preceitos a que o recorrente alude sejam feitas textualmente com as palavras deles constantes, bastando que o arguido seja informado de que é obrigado a responder às perguntas relativas à sua identificação, devendo obviamente fazê-lo com verdade, sendo dispensável advertência expressa a este respeito quando nada permita duvidar da veracidade das respostas, sobretudo quando elas coincidem com os elementos já existentes nos autos, e, bem assim, de que em relação à matéria da acusação pode usar do direito ao silêncio. O que, inequivocamente, foi feito, em sentido que substancialmente nem se afasta do que ficou consignado na acta, sendo certo que a elaboração desta é, regra geral e no que respeita à normal tramitação da audiência, feita com recurso a fórmulas padronizadas que se limitam a reproduzir o teor dos preceitos legais atinentes.
Donde que se tenham por suficientemente cumpridas as advertências impostas pela lei, não se registando qualquer nulidade, muito menos insanável, sendo certo que, se algum outro vício se tivesse verificado, já se encontraria sanado muito antes até de o recorrente, vários meses após a realização da audiência, ter vindo pedir a rectificação da acta. E daí que também não assista a mínima razão ao recorrente quando pretende por esta via afastar a valoração das declarações do co-arguido FMSO.

3.5. Noutra vertente, o recorrente considera que tais declarações, na parte relativa a factos que lhe são desfavoráveis, só poderiam fundamentar a prova de um facto criminalmente relevante se existisse prova adicional que as corroborasse e, no caso, o acórdão recorrido não menciona qualquer prova adicional, razão pela qual o mesmo padece dos vícios aludidos nas als. a) e c) do nº 2 do C.P.P.

A questão suscitada pelo recorrente, sendo na sua essência de facto, pressupõe uma questão de direito, relacionada com o valor probatório das declarações do co-arguido, que vamos começar por contextualizar.
Entre os direitos que a nossa lei processual penal reconhece ao arguido encontra-se o de não prestar declarações sobre os factos que lhe foram imputados ( cfr. al. d) do nº 1 do art. 61º do C.P.P., diploma ao qual pertencerão os preceitos adiante indicados sem menção especial ). Optando por prestá-las, está impedido de o fazer na qualidade de testemunha - proibição que “enquanto limitação dos mecanismos de constrangimento inerentes à prova testemunhal, constitui expressão do privilégio contra a auto-incriminação[13] -, quer no que respeita às infracções cuja prática lhe é imputada em exclusivo, quer em relação àquelas em que, no âmbito do mesmo processo ou em processos conexos, haja co-arguição, enquanto mantiver a qualidade de arguido ( cfr. al. a) do nº 1 do art. 133º ). Mesmo no caso de se dispor a prestar declarações em sede de julgamento, o arguido conserva o direito de, espontaneamente ou a recomendação do seu defensor, recusar a resposta a algumas ou a todas as perguntas que juízes, jurados ou o presidente, a solicitação do MºPº, do advogado do assistente ou do defensor, lhe formulem, sem que isso o possa desfavorecer ( cfr. nºs 1 e 2 do art. 345º ). Apesar de não estar obrigado ao dever de verdade, as suas declarações são meio de prova permitido ( cfr. art. 125º ), sujeito à regra da livre apreciação da prova, consagrada no art. 127º. No entanto, na hipótese de as suas declarações serem prejudiciais para um co-arguido no mesmo processo ou em processos conexos, não poderão valer como meio de prova se se recusar a responder às perguntas que lhe forem formuladas nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 345º, por força do disposto no nº 4[14] deste preceito. A contrario, não se recusando a responder a tais perguntas, possibilitando o exercício do contraditório – que a defesa do co-arguido exercerá, ou não, conforme a estratégia que entenda mais conveNB prosseguir -, nada impede que as suas declarações sejam valoradas, nem mesmo quando o co-arguido use do direito ao silêncio[15].
É este o entendimento largamente dominante na doutrina[16] e, cremos que uniforme, na jurisprudência[17], que converge no que concerne à necessidade de essa valoração se revestir de particulares cautelas destinadas a despistar eventuais motivos escusos ou segundas intenções que lhes possam subjazer e, dessa forma, apurar em que medida são verosímeis e merecedoras de credibilidade, cautelas essas que alguns, pondo a tónica na fragilidade desse meio de prova, entendem deverem passar também pela exigência de corroboração[18].
A orientação mais recente, que merece a nossa inteira concordância, é a representada pelos Acs. STJ 12/3/08 e 3/9/08 ( já referidos em nota de rodapé ), condensada nestas linhas dos respectivos sumários, que a seguir e pela mesma ordem se transcrevem:
“II - As declarações de co-arguido, sendo um meio de prova legal, cuja admissibilidade se inscreve no art. 125.º do CPP, podem e devem ser valoradas no processo.
III - Questão diversa é a da credibilidade desses depoimentos, mas essa análise só em concreto, e face às circunstâncias em que os mesmos são produzidos, pode ser realizada.
IV - Por isso, dizer em abstracto e genericamente que o depoimento do co-arguido só é válido se for acompanhado de outro meio de prova é uma subversão das regras da produção de prova, sem qualquer apoio na letra ou espírito da lei.
V - A admissibilidade como meio de prova do depoimento de co-arguido, em relação aos demais co-arguidos, não colide minimamente com o catálogo de direitos que integram o estatuto inerente àquela situação, mostrando-se adequada à prossecução de legítimos e relevantes objectivos de política criminal, nomeadamente no que toca à luta contra a criminalidade organizada.
VI - O direito ao silêncio não pode ser valorado contra o arguido. Porém, a proibição de valoração incide apenas sobre o silêncio que o arguido adoptou como estratégia processual, não podendo repercutir-se na prova produzida por qualquer meio legal, designadamente a que venha a precisar e demonstrar a responsabilidade criminal do arguido, revelando a falência daquela estratégia.
VII - Inexiste no nosso ordenamento jurídico um direito a mentir; a lei admite, simplesmente, ser inexigível dos arguidos o cumprimento do dever de verdade. Contudo, uma coisa é a inexigibilidade do cumprimento do dever de verdade e outra é a inscrição de um direito do arguido a mentir, inadmissível num Estado de Direito.
VIII - É evidente que, tal como em relação ao depoimento da vítima, é preciso ser muito cauteloso no momento de pronunciar uma condenação baseada somente nas declarações do co-arguido, porque este pode ser impulsionado por razões aparentemente suspeitas, tal como o anseio de obter um trato policial ou judicial favorável, o ânimo de vingança, o ódio ou ressentimento, ou o interesse em auto-exculpar-se mediante a incriminação de outro ou outros acusados.
IX - Por isso, para dissipar qualquer dessas suspeitas objectivas, é razoável que o co-arguido transmita algum dado externo que corrobore objectivamente a sua manifestação incriminatória, com o que deixará de ser uma imputação meramente verbal para se converter numa declaração objectivada e superadora de um eventual défice de credibilidade inicial. Não se trata de criar, à partida e em termos abstractos, uma exigência adicional ao depoimento do co-arguido quando este incrimine os restantes, antes de uma questão de fiabilidade.
X - A credibilidade do depoimento incriminatório do co-arguido está na razão directa da ausência de motivos de incredibilidade subjectiva, o que, na maioria dos casos, se reconduz à inexistência de motivos espúrios e à existência de uma auto-inculpação.
XI - O TC e o STJ já se pronunciaram no sentido de estar vedado ao tribunal valorar as declarações de um co-arguido, proferidas em prejuízo de outro, quando, a instâncias deste, o primeiro se recusa a responder, no exercício do direito ao silêncio (cf. Acs. do TC n.º 524/97, de 14-07-1997, DR II, de 27-11-1997, e do STJ de 25-02-1999, CJSTJ, VII, tomo 1, pág. 229).
XII - E é exactamente esse o sentido da alteração introduzida pelo n.º 4 do art. 345.º do CPP quando proíbe a utilização, como meio de prova, das declarações de um co-arguido em prejuízo de outro nos casos em que aquele se recusar a responder às perguntas que lhe forem feitas pelo juiz ou jurados ou pelo presidente do tribunal a instâncias do Ministério Público, do advogado do assistente ou do defensor oficioso.
XIII - Tal como quando é exercido o direito ao silêncio, as declarações incriminadoras de co-arguido continuam a valer como prova quando o incriminado está ausente.
XIV - Na verdade, tal ausência não afecta o direito ao contraditório – que, na fase de julgamento, onde pontifica a oralidade e imediação, pressupõe a possibilidade de o arguido, por intermédio do seu defensor, sugerir as perguntas necessárias para aquilatar da credibilidade do depoimento que se presta e infirmá-lo caso se mostre adequado –, pois estando presente o defensor do arguido o mesmo pode e deve exercer o contraditório sobre os meios de prova produzidos (arts. 63.º e 345.º do CPP).
XV - Questão distinta seria a da recusa do mesmo co-arguido a depor sobre perguntas formuladas pelo tribunal e sugeridas pelo defensor ou pelo MP.”

