Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
303706/10.3YIPRT-B.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: PENHORA
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Data do Acordão: 03/19/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 – A agressão do património do executado só é permitida numa medida em que seja adequada e necessária para a satisfação da pretensão do exequente.
2 – Na concretização prática dos princípios da proporcionalidade e da suficiência, ao fiscalizar a legalidade da operação de penhora dos bens do devedor, o julgador deverá tentar alcançar um equilíbrio justo entre o direito do credor à satisfação do seu crédito e o direito do devedor à preservação do património não essencial ao pagamento da dívida exequenda, de acordo com um critério de normalidade social.
3 – Decorridos 9 (nove) anos sobre a data da primeira penhora, a exequente não recebeu qualquer pagamento, coercivo ou voluntário, relacionado com a quantia exequenda devida, mostrando-se assim o objectivo da execução incumprido e isso viabiliza a realização de nova apreensão de bens imóveis.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 303706/10.3YIPRT-B.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre – Juízo Central de Competência Cível e Criminal de Portalegre – J2
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
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I – Relatório:
Por apenso aos autos de execução para pagamento de quantia certa, a executada “(…) Resort (…), SA” veio deduzir incidente de oposição à penhora contra “(…) – Administração e Gestão de Sistemas de (…), SA”. Indeferida a pretensão, a executada interpôs o competente recurso.
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A executada defendeu que devia ser julgado procedente a oposição face à nulidade do acto de penhora e à nulidade do respectivo auto de penhora, anulando-se os termos subsequentes que desta penhora dependam, devendo ser determinado o levantamento das penhoras efectuadas em 08/09/2023.
Caso assim não se entendesse, subsidiariamente, face à inadmissibilidade da penhora por manifestamente excessiva e objectivamente ilegal, deveria ser determinado o levantamento da penhora efectuada dos dois (2) imóveis, que estão identificados na respectiva «Descrição» e «Verba», sob os n.ºs 1 e 2, do auto de penhora de 08/09/2023.
Requereu ainda a condenação da Exequente no reembolso das custas de parte incluindo as respectivas taxas, preparos para despesas inerentes e decorrentes desta penhora e da notificação para deduzir oposição à mesma. E, finalmente, apresentou meios de prova.
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Em síntese e para tanto, alegou que o auto de penhora era omisso quanto ao valor dos prédios penhorados, impossibilitando assim a determinação da penhora e da suficiência dos bens para a realização do fim da execução.
Mais afirmou que os bens já penhorados na execução são suficientes para garantir o pagamento da quantia exequenda.
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A oposição à execução foi recebida e o exequente notificado para contestar, nos termos do disposto no artigo 293.º, n.º 2, ex vi do artigo 785.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil.
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A exequente pronunciou-se, referindo que a omissão do valor não constitui qualquer nulidade e que a penhora dos bens anteriormente realizadas não foi suficiente para o ressarcimento do credito em causa.
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O Tribunal a quo entendeu que os autos tinham disponíveis os elementos necessários proferir decisão. E, nessa sequência, as partes foram notificadas para se pronunciarem sobre a possibilidade de ser proferida decisão sem a realização de ulterior prova e nenhuma se opôs.
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Em 28/01/2019 o Tribunal a quo determinou que a venda prosseguisse considerando o valor base de € 942.000,00 (novecentos e quarenta e dois mil euros).
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Na parte relevante, o Juízo de Competência Central Cível e Criminal de Portalegre decidiu que «a questão do valor será, então, pertinente para o momento em que, porventura, seja fixado o valor do imóvel para efeito da venda executiva, nos termos do disposto no artigo 812.º do C.P.C, mas não são susceptíveis de fundamentar oposição à penhora nos termos do disposto no artigo 784.º do C.P.C.».
E quanto à outra questão suscitada adiantou que «coloca ainda o oponente em crise a penhora realizada na sua extensão, por já não ser necessária ao ressarcimento da divida exequenda tendo em consideração o valor dos bens já antes penhorados.
Da matéria de facto provada resulta que a divida exequenda é de € 509.556,69.
Dos imoveis penhorados foi obtida como melhor proposta € 411.111,00.
Encontrando-se bens penhorados desde 2015, ainda nenhum pagamento coercivo ou voluntario da quantia exequenda desde essa data.
Assim, afigura-se notório que os bens penhorados serão insuficientes para pagamento da quantia exequenda.
Por outro lado, ainda se o fossem, por não possibilitarem o pagamento da dívida exequenda no prazo de 6 meses, tendo em consideração que o exequente tem direito ao pagamento num prazo razoável, nos termos do disposto no artigo 751.º, n.º 3, alínea c), do C.P.C., sempre a penhora seria admissível».
Em função disto, o Meritíssimo Juiz de Direito julgou improcedente a oposição.
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Inconformada com tal decisão, a recorrente apresentou recurso e as suas alegações continham as seguintes conclusões:
«A) Em 20/09/2023 a Executada deduziu oposição à terceira penhora, com o fundamento (previsto no artigo 748.º, n.º 1, alínea a), do CPC) da inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada e o Tribunal a quo julgou improcedente a oposição a esta terceira penhora.
