Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
5358/16.7T8STB.E1
Relator: PAULO AMARAL
Descritores: ARRENDAMENTO
SUSPENSÃO DO CONTRATO
Data do Acordão: 03/09/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Se, na pendência de um procedimento cautelar, em que se pede a suspensão do pagamento da renda, proposto por um inquilino contra o senhorio, o contrato de arrendamento deixa de vigorar, verifica-se a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 5358/16.7T8STB.E1 (2.ª Secção)
Acordam no Tribunal da Relação de Évora

(…), Unipessoal, Lda. veio intentar o presente procedimento cautelar comum contra (…) e (…), peticionando:
a) que o pagamento das rendas do locado seja declarado suspenso até à decisão sobre a obtenção da licença para fins comerciais;
b) que o pagamento das rendas seja declarado suspenso até o requerente ter livre acesso à cave;
c) que o pagamento das rendas seja declarado suspenso, até à decisão final sobre a legalização das obras de ampliação do armazém;
d) caso assim não se entenda, deverá o contrato de arrendamento ser declarado nulo, por inexistência de licença comercial;
e) deverão ainda os requeridos procederem à entrega imediata do certificado energético do locado;
f) deverão ainda os requeridos serem condenados no valor de 10 mil euros a título de investimentos feitos no armazém.
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Os requeridos impugnaram os factos e invocaram que não existe justificação para a suspensão do pagamento de rendas, tendo os requeridos procedido à resolução do contrato com esse fundamento, por carta datada de 18.07.2016.
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Foi decidido, depois de audição das partes, julgar extinta a instância por inutilidade da lide. E decidiu-se assim porque, por carta de 18 de Julho de 2016, os requeridos resolveram o contrato.
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Deste despacho recorre o requerente alegando que a sentença é nula a fundamentação da douta sentença está em oposição à decisão e condena o ora recorrente em objecto diverso do pedido – artigo 615.º, n.º 1, alíneas c), d) e e) do CPC.
No mais alegou que o senhorio não argumentou qualquer excepção de resolução do contrato, nem se depreende do seu teor qualquer alusão à resolução.
A suposta comunicação de resolução do contrato ao ter sido efectuada através de carta registada com aviso de recepção, tal comunicação não goza de eficácia para fazer cessar o contrato por resolução com fundamento na falta de pagamento da renda (art.º 1084.º do CC e 7.º do art.º 9.º da Lei nº 6/06).
Até ao momento não foi feita notificação judicial da resolução do contrato.
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Foram colhidos os vistos.
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Começaremos por analisar a questão da nulidade da sentença e para afirmar que ela não existe.
Ao contrário do que afirma o recorrente, não houve qualquer condenação; o tribunal limitou-se a constatar que, perante um determinado facto, a lide não tinha que prosseguir. Por isso mesmo, também não se pode dizer que exista contradição entre os fundamentos e a decisão. Mais uma vez, antes pelo contrário. Constatando que o contrato tinha sido resolvido, e por causa disto, o tribunal decidiu que, não existindo arrendamento, perderam fundamento os pedidos do recorrente (suspensão do pagamento de rendas o que pressupõe a vigência do contrato).
Assim, julga-se improcedente a arguição.
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Da leitura da oposição, acompanhada de documentos, tira-se a conclusão que os recorridos alegaram a resolução do contrato.
Com efeito, no art.º 7.º escreveram o seguinte:
«Do exposto decorre que o inquilino, ora requerente, à excepção do 1º pagamento nunca procedeu ao pagamento atempado da renda, incorrendo sempre em mora superior a oito dias, o que tendo sucedido por mais de 4 vezes, desde o início do contrato, motivou em 19 de Julho de 2015, a expedição de carta com notificação para desocupar o locado e entregá-lo livre de pessoas e bens». E juntam, como documento n.º 2, a carta de resolução. Esta tem a data de 2016 pelo que temos de entender a referência ao ano de 2015 feita no articulado como um lapso.
Temos, assim, por certo que a resolução do contrato foi alegada pelo que tal facto não podia deixar de merecer a devida atenção.
Como se escreve na sentença recorrida, não é este o local nem o momento para discutir a validade da resolução ou os respectivos fundamentos (algo que nem sequer está aqui em questão); o que não se pode deixar de ter em conta é que tal resolução ocorreu. Trata-se de um direito potestativo, ou seja, de um direito subjectivo apto a «produzir uma alteração na esfera jurídica de outrem, mediante uma manifestação de vontade a isso dirigida» (Castro Mendes, Direito Civil Teoria Geral, vol. II, poli., Lisboa, 1979, p. 127). Tal direito pode ser de exercício judicial obrigatório ou não. No caso da resolução do contrato de arrendamento, e desde que ela seja feita com os fundamentos indicados no n.º 3 e n.º 4 do art.º 1083.º Cód. Civil (que é o caso alegado), a extinção do contrato opera «por comunicação à contraparte onde fundamentadamente se invoque a obrigação incumprida» (art.º 1084.º, n.º 2), o que é confirmado pelo art.º 9.º, n.º 7, al. c), da Lei n.º 6/2006.
Sendo assim, ou seja, estando acabado o contrato, nada há a pedir com base nele como se ele estivesse em vigor (queremos com isto ressalvar a possibilidade de se pedirem contas pela execução do contrato que é independente da sua vigência).
O pedido de suspensão do pagamento das rendas pressupõe que o contrato ainda exista, ainda valha entre as partes. Como o pressuposto não existe, não há que determinar tal suspensão pelo que o pedido formulado sempre teria de improceder.
E o mesmo vale para o pedido subsidiário de declaração de nulidade do contrato pois que a resolução temo mesmo efeito extintivo e é equiparada, quanto aos seus efeitos, à declaração de nulidade, nos termos do art.º 433.º, Cód. Civil.
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Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso.
Custas pelo recorrente.
Évora, 09 de Março de 2017
Paulo Amaral
Francisco Matos
José Tomé de Carvalho