“I - Relativamente ao valor das declarações do arguido como meio de prova, subscrevemos o que tem sido o posicionamento jurisprudencial do STJ, cujo eixo radica na ideia de que, fundamentalmente, o que está em causa é a posição interessada do arguido que, assumido o seu impedimento para depor como testemunha, não obsta a que preste declarações, nomeadamente para esclarecer o tribunal sobre a sua responsabilidade criminal, numa postura de colaboração na procura da verdade material. Sendo um meio de prova legal, cuja admissibilidade se inscreve no art. 125.º do CPP, as declarações do co-arguido podem, e devem, ser valoradas no processo.
II - No que respeita à questão de saber se é processualmente válido o depoimento do arguido que incrimina os restantes arguidos, a resposta é frontalmente afirmativa e dimana desde logo da regra do art. 125.º do CPP, que dispõe que são admitidas as provas que não forem proibidas por lei. Por outro lado, não se sente qualquer apoio numa interpretação rebuscada da Constituição que aponte a inconstitucionalidade de tal interpretação: pelo contrário, a consideração de que o depoimento do arguido – que é, antes do mais, um cidadão no pleno uso dos seus direitos – se reveste à partida de uma capitis diminutio só pelo facto de ser arguido ofende o princípio da igualdade dos cidadãos. Portanto, a questão que se coloca neste caso é, como em relação a todos os meios de prova, a da credibilidade do depoimento do co-arguido.
III - Esta credibilidade só pode ser apreciada em concreto, face às circunstâncias em que é produzida. O que não é admissível é a criação de regras abstractas para essa apreciação, retornando ao sistema da prova tarifada: assim, dizer em abstracto e genericamente que o depoimento do co-arguido só é válido se for acompanhado de outro meio de prova é uma subversão das regras da produção de prova sem qualquer apoio na letra ou no espírito da lei.
IV - A admissibilidade do depoimento do arguido como meio de prova em relação aos demais co-arguidos não colide minimamente com o catálogo de direitos que integram o estatuto inerente àquela situação, mostrando-se adequada à prossecução de legítimos e relevantes objectivos de política criminal, nomeadamente no que toca à luta contra a criminalidade organizada.
V - A proibição de valoração, contra o arguido, do exercício do direito ao silêncio incide apenas sobre o silêncio que aquele adoptou como estratégia processual, não podendo repercutir-se na prova produzida por qualquer meio legal, designadamente a que venha a precisar e demonstrar a responsabilidade criminal do arguido, revelando a falência daquela estratégia.
VI - O depoimento incriminatório de co-arguido está sujeito às mesmas regras de outro e qualquer meio de prova, ou seja, aos princípios da investigação, da livre apreciação e do in dubio pro reo. Assegurado o funcionamento destes e o exercício do contraditório, nos termos preconizados pelo art. 32.º da CRP, nenhum argumento subsiste contra a validade de tal meio de prova.
VII - Aliás, a partir do momento em que o arguido depõe no exercício do seu direito de defesa, é evidente que as suas palavras têm uma dupla conotação: sendo emergentes de um inviolável direito de defesa, elas são também um meio de prova. Não é possível, em termos práticos, separar aquela realidade concreta que é o depoimento arguido, considerando-o ora como um exercício legítimo de um direito ora como meio de prova. Tal visão, para além de um inequívoco maniqueísmo, esquece que o processo penal visa a descoberta da verdade material e não de tantas realidades quantas as que interessam aos diversos sujeitos processuais.
VIII - Inexiste no nosso ordenamento jurídico um direito a mentir; a lei entende, simplesmente, ser inexigível ao arguido o cumprimento do dever de verdade. Porém, uma coisa é a inexigibilidade do cumprimento do dever de verdade – reconduzindo-o a um mero dever moral – e outra é a inscrição de um direito do arguido a mentir, inadmissível num Estado de Direito.
IX - É evidente que, tal como em relação ao depoimento da vítima, é preciso ser muito cauteloso no momento de pronunciar uma condenação baseada somente nas declarações do co-arguido, porque este pode ser impulsionado por razões aparentemente suspeitas, tal como o anseio de obter um trato policial ou judicial favorável, o ânimo de vingança, o ódio ou ressentimento, ou o interesse em auto-exculpar-se mediante a incriminação de outro ou outros acusados.
X - Por isso, para dissipar qualquer dessas suspeitas objectivas, é razoável que o co-arguido transmita algum dado externo que corrobore objectivamente a sua manifestação incriminatória, com o que deixará de ser uma imputação meramente verbal para se converter numa declaração objectivada e superadora de uma eventual suspeita inicial. Não se trata de criar, à partida e em termos abstractos, uma exigência adicional ao depoimento do co-arguido quando este incrimine os restantes, mas sim de uma questão de credibilidade daquele depoimento em concreto.
XI - A credibilidade do depoimento incriminatório do co-arguido está na razão directa da ausência de motivos de incredibilidade subjectiva, o que, na maioria dos casos, se reconduz à inexistência de motivos espúrios e à existência de uma auto-inculpação, assumindo igualmente uma real importância a concorrência de corroborações periféricas objectivas que demonstrem a verosimilhança da incriminação.”
Também destacamos, por igualmente corresponder ao entendimento que consideramos mais correcto, este trecho do Ac. RE 8/11/11 ( igualmente referido em nota de rodapé, sendo nossos os sublinhados ):
“Na ausência de regra tarifada sobre prova por declaração de co-arguido, a credibilidade deve ser sempre aferida em concreto, à luz do princípio da livre apreciação, mas, com um especial cuidado, que poderá passar por uma procura de corroboração. A prudência deve integrar a racionalidade do discurso da motivação da matéria de facto.
Por corroboração entendemos algum apoio ou suporte em conteúdos probatórios fora das declarações do co-arguido que, juntamente com elas, permitam concluir pela sua correspondência à verdade. Não se trata de uma exigência de prova da prova por co-arguição mas apenas de algo mais que convença da correcção dessa versão dos factos.
A tendencial procura de corroboração
não terá de passar necessariamente por prova externa, no sentido de prova exterior a toda a co-arguição.
Ou seja, aquilo que pode minar a força probatória da declaração do co-arguido reside numa suspeição. Essa suspeição baseia-se no interesse pessoal que o declarante pode ter no resultado da sua própria declaração: o arguido em incrimina o outro, para se defender (“não fui eu, foi ele”) ou para dividir a sua responsabilidade (“não fui apenas eu, fomos os dois”).
Pode ainda ter um interesse geral de pseudo contribuição para a descoberta da verdade, com eventual peso atenuativo na escolha e medida da sua pena.
Por tudo, revela-se prudente desconfiar, não de toda a co-arguição, como regra – esta regra não existe – mas da declaração de co-arguido que se encontre numa das referidas situações. Já relativamente a declaração de arguido fora de situação suspeita, a fragilização do potencial probatório deste contributo carece de justificação.”
E este outro, retirado do sumário do Ac. RP 18/2/15[19]:
I – Na prova por declarações de co-arguido a credibilidade deve ser sempre aferida em concreto, à luz do princípio da livre apreciação da prova, mas com especial cuidado que pode passar por uma corroboração.
II – O que pode minar a força probatória da declaração do co-arguido reside na suspeição resultante do interesse pessoal que o declarante pode ter no resultado da sua declaração.
III – Não havendo juízo de suspeição sobre a declaração do co arguido não ocorre justificação para considerar fragilizado o seu potencial probatório.
IV – As declarações do co-arguido podem ser suficientes para incriminar o outro arguido desde que: a) sejam credíveis, por inexistir nas relações entre arguidos ressentimento, inimizade ou tentativa de exculpação do declarante; b) sejam verosímeis, existindo corroborações através de factos objectivos; c) sejam persistentes e idênticas, ao longo do processo e sem ambiguidades ou com tradições.