B) Em 29.10.2015 foi realizada a primeira penhora e, desde 29.10.2015, estão penhorados dois imóveis os quais têm o valor € 76.000,00 e de € 942.000,00 como valor real de mercado o que perfaz, o valor global de € 1.018.000,00 (um milhão e dezoito mil euros) de bens penhorados neste processo, como resulta provado pela instrução destete único e mesmo processo executivo.
C) Na primeira penhora o Senhor Perito, no respetivo Relatório de Avaliação, de outubro de 2018, de cada um dos referidos prédios (… e Herdade do …), determinou respetivamente o valor de € 76.000,00 e de € 942.000,00 como valor real de mercado, em 22.10.2018, para efeitos da avaliação de património para venda; como os factos jurídicos ou factos judiciais provados neste processo evidenciam.
D) Logo, na primeira penhora ficaram penhorados imóveis no valor de € 1.018.000,00 o qual é manifestamente superior ao valor do limite da penhora que é no «Total € 509.556,69» fixado como «Limite da penhora» da terceira penhora, como a instrução deste processo prova.
E) Resulta do processado que está a assente que neste mesmo processo, o Digníssimo Tribunal, em 28.01.2019, proferiu douta decisão:
«… determinando que a venda prossiga, considerando-se o valor base de € 942.000,00 (novecentos e quarenta e dois mil euros), na modalidade determinada pelo agente de execução».
F) Está provado que transitou em julgado a decisão, de 28.01.2019, que determinou que a venda prossiga, considerando-se o valor base de € 942.000,00 (novecentos e quarenta e dois mil euros).
G) Está em curso a venda dos dois prédios, penhorados na primeira penhora, com valor real de mercado de € 1.018.000,00 e o Digníssimo Tribunal neste processo, apenas considerando um dos dois referidos prédios da primeira penhora, determinou que a venda prossiga, com o valor base de € 942.000,00, o que está provado pela instrução deste processo.
H) Em 10.08.2023 foi realizada uma segunda penhora, mediante a qual foram penhorados mais doze (12) imóveis, identificados na respetiva «Descrição» e «Verba», sob os n.ºs 1 a 12, com valor de mais de € 5.000.000,00 e este valor de € 5.000.000,00 considera-se assente porque foi admitido por acordo porque a Exequente não impugnou os factos articulados pela Executada na oposição à segunda penhora.
I) Mediante a primeira e a segunda penhora, até 10.08.2023, foram penhorados catorze (14) imóveis, que têm o valor global de € 6.018.000,00 (seis milhões e dezoito mil euros), como resulta provado pela instrução deste processo.
J) É notório que o valor global de € 6.018.000,00 é manifestamente superior ao valor do limite da penhora que é no «Total € 509.556,69» fixado para a terceira penhora.
K) Menos de um mês, após a realização da segunda penhora (de 10.08.2023) no valor de mais de € 5.000.000,00, o Agente de Execução efetuou esta terceira penhora (em 08.09.2023) e entre estas duas penhoras o Agente de Execução não realizou qualquer diligência com vista à venda dos doze (12) imóveis, com valor de mais de € 5.000.000,00 que foram penhorados na segunda penhora, assim sem sequer promover a venda dos doze (12) imóveis penhorados na segunda penhora, o Agente de Execução abusiva e desproporcionadamente efetuou a terceira penhora, como está provado pela instrução deste processo.
L) O Tribunal a quo não conheceu, não atendeu aos factos jurídicos essenciais que constituem a matéria de facto provada documentalmente, por decorrência da instrução deste único e mesmo processo executivo, isto é, os factos judiciais provados nos e pelos termos do processado, maxime os factos jurídicos e ou judiciais provados documentalmente indicados nestas conclusões.
M) Em 08.09.2023 foi realizada a terceira penhora pela qual o agente de execução, como está provado neste processo, pelo auto da terceira penhora, foram penhorados mais dois (2) imóveis, os quais têm um valor de mais de € 880.950,94, pelo que este ato da terceira penhora além de violar o princípio da proporcionalidade é desnecessária e viola princípio da proibição de atos inúteis e consubstancia um abuso de direito.
N) Neste único e mesmo processo executivo, estão penhorados dezasseis (16) imóveis que tem o valor global de € 6.898.950,94, pelo que esta penhora é substancialmente superior ao montante «Total € 509.556,69» da dívida e acréscimos legais.
O) É notório que os bens penhorados, são mais que suficientes para pagamento da quantia exequenda e esta terceira penhora pela sua extensão é excessiva e objetivamente ilegal.
P) É inadmissível a terceira penhora em que foram penhorados mais dois (2) imóveis que têm um valor de € 880.950,94, até porque é público e notório que os valores patrimoniais constantes das cadernetas prediais estão desatualizados e o atual valor de mercado dos dois (2) imóveis é superior ao patrimonial das cadernetas prediais.
