Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | TOMÉ DE CARVALHO | ||
Descritores: | EXONERAÇÃO DO PASSIVO RESTANTE RECUSA PREJUÍZO PARA OS CREDORES | ||
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Data do Acordão: | 09/14/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | 1 – A gravidade das consequências para o devedor da revogação ou da recusa da exoneração – com a consequente vinculação à satisfação integral de todos os créditos sobre a insolvência – impõe, por aplicação do princípio de proporcionalidade ou razoabilidade, que aquela extinção só possa fundamentar-se numa conduta dolosa ou com culpa grave do devedor que seja causa de um dano para os seus credores, objectivamente imputável àquela conduta, mesmo quando o fundamento jurídico da decisão esteja indexado à violação do dever de colaboração devido. 2 – Uma decisão que seja completamente omissa na enunciação de factos não permite considerar que estão preenchidos os requisitos da reiterada existência de negligência grave ou dolo das suas obrigações e que desse facto resulta prejuízo efectivo para a satisfação dos créditos. (Sumário do Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 213/16.3T8STR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de ... – Juízo de Comércio ... – J... * Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: AA requereu o procedimento de exoneração do passivo restante e, ao ser recusada a exoneração do passivo restante, a devedora veio interpor recurso. * Por decisão datada de 11/02/2016, foi declarada a insolvência de AA. * Em 12/04/2016, foi admitido liminarmente o incidente de exoneração do passivo e foi fixado como limiar do rendimento disponível individual o valor correspondente a um salário mínimo nacional, devendo todo o excedente mensal ser entregue ao fiduciário designado. * Em 18/06/2018 foi determinado o encerramento do processo de insolvência. * A insolvente não remeteu ao fiduciário a informação relativa ao rendimento por si obtido, desde o início da exoneração. * Na sequência de requerimento apresentado pelo “(…) Banco, SA” em que solicitava que fosse recusada a exoneração, foi ordenada a notificação do fiduciário para que, no prazo de 10 dias, informasse se a insolvente entregou os comprovativos dos rendimentos e, sendo caso, complementar o relatório. * O fiduciário informou que a insolvente não entregou a documentação em falta.* Foi realizada a notificação da insolvente, pessoalmente e através do seu Ilustre Mandatário para, no prazo de dez dias, se pronunciar sobre a requerida cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 243.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. * A insolvente nada disse. * Em 21/06/2023, foi proferida a decisão recorrida, que recusou a exoneração do passivo restante à insolvente AA e, consequentemente, declarou a cessação antecipada do procedimento. * A insolvente não se conformou com a referida decisão e as suas alegações contenham as seguintes conclusões: «1. A sentença recorrida viola os princípio do CIRE. 2. Pois o recorrente demonstrou com documentos que os valores que ficam para viver são insuficientes. 3. O prejuízo que eventualmente que os credores poderiam ter sofrido. 4. O prejuízo a que se refere o artigo 238.º, n.º 1, alínea d), deverá corresponder a um prejuízo concreto que, nas concretas circunstâncias do caso, tenha sido efetivamente sofrido pelos credores em consequência do atraso á apresentação a insolvência 5. Cabia aos credores, o dever de virem reclamar tais prejuízos o que não aconteceu e os que fizeram foram ressarcidos. 6. Alias nenhum dos credores levantou este assunto em processo. 7. O recorrente esteve e sempre esteve de boa-fé. 8. Não sonegou bens, e antes pelo contrario demonstram os seus rendimentos na sua totalidade. 9. Tanto mais que nenhum credor foi prejudicado. 10. Não existe qualquer violação do CIRE. 11. O insolvente sempre prestou a colaboração. 12. Nunca disse que não entregava o carro. 