Vistas estas considerações, não vislumbramos, nem o tribunal recorrido vislumbrou, qualquer fundamento para duvidar da veracidade das declarações prestadas pelo co-arguido FMSO – relativamente às quais os defensores dos outros dois co-arguidos que faltaram ao julgamento tiveram ampla oportunidade de exercer o contraditório - e valorá-las na parte em que se mostraram desfavoráveis em relação aos co-arguidos, pois apesar da tentativa que fez de se desculpabilizar, escudando-se num suposto desconhecimento sobre a forma de obtenção das viaturas, as circunstâncias em que as mesmas foram rebocadas para a sucateira apontam claramente no sentido de que não actuou sozinho, nada obstando a que as mesmas, nessa parte, constituam meio de prova permitido e bastante para alicerçar a convicção formada.
Questão diversa reside em saber se o tribunal recorrido percepcionou correctamente as declarações do co-arguido FMSO, ou seja, se houve erro de julgamento que o recorrente também invoca ao apelar ao teor das mesmas, transcrevendo um excerto delas retirado e com base no qual sustenta que ele só admitiu ter tido intervenção no furto de 4 das viaturas ( Lancia UG-87-46; Toyota QN-36-13; Citroen W 7959P; Rover XX-18-90 ), invocando em reforço da sua interpretação que aquele co-arguido, ao afirmar “ter ido dizer os carros para os quais ajudava”, só podia estar a referir-se ao momento do seu interrogatório ( fls. 405-406 ) e à colaboração com o OPC no RDE a fls. 410-415.
Nada permite, porém, uma interpretação desse modo restritiva das aludidas declarações. Por um lado, o co-arguido FMSO foi devidamente informado do teor da acusação, estando perfeitamente ciente de que lhe eram imputados os furtos de 8 viaturas, e não apenas das 4 acima mencionadas. Nem em julgamento, nem posteriormente no recurso que apresentou, veio pôr em causa a imputação do furto daquelas viaturas ou a sua condenação pela prática de todos os factos. Ouvidas as suas declarações, em momento algum negou ter participado no furto de alguma das viaturas mencionadas na acusação, antes admitiu ter ajudado os co-arguidos no reboque das viaturas – todas aquelas viaturas, conforme lhe foi perguntado e por ele afirmativamente respondido – furtadas. O facto de ter mencionado que, quando o acusaram, foi dizer quais foram os carros em que ajudou, não significa que tenha participado no furto dos 4 em que tal sucedeu pois, perguntado novamente, logo voltou afirmar que eram os que vinham mencionados na acusação. E, tanto mais se tivermos em atenção que, na mesma ocasião em que foi rebocado um dos 4 acima aludidos (o XX-18-90), também foi rebocado um outro (JT-44-10) neles não compreendido.
E, se estendermos a nossa análise aos elementos do inquérito a que o recorrente alude, a outra conclusão também se não chega, antes se consolida a forma abrangente como foram interpretadas, pelo tribunal recorrido, as declarações prestadas pelo co-arguido FMSO. De facto, aquando do seu interrogatório, este co-arguido, questionado sobre o período temporal em que participou/presenciou os reboques de viaturas, admitiu tê-lo feito “desde o dia em que foi contactado (cerca de dia 03 de Abril) até ao dia em que foi apreendido o reboque por esta Polícia, dia 17 de Abril”, acrescentando que, embora não saiba precisar um número certo dos reboques realizados na sua presença e a sua localização, “não terá ultrapassado a dezena”. Além disso, resulta claro do RDE a fls. 410 que a deslocação do co-arguido com a Polícia ao local se restringiu aos casos “onde ainda suscitavam algumas dúvidas”.
Resta apreciar se a motivação da decisão de facto explica suficientemente o raciocínio seguido pelos julgadores na formação da convicção, especialmente no que concerne ao envolvimento do recorrente e do co-arguido SB na prática, em co-autoria, dos factos, sendo que dúvidas não restam de que este último era o motorista do reboque, no qual também seguia o co-arguido FMSO aquando da intervenção policial. Ou se, como considera a Exmª PGA, essa motivação não é esclarecedora da medida em que a prova produzida em audiência contribuiu para alicerçar a convicção quanto a esse envolvimento.
De acordo com o que foi consignado no acórdão recorrido, a convicção dos julgadores quanto aos factos provados formou-se com base nas declarações do co-arguido FMSO “que em audiência admitiu ter colaborado no reboque das viaturas a que se refere a acusação, ajudando o motorista do reboque [ o co-arguido SB], por indicação e contra o pagamento efectuados pelo arguido PFSF” e que “Prestou as suas declarações de forma a não deixar dúvida sobre a ocorrência daqueles factos, ainda que se tivesse escudado num suposto desconhecimento sobre a forma de obtenção das mesmas, pois, segundo começou por afirmar, estava convencido de que se tratava de bens previamente adquiridos.” As manobras para proceder ao reboque das viaturas não podiam ser executadas por uma só pessoa, sendo necessárias pelo menos duas, uma que ajudava orientando a viatura para cima da correspondente plataforma, manobrando o guincho, enquanto a outra manuseava o volante. Tarefas que, de acordo com as declarações do co-arguido FMSO, eram executadas por ele e pelo co-arguido SB, o motorista da viatura. Que o FMSO tinha perfeito conhecimento de que as viaturas eram furtadas, foi retirado, além do mais, do facto por ele reconhecido de que “nalguns dos casos tiveram de quebrar o vidro dos veículos a rebocar”, o que vai de encontro às declarações do assistente Norberto Sebastião, “que atestou em audiência que a viatura [ de matrícula 20-19-EI ] que os arguidos lhe rebocaram para uma sucateira, tinha as portas rebentadas quando ali se deparou com a mesma”, sendo este “Sem dúvida, o método alternativo à quebra dos vidros”. Ora, se o co-arguido FMSO “sabia perfeitamente que as viaturas estavam a ser retiradas aos donos e contra a vontade dos mesmos”, concluiu o tribunal recorrido que “atendendo à sua posição claramente subalterna relativamente aos demais [ co-arguidos ], também estes o sabiam.” Conclusão perfeitamente lógica e verosímil, pois se o co-arguido FMSO, até pelas circunstâncias e métodos utilizados no reboque das viaturas, sabia que se tratava de viaturas furtadas, por maioria de razão também não o podiam desconhecer o motorista do reboque ( o co-arguido SB ), que participava nesses reboques, e o recorrente, que indicava as viaturas a rebocar e efectuava o pagamento dos “serviços” prestados pelo co-arguido FMSO. E, se todos eles sabiam que se tratava de viaturas furtadas e actuaram pelo modo descrito, o recorrente indicando as viaturas a rebocar e os demais co-arguidos procedendo ao respectivo reboque, outra conclusão não se alcança se não a de que actuaram de comum acordo e em conjugação de esforços.
Temos, pois, que embora a motivação da decisão de facto não seja modelar, ela cumpre, ainda assim, o dever de fundamentação já que permite reconstituir o percurso trilhado na formação da convicção pelos julgadores, não se evidenciando no mesmo qualquer hiato lógico, conclusão arbitrária ou desvio às regras da experiência comum.
Em suma, não se detecta qualquer vício que inquine a prova que foi considerada como relevante, que constitui suporte adequado da convicção formada, a apreciação que dela foi feita e a forma como essa valoração foi explicada.