Q) Com esta terceira penhora neste único e mesmo processo executivo que estão penhorados dezasseis (16) imóveis que tem o valor global de € 6.898.950,94, pelo que esta penhora é substancialmente superior ao montante «Total € 509.556,69» da dívida e acréscimos legais.
R) O valor de € 6.898.950,94 ultrapassa manifestamente – onze vezes mais – o «Limite da penhora» de € 509.556,69 (€ 509.556,69 x 11 = € 5.605.126,89).
S) Com a terceira penhora, ainda que se considere apenas o valor de € 942.000,00, este é mais que suficiente, para permitir a satisfação do pagamento da dívida exequenda e das despesas previsíveis da execução, que já está em curso a venda.
T) Com a terceira penhora foi imposto um sacrifício ou ‘carga coativa’ à executada que, em concreto, é desnecessária, nomeadamente porque desde a primeira penhora estão penhorados dois imóveis, com o valor global, de € 1.018.000,00 e o valor de € 1.018.000,00 ultrapassa o limite necessário para pagamento da quantia exequenda, visto que é manifestamente superior ao valor do limite da penhora que é no Total € 509.556,69.
U) A terceira penhora além de desnecessária é desproporcionada e excessiva, porque em conjunto com as duas anteriores penhoras, se traduz num desproporcionado sacrifício ou “carga coativa” de penhora de dezasseis (16) imóveis que tem o valor global de € 942.000,00 a € 6.898.950,94.
V) Esta terceira penhora, conjuntamente com as duas penhoras anteriores, é uma abusiva agressão ao património da Executada, mediante as quais foram penhorados todos os imóveis da Executada o que coloca em causa própria sobrevivência económica da Executada por causa da realização de “penhoras por arrastão” de dezasseis (16) imóveis que pela sua extensão é excessiva e objetivamente ilegal.
W) A natureza gravosa da penhora deve assim com o justo equilíbrio limitar-se ao que seja necessário para a satisfação do crédito exequente e das custas, mas desde que sejam respeitados os princípios da adequação (artigo 751.º, n.º 1, do CPC), da proporcionalidade e os limites estabelecidos em normas imperativas como seja o artigo 751.º, n.º 2, do C.P.C..
X) A mais atual e melhor jurisprudência é no sentido que é esta interpretação e aplicação que deve ser feita do artigo 751.º do CPC, porque o princípio da proporcionalidade é um princípio constitucionalmente imperativo consagrado no artigo 18.º da CRP e estabelecido nos artigos 735.º, n.º 3 e 751.º, n.º 2, do CPC e prevalece sobre o disposto no n.º 3 do artigo 751.º do CPC, uma vez que o princípio da proporcionalidade é o parâmetro legal que estabelece limites objetivos que prevalecem de forma imperativa sobre o disposto no n.º 3 do artigo 751.º do CPC.
Z) Como sustenta a melhor jurisprudência e doutamente o Professor Rui Pinto:
«A “segunda parte do n.º 2 do artigo 751.º ressalva que o agente de execução não deve cumprir a nomeação de bens do exequente que viole norma legal (processual ou substantiva) imperativa (…), ofenda o princípio da proporcionalidade da penhora (cfr. artigo 735.º, n.º 3) ou infrinja manifestamente o princípio da adequação afirmado no n.º 1 do próprio artigo 751.º; (…) sendo de concluir como ilícita a prática de penhoras desadequadas ao escopo da execução, por força do artigo 130.º”.
A.a) Perante um problema a resolver, não se aplica apenas a norma primacialmente vocacionada para a solução; todo o Direito é chamado a depor. Por isso, há que lidar com diversos ramos do Direito em termos articulado, com relevo para a Constituição – a interpretação deve ser conforme a Constituição. (...) Os direitos fundamentais valem também para a aplicação e desenvolvimento (das decisões) judiciais do direito privado», como é defendido por C. W. Canaris.
A.b) Sempre com o devido respeito por opinião diversa, o Tribunal a quo fez uma interpretação e aplicação inconstitucionalidade do disposto no artigo 751.º, n.º 1 e 2, do CPC, porque o princípio da proporcionalidade é um princípio constitucionalmente imperativo que prevalece sobre o disposto no n.º 3 do artigo 751.º do CPC, porquanto o princípio da proporcionalidade é o parâmetro constitucional/legal que estabelece os limites objetivos que prevalecem de forma imperativa sobre o n.º 3 do artigo 751.º do CPC.
A.c) Salvo o devido respeito e melhor opinião de acordo com os factos carreados e provados neste processo e nos termos do direito aplicável ao presente caso, o Tribunal a quo, com a decisão recorrida, não deveria – e não pode – dar “cobertura” ao ato inútil e ilegal à terceira penhora o qual é uma clara e abusiva agressão ao património da Executada, porque esta terceira penhora, conjuntamente com as duas penhoras anteriores, consubstancia a realização de “penhoras por arrastão” de dezasseis (16) imóveis – no valor € 6.898.950,94 – que, pela sua extensão, é excessiva e objetivamente ilegal: é manifesto e clamoroso o abuso de direito o ato da terceira penhora em que foi ultrapassado manifesta e substancialmente o «Limite da penhora» e, concomitantemente, este ato da penhora é um ato inútil que viola o princípio da proibição de atos inúteis.