13. Por isso deve ser decretada a exoneração do recorre. Nestes termos e nos demais , requer-se a V. Exa. que seja revogada a sentença e seja decretada a exoneração do passivo ora negada com as consequências legais. Assim se fará a costumada Justiça». * Não houve lugar a resposta. * Admitido o recurso, foram observados os vistos legais. * II – Objecto do recurso: É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma). Analisadas as conclusões das alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito ao apuramento se deve ser recusada a cessão do passivo restante. * III – Factos com interesse para a decisão da causa: Os factos com interesse para a justa decisão da causa constam do relatório inicial quanto à tramitação processual e, bem assim, os seguintes: 1 – À data da entrada da petição inicial, a insolvente era casada, mas vivia separada do marido, tinha dois filhos maiores e trabalhava como doméstica. 2 – Foi apreendida nos autos a meação de fracção autónoma designada pela letra ..., descrita na Conservatória do registo Predial ... sob o n.º...92 e inscrita na matriz sob o artigo ...30, correspondente ao ... andar para habitação, sita na Rua ..., em .... A outra metade da meação estava apreendida no processo registado sob o n.º 214/16.... e ficou decidida a liquidação conjunta, devendo ser entregue metade do montante apurado aos presentes autos. * IV – Fundamentação: 4.1 – Considerações gerais sobre a exoneração do passivo: Como se pode ler no Preâmbulo do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, no que respeita aos insolventes singulares, procura-se conjugar de «forma inovadora o princípio fundamental do ressarcimento dos credores com a atribuição aos devedores singulares da possibilidade de se libertarem de algumas das suas dívidas, e assim lhes permitir a sua reabilitação económica». A exoneração do passivo restante constitui uma novidade do nosso ordenamento jurídico, inspirada no direito alemão (Restschuldbefreiung), determinada pela necessidade de conferir aos devedores pessoas singulares uma oportunidade de começar de novo[1]. Este instituto é igualmente tributário da Discharge da lei norte-americana (Bankruptcy Code). O procedimento de exoneração do passivo restante encontra assento nos artigos 235.º a 248.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, com particular enfoque no regime substantivo do instituto da cessão do rendimento disponível provisionado no artigo 239.º[2] do diploma em análise. A exoneração do passivo restante traduz-se na liberação definitiva do devedor quanto ao passivo que não seja integralmente pago no processo de insolvência ou nos três anos posteriores ao encerramento das condições fixadas no incidente[3] (à data cinco anos). Daí falar-se de passivo restante. Excepciona-se, contudo, as dívidas abrangidas pela estatuição do n.º 2 do artigo 245.º[4] [5]. Estamos confrontados com dois interesses conflituantes, por um lado, a subsistência dos insolventes e, por outro, a finalidade primária do processo de insolvência que consiste no pagamento dos credores, à custa dos bens e dos rendimentos que deveriam ser canalizados para a massa insolvente. A exoneração do passivo não se traduz numa faculdade do direito falimentar para o insolvente se libertar, incondicionalmente, da responsabilidade de satisfazer as obrigações que tem para com os seus credores durante o período de cessão e isso implica que seja encontrado um ponto de equilíbrio entre o ressarcimento desses credores e a garantia do mínimo necessário ao sustento digno do devedor e do seu agregado familiar. Para além das obras genéricas relacionadas com o direito falimentar, sobre a problemática específica da exoneração do passivo restante podem consultar-se as posições de Luís Carvalho Fernandes[6] [7], Catarina Serra[8] [9], Adelaide Menezes Leitão[10] [11], Ana Filipa Conceição[12] [13], Alexandre Soveral Martins[14], Catarina Frade[15], Cláudia Oliveira Martins[16], Francisco de Siqueira Muniz[17], Gonçalo Gama Lobo[18] [19], José Gonçalves Ferreira[20], Mafalda Bravo Correia[21], Maria Assunção Cristas[22], Maria do Rosário Epifânio[23], Paulo Mota Pinto[24] e Pedro Pidwell[25]. * 4.2 – Da decisão recorrida: A decisão recorrida estriba-se no seguinte premissa: «a insolvente tinha conhecimento das obrigações que sobre si impendiam, tanto mais que foi notificada das mesmas aquando da prolação do despacho inicial a que alude o artigo 238.