3.6. A discordância do recorrente dirige-se, também, contra a medida em que foram fixadas as penas parcelares e única, que considera desnecessárias, desadequadas e desproporcionais, seja porque não houve diferenciação entre as penas parcelares feitas corresponder a cada um dos crimes, não se tendo levado em linha de conta a ilicitude de cada um deles consoante o concreto valor de cada uma das viaturas furtadas nem fundamentado o critério que levou à determinação de penas em medida igual por cada um deles, seja porque os antecedentes criminais do recorrente ( pela prática de 2 crimes de furto ) remontam a Agosto de 2002 e desde então e até à prática dos factos adoptou uma conduta conforme ao direito, seja porque a ilicitude dos factos é reduzida na medida em que as viaturas furtadas tinham um reduzido valor de mercado, tratando-se de veículos em fim de vida e com sinais de abandono na via pública, seja porque nada permite concluir que os meios utilizados fossem sofisticados, que existisse uma rede dedicada à actividade ou sequer que o recorrente estivesse em posição superior em relação aos demais co-arguidos. Assim, e em seu entender, a pena única não devia ter sido fixada em medida superior a 3 anos de prisão.

As finalidades das penas vêm indicadas no nº 1 do art. 40º do C. Penal: “a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”. São, pois, finalidades relativas de prevenção, geral e especial, que justificam a intervenção do sistema penal e conferem fundamento e sentido às suas reacções específicas[20]. A prevenção geral, enquanto prevenção positiva ou de integração, i. e. “como estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma infringida”, assume o primeiro lugar como finalidade da pena[21]. No entanto, o equilíbrio desejável entre as finalidades relativas à prevenção geral e à prevenção especial não obsta a que, perante as especificidades do caso concreto, uma dessas finalidades haja de prevalecer sobre a outra.
Por outro lado, o princípio da culpa, acolhido no nosso ordenamento jurídico-penal e cujo fundamento axiológico radica no princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal, implica que a culpa seja condição necessária da aplicação da pena e, simultaneamente, que a medida da pena não possa ultrapassar a medida da culpa[22],[23]. Limite este que vem expressamente consagrado no nº 2 do referido art. 40º.
Também o nº 1 do art. 71º do C. Penal manda atender, na determinação da medida concreta da pena dentro da moldura penal aplicável, à culpa do agente e às exigências de prevenção, contendo o nº 2 do mesmo preceito uma enumeração exemplificativa das circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor ou contra o agente, e que devem ser levadas em consideração pelo tribunal.
Nos casos em que a lei preveja, em alternativa, a aplicação de pena privativa e não privativa da liberdade, antes da determinação da medida concreta da pena haverá que proceder à escolha da pena seguindo o critério definido no art. 71º do C. Penal, ou seja, dar preferência à pena não privativa da liberdade sempre que ela realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição ( indicadas no art. 40º, como já acima referimos ).

Feitas estas considerações gerais, vamos conferir o percurso seguido na decisão recorrida em ordem a determinar a medida concreta das penas.
Sendo os crimes em causa puníveis em alternativa com pena privativa ou não privativa da liberdade, o tribunal recorrido, optou justificadamente e sem contestação, pela primeira.
Após o que expendeu as seguintes considerações:
Há que apreciar, à luz do artº 71º do Código Penal, a culpa dos arguidos, bem como as suas personalidades e todas as circunstâncias que rodearam os factos, para, pesando as necessidades de prevenção geral e especial, encontrar as concretas medidas das penas, dentro daquela moldura abstracta e na medida da culpa dos arguidos.
A ilicitude dos factos é elevada, atendendo aos meios utilizados, com alguma sofisticação e a indiciar clara pertença a rede dedicada a semelhante actividade.
Tal ilicitude é muito mais elevada relativamente ao arguido PFSF, já que se encontra em posição superior relativamente aos demais, que executam os actos materiais dos crimes que aquele controla e incentiva.
O dolo, para além de directo é intenso e duradouro.
É uma actividade apta a gerar alarme social de monta e a causar gravas prejuízos aos cidadãos visados, já claramente desfavorecidos, atendendo ao tipo de viaturas em causa.
Os antecedentes criminais pesarão na medida da sua existência e peso relativo, sendo atenuante a sua ausência, ao que se alia a postura do arguido FMSO em audiência e ultimamente em sociedade, reveladora de início de arrependimento.
Mostram-se por isso justas por adequadas e proporcionais à culpa do arguido PFSF as penas de 1 ano e 6 meses de prisão por cada um dos crimes, a de 1 ano e 3 meses para o arguido FMSO e a de 1 ano para o arguido SB.