A.d) O Tribunal a quo incorreu em erros de julgamento de direito: já que o princípio da proporcionalidade, da proibição do excesso, da adequação e ou suficiência, é um principio constitucionalmente imperativo consagrado no artigo 18.º da Constituição e estabelecido nos artigos 735.º, n.º 3 e 751.º, n.º 2, do CPC e prevalecente sobre o disposto no n.º 3 do artigo 751.º do CPC – a interpretação/aplicação da Lei, a hermenêutica da extensão ou excesso da penhora e do princípio da adequação e ou da proporcionalidade, deve a ir além da mera interpretação literal para que se possa alcançar a ratio legis do que é extensão ou excesso da penhora, face ao princípio da proporcionalidade e dos subprincípios da proibição do excesso, da adequação e ou suficiência.
A.e) Perante esta terceira penhora, quer se considere o referido valor global de € 6.898.950,94 ou apenas o valor global de € 1.018.000,00 dos bens penhorados na primeira penhora ou se considere que na segunda penhora, foram penhorados mais doze (12) imóveis, com valor de mais de € 5.000.000,00 e na terceira penhora foram penhorados mais dois (2) imóveis que têm um valor de € 880.950,94, pelo que a terceira penhora é desnecessária porque substancialmente superior ao montante «Total € 509.556,69» da dívida e acréscimos legais, sendo que o ato da terceira penhora além consubstanciar um abuso de direito é um ato inútil que viola o princípio da proibição de atos inúteis a que acresce que a terceira penhora, conjuntamente com as duas penhoras anteriores é uma abusiva agressão ao património da Executada, mediante as quais foram penhorados todos os imóveis da Executada o que coloca em causa própria sobrevivência económica da Executada por causa da realização de “penhoras por arrastão” de dezasseis (16) imóveis que pela sua extensão é excessiva e objetivamente ilegal.
A.f) O Tribunal a quo, com a decisão recorrida, ao admitir a nova e terceira penhora e ao julgar improcedente a oposição à penhora, incorreu em erro de julgamento de direito, face à errada interpretação e aplicação do artigo 748.º, n.º 3, alínea c), do CPC, por violação do princípio da proporcionalidade, da proibição do excesso, da adequação e ou suficiência e violação do subprincípio da justa medida ou proporcionalidade pelo qual não podem adotar-se medidas excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos e resulta do referido principio que as medidas restritivas de direitos, liberdade e garantias devem revelar-se como adequadas para a prossecução dos fins visados, mas sempre com respeito e com salvaguarda dos outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos, pelo que a sentença violou o disposto nos artigos 18.º, n.º 2 e 62.º, n.º 1, da CRP e violou o estabelecido nos artigos 5.º, n.º 1, n.º 2, alíneas a) a c), 6.º, 411.º, 412.º e 413.º, 567.º, n.º 1, 735.º, n.º 3 e 751.º, n.º 2, do CPC, o que fere de nulidade a sentença, face aos artigos 607.º, n.ºs 4 e 5, 608.º e 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC.
A.g) Face ao exposto, deve a oposição à penhora, deduzida pela Executada em 20.09.2023, ser julgada procedente, revogando-se a decisão recorrida e ordenando-se o levantamento das penhoras realizadas em 08.09.2023.
A.h) O Tribunal a quo, na decisão recorrida, não conheceu e não se pronunciou sobre o pedido subsidiário para que este processo prosseguir a sua tramitação normal para que seja produzida a respetiva prova, com vista a apuramento dos factos e à boa decisão do pedido na oposição à penhora.
A.i) Porque o Tribunal a quo, na decisão recorrida, não conheceu e não se pronunciou sobre o pedido subsidiário por este motivo a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 5.º, n.º 1, n.º 2, alíneas a) a c), 6.º, 411.º, 412.º, 413.º e 567.º, n.º 1, do CPC, o que também fere de nulidade a sentença, face aos artigos 607.º, n.ºs 4 e 5, 608.º e 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC e, também por isto, deve ser revogada.
Nestes termos, por qualquer um dos fundamentos enunciados e nos melhores de Direito e de Justiça que, suprindo, a Veneranda Relação de Évora queira subscrever, pede-se o provimento do presente recurso, no sentido da sentença ser revogada, mas a Veneranda Relação ad quem melhor deliberará, com o que se fará, como sempre, Justiça.
Subsidiariamente, pelos motivos enunciados neste recurso, a Apelante pede aos Venerandos Desembargadores que deliberem que a sentença em crise seja alterada no sentido de que a terceira penhora seja reduzida apenas a um dos imóveis penhorado, concretamente ao prédio denominado de “(…)”, identificado no auto da penhora, de 08.09.2022, como Verba n.º 2, ao qual no ano de 2007, foi atribuído o valor de mercado de € 377.461,76, mas a Veneranda Relação melhor deliberará e fará Justiça».