º, n.º 1, do CIRE. Do supra exposto, resulta que a insolvente não prestou as informações a que estava obrigado nos termos do artigo 239.º, n.º 4, alínea a), do CIRE e, mesmo quando notificada pelo tribunal, não as prestou nem justificou esse comportamento omissivo. Assim sendo, a conduta da insolvente consubstancia uma grosseira displicência face aos deveres que lhe estavam cometidos no período de cessão, mais concretamente, o dever de prestar as informações sobre os seus rendimentos (artigo 239.º, n.º 4, alínea a), do CIRE), actuação que se qualifica de grave negligência». As causas que fundamentam a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante vêm estatuídas nas alíneas do n.º 1 do artigo 243.º[26] do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. A decisão de cessação tem uma especificidade processual nas situações previstas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do presente artigo e isso implica que, antes de emitir decisão, o juiz oiça «o devedor, o fiduciário e os credores da insolvência». A alínea a) refere-se a comportamentos do devedor, ocorridos no período de cessão, que envolvam violação dolosa ou com negligência grave das obrigações que lhe são impostas pelas alíneas do n.º 4 do artigo 239.º, desde que daí resulte prejuízo para a realização dos créditos sobre a insolvência[27]. Em situação que entronca com a presente hipótese jurisdicional já escrevemos noutro acórdão proferido que «o eventual incumprimento da obrigação de entrega dos montantes que ultrapassem o salário mínimo mensal apenas pode ser imputado na esfera jurídica dos insolventes. Na realidade, os insolventes estão vinculados a um dever de informação, mostravam-se representados por mandatário forense – mesmo que esta relação tivesse sido interrompida ou que existissem dificuldades de comunicação com o advogado ou com o fiduciário – que, em caso de dúvida, deveria accionar os meios processuais adequados em ordem a perfectibilizar a ordem judicial prévia. Não está demonstrado nos autos que existisse qualquer erro ou omissão do fiduciário e a obrigação é de depósito e não de mera comunicação de rendimentos»[28]. Existe a obrigação de entrega imediata ao fiduciário de qualquer quantia recebida que integre rendimentos objecto de cessão, por impulso do insolvente e sem necessidade de intervenção directora do Tribunal ou do administrador judicial nomeado para fase de exoneração do passivo restantes. Recentrando na questão submetida à apelação, como elemento inovador e solucionando dissídios jurisprudenciais sobre a interpretação da extensão da obrigação de colaboração contidas no regime precedente, o motivo subjacente à recusa da exoneração consiste no não fornecimento «no prazo que lhe seja fixado informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações». Pergunta-se assim se a violação daquela obrigação funciona de forma automática e dispensa os requisitos de culpa e prejuízo exigidos para os demais institutos relacionados com o indeferimento liminar, cessação antecipada ou recusa de exoneração do passivo? Na situação vertente, é fácil constatar que a recorrente incumpriu o dever de informação que sobre ela impedia. Porém, a nosso ver, a recusa da exoneração do passivo restante depende dos mesmos fundamentos e subordina-se aos mesmos requisitos previstos no artigo 243.