Aqui chegados, há que frisar que, como é entendimento generalizado[24], a intervenção correctiva do tribunal de recurso na medida da pena só colhe justificação quando se registem desvios aos princípios, operações e critérios que regem a sua dosimetria, não abrangendo a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena que não se revele de todo desproporcionada.
No que concerne às penas parcelares, e muito embora as viaturas furtadas não tenham todas o mesmo valor, certo é que também não se registam diferenças significativas de tal modo que determinassem uma elevação ou diminuição significativa de ilicitude entre os vários crimes de furto. O que emerge com preponderância é o modus operandi uniforme e o destino dado às viaturas, não havendo sequer referência à obtenção de lucros diferenciados com a venda das mesmas à sucateira. Daí que consideremos que não se impunha uma graduação das penas parcelares dos vários crimes de furto atida àqueles valores. Por outro lado, e diferentemente do que pretende o recorrente, o grau de ilicitude, não se aferindo apenas pelo valor da coisa furtada, não se pode considerar como reduzido. Embora não tenha tradução na prova a clara pertença a rede dedicada à actividade de furto de viaturas para sucata que o tribunal recorrido considerou como indiciada – as suspeitas que a esse respeito surgiram nos autos acabaram por se desmoronar por incapacidade de recolha de prova que o demonstrasse e é seguramente forçado falar numa “rede” quando tudo o que foi possível apurar se limitou às condutas de um grupo de três arguidos, um que indicava as viaturas a furtar e rebocar e outros dois que executavam essas tarefas – também é inegável a existência de alguma sofisticação nos meios utilizados para o furto e transporte das viaturas para a sucateira, com o recurso a um reboque, meio que lhe confere uma capa de normalidade que não concitaria as suspeitas do cidadão comum. Além disso, a apurada conduta do recorrente, sendo demonstrativa de que era ele o “cérebro” das operações e os demais co-arguidos os seus executores, por ele pagos para proceder aos furtos e reboques das viaturas que indicava, confere-lhe um papel preponderante, exponenciando o grau de culpa por comparação com o daqueles. Se tivermos ainda em conta que o recorrente tem antecedentes criminais ( foi condenado por sentença proferida em 7/7/04 e transitada em 4/11/04, pela prática, em 8/4/99, de um crime de emissão de cheque sem provisão, na pena de 100 dias de multa e, por acórdão proferido em 18/11/03 e transitado em 21/6/05, pela prática, em Agosto de 2002, de um crime de furto simples e de um crime de furto qualificado, na pena única de 3 anos de prisão, com execução suspensa por 4 anos, que veio a ser declarada extinta em 15/10/09 ), diferentemente do co-arguido SB e de maior gravidade em relação aos do co-arguido FMSO, e que não vislumbram quaisquer circunstâncias atenuantes, não se apresentam como desproporcionais as penas parcelares fixadas em 1 ano e 6 meses de prisão dentro de uma moldura abstracta de 1 mês a 3 anos de prisão.
Já quanto à fixação da pena única, há desde logo que fazer notar que o tribunal recorrido se circunscreveu a uma fundamentação meramente formal, que não vai além da letra da lei e que vamos suprir na medida em que os autos fornecem os elementos necessários para o efeito.
Tendo o recorrente praticado vários crimes em concurso, impõe-se a fixação de uma pena única, em observância do disposto no nº 1 do art. 77º do C. Penal e de acordo com as regras estabelecidas neste preceito.
Assim, e sendo inequívoco que o legislador penal repudiou o sistema de acumulação material de penas, adoptando um sistema de pena conjunta, obtida através de um cúmulo jurídico, a moldura penal abstracta do concurso constrói-se a partir das penas parcelares e terá como limite máximo, caso elas sejam todas da mesma espécie, a soma dessas penas, sem contudo poder ultrapassar os limites estabelecidos no nº 2 do art. 77º, e como limite mínimo a mais elevada das penas parcelares concretamente aplicadas.
A medida da pena única é fixada, dentro dos limites da moldura do concurso, em função dos critérios gerais de culpa e das exigências de prevenção ( arts. 40º nº 1 e 71º nº 1 do C. Penal ), a que acresce o critério especial indicado na 2ª parte do nº 1 do aludido art. 77º, que determina que sejam considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.
Em função deste critério, a determinação da medida da pena única requer uma especial fundamentação, havendo que levar em conta vários aspectos salientados, entre outros, nos acórdãos cujos excertos a seguir se transcrevem:
“Tudo deve passar-se (…) como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)[25].

Segundo preceitua o n.º 1 daquele artigo [77º ], na medida da pena única são considerados em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que significa que o cúmulo jurídico de penas não é uma operação aritmética de adição, nem se destina, tão só, a quantificar a pena conjunta a partir das penas parcelares cominadas. De facto, deve ser encontrada a partir do conjunto dos factos e da personalidade do agente, tendo-se em atenção, em primeira linha, se os factos delituosos em concurso são expressão de uma inclinação criminosa ou apenas constituem delitos ocasionais sem relação entre si, sem esquecer a dimensão da ilicitude do conjunto dos factos e a conexão entre eles existente, bem como o efeito da pena sobre o comportamento futuro do delinquente, sendo que a «autoria em série» deve considerar-se, em princípio, como factor agravante da pena.”[26]

I - Com a fixação da pena conjunta pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas especialmente pelo seu conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda que se considere, em conjunto, (e não unitariamente) os factos e a personalidade do agente.
II - Exige-se um exame crítico de ponderação conjunta sobre a interligação entre os factos e a personalidade do agente, de molde a poder valorar-se o ilícito global perpetrado.
III - Afastada a possibilidade de aplicação de um critério abstracto, que se reconduz a um mero enunciar matemático de premissas, impende sobre o juiz um especial ónus de justificar quais os factores relevantes de cada operação de formação da pena conjunta, quer no que respeita à culpa em relação ao conjunto dos factos, quer no que respeita à prevenção, quer ainda no que concerne à personalidade e factos considerados no seu significado conjunto.[27]

Importante na determinação concreta da pena conjunta será a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza, a gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos, tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso, tendo presente o efeito dissuasor e ressocializador que essa pena irá exercer sobre aquele.[28]

Refira-se, ainda, que, embora a lei não estabeleça nenhum critério rígido a seguir na determinação da medida concreta da pena única dentro da moldura do concurso, a prática jurisprudencial tende no sentido de, em casos que não fogem à normalidade, fazer acrescer à pena parcelar mais grave 1/3 das demais, oscilando para mais ou para menos consoante as específicas circunstâncias do caso e a personalidade do agente[29]. Trata-se, na verdade, de um critério orientador, não vinculativo, moldável às especificidades do caso concreto, mas que serve como auxiliar e merece ser ponderado.