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A parte contrária apresentou resposta, sustentando que deverá ser negado provimento à apelação. *
Admitido o recurso, foram observados os vistos legais. *
II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação da existência de nulidade e de erro na avaliação dos factos e na aplicação do direito.
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III – Dos factos apurados:
Para a justa decisão da causa interessam os factos referidos no relatório inicial e, além disso, no Tribunal a quo foi fixada a seguinte factualidade:
3.1 – Factos provados:
1. Em 08/09/2023 foram penhorados os seguintes imóveis:
- “Prédio misto denominado "Herdade de (…)" composto por parte rústica: cultura arvense, estéril, dependência agrícola, oliveiras, pastagem, olival, solo subjacente-cultura arvense-olival e leito de curso de água. Área: 44,2000 hectares – parte urbana: r/c, destinada a habitação -111 m2 - Norte: Couto da (…); - Sul: Ribeira da (…); - Nascente: Couto da (…); - Poente: herdade (…). Descrito na Conservatória do Registo Predial de Fronteira sob n.º (…), da freguesia de Fronteira e inscrito na matriz rústica (…), seção (…) e urbana (…);
- “Prédio rústico denominado "(…)" composto por cultura arvense, sobreiros e leito de curso de água. Área: 39,8750 hectares - Norte: Ribeira da (…); - Sul: herdade das (…); - Nascente: Couto da (…); - Poente: (…). Descrito na Conservatória do Registo Predial de Fronteira sob o n.º (…), da freguesia de Fronteira e inscrito na matriz (…), seção (…)”.
2. No referido auto, no quadro referente ao valor do prédio nada consta e no quadro referente ao total das verbas penhoradas consta “0,0”.
3. Nos autos, foram penhorados 10 imóveis em 10/08/2023, conforme auto de penhora junto aos autos principais, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, com o valor patrimonial total de € 36.592,12.
4. Encontra-se penhorado e na fase de venda nos autos principais os prédios penhorados em 29/10/2015.
5. A quantia exequenda está liquidada em € 509.556,69.
6. Os bens em fase de venda até à presente data nunca foram vendidos, tendo sido frustrada a venda através do tribunal, por leilão electrónico e por negociação particular.
7. O valor mais elevado proposto pelos bens foi de € 411.111,00.
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3.2 – Factos não provados:
Inexistem.
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IV – Fundamentação:
4.1 – Nulidade por omissão de pronúncia:
De acordo com a primeira parte da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, a sentença é nula, quando «o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».
A nulidade da decisão por omissão de pronúncia só acontece quando o acto decisório deixa de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra questão submetida à apreciação do Tribunal.
Questões submetidas à apreciação do Tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as excepções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio.
É a violação daquele dever que torna nula a decisão e tal consequência justifica-se plenamente, uma vez que a omissão de pronúncia se traduz, ao fim e ao cabo, em denegação de justiça e o excesso de pronúncia na violação do princípio dispositivo que contende com a liberdade e autonomia das partes.
Coisa diferente são as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, as quais correspondem a simples argumentos e não constituem questões na dimensão valorativa estipulada no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil.
Na esteira do preconizado por Alberto dos Reis há que não confundir questões suscitadas pelas partes com motivos ou argumentos por elas invocados para fazerem valer as suas pretensões. Na realidade, «são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o Tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão»[1].
Amâncio Ferreira evidencia que se trata da nulidade mais invocada nos tribunais, «originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda»[2].
Deste modo, o julgador não tem que analisar e a apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições. Apenas tem que resolver as questões que por aquelas lhe tenham sido postas[3] [4].
Na hipótese vertente existe uma identidade absoluta entre as pretensões deduzidas pelas partes e a matéria solucionada pelo Tribunal e, por conseguinte, aquilo que se acabou de expressar é suficiente para concluir que não existe omissão de pronúncia, sendo que claramente o Juízo Central de Competência Cível e Criminal de Portalegre conheceu, ao mesmo passo, do pedido principal e da pretensão subsidiária.
A opção por uma solução diversa daquela que foi preconizada na oposição à penhora não significa que ocorra qualquer nulidade formal na decisão, independentemente da avaliação do mérito da questão suscitada, a qual será conhecida de seguida.
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4.2 – Do excesso das penhoras realizadas e das demais questões suscitadas:
A acção executiva visa a realização efectiva, por meios coercivos, do direito violado e tem por suporte um título que constitui a matriz ou limite quantitativo e qualitativo da prestação a que se reporta (artigos 2.º e 10.º n.ºs 1, 4 e 5, do Código de Processo Civil).
