Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1196/10.9TBALR-A.E1
Relator: FRANCISCO XAVIER
Descritores: PROCURAÇÃO FORENSE
REPRESENTAÇÃO SEM PODERES
Data do Acordão: 03/27/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Sumário:
I. A subscrição de procuração pela qual o mandante confere ao mandatário amplos poderes forenses e os poderes especiais para confessar, transigir ou desistir em qualquer causa em que o mandante seja parte ou interessado, consubstancia uma relação de mandato forense.
II. Os poderes gerais e especiais atribuídos ao mandante são poderes forenses, para agir em Juízo, que não incluem poderes de representação extrajudicial, que não tenham a ver com a condução e resolução da lide, como a prática de actos extrajudiciais em nome do mandante para que sejam exigidos poderes de representação específicos, no caso a resolução de contratos.
III. Na situação de representação, o representante age, de modo expresso e assumido, em nome do representado, dando a conhecer aos interessados o facto da representação. O destinatário da conduta tem, então, o direito, nos termos do n.º 1 do artigo 260º do Código Civil, de exigir que o representante, dentro de prazo razoável, faça prova dos seus poderes, sob pena de a declaração não produzir efeitos.
IV. Se o destinatário da conduta não exigir a comprovação dos poderes de representação aceitou o representado a praticar o acto, o qual produz efeitos na sua esfera jurídica.

Sumário do relator
Decisão Texto Integral:
Acórdão na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
1. Nos autos de execução n.º 1196/10.9TBALR, que correm termos no Tribunal Judicial de Almeirim, em que figuram como exequente Banco..., SA., e executados S..., Lda., e outros, veio a executada C..., invocar a insuficiência do título executivo – no caso, o contrato de mútuo identificado nos autos -, invocando que não se verificou a resolução do contrato de mútuo alegada no requerimento executivo, porquanto as cartas registadas, com aviso de recepção, datadas de 29/11/2010, enviadas para a morada do contrato, em que a exequente declara o vencimento antecipado de todas as prestações, ao abrigo das cláusulas 2ª, 4ª e 6ª das “condições gerias do contrato e do artigo 781º do Código Civil, não foram subscritas por “nenhum legal representante da exequente”, com poderes para o acto, mas sim remetidas pela “Sociedade de Advogados”, não tendo sido junta então, nem agora, procuração que conferisse tais poderes de representação à dita sociedade.
Invocou ainda que, aquando da citação o requerimento executivo não se fazia acompanhar de determinados documentos, no caso, o comprovativo do pagamento da taxa de justiça, declaração de aceitação do Solicitador de Execução e da procuração forense.

2. Respondeu a exequente alegando que a “Sociedade de Advogados” encontrava-se devidamente mandatada para o efeito, com base na procuração junta aos autos em que “são conferidos os mais amplos poderes aos Mandatários bem como poderes especiais para confessar, desistir ou transigir”, concluindo que “quem pode o mais pode o menos” e, por conseguinte “se o mandatário tem amplos poderes, para além de ter os mencionados poderes especiais, também terá poderes para enviar uma carta de interpelação, invocando ainda, com relevo, o disposto no artigo 260º do Código Civil.

3. Por despacho ref. 1318701 (cf. fls. 65/66 deste apenso) foi indeferido o “incidente” da alegada “insuficiência do título executivo”, com os seguintes fundamentos:
“Nos presentes autos veio a executada C... alegar a insuficiência do título executivo na medida em que a declaração de resolução do contrato dado à execução como título executivo, não se encontrava subscrita por quem tem poderes para vincular a exequente, mas sim pela sociedade de advogados.
Afirma ainda que a procuração junta aos autos não foi comunicada à executada aquando da citação.
A exequente pugna pelo indeferimento desta pretensão, uma vez que a procuração conferida à sociedade de advogados confere os mais amplos poderes, incluindo os de confessar, desistir ou transigir.
Efectivamente, assiste razão à exequente na medida do expedido na sua resposta que aqui se dá por reproduzida, sendo certo que a procuração em apreço, conferindo poderes nos termos descritos, abrange o poder de liquidar quantias em dívida e resolver contratos, por tal constituir um minus em relação aos descritos poderes especiais e por estar incluído nos mais amplos poderes conferidos.
No que respeita à falta de comunicação de tal elemento aquando da citação, a executada não logrou provar tal alegação, pelo que, por esta via, não pode também o pedido em apreço ter acolhimento.
Pelo exposto, indefere-se o requerimento em apreço.
(…)”