No caso, temos uma pluralidade apreciável de crimes da mesma natureza, praticados por modus operandi idêntico, durante um período que se estendeu por cerca de 2 meses e cuja cessação coincidiu com a intervenção das autoridades policiais, e um agente que já tem antecedentes criminais pela prática de crimes contra o património, embora já tenham decorrido alguns anos sobre as condenações anteriores. Embora não existam elementos seguros para afirmar uma tendência criminosa, os factos já revelam alguma propensão para a prática de crimes desta natureza. Ainda assim, a imagem global do ilícito não justifica, na determinação da pena única, um afastamento do critério orientador a que acima aludimos. Nem para mais, nem tão pouco para menos. Ao invés, é na sua aplicação que, no presente caso, se vai encontrar a pena justa.
Decorrentemente, justifica-se que a pena única achada dentro da moldura abstracta correctamente indicada na decisão recorrida, de 1 ano e 6 meses a 12 anos de prisão, seja reduzida para 5 anos de prisão, por aplicação do critério a que aludimos, assim se dando parcial acolhimento à pretensão recursiva.

3.7. Como derradeiro fundamento do recurso o recorrente, suposta a redução da medida da pena única por que também se bateu, o recorrente considera que se mostram preenchidos os requisitos para que seja suspensa a sua execução.

A medida em que a pena única foi fixada no acórdão recorrido não permitia a aplicação desta pena de substituição. Reduzida que foi para 5 anos, há agora que ponderar a sua aplicação de acordo com o disposto no nº 1 do art. 50º do C. Penal, que estabelece que “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
O tribunal deve, assim, fazer um juízo de prognose, reportado ao momento da decisão, acerca do comportamento futuro do arguido e, se concluir que se pode esperar que ele não voltará a adoptar novas condutas desviantes, deve[30] suspender a execução da pena. Mas isso não basta porque, mesmo quando o tribunal concluir por um prognóstico favorável, assente exclusivamente em considerações de prevenção especial de socialização, ainda assim “a suspensão da execução da pena de prisão não deverá ser decretada se a ela se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. Estão aqui em questão não quaisquer considerações de culpa, mas exclusivamente considerações de prevenção geral sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico. Só por essas exigências se limita – mas por elas se limita sempre – o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto ora em análise.”
Por outro lado, na formulação do juízo de prognose, “o que (…) está em causa não é qualquer «certeza», mas a esperança fundada de que a socialização em liberdade possa ser lograda, o tribunal deve encontrar-se disposto a correr um certo risco – digamos: fundado e calculado – sobre a manutenção do agente em liberdade. Havendo, porém, razões sérias para duvidar da capacidade do agente de não repetir crimes, se for deixado em liberdade, o juízo de prognose deve ser desfavorável e a suspensão negada.[31]
Nesta linha vem também decidindo o STJ, como por amostragem se colhe dos segmentos a seguir transcritos:
Não são considerações de culpa que interferem na decisão relativa à execução da pena, mas somente razões ligadas às finalidades preventivas da punição, sejam as de prevenção geral positiva ou de integração, sejam as de prevenção especial de socialização, acentuadamente tidas em conta no instituto em questão, desde que satisfeitas as exigências de prevenção geral, ligada à necessidade de correspondência às expectativas da comunidade na manutenção da validade das normas violadas”.[32]
É sabido que só se deve optar pela suspensão da pena quando existir um juízo de prognose favorável, centrado na pessoa do arguido e no seu comportamento futuro. A suspensão da pena tem um sentido pedagógico e reeducativo, sentido norteado, por sua vez, pelo desiderato de afastar, tendo em conta as concretas condições do caso, o delinquente da senda do crime.
(…) De um lado, cumpre assegurar em que a suspensão da execução da pena de prisão não colida com as finalidades da punição. Numa perspectiva de prevenção especial, deverá mesmo favorecer a reinserção social do condenado.
Por outro lado, tendo em conta as necessidades de prevenção geral, importa que a comunidade não encare, no caso, a suspensão, como sinal de impunidade, retirando toda a sua confiança ao sistema repressivo penal.[33]
Quando se conclua pela adequação e suficiência desta pena de substituição, poderá a mesma ficar subordinada ao cumprimento de deveres destinados a reparar o mal do crime, podendo ser imposto ao condenado o cumprimento de regras de conduta destinadas a facilitar a sua reintegração na sociedade, podendo também a suspensão ser acompanhada de regime de prova – obrigatoriamente “quando a pena de prisão cuja execução for suspensa tiver sido aplicada em medida superior a três anos” ( cfr. nº 3 do art. 53º do C. Penal ), , assente num plano individual de readaptação, se tal regime se mostrar conveNB e adequado a facilitar a reintegração do condenado na sociedade ( cfr. arts. 51º, 52º, 53º e 54º do C. Penal ).

Conferido o acórdão recorrido, verificamos que nada se apurou em relação às condições de vida do recorrente – o que, não estando demonstrada a impossibilidade de obter tais elementos, configura o vício da al. a) do nº 2 do art. 410º do C.P.P. – sendo muito escasso o que se apurou relativamente aos seus antecedentes criminais, vista a data a que se reportam, para permitir formular, ou infirmar, com segurança, o juízo de prognose positiva acerca do seu comportamento futuro que a suspensão da execução da pena exige.
No entanto, essa falta de elementos acaba por resultar, no caso, irrelevante, na medida em que, ainda que fosse possível a formulação desse juízo, sempre à suspensão da execução da pena se oporiam as necessidades de reprovação e prevenção do crime. Mal compreenderia a comunidade que condutas como as praticadas pelo recorrente, reiteradamente por 8 vezes, traduzidas em furtos de outros tantos veículos, bens caros aos cidadãos na sociedade hodierna, deles definitivamente privados os respectivos proprietários ou legítimos possuidores sem que da parte do recorrente tenha havido qualquer gesto de compensação pelos prejuízos causados, fossem sancionadas com uma pena suspensa, ainda que sujeita a deveres e/ou regime de prova. Seria um sinal de impunidade e contribuiria para o descrédito dos tribunais.
Donde que entendamos não dever ser, em qualquer caso, suspensa a execução da pena aplicada ao recorrente.


4. Decisão
Nos termos e pelos fundamentos expostos:
a) rejeitam o recurso do arguido FMSO, por manifesta improcedência;
b) julgam parcialmente procedente o recurso do arguido PFSF, reduzindo para 5 ( cinco ) anos de prisão a pena única que lhe foi aplicada;
mantendo em tudo o mais o acórdão recorrido.
Vai o recorrente FMSO condenado a pagar 3 UC de taxa de justiça, a que acrescem 3 UC por força do disposto no nº 4 do art. 420º do C.P.P.