Em primeiro lugar, concorda-se com a posição do Tribunal recorrido quanto à problemática da omissão da referência ao valor dos bens objecto da penhora sub judice. A falta dessa referência no auto de penhora não corresponde a uma nulidade da penhora. Neste particular, o valor dos bens pode ser reconstituído a partir dos dados de avaliação fiscal dos prédios. Para além disso, em última análise e em caso de discordância, em sede de actos preparatórios da venda, os sujeitos processuais gozam de prerrogativas processuais que lhes permitem requerer a avaliação dos prédios em ordem a fixar o valor justo dos mesmos.
Numa segunda linha de intervenção, colocava-se a questão da não produção da prova requerida. No entanto, após o Tribunal a quo ter anunciado que dispunha de todos os elementos necessários para promover uma decisão conscienciosa, as partes foram notificadas para se pronunciarem e nada disseram. E, nessa ordem de ideias, a opção de não realizar qualquer das diligências requisitadas era legítima.
Ainda assim, numa terceira dimensão, o Tribunal ad quem poderia concluir pela insuficiência de elementos de facto. Contudo, da análise integrada de todos os elementos disponibilizados pelo processo entende-se que não existe qualquer motivo para desencadear uma fase de instrução quanto a este tema probatório, por os autos conterem tudo aquilo que se mostra necessário para um julgamento esclarecido.
Numa visão subsequente, é colocada em causa a matéria de facto que foi utilizada para construir o silogismo judiciário. Gabriel Catarino afiança que «toda a decisão judicial deflui ou é gerada numa causa que tem na sua origem uma situação factual a que, conceptualmente, corresponderá uma hipótese suposta numa norma»[5].
Nesta equação, a sentença comporta um silogismo em que a premissa maior é a lei, a premissa menor corresponde aos factos apurados no caso concreto e a conclusão é a decisão. Num silogismo, as premissas são os juízos que precedem a conclusão e dos quais ela decorre como consequente necessário. No silogismo judiciário as premissas – ou juízos – são os fundamentos e a conclusão é a decisão propriamente dita, devendo esta inferir-se daqueles como seu corolário lógico.
Neste ponto, não foi carreado para os autos qualquer elemento sólido e credível que permitisse destruir a motivação e a fixação da decisão de facto. Na verdade, os Tribunais Superiores vem pugnando que a alocução fundamento para impor decisão diversa, nos termos proclamados pelo n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil, não se basta com a possibilidade de uma alternativa decisória antes exige que o juízo efectuado pela Primeira Instância esteja estruturado num lapso relevante no processo de avaliação da prova[6]. E aqui não existe qualquer erro na fixação da matéria.
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Feita esta primeira análise global do processo importa entrar na questão verdadeiramente pertinente e responder à pergunta se a extensão da penhora ultrapassa o objectivo precípuo do pagamento da quantia exequenda e dos demais encargos inerentes cobráveis?
Na previsão do n.º 3 do artigo 735.º do Código de Processo Civil, «a penhora limita-se aos bens necessários ao pagamento da dívida exequenda e das despesas previsíveis da execução».
O supra mencionado n.º 3 consagra um limite para o valor dos bens penhorados e, sendo penhorados bens em excesso, poderá o executado deduzir oposição à penhora nos termos da parte final da alínea a) do n.º 1 do artigo 784.º[7] do Código de Processo Civil.
A lei provisiona a própria fórmula adequada de cálculo do objecto da execução, a qual é constituída pelo montante da dívida exequenda acrescido das despesas previsíveis da execução, de acordo com um critério matemático alocado à alçada do Tribunal, sem prejuízo de ulterior liquidação.
Rui Pinto afirma que estas regras da proporcionalidade funcionam de modo objectivo, em função do valor das dívidas, principal e acessórias, não em função da configuração subjectiva da causa[8].
Com efeito, no preceito legal em discussão, para além dos casos de impenhorabilidade parcial, foi intenção do legislador a estipulação de um conceito de moderação que impedisse a violação do princípio da proporcionalidade reportado no n.º 2 do artigo 751.º do Código de Processo Civil.
O princípio da proporcionalidade deve ser utilizado não só para apreciar se a penhora excede (ou não) os limites estabelecidos no n.º 2 do artigo 751.º[9] [10] do Código de Processo Civil, mas também para determinar, caso se conclua pela existência de excesso, qual ou quais dos bens do executado devem permanecer penhorados, em vista da realização da finalidade última da execução – integral satisfação do crédito exequendo – e, por contraponto, quais dos bens devem ser libertados e subtraídos a tal garantia[11].
Este princípio, também designado por princípio da suficiência[12], tem raiz constitucional no direito de propriedade privada (cfr. artigo 62.º[13] da Constituição da República Portuguesa) que torna excepcional qualquer oneração ou perda forçada das situações jurídicas activas privadas[14].
Nesta sede, o julgador deverá tentar alcançar um equilíbrio justo entre o direito do credor à satisfação do seu crédito e o direito do devedor à preservação do património não essencial ao pagamento da dívida exequenda.