4. Inconformado com esta decisão recorreu a executada C..., pedindo a revogação do despacho recorrido, com os fundamentos que assim resumiu [segue transcrição das respectivas conclusões]:


I. Constitui objecto do presente Recurso, o Douto Despacho proferido em e 21/01/2013 com a Ref. 1318701 que indeferiu o Requerimento da ora Recorrente de 21/11/2011 com a Ref. 8662248, onde foi suscitada a Insuficiência do Titulo Executivo para a presente acção executiva, o qual põe termo ao incidente.
II. Da leitura do Despacho ora recorrido, decorre que o Tribunal "a quo" fundamentou a decisão de indeferimento do requerimento da Recorrente, basicamente na resposta que então foi apresentada pela Exequente, reproduzindo sucintamente os mesmos argumentos, no sentido que "a procuração em apreço, conferindo poderes nos termos descritos, abrange o poder de liquidar quantias em dividas e resolver contratos, por tal constituir um minus em relação aos descritos poderes especiais e por estar incluído nos mais amplos poderes conferidos", assim aderindo também, ainda que implicitamente, à respectiva fundamentação legal, a qual se apresenta sustentada no texto dos artsº 1157°, 1178°, 258° e ss, 260° todos do Código Civil e, no mais, ou seja, na fundamentação da questão relativa à falta de comunicação à Executada dos documentos o Tribunal "a quo" limita-se a afirmar que "a executada não logrou provar tal alegação, (. . .)", fazendo assim, uma aplicação (implícita) da regra geral (art° 342°, n.º1 do Código Civil), em matéria de repartição do ónus da prova.
III. Ora, salvo o devido respeito, entende a Exequente ora Recorrente que o Tribunal "a quo", efectuou uma errada interpretação das supra referidas normas legais.
Porquanto,
IV. A exequente apresentou à execução, como título executivo um Documento Particular- contrato de mútuo com o n.º 2020455, cujo financiamento ascendeu a €35.000,OO (trinta e cinco mil euros), tendo no seu Requerimento Executivo (Factos), alegado que: " ... nos termos das cláusulas 2. a, 4. a e 6. a das "condições Gerais" e do artigo 781° do Código Civil, a Exequente declarou o vencimento antecipado de todas as prestações, por cartas registadas com aviso de recepção datadas de 29/11/2010, enviadas para a morada constante do contrato, cf. Documentos que ora se juntam como docs. 2,3,4,5,6 e 7 respectivamente, e se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais".
V. Da leitura dos supra referidos documentos juntos pela exequente constata-se que as ditas cartas para alegada resolução do contrato em questão foram, todas elas, remetidas pela “Sociedade de Advogados”, sendo que igualmente se encontram assinadas em representação desta, e não, pela Exequente e, não foi então, como não o foi posteriormente, junta qualquer procuração que conferisse à referida Sociedade de Advogados, os poderes necessários para, em representação da Exequente, poder resolver quaisquer contratos, sendo certo porém, que, nenhum legal representante da exequente, com poderes para tal acto, (segundo a forma de obrigar constante dos respectivos estatutos), remeteu à Executada, ora Recorrente qualquer carta para resolução do contrato de mútuo em causa.
VI. Assim, resulta inequivocamente do supra referido que a Exequente apresenta como Titulo Executivo o supra referido documento particular, alegadamente resolvido, por via extrajudicial, tanto mais que, mesmo já na fase judicial (no âmbito da presente Execução), a própria Exequente afirma (vd. artigo 10 do Requerimento de 07/12/2011, com Ref. 8812050), que: “Pela procuração junta aos autos são conferidos os mais amplos poderes aos mandatários bem como os poderes especiais para confessar, desistir ou transigir”: Concluindo depois, que (vd. artigo 11 daquele Requerimento): “ ... quem pode o mais, pode o menos”.
VII. Ora, salvo o devido respeito, ter-se-á esquecido a Exequente e, por remissão e total adesão á argumentação expandida, também o Tribunal a quo, do disposto no n.º 2 do Artigo Único do Decreto-Lei n.º 267/92 de 28 de Novembro, disposição legal que se encontra em vigor e, que, face ao circunstancialismo em questão, tem aplicação directa no caso em apreço, a qual dispõe que: "As procurações com poderes especiais devem especificar o tipo de actos, qualquer que seja a sua natureza, para os quais são conferidos esses poderes".(os sublinhados são nossos).