Évora, 14 de Julho de 2015

Maria Leonor Esteves

António João Latas

__________________________________________________
[1] SB, que também foi condenado pela prática de 8 crimes de furto simples, na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão, com execução suspensa por igual período de tempo sob condição idêntica à determinada em relação ao arguido FMSO, sem que tenha interposto recurso.
[2] (cfr. Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal” III, 2ª ed., pág. 335 e jurisprudência uniforme do STJ (cfr. Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196 e jurisprudência ali citada).
[3] Ac. STJ para fixação de jurisprudência nº 7/95, de 19/10/95, publicado no DR, série I-A de 28/12/95.
[4] Diploma ao qual pertencerão os preceitos adiante citados sem menção especial.
[5] Em anotação ao nº 6 do art. 174º, no Código de Processo Penal comentado, o Cons. Santos Cabral considera como adequado, em relação à comunicação da efectivação de busca sem prévia autorização judicial, o prazo de 48 h, que “não se afigura excessivo, desde logo por comparação com o prazo de apresentação de arguidos detidos sem ordem judicial”.
Por outro lado, a inobservância dessa imediata comunicação implica a nulidade do acto realizado sem mandado prévio, tratando-se, no entanto, de nulidade sanável.
[6] Cfr. P.Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, pág. 626.
[7] Código de Processo Penal comentado, pág. 739.
[8] Em sentido convergente, considera-se no Ac. RP 21/1/15,proc. nº 27/14.5PEVNG-A.P1 que “Conquanto o texto legal indique como destinatário da comunicação o JIC, sufraga-se o entendimento de que deve interpretar-se em conformidade com as normas que regulam a quem compete ordenar as buscas e revistas, e, consequentemente, deve restringir-se a exigência de intervenção do JIC, na fase do inquérito, às buscas domiciliárias (artigo 269.º, n.º 1, alínea c) do Código Processo Penal), devendo admitir-se que, nessa fase processual, a fiscalização do procedimento levado a cabo pelo OPC, quanto a buscas não domiciliárias, seja realizado pelo Ministério Público (artigos 53.º n.º 2, alínea b), 263.º, n.º 1 e 267.º do Código Processo Penal).”
[9] cfr. P.Pinto de Albuquerque, ob. cit., pág. 630.
[10] Idem, ibidem, pág. 648
[11] Assim, v.g., Acs. RP 28/2/01, proc. nº 0040980 ( “Relativamente ao crime de furto simples previsto e punido pelo artigo 203 n.1 do Código Penal, que só pode ser perseguido mediante prévia queixa, também é ofendido e titular do interesse que a lei quis especialmente proteger aquele que, não sendo o dono da coisa móvel subtraída, tem sobre esta a disponibilidade de fruição das respectivas utilidades. Assim, o legítimo possuidor da coisa, que lhe havia sido emprestada pelo seu proprietário, tem legitimidade para exercer o direito de queixa.” ) e 21/3/13, proc. nº 530/10.6PAMAI.P1 ( “I - Para fins de exercício do direito de queixa por crime de furto, deve ser adoptado um conceito amplo de ofendido, entendendo-se como tal não apenas o titular do direito de propriedade mas também a pessoa que beneficia directamente da posse, uso e fruição da coisa, posto que não seja com um carácter meramente ocasional ou à margem do direito” )
[12] Do AUJ nº 7/2011 que, a propósito do crime de dano, dirimiu a questão de saber “se o mero detentor/possuidor (não proprietário) de bem móvel (automóvel), do qual tem o uso, gozo e fruição, é ou não titular do interesse juridicamente protegido pelo crime de dano, como condição de legitimidade para efeito apresentar queixa, independentemente de eventual queixa do titular do respectivo direito de propriedade”, dando-lhe resposta afirmativa, fixando jurisprudência no sentido de que “No crime de dano, previsto e punido no artigo 212.º, n.º 1, do Código Penal, é ofendido, tendo legitimidade para apresentar queixa, nos termos do artigo 113.º, n.º 1, do mesmo diploma, o proprietário da coisa ‘destruída no todo ou em parte, danificada, desfigurada ou inutilizada’, e quem, estando por título legítimo no gozo da coisa, for afectado no seu direito de uso e fruição”, retiram-se as seguintes considerações, com plena transposição para o crime de furto: “(…) existem interesses de carácter fundamental, que justificam uma concepção mais abrangente do bem jurídico protegido pela incriminação «do artigo 212.º do Código Penal, no sentido de integrar, além da relação jurídica formal de propriedade, outros direitos e interesses legítimos de uso, de gozo e de fruição da coisa — um poder de facto sobre a coisa, assente numa «representação jurídica» «que permita a fruição das respectivas utilidades» (cf., a propósito do lugar paralelo do crime de furto, PFSF Saragoça da Matta, «Subtracção de coisa móvel alheia», in «Liber Discipulorum» para Jorge de Figueiredo Dias, 2003, pp. 993 e segs., desig. P. 995 -996). (…) Deste modo, para efeitos do artigo 113º nº 1, do Código Penal, o conceito de “ofendido” como titular dos interesses que a incriminação quis proteger, pode, assim, abranger tanto o proprietário, como aquele que tem a disponibilidade da fruição das utilidades da coisa, com um mínimo de representação jurídica que justifica a tutela penal, assistindo legitimidade aos titulares desses direitos e interesses legítimos, enquanto representantes de interesses especialmente tutelados pela incriminação, para apresentar queixa-crime, quando a coisa tenha sido alvo de qualquer uma das acções compreendidas no tipo do art. 212º do Código Penal.
Este critério significa que tem legitimidade para apresentar queixa por crime de dano, o proprietário – em qualquer situação este não poderia ser excluído, porque tal implicaria uma alteração do bem jurídico protegido pela incriminação - o usufrutuário, o possuidor, o titular de qualquer direito real de gozo sobre a coisa e, ainda, todo aquele que tenha um interesse juridicamente reconhecido na fruição das utilidades da coisa.”. (sublinhado nosso)
[13] Como se refere no Ac. TC nº 304/2004.
[14] Esta norma, introduzida pela Lei nº 48/2007 de 29/8, veio consagrar a doutrina do Ac. TC nº 524/97, que julgou inconstitucional, por violação do art. 32º nº 5 da C.R.P., a norma extraída com referência aos arts. 133º, 343º e 345º ( na anterior redacção ) do C.P.P., no sentido em que confere valor de prova às declarações proferidas por um co-arguido, em prejuízo de outro co-arguido quando, a instâncias destoutro co-arguido, o primeiro se recusa a responder, no exercício do direito ao silêncio.
Como foi salientado no Ac. TC nº 133/2010, naquele aresto “Não se negou valor probatório às declarações do co-arguido. O que motivou o julgamento de inconstitucionalidade foi a violação do contraditório, não a falta ou deficiência de aptidão probatória de tais declarações. Apenas se afastaram em função do seu modo de produção, considerando-se contrário às garantias do arguido em processo penal que o arguido não possa contraditar toda a prova contra si produzida, como sucede quando o co-arguido se recusa a responder, no exercício do seu direito ao silêncio, às perguntas que a defesa do arguido prejudicado pelas suas declarações anteriores entende colocar-lhe.” ( sendo nosso o sublinhado ).
[15] Apreciando a sua compatibilidade com as garantias de defesa consagradas no art. 32º da C.R.P., o Ac. TC nº 133/2010 pronunciou-se no sentido de não julgar inconstitucional a norma do nº 4 do art. 345º do C.P.P., conjugada com os artigos 133º, 126º e 344º, quando interpretados no sentido de permitir a valoração das declarações de um arguido em desfavor do co-arguido que entenda não prestar declarações sobre o objecto do processo.