A agressão do património do executado só é permitida numa medida em que seja adequada e necessária para a satisfação da pretensão do exequente. A natural e indispensável prevalência dos interesses do exequente não pode determinar um completo desrespeito dos interesses do executado, pois que a posição jurídica do credor, embora prevalecente, não pode ser considerada absoluta[15] [16] [17].
O critério da proporcionalidade e da suficiência na penhora de bens do devedor deve ser apreciado em termos de normalidade, tendo-se em atenção não só o valor dos bens em causa, mas ainda se os mesmos se encontram livres e desembaraçados[18] [19].
Na concretização prática dos princípios da proporcionalidade e da suficiência, ao fiscalizar a legalidade da operação de penhora dos bens do devedor, o julgador deverá tentar alcançar um equilíbrio justo entre o direito do credor à satisfação do seu crédito e o direito do devedor à preservação do património não essencial ao pagamento da dívida exequenda, de acordo com um critério de normalidade social.
Dito de outra forma, na jurisprudência nacional, prevalece o entendimento que a natureza gravosa da penhora se limita àquilo que seja necessário para a satisfação do crédito exequente e das custas, devendo penhorar-se bens cujo valor pecuniário seja de mais fácil realização e se mostrem adequados ao ressarcimento do montante do crédito do exequente.
É nesta relação dialéctica entre os princípios da proporcionalidade e o da adequação que cumpre aferir se os bens penhorados são suficientes para pagamento do crédito e das custas ou, se pelo contrário, o objecto da penhora é manifestamente excessivo e viola os limites legais editados a este propósito.
É certo que se está perante um terceiro acto apreensão de bens e é igualmente inquestionável que existe um número impressionante de imóveis penhorados. Todavia, os imóveis apreendidos nos autos em momento anterior não demonstraram ser idóneos a garantir o pagamento da quantia de € 509.556.69 (quinhentos e nove mil e quinhentos e cinquenta e seis euros e sessenta e nove cêntimos).
Uma penhora materialmente justa exige sempre alguma ponderação casuística e, na situação vertente, da consulta dos autos ressalta que entre 2015 (o momento da penhora inicial ocorre em 29/10/2015) e 2024, a projectada transacção dos imóveis penhorados resultou frustrada, tanto na modalidade de venda por “carta fechada”, como por negociação particular” e, por fim, idêntico resultado negativo está presente na venda em leilão electrónico.
Não merece assim qualquer censura a premissa que, decorridos 9 (nove) anos sobre a data da primeira penhora, a exequente não recebeu qualquer pagamento, coercivo ou voluntário, relacionado com a quantia exequenda devida, mostrando-se assim o objectivo da execução incumprido.
Deste modo, ao contrário daquilo que foi avançado na impugnação por via recursal, não existem dados que permitam concluir que estamos perante uma penhora inadmissível, ilícita e desnecessária de bens para o pagamento da dívida.
Efectivamente, no plano concreto, para além da já assinalada dificuldade de venda dos bens em causa, não está viabilizada a leitura que as penhoras em causa vão para além do necessário ao pagamento da dívida exequenda e das despesas previsíveis da execução. Inexistem, assim, dados que permitam concluir que o juízo prudencial efectuado pelo Meritíssimo Juiz de Direito está errado.
Desta sorte, apenas temos de validar o entendimento que os bens inicialmente penhorados são «insuficientes para pagamento da quantia exequenda» e que o «exequente tem direito ao pagamento num prazo razoável», não havendo qualquer argumento recursivo com a virtualidade de infirmar o veredicto contido no acto recorrido.
Aquilo que o julgador a quo e o agente de execução têm de avaliar é se, na dinâmica processual em curso, podem ocorrer actos de venda que ultrapassassem os limites necessários ao pagamento da quantia exequenda, caso em que estão jungidos a tomar as medidas apropriadas e adequadas para que tal não aconteça. Essa, sim, seria a circunstância que poderia colocar em causa o direito à propriedade privada da executada e o princípio da proporcionalidade, mas que, até à data, não se verifica nem existem indícios que tal possa vir a ocorrer.
Assim, julga-se improcedente o recurso e confirma-se a decisão recorrida, devendo os autos prosseguir nos termos definidos na sentença recorrida.
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V – Sumário: (…)
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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar improcedente o recurso de apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela recorrente, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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Processei e revi.
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Évora, 19/03/2024
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Cristina Maria Xavier Machado Dá Mesquita
Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite
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[1] José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), pág. 143.
[2] Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª Edição, pág. 57.
[3] José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), ob. cit., pág. 141.
[4] A. Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, pág. 688.
[5] Gabriel Catarino, Decisões judiciais/Sentença. Aspectos da sua formação, A Reforma do Processo Civil, Revista do Ministério Público, Cadernos II, 2012, pág. 104.
[6] Por todos podem ser consultados os acórdãos de 30/01/2020, 13/02/2020, 04/06/2020, 08/10/2020, 03/12/2020, 13/05/2021 e 30/06/2021, entre muitos outros disponíveis na plataforma www.dgsi.pt.