VIII. Sucede que, na procuração em apreço (a qual nunca foi sequer entregue e/ou remetida à Executada/Recorrente), em lado algum consta que a Exequente tenha conferido aos seus mandatários os poderes específicos e/ou concretos para resolver quaisquer contratos e, salvo melhor opinião, a concessão de poderes necessários para resolver contratos (extra judicialmente), não pode ser visto como um minus relativamente aos poderes especiais invocados (confessar, desistir ou transigir), antes correspondendo, isso sim, a um distinto poder especial, o qual, in casu, não se verifica ter sido consagrado, sendo aliás, consabido que, mesmo no âmbito de um processo judicial, não pode o mandatário munido (apenas) de procuração forense com os aludidos poderes especiais (para confessar, desistir ou transigir), exigir, por exemplo, as respectivas custas de parte, ou, por exemplo, representar extrajudicialmente o seu constituinte e, em seu nome, na qualidade de mutuário, celebrar uma escritura de compra de imóvel, com mútuo e, eventualmente, com constituição de hipoteca ...
IX. Questiona-se então a Executada/Recorrente, porque haveria de ser possível, isto é, válido, que tal procuração forense, possa conferir poderes (quando não especificados) para RESOLVER CONTRATO em representação e na qualidade de mutuante!!!, pois que, in casu, não se vislumbra em lado algum que tais poderes tenham sido especificados, concretizados ou descriminados na procuração em apreço.
X. Pois que, in casu, não se vislumbra em lado algum que tais poderes tenham sido especificados, concretizados ou descriminados na procuração em apreço, devendo a mesma conclusão retirar-se forçosamente também das disposições legais relativas ao contrato de mandato invocadas pela Exequente (vd. artigos 15 a 19 do Requerimento de 07/12/2011, com Ref. 8812050), porquanto aquele normativo legal, remete expressamente para o disposto no artº 258º e ss do Código Civil, que vem inquinar por completo toda a fundamentação da Exequente e, por conseguinte do Despacho recorrido, porquanto, conforme decorre do texto do citado artigo: “O negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes que lhe competem, produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último”- (Os sublinhados são nossos).
XI. Ora, resulta evidente do supra exposto que, in casu, os mandatários extravasaram os limites dos poderes que lhes foram conferidos, pelo que em consequência, os actos por eles praticados, não são susceptíveis de produzir os respectivos efeitos na esfera jurídica da sua representada (mandante), neste caso, a Exequente e, assim sendo, porque não se verificou qualquer resolução contratual válida, não se podem considerar vencidas todas as prestações conforme alegado pela Exequente, verificando-se por conseguinte a invocada Insuficiência do Título Executivo.
XII. Por outro lado, ainda, importa repetir aqui que, não obstante constar do Requerimento Executivo em causa (Declarações Complementares), que foram juntos(à execução), os seguintes documentos:
- Comprovativo do pagamento da taxa de justiça;
- Declaração de aceitação do SE; e,
Procuração forense.
A verdade é que tais documentos não acompanhavam o dito Requerimento Executivo aquando da "citação".
XIII. No respeita a esta questão o Tribunal a quo, ao afirmar que a Executada, ora Recorrente não logrou provar tal alegação, aplica ainda que implicitamente a regra geral (artº 342°, n.º1 do Código Civil), em matéria de repartição do ónus da prova, porém, esta invocou um facto negativo, ou seja, o facto de não ter sido notificada da alegada existência nos autos determinados documentos ...
XIV. É ao Tribunal/Secção ou, neste caso (Acção Executiva), ao Agente de Execução que compete proceder a tal diligência (Citação), devendo cumprir todas as formalidades legais e, assim, nestas circunstâncias, exigir a demonstração de que não foram cumpridos os requisitos legais de tal diligência à Executada, corresponde à exigência da PROVA IMPOSSIVEL (DIABÓLICA).
XV. De facto, in casu, face a tal circunstância, impunha-se a inversão da regra geral em matéria de ónus da prova, como decorre do disposto no n.º 2 do artº 342º do Código Civil, uma vez que a Executada invocou no seu Requerimento (que foi indeferido), actos impeditivos e/ou extintivos do direito invocado (pela Exequente), pelo que, ou existiam nos autos elementos que permitissem ao Tribunal aferir, isto é, comprovar, a veracidade do alegado pela Executada, ou, caso contrário, deveria ser o Agente de Execução notificado para vir aos autos prestar os esclarecimentos e/ou juntar os documentos tidos por necessários para o efeito.
XVI. Em resumo:
O Douto Despacho recorrido é ilegal, porquanto violou o disposto nos artºs 1157°, 1178°, 258° e ss, 260° e 342°, n.ºs 1 e 2 todos do Código Civil bem assim como, violou, por omissão, o disposto no n.º 2 do Artº Único do DL n.º 267/92 de 28 de Novembro.
bem assim como, e em consequência,
Violou, também o disposto nos artºs 494°; 493°, n.ºs 1 e 2 e 495°, todos do Código de Processo Civil.
Nestes termos, nos melhores de direito e sempre com o Mui Douto Suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se o Despacho recorrido e substituindo-o por outro que declare a insuficiência do título executivo em causa e, consequentemente determine a extinção da presente execução, com as legais consequências.