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas pelos quais poderia ter cessado antecipadamente[29] [30]. Quer o indeferimento liminar, quer a cessação antecipada ou a recusa de exoneração exigem que esteja preenchido o elemento subjectivo do tipo, ou seja que o devedor actue com dolo ou culpa grave[31], pois o incumprimento do devedor tem de resultar de uma concreta actuação dolosa ou gravemente negligente do seu comportamento, prejudicando por esse facto os credores. A relevância do prejuízo deve aferir-se pelo quantum do valor desse rendimento e do não cumprimento daquele prestação, pelo valor global dos débitos do insolvente, pela natureza dos créditos e pela qualidade dos credores insatisfeitos[32]. E da decisão não resulta a existência de qualquer prejuízo para os credores. Efectivamente, a gravidade das consequências para o devedor da revogação ou da recusa da exoneração – com a consequente vinculação à satisfação integral de todos os créditos sobre a insolvência – impõe, por aplicação do princípio de proporcionalidade ou razoabilidade, que aquela extinção só possa fundamentar-se numa conduta dolosa ou com culpa grave do devedor que seja causa de um dano para os seus credores, objectivamente imputável àquela conduta, mesmo quando o fundamento jurídico da decisão esteja indexado à violação do dever de colaboração devido. O Tribunal Constitucional sufraga o entendimento de que «envolvendo a exoneração do passivo restante uma colisão de direitos ou valores constitucionalmente protegidos – de um lado, a protecção constitucional dos créditos, no quadro da proteção geral do património; do outro lado, a protecção da liberdade económica e do direito ao desenvolvimento da personalidade, e, também, o princípio, próprio do Estado Social de Direito, da proteção social dos mais fracos – apenas os interesses do devedor insolvente não culposo foram considerados pelo legislador como devendo prevalecer sobre os dos credores, tanto mais que para a exoneração não é exigida sequer uma satisfação parcial dos créditos destes»[33]. Isto é, terá de ser sempre formulado um juízo de culpabilidade, positivo ou negativo. Na presente situação, a decisão é completamente omissa na enunciação de factos e não se retira como o Tribunal a quo deu como preenchidos os requisitos da reiterada existência de negligência grave ou dolo das suas obrigações e desse facto resultar prejuízo efectivo para a satisfação dos créditos. E, ao substituir-se ao decisor «a quo» na elaboração da decisão de facto, o Tribunal da Relação de Évora não logrou reconstituir o juízo de censura que deve ser dirigido ao agente por ter agido como agiu quando, dada a sua capacidade e em face da situação concreta, podia e devia ter agido doutra maneira e, de igual modo, como já se deixou assinalado, não está evidenciado qualquer prejuízo para os credores. Gabriel Catarino afiança que «toda a decisão judicial deflui ou é gerada numa causa que tem na sua origem uma situação factual a que, conceptualmente, corresponderá uma hipótese suposta numa norma»[34]. Nesta equação, a sentença comporta um silogismo em que a premissa maior é a lei, a premissa menor corresponde aos factos apurados no caso concreto e a conclusão é a decisão. Num silogismo, as premissas são os juízos que precedem a conclusão e dos quais ela decorre como consequente necessário. No silogismo judiciário as premissas – ou juízos – são os fundamentos e a conclusão é a decisão propriamente dita, devendo esta inferir-se daqueles como seu corolário lógico. Mais importante do que a eventual nulidade por falta de fundamentação, o problema básico não é este Tribunal da Relação de Évora desconhecer qual é a motivação da construção jurídica – a exemplo de uma determinada corrente jurisprudencial[35] a Meritíssima Juíza de Comércio de ... parece defender o automatismo da previsão –, mas antes se funda num entendimento que exige numa decisão que bule com direitos fundamentais terá de existir factualidade de suporte que fundamente a recusa da exoneração. E os poucos factos disponibilizados pelo processo indicam que a insolvente é pessoa carenciada, de fracas posses e que já foi privada da sua casa de morada de família, o que, na nossa visão, afasta o preenchimento do conceito de culpa concreta, sendo que a formulação normativa de recusa de exoneração do passivo, ainda que de informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações, não dispensa os aludidos requisitos da culpa e do prejuízo. Não