[7] Artigo 784.º (Fundamentos da oposição):
1 - Sendo penhorados bens pertencentes ao executado, pode este opor-se à penhora com algum dos seguintes fundamentos:
a) Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada;
b) Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda;
c) Incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência.
2 - Quando a oposição se funde na existência de patrimónios separados, deve o executado indicar logo os bens, integrados no património autónomo que responde pela dívida exequenda, que tenha em seu poder e estejam sujeitos à penhora.
[8] Rui Pinto, A Ação Executiva, AAFDL, Lisboa, 2018, pág. 537.
[9] Artigo 751.º (Ordem de realização da penhora):
1 - A penhora começa pelos bens cujo valor pecuniário seja de mais fácil realização e se mostrem adequados ao montante do crédito do exequente.
2 - O agente de execução deve respeitar as indicações do exequente sobre os bens que pretende ver prioritariamente penhorados, salvo se elas violarem norma legal imperativa, ofenderem o princípio da proporcionalidade da penhora ou infringirem manifestamente a regra estabelecida no número anterior.
3 - Ainda que não se adeque, por excesso, ao montante do crédito exequendo, é admissível a penhora de bens imóveis que não sejam a habitação própria permanente do executado, ou de estabelecimento comercial, desde que a penhora de outros bens presumivelmente não permita a satisfação integral do credor no prazo de seis meses.
4 - Caso o imóvel seja a habitação própria permanente do executado, só pode ser penhorado:
a) Em execução de valor igual ou inferior ao dobro do valor da alçada do tribunal de 1.ª instância, se a penhora de outros bens presumivelmente não permitir a satisfação integral do credor no prazo de 30 meses;
b) Em execução de valor superior ao dobro do valor da alçada do tribunal de 1.ª instância, se a penhora de outros bens presumivelmente não permitir a satisfação integral do credor no prazo de 12 meses.
5 - A penhora pode ser reforçada ou substituída pelo agente de execução nos seguintes casos:
a) Quando o executado requeira ao agente de execução, no prazo da oposição à penhora, a substituição dos bens penhorados por outros que igualmente assegurem os fins da execução, desde que a isso não se oponha o exequente;
b) Quando seja ou se torne manifesta a insuficiência dos bens penhorados;
c) Quando os bens penhorados não sejam livres e desembaraçados e o executado tenha outros que o sejam;
d) Quando sejam recebidos embargos de terceiro contra a penhora, ou seja a execução sobre os bens suspensa por oposição a esta deduzida pelo executado;
e) Quando o exequente desista da penhora, por sobre os bens penhorados incidir penhora anterior;
f) Quando o devedor subsidiário, não previamente citado, invoque o benefício da excussão prévia.
6 - Nos casos previstos na alínea a) do número anterior em que se verifique oposição à penhora, o agente de execução remete o requerimento e a oposição ao juiz, para decisão.
7 - Em caso de substituição, e sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 745.º, só depois da nova penhora é levantada a que incide sobre os bens substituídos.
8 - O executado que se oponha à execução pode, no ato da oposição, requerer a substituição da penhora por caução idónea que igualmente garanta os fins da execução.
[10] A que correspondia o n.º 3 do artigo 821.º do Código de Processo Civil, na sua anterior redacção e que é referenciado no acórdão citado.
[11] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29/03/2011, in www.dgsi.pt.
[12] Neste sentido podemos encontrar o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 24/05/2007, in www.dgsi.pt.
[13] Artigo 62.º (Direito de propriedade privada):
1. A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição.
2. A requisição e a expropriação por utilidade pública só podem ser efectuadas com base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização.
[14] Rui Pinto, A Ação Executiva, AAFDL, Lisboa, 2018, pág. 536.
[15] Miguel Teixeira de Sousa, Acção Executiva Singular, Lex, Lisboa, 1998, pág. 33.
[16] Com o mesmo posicionamento pode ser encontrado o comentário de Diogo Leite Campos, Da responsabilidade do credor na fase do incumprimento, Revista da Ordem dos Advogados, ano 52º, vol. III, Dez. 1992, pág. 860, quando sublinha que «o credor insatisfeito que vem satisfazer o seu crédito sobre o património do devedor, está vinculado por normas jurídicas que fixam limites à acção. Limites internos (como a boa fé) e limites externos (como a proibição de causar danos ao devedor, para além da deslocação patrimonial necessária para satisfazer a sua pretensão).
[17] Ou ainda como Marco Gonçalves Carvalho, Lições do Processo Civil Executivo, Almedina, Coimbra, 2016, págs. 283-284, que advoga que o legislador procurou proteger o executado contra a verificação de eventuais abusos na execução do seu património, impedindo, designadamente, a penhora de bens e/ou direitos de valor manifestamente superior ao necessário ao pagamento da dívida exequenda e demais custas e despesas da execução.
[18] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29/11/2004, in www.dgsi.pt.
[19] Acórdão do Tribunal da Relação de lisboa de 09/06/2005, in www.dgsi.pt.