5. A recorrida nas contra-alegações sustentou a manutenção do despacho recorrido.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II – Objecto do recurso
O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 660.º, n.º 2, 684.º, n.º3 e 685º-A, nº1, todos do Código de Processo Civil [redacção vigente à data da decisão recorrida, anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho].
Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, verifica-se que a questão essencial a decidir consiste na apreciação da alegada falta de poderes do representante para proceder à resolução do contrato de mútuo, que a executada/recorrente invocou como causa da insuficiência do título executivo.
Esta foi a questão que a recorrente suscitou no “incidente” que deduziu na execução, sobre o qual se pronunciou o despacho recorrido, e corresponde à pretensão que pretende fazer vingar no recurso.
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III – Fundamentação
A) - Os Factos
Com interesse para a decisão relevam as ocorrências processuais constantes do relato dos autos.
Importa ainda considerar o teor da procuração, datada de 20 de Novembro de 2007, que constitui o documento junto a fls. 24 deste apenso, nos termos do qual se declara que: “Banco…, S.A. … representada neste acto pelos … constitui seus procuradores os Senhores Dr. …, Dr. …, Dr. …, Drª … … , com escritório …, a quem em conjunto ou separadamente e com faculdade de substabelecer, confere os mais amplos poderes forenses em direito permitidos e, bem assim os especiais para confessar, transigir ou desistir em qualquer causa em que a mandante seja parte ou interessada”.
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B) – O Direito
1. Com se referiu, na decisão recorrida concluiu-se pela inexistência da alegada insuficiência do título executivo por se considerar que “… a procuração em apreço, conferindo poderes nos termos descritos, abrange o poder de liquidar quantias em dívida e resolver contratos, por tal constituir um minus em relação aos descritos poderes especiais e por estar incluído nos mais amplos poderes conferidos”.
Ora, salvo o devido respeito não se concorda com semelhante argumentação, adiantando-se, desde já, que tal não significa que se entenda que a “resolução do contrato” não tenha produzido efeitos.