existem, pois, elementos de facto que viabilizem a formulação jurídica sobre uma realidade processualmente certa, posto que, assim sendo, revoga-se a decisão recorrida. * V – Sumário: (…) * VI – Decisão:Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar procedente o recurso interposto, julga-se procedente o recurso interposto, revogando-se a decisão recorrida. Sem tributação. Notifique. * Processei e revi. * Évora, 14/09/2023 José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho Vítor Sequinho dos Santos Maria Domingas Alves Simões __________________________________________________ [1] Maria do Rosário Epifânio, Manual do Direito da Insolvência, 6ª edição, Almedina, Coimbra, 2016, pág. 320. [2] Artigo 239.º (Cessão do rendimento disponível), na redacção introduzida pela Lei n.º 9/2022, de 11 de Janeiro: 1 - Não havendo motivo para indeferimento liminar, é proferido o despacho inicial, na assembleia de apreciação do relatório, ou nos 10 dias subsequentes a esta ou ao decurso dos prazos previstos no n.º 4 do artigo 236.º. 2 - O despacho inicial determina que, durante os três anos subsequentes ao encerramento do processo de insolvência, neste capítulo designado por período da cessão, o rendimento disponível que o devedor venha a auferir se considera cedido a entidade, neste capítulo designada por fiduciário, escolhida pelo tribunal de entre as inscritas na lista oficial de administradores da insolvência, nos termos e para os efeitos do artigo seguinte. 3 - Integram o rendimento disponível todos os rendimentos que advenham a qualquer título ao devedor, com exclusão: a) Dos créditos a que se refere o artigo 115.º cedidos a terceiro, pelo período em que a cessão se mantenha eficaz; b) Do que seja razoavelmente necessário para: i) O sustento minimamente digno do devedor e do seu agregado familiar, não devendo exceder, salvo decisão fundamentada do juiz em contrário, três vezes o salário mínimo nacional; ii) O exercício pelo devedor da sua actividade profissional; iii) Outras despesas ressalvadas pelo juiz no despacho inicial ou em momento posterior, a requerimento do devedor. 4 - Durante o período da cessão, o devedor fica ainda obrigado a: a) Não ocultar ou dissimular quaisquer rendimentos que aufira, por qualquer título, e a informar o tribunal e o fiduciário sobre os seus rendimentos e património na forma e no prazo em que isso lhe seja requisitado; b) Exercer uma profissão remunerada, não a abandonando sem motivo legítimo, e a procurar diligentemente tal profissão quando desempregado, não recusando desrazoavelmente algum emprego para que seja apto; c) Entregar imediatamente ao fiduciário, quando por si recebida, a parte dos seus rendimentos objecto de cessão; d) Informar o tribunal e o fiduciário de qualquer mudança de domicílio ou de condições de emprego, no prazo de 10 dias após a respectiva ocorrência, bem como, quando solicitado e dentro de igual prazo, sobre as diligências realizadas para a obtenção de emprego; e) Não fazer quaisquer pagamentos aos credores da insolvência a não ser através do fiduciário e a não criar qualquer vantagem especial para algum desses credores. 5 - A cessão prevista no n.º 2 prevalece sobre quaisquer acordos que excluam, condicionem ou por qualquer forma limitem a cessão de bens ou rendimentos do devedor. 6 - Sendo interposto recurso do despacho inicial, a realização do rateio final só determina o encerramento do processo depois de transitada em julgado a decisão. [3] Artigo 235.º (Princípio geral): Se o devedor for uma pessoa singular pode ser-lhe concedida a exoneração dos créditos sobre a insolvência que não forem integralmente pagos no processo de insolvência ou nos três anos posteriores ao encerramento deste, nos termos do presente capítulo. [4] Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª edição (actualizada de acordo com o Decreto-Lei n.º 26/2015, de 6 de Fevereiro, e o Código de Processo Civil de 2013), Quid Juris, Lisboa, 2015, pág. 848. [5] Artigo 245.