[16] cfr. Teresa Beleza, Rev. MP, Ano 19º, nº 74, pág. 39 e ss., Medina Seiça, “O Conhecimento Probatório do co-Arguido”, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, pág. 190 ss., Figueiredo Dias, em parecer junto a um recurso, aludido nomeadamente no Ac. STJ 12/7/06 adiante referido, PFSF Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, pág. 855, ( em anot ao art. 345º ), todos afinando pela necessidade de corroboração; contra, no sentido da proibição de prova, Rodrigo Santiago, RPCC, 1994, pág. 27 e ss.
[17] Vejam-se, entre muitos outros, os Acs. STJ 12/2/03, proc. nº 02P4524, 12/7/06, proc. nº 06P1608 , 8/2/07, proc. nº 07P028, 21/3/07, proc. nº 07P024, 8/11/07, proc. nº 07P3984, 27/11/07, proc. nº 07P3872, 12/3/08, proc. nº 08P694, 12/6/08, proc. nº 08P1151, 18/6/08, proc. nº 08P1971, 3/9/08, proc. nº 08P2044, 7/5/09, proc. nº 08P1213, 4/11/09, proc. nº 97/06.JRLSB.S1; RP de 15/4/09, CJ, t.2, pág.242; RL 10/5/06, proc. nº 3616/2006-3 e 26/4/07, proc. nº 3318/07-9; RG 9/2/09, proc. nº 1834/08-2 e 16/5/11, proc. nº 236/05.8GBGMR.G1; RE 8/11/11, proc. nº 92/10.4GAENT.E1; e RC 30/11/11, proc. nº 51/07.4GBMGL.C1.
[18] Na senda da construção proposta por Medina Seiça, ob. cit., que a remata com a seguinte conclusão: “O percurso efectuado em torno do critério da valoração do conhecimento probatório do co-arguido leva-nos a concluir que tal material probatório requer uma verificação suplementar que se traduz na exigência de corroboração. Com a corroboração significa-se a existência de elementos oriundos de fontes probatórias distintas da declaração que, embora não se reportem directamente ao mesmo facto narrado na declaração, permitem concluir pela veracidade desta. A regra da corroboração traduz de modo particular uma exigência acrescida de fundamentação, devendo a sua falta merecer a censura de uma fundamentação insuficiente”.
[19] Proc . nº 200/12.0GAMSF.P1
[20] Na síntese de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, t. I, pág. 81: “(1) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção geral e especial; (2) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa; (3) Dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico; (4) Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa, de intimidação ou de segurança individuais.”
Assim, “Toda a pena que responda adequadamente às exigências preventivas e não exceda a medida da culpa é uma pena justa.”
[21] cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime, págs. 72-73.
[22] Idem, Ibidem, pág. 73.
[23] Nas palavras de Figueiredo Dias, Direito Penal…, pág. 79-80, “A verdadeira função da culpa no sistema punitivo reside efectivamente numa incondicional proibição de excesso; a culpa não é fundamento da pena (.), mas constitui o seu pressuposto necessário e o seu limite inultrapassável: o limite inultrapassável por quaisquer considerações ou exigências preventivas – sejam de prevenção positiva de integração ou antes negativa de intimidação, sejam de prevenção especial positiva de socialização ou antes negativa de segurança ou de neutralização”. Preencherá, assim, a sua função de “estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua pessoa nos quadros próprios de um Estado de Direito democrático. E a de, por esta via, constituir uma barreira intransponível ao intervencionismo punitivo estatal e um veto incondicional aos apetites abusivos que ele possa suscitar.”
[24] A título de exemplo, cfr. Acs. STJ 14/5/09, proc. nº 19/08.3PSPRT:
“(…) na dimensão das finalidades da punição e da determinação em concreto da pena, as circunstâncias e os critérios do art. 71.º do CP têm a função de fornecer ao juiz módulos de vinculação na escolha da medida da pena; tais elementos e critérios devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores) como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente. Observados estes critérios de dosimetria concreta da pena, há uma margem de actuação do julgador dificilmente sindicável, se não mesmo impossível de sindicar.”;
RP 2/6/10, proc. nº 60/09.9GNPRT.P1:
“(…) no recurso dirigido à reacção penal aplicada, a pretensão recursiva apenas incidirá sobre os seus critérios fundamentais (culpa, prevenção especial ou geral) ou mesmos em relação às demais circunstâncias que rodearam o cometimento do crime, sejam pretéritas, contemporâneas ou posteriores a essa ocorrência, de tal modo que a pena aplicada se mostre inadequada quanto à escolha ou desajustada no que concerne ao seu quantitativo.
Nesta conformidade, esse desajustamento quantitativo terá que ser relevante, mostrando-se desproporcionado em função da culpa relevada ou das exigências de prevenção que se fazem sentir, impondo-se a sua correcção por via de recurso.
Mas já não passa pela precisão ou exactidão da reacção penal aplicada, definidos que estejam correctamente os respectivos parâmetros legais e judiciais, salvo, como já referimos, na falta de razoabilidade ou desproporcionalidade da reacção penal aplicada.
Assim, no recurso sobre a medida da pena o que poderá ser objecto do mesmo são a correcção dos critérios legais e judiciais de determinação da pena, de modo que seja aplicada uma reacção penal justa, mas não aquela pena exactamente justa.”
e RE 30/9/14, proc. nº 344/08.3 GAOLH.E1 ( em que a ora relatora interveio como adjunta)::
“(…) os recursos (quer em matéria de facto, quer em matéria de direito) não são re-julgamentos da causa mas tão só remédios jurídicos.
Assim, também em matéria de pena, o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico.
Daqui resulta que o tribunal da Relação deve intervir na pena, alterando-a, tão só quando detecta incorrecções ou distorções no processo aplicativo desenvolvido em primeira instância, na interpretação ou aplicação das normas legais e constitucionais que regem a pena.
A Relação não decide da pena como se o fizesse ex novo, como se inexistisse decisão de 1ª instância. O recurso não visa, não pretende e não pode eliminar alguma margem de actuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do acto de julgar.
A sindicabilidade da pena em via de recurso situa-se, pois, na detecção de um desrespeito aos princípios que norteiam a pena ou de um desvio nas operações de determinação impostas por lei.
Daí que não abranja a determinação/fiscalização dum quantum exacto de pena que, decorrendo duma correcta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionado.”
[25] cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, págs. 291-292.
[26] Ac. STJ 8/1/14, proc. nº 154/12.3GASSB.L1.S1
[27] Ac. STJ 14/5/14, proc. nº 31/13.0JAAVR.C1.S1
[28] Ac. STJ 9/5/12, proc. nº 418/08.0PAMAI.S1
[29] Disso são exemplo, entre outros, os Acs. STJ 11/2/02, proc. nº 02P1259 e 27/11/08, proc. nº 08P2149.
[30] “Trata-se de um poder-dever, ou seja de um poder vinculado do julgador, que terá que decretar a suspensão da execução da pena, na modalidade que se afigurar mais conveNB para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os apontados pressupostos” – cfr. Maia Gonçalves, C. Penal Anotado e Comentado, 14º ed. – 2001, pág. 191
[31] cfr. Fig. Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 344.
[32] Ac. STJ 30/6/99, proc. nº 99P566
[33] Ac. STJ 27/11/08, proc. nº 08P1773.