2. Efectivamente, a procuração em causa documenta uma relação de mandato, tal como é definida no artigo 1157º do Código Civil, pela qual se confere ao mandante poderes de representação, sendo-lhe aplicável os artigos 258º e segs. do Código Civil, como decorre do n.º 1 do artigo 1178º do mesmo código.
Mas, o mandato conferido a cada um ou em conjunto aos causídicos nomeados na procuração é um mandato forense, no caso, com poderes gerais de representação em Juízo e especiais para confessar, transigir ou desistir em qualquer causa.
O mandato forense é um mandato especial e envolve a atribuição de específicos poderes ao mandatário para representar o mandante em todos os actos e termos de qualquer processo e respectivos incidentes, mesmo perante tribunais superiores (cf. artigo 36º, nº 1, do Código Civil), sendo, assim, um mandato representativo típico, assente na atribuição de um poder geral para pleitear em juízo, realizando, em nome da parte, todos os actos ordinariamente compreendidos na tramitação dos processos judiciais.

E a procuração que é instrumento desse mandato deve conter a declaração de que o respectivo outorgante dá poderes forenses ou para ser representado em tal e, se for caso disso, dos poderes para confessar, transigir ou desistir (cf. Artigo 37º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil).
Porém, tal como resulta da alegação da recorrente, tais poderes gerais e especiais atribuídos ao mandante são poderes forenses, para agir em Juízo, e não poderes de representação extrajudiciais, que não tenham a ver com a condução da lide, como seja a resolução de contratos, que é necessariamente um acto anterior ao pleito e pressupõe a atribuição de poderes específicos para esse efeito.
Contrariamente ao decidido não está em causa uma situação “de mais e de menos”, porque estão em causa realidades diferentes, em que uma é a representação judicial, ainda que com poderes especiais, e outra, distinta, a representação para a prática de actos extrajudiciais para a qual se exigem poderes específicos para tanto - trata-se de por fim a uma relação contratual em nome do mandante.
Deste modo, temos por assente que os amplos poderes forenses gerais e especiais atribuídos pela procuração em causa não incluem os poderes de resolução do contrato de mútuo celebrado entre o exequente e os executados.

3. Contudo, tal não significa que a declaração de resolução do contrato, operada pela comunicação datada de 29 de Novembro de 2010, remetida aos executados pela “Sociedade de Advogados”, que invoca agir em nome da representada Banco..., SA., exequente nestes autos, não tenha produzido efeitos na esfera jurídica dos destinatários e, bem assim, da representada.
Na verdade, prescreve o n.º 1 do artigo 260º do Código Civil que: “Se uma pessoa dirigir em nome de outrem uma declaração a terceiro, pode este exigir que o representante, dentro de prazo razoável, faça prova dos seus poderes, sob pena de a declaração não produzir efeitos”.
Como refere Menezes Cordeiro: “Na situação de representação, o representante age, de modo expresso e assumido, em nome do representado: dá a conhecer aos interessados o facto da representação. O destinatário da conduta tem, então, o direito, nos termos do artigo 260º, n.º 1, de exigir que o representante, dentro de prazo razoável, faça prova dos seus poderes, doutro modo a declaração não produzirá efeito.
Trata-se dum esquema destinado, por um lado, a dar credibilidade à representação e, por outro, a evitar situações de incerteza quanto ao futuro do negócio, sempre que tarde a surgir a prova dos poderes invocados pelo representante” (Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo IV, 2007, págs. 85/86).
No caso dos autos, a executada, confrontada com a comunicação de resolução do contrato, na qual é expressamente invocada a “representação” não exigiu ao representante a comprovação dos poderes a que este se arroga (aliás nem sequer alega tal facto), pelo que, não o tendo feito, aceitou-o a praticar o acto em nome da representada, não lhe sendo licito vir agora, apenas quando demandada na acção executiva, invocar tal vício, designadamente ao abrigo do artigo 258º do Código Civil.
Neste preceito estabelece-se que: “O negócio jurídico realizado pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes de representação, produz os seus efeitos na esfera jurídica deste último”.
Porém, o mesmo visa evitar a produção de efeitos jurídicos na esfera do representado decorrente da falta ou insuficiência dos poderes do representante, pelo que é o representado e não o terceiro (no caso a executada) que tem interesse na invocação de tal vício.
O terceiro tem ao seu dispor, como se referiu o mecanismo previsto no artigo 260º do Código Civil.
Deste modo, como não fez uso de tal direito a comunicação da resolução do contrato produziu efeito na sua esfera jurídica, bem como na do representado, sendo manifesto que este aceitou a prática do acto pelo representante, tanto mais que o mandatou para correspondente acção executiva.
Idêntico entendimento resulta do Acórdão do Supremo Tribunal da Justiça de 31 de Março de 1993, citado por Abílio Neto no Código Civil Anotado, em anotação ao artigo 260º, onde se entendeu que “a carta dirigida à entidade patronal pelo advogado do trabalhador, em nome deste, comunicando-lhe a resolução do contrato laboral, é válida e eficaz, se a entidade patronal não duvidar da suficiência dos poder do advogado”, e do Acórdão da Relação de Lisboa, de 20 de Junho de 2013, no qual se concluiu que: “Quem contrata como representante sem para tal ter poderes, tem obrigação de dar disso conhecimento ao outro contraente. Este, por sua vez, tem o ónus de exigir ao pseudo representante a justificação dos seus poderes, nos termos do art 260º CC.”.
Assim, sendo a declaração de resolução uma declaração negocial unilateral receptícia, isto é, para ser eficaz tem de chegar ao conhecimento do destinatário, produzindo os seus efeitos logo que recebida por este (cf. artigo. 224.º n.º 2 do Código Civil), e não tendo a executada exigido atempadamente, nos termos do artigo 260º a comprovação dos poderes do representante, o acto praticado por este produziu efeitos, pelo que não ocorre o facto gerador da insuficiência do título executivo por aquela invocado.