º (Efeitos da exoneração): 1 - A exoneração do devedor importa a extinção de todos os créditos sobre a insolvência que ainda subsistam à data em que é concedida, sem excepção dos que não tenham sido reclamados e verificados, sendo aplicável o disposto no n.º 4 do artigo 217.º. 2 - A exoneração não abrange, porém: a) Os créditos por alimentos; b) As indemnizações devidas por factos ilícitos dolosos praticados pelo devedor, que hajam sido reclamadas nessa qualidade; c) Os créditos por multas, coimas e outras sanções pecuniárias por crimes ou contra-ordenações; d) Os créditos tributários e da segurança social. [6] Luís Carvalho Fernandes, La exoneración del passivo restante en la insolvência de personas naturales en el Derecho Português, Revista de Derecho Concursal y Paraconcursal, n.º 3-2005. [7] Luís Carvalho Fernandes, A exoneração do passivo restante na insolvência das pessoas singulares no Direito Português, in Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, Colectânea de estudos sobre a insolvência, Quid Juris, Lisboa, 2009, págs. 275 e seguintes. [8] Catarina Serra, As funções do Direito da Insolvência no âmbito de life time contracts (breve reflexão), in Nuno Manuel Pinto Oliveira e Benedita McCrorie (coordenação), Pessoa, Direito e direitos, Braga, Direitos Humanos – Centro de investigação Interdisciplinar, Escola de direito da Universidade do Minho, 2016. [9] Catarina Serra, Lições de Direito da Insolvência, Almedina, Coimbra, 2018, págs. 556 e seguintes. [10] Adelaide Menezes Leitão, Pré-condições para a exoneração do passivo restante – Anotação ao Ac. do TRP de 29.9.2010, Proc. 995/09”, Cadernos de Direito Provado, 2011, 35, págs. 65 e seguintes. [11] Adelaide Menezes Leitão, Insolvência de pessoas singulares: a exoneração do passivo restante e o plano de pagamentos: as alterações da Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, in AA. VV. Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor José Lebre de Freitas, vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 2013, págs. 509 e seguintes. [12] Ana Filipa Conceição, Disposições específicas da insolvência de pessoas singulares no Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, in I Congresso de Direito da Insolvência, [13] Ana Filipa Conceição, A jurisprudência portuguesa dos tribunais superiores sobre exoneração do passivo restante – Breves notas sobre a admissão da exoneração e a cessão de rendimentos em particular”, Julgar on line, Junho de 2016. [14] Alexandre Soveral Martins, A reforma do CIRE e as PMEs”, Estudos de Direito da Insolvência, Coimbra Editora, Coimbra, pág. 15 e seguintes. [15] Catarina Frade, O perdão das dívidas na insolvência das famílias, In Ana Cordeiro Santos (coordenação) Famílias endividadas: uma abordagem de economia política e comportamental. Causas e Consequências, Almedina, Coimbra, 2015. [16] Cláudia Oliveira Martins, O procedimento de exoneração do passivo restante – controvérsias jurisprudenciais e alguns aspectos práticos, Revista de direito da Insolvência, 2016, ano 0, págs. 213 e seguintes. [17] Francisco de Siqueira Muniz, O sobreendividamento por créditos ao consumo e os pressupostos de indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo restante no processo de insolvência, Estudos do Direito do Consumidor, 2017, n.º 12, págs. 337 e seguintes. [18] Gonçalo Gama Lobo, Da exoneração do passivo restante, in Pedro Costa Azevedo (coordenação), Insolvência, Volume especial, Nova Causa, 2012. [19] Gonçalo Gama Lobo, Exoneração do passivo restante e causas de indeferimento liminar do despacho inicial, in Catarina Serra (coordenação), I Colóquio do Direito da Insolvência de Santo Tirso, Almedina, Coimbra, 2014, págs. 257 e seguintes. [20] José Gonçalves Ferreira, A exoneração do passivo restante, Coimbra Editora, Coimbra, 2013. [21] Mafalda Bravo Correia, Critérios de fixação do rendimento indisponível no âmbito do procedimento de exoneração do passivo restante na jurisprudência e na conjugação com o dever de prestar alimentos, Julgar, 2017, 31, págs. 109 e seguintes. [22] Maria Assunção Cristas, Exoneração do Devedor pelo Passivo Restante, Themis, edição especial, 2005. [23] Maria do Rosário Epifânio, Manual do Direito da Insolvência, 6ª edição, Almedina, Coimbra, 2016. [24] Paulo Mota Pinto, Exoneração do passivo restante: fundamento e constitucionalidade, in Catarina Serra (coordenação), III Congresso de Direito da Insolvência, Almedina, Coimbra, 2015, pág. 175 e seguintes. [25] Pedro Pidwell, Insolvência de pessoas Singulares. O “Fresh Start” – será mesmo começar de novo? O fiduciário. Algumas notas”, revista de Direito da insolvência, 2016, n.