4. Alega ainda a executada que com a citação não lhe foram entregues o comprovativo do pagamento da taxa de justiça, a declaração de aceitação do Solicitador de Execução e da procuração forense, e que o tribunal entendeu, erradamente, que lhe competia demonstra tal facto.
Tal alegação - da falta de entrega dos documentos - surge no contexto da invocada insuficiência do título executivo e, ao que nos parece, na sequência da alegação de que não foi junta a procuração com o acto de resolução nem agora na execução.
Com tal alegação não está a executada a invocar a nulidade da citação por a mesma não vir acompanhada de todos os documentos, nos termos dos artigos 235º e 198º do Código de Processo Civil, mas tão só a apontar a dita irregularidade, designadamente da falta de entrega dos ditos documentos, em especial da procuração, na qual a exequente funda os poderes conferidos ao representante para em seu nome resolver o contrato.
De todo o modo, independentemente de saber se todos os documentos em causa integram o elenco dos que, nos termos do artigo 235º e 152º, n.º 2, do Código de Processo Civil, deviam acompanhar o acto de citação, sempre se dirá que a sua falta não constitui nulidade, porque não prejudicou a defesa da executada (cf. artigo 198º, n.º 4 do Código de Processo Civil), que a exerceu.
Assim, e não obstante se reconhecer assistir razão à recorrente quando alega que não lhe compete o ónus de provar que não recebeu os documentos com a citação, competindo, antes ao tribunal decidir depois de averiguar tal facto, certo é que a falta da entrega dos ditos documentos, designadamente da procuração forense, é inócua para a decisão da questão da insuficiência do título executivo, e a executada até demonstra nas alegações conhecer o seu teor.
Na verdade, como se viu, não foi com fundamento na existência da procuração em causa, alegadamente não entregue à recorrente, que se considerou improcedente o fundamento de oposição invocado, mas sim pelo facto de a recorrente, perante a comunicação de resolução que lhe foi dirigida, não ter feito uso do mecanismo previsto no n.º 1 do artigo 260º do Código Civil, exigindo a comprovação dos poderes de representação invocados.
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IV – Decisão
Nestes termos e com tais fundamentos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação e, embora com diferente fundamentação, confirmar o despacho recorrido.

Custas a cargo da recorrente.
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Évora, 27 de Fevereiro de 2014
(Francisco Xavier)
(Elisabete Valente)
(Cristina Cerdeira)