º …, págs. 195 e seguintes. [26] Artigo 243.º (Cessação antecipada do procedimento de exoneração), na redacção introduzida pela Lei n.º 9/2022, de 11 de Janeiro. 1 - Antes ainda de terminado o período da cessão, deve o juiz recusar a exoneração, a requerimento fundamentado de algum credor da insolvência, do administrador da insolvência, se estiver ainda em funções, ou do fiduciário, caso este tenha sido incumbido de fiscalizar o cumprimento das obrigações do devedor, quando: a) O devedor tiver dolosamente ou com grave negligência violado alguma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º, prejudicando por esse facto a satisfação dos créditos sobre a insolvência; b) Se apure a existência de alguma das circunstâncias referidas nas alíneas b), e) e f) do n.º 1 do artigo 238.º, se apenas tiver sido conhecida pelo requerente após o despacho inicial ou for de verificação superveniente; c) A decisão do incidente de qualificação da insolvência tiver concluído pela existência de culpa do devedor na criação ou agravamento da situação de insolvência. 2 - O requerimento apenas pode ser apresentado dentro dos seis meses seguintes à data em que o requerente teve ou poderia ter tido conhecimento dos fundamentos invocados, devendo ser oferecida logo a respetiva prova. 3 - Quando o requerimento se baseie nas alíneas a) e b) do n.º 1, o juiz deve ouvir o devedor, o fiduciário e os credores da insolvência antes de decidir a questão; a exoneração é sempre recusada se o devedor, sem motivo razoável, não fornecer no prazo que lhe seja fixado informações que comprovem o cumprimento das suas obrigações, ou, devidamente convocado, faltar injustificadamente à audiência em que deveria prestá-las. 4 - O juiz, oficiosamente ou a requerimento do devedor ou do fiduciário, declara também encerrado o incidente logo que se mostrem integralmente satisfeitos todos os créditos sobre a insolvência. [27] Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª edição, Quid Juris, Lisboa, 2015, pág. 867. [28] Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 05/12/2019, consultável em www.dgsi.pt. [29] Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 02/03/2023, disponibilizado em www.dgsi.pt. [30] Artigo 244.º (Decisão final da exoneração): 1 - Não tendo havido lugar a cessação antecipada, ouvido o devedor, o fiduciário e os credores da insolvência, o juiz decide, nos 10 dias subsequentes ao termo do período da cessão, sobre a respetiva prorrogação, nos termos previstos no artigo 242.º-A, ou sobre a concessão ou não da exoneração do passivo restante do devedor. 2 - A exoneração é recusada pelos mesmos fundamentos e com subordinação aos mesmos requisitos por que o poderia ter sido antecipadamente, nos termos do artigo anterior. 3 - Findo o prazo da prorrogação do período de cessão, se aplicável, o juiz decide sobre a concessão ou não da exoneração do passivo restante nos termos dos números anteriores. [31] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18/04/2023, cuja leitura pode ser realizada em www.dgsi.pt. [32] Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 03/06/2014, pesquisável em www.dgsi.pt. [33] Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 733/2021, de 22/09/2021, pesquisável em www.tribunalconstitucional.pt. [34] Gabriel Catarino, Decisões judiciais/Sentença. Aspectos da sua formação, A Reforma do Processo Civil, Revista do Ministério Público, Cadernos II, 2012, pág. 104. [35] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18/04/2023, editado em www